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Atividade Prática de Laboratório

Capítulo II – (Re)pensar a aula de Física

4. Atividades didáticas

4.1. Atividade Prática de Laboratório

“Eu ouço e esqueço, eu vejo e lembro, eu faço e compreendo.” Confúcio

Uma criança, desde o seu nascimento, tenta desvendar o mundo em que vive. Para tal, observa, ouve, toca e só mais tarde, quando se consegue expressar verbalmente, pergunta. Neste contexto e sendo a Física uma ciência que procura a explicação do mundo natural, a eficaz realização de atividades práticas de laboratório (APL) reveste- se de grande importância para a compreensão dos conceitos (Cachapuz et al., 2000) e aceite como metodologia de ensino que pode gerar frutíferas discussões entre os alunos (Cachapuz, 2000).

Porém, embora seja indispensável que um estudante do Ensino Básico e Secundário tenha aulas num laboratório, este tipo de aulas não é garantia que traga aprendizagem para os estudantes (Hofstein e Lunetta, 2004). Os resultados dos estudos realizados em diversos países e citados por Almeida (2004) mostram que os estudantes, principalmente do género feminino, não valorizam os resultados das aulas de laboratório para a sua aprendizagem.

Alguns autores referem mesmo uma necessidade da reconceptualização da APL, à luz de uma perspetiva construtivista social da natureza da ciência e da aprendizagem (Hodson,1996). Assim, é necessário repensar o seu papel na educação em ciências e ativar os meios para que ela concretize uma aprendizagem significativa.

No ensino tradicional o trabalho experimental (TE) apresenta uma visão mecanicista, em que os alunos se limitam a seguir as instruções, tipo receita, sem estabelecer uma relação coerente entre os conceitos envolvidos (Lopes e Silva, 2004).

Esta visão conteudística foi já rejeitada pelas linhas pedagógicas, que tencionam dar ao TE um alcance mais ambicioso, como a redescoberta da ciência aliada à construção de estruturas cognitivas e da mudança concetual.

Tal como a pedagogia vigotskiana defende e citado por Gaspar (2014), a aprendizagem não resulta da aprendizagem em si, mas das interações sociais que é

capaz de desencadear. O objetivo fundamental da atividade teórica ou experimental é promover interações sociais que permitam o ensino de determinado conteúdo. Portanto, a opção do TE deve ter como objetivo valorizar as interações sociais em relação ao conteúdo envolvido.

Podemos apontar as seguintes vantagens do TE: a) papel do aluno.

Atividades em que o professor direciona muito as instruções, tornam-se pobres e desenvolvem pouco as competências dos alunos. Segundo Lopes e Silva (2010), a autonomia dos alunos poderá ser promovida se forem incentivados os seguintes passos: - dar tempo para que os alunos se envolvam suficientemente na realização do TE; - dar pequenas instruções aos alunos, apenas quando estes atingirem pontos de bloqueio; - permitir que os alunos trabalhem colaborativamente e discutam os seus pontos de vista; - ouvir os alunos e não cair na tentação de os interromper, sempre que mencionam algo que não é cientificamente aceite.

Segundo o trabalho de Engle e Conant (2002), os 4 princípios orientadores para promover o envolvimento produtivo dos alunos são: - o professor encorajar os alunos para darem contribuições intelectuais; - dar liberdade aos alunos para se tornarem mais ativos nas suas aprendizagens; - responsabilizar os alunos nas boas práticas de sala de aula; - providenciar os recursos materiais necessários e fontes de informação pertinentes.

b) papel do professor.

O professor é o responsável pelo desenvolvimento académico e social dos seus alunos. Assim, deverá imprimir um ambiente positivo na sua sala de aula, caracterizado por uma escuta ativa, interação, motivação, respeito e realização de um trabalho produtivo.

Segundo Veiga (2010) o aluno melhora os seus resultados académicos quando o professor ao interagir com os seus alunos, lhes dá autonomia, ouve-os com atenção, pede para fundamentarem as suas escolhas/ justificações, valoriza as suas intervenções (destacando os aspetos positivos), elogia a qualidade do seu trabalho e faculta o tempo necessário para o cumprimento das tarefas. Recorrendo a uma metáfora para tentar explicar o papel do professor, talvez pudéssemos compará-lo aos andaimes que suportam exteriormente um edifício

em construção e que vão sendo retirados à medida que a estrutura em construção se vais conseguindo sustentar sem ajuda.

c) ambiente de sala de aula.

O ambiente de sala de aula deverá ser positivo, de forma a potenciar a participação dos alunos, o trabalho colaborativo e à reflexão.

Nem sempre um professor experiente e detentor de competências científicas, consegue pôr em prática as dinâmicas de grupo, tão fundamentais para a realização do TE. Quando tal se verifica, poderá pôr em prática uma metodologia do tipo investigação-ação (Cohen et al., 2010).

A tabela 3 apresenta uma sugestão de critérios orientadores de uma pedagogia para o TE, inspirado na teoria de Vigotski e numa vertente de metodologia de investigação ação.

Tabela 3 – Critérios orientadores de uma metodologia de TE. (Adaptado de Gaspar, 2014) Critério Descrição  Estar ao alcance da zona de desenvolvimento proximal

É importante que a exposição da questão desafio e de toda abordagem esteja adequada ao nível cognitivo dos estudantes.

Não é a complexidade do conceito que determina a sua compreensão, mas a atividade/tarefa proposta pelo professor.

 Garantir a mediação da aprendizagem por pares mais capazes

A aprendizagem de conhecimento ocorre num ambiente social, em que o professor ou um colega mais apto, guia a atividade de um aluno menos apto. Durante a instrução guiada e à medida que se vão desenvolvendo os conhecimentos e competências do aprendiz, o “guia” vai-lhe transferindo, cada vez mais, o “controlo das operações”.

Critério Descrição  Garantir a partilha das perguntas e das conclusões alcançadas

Determinados TE têm elementos acessórios - interruptores, fios, entre outros - que não estão propriamente relacionados com o objetivo da tarefa. Neste caso os alunos mais capazes devem tentar centrar a atenção dos restantes colegas nos pontos essenciais a observar e discutir, para que consigam chegar à resposta do desafio inicial.

 Garantir a partilha da linguagem científica

Na construção social do conhecimento, todos os aprendizes devem contribuir para estarem familiarizados com a linguagem científica utilizada, bem como com a interpretação de gráficos, esquemas, simbologia específica.

Em face da realidade nacional – elevado número de alunos por turma, programas curriculares muito extensos e heterogeneidade no apetrechamento dos laboratórios de Física – alguns professores terão de fazer escolhas na dinamização de cada um dos TE. Assim, podem optar por uma das duas modalidades de atividades experimentais:

a) de demonstração.

b) realizadas pelo aluno ou grupo de alunos.

As atividades experimentais de demonstração devem ser planificadas tendo em conta os seguintes critérios:

 montagem - devem ser levadas para a aula já preparadas e testadas previamente, para evitar possíveis imprevistos.

 tempo de apresentação - deve ser inferior ao tempo total da aula, deixando “espaço” para as observações, discissão e esclarecimento de dúvidas. Experiências cuja obtenção dos resultados se estendem por um longo intervalo de tempo devem ser evitadas.

 observação dos resultados - o professor deve garantir que todos os alunos conseguiram observar os resultados.

 visibilidade - os equipamentos de laboratório devem ter a dimensão mais adequada para que as observações sejam alcançadas por todos.

 eficiência dos equipamentos - caso os equipamentos estejam mal montados ou em mau estado de conservação (por exemplo, kit de circuitos elétrico oxidados ou com maus contactos), os alunos podem desviar o foco da sua atenção para pontos acessórios e pôr em causa o processo social a que a aprendizagem assim o exige.

 Intervenção do professor - deverá ser sempre efetuada pelo professor, caso se tratar de uma experiência que acarreta riscos ou se caracterize por um elevado nível de complexidade. Porém, se não for esse o caso, será muito mais produtivo que seja apresentada por um aluno ou grupo de alunos.

No caso de atividades experimentais realizadas por um aluno ou grupo de alunos devem seguir-se os seguintes aspetos:

 viabilidade da montagem - o professor deve comprovar previamente a qualidade dos equipamentos necessários, o tempo necessário para a realização da respetiva atividade e avaliar a riqueza da atividade na consecução dos objetivos pretendidos.

 tempo de apresentação - é importante que tenha a duração estritamente necessária, para que se consiga deixar tempo para o debate de ideias.

 prontidão do professor para dar solução às dúvidas dos alunos - é sabido que apesar de ser exigido ao professor uma boa preparação pedagógica e científica, pode acontecer uma situação em que este não consiga responder de imediato ao aluno. Nesse caso, deverá procurar a resposta cientificamente correta e comunicá-la posteriormente ao aluno.

Do que foi exposto anteriormente, podemos concluir que caso o TE seja bem explorado e orientado, poderão advir daí vantagens para o aluno. Esta atividade irá permitir que o aluno consiga não só construir uma estrutura mental mais rica, como desenvolver a capacidade de compreender os conceitos e também os princípios de montagem e funcionamento dos equipamentos.