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5. TERAPIA OCUPACIONAL E AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS: PERCPEÇÕES

5.2 Atividades desenvolvidas na prática

Na entrevista com as terapeutas ocupacionais foi solicitado que relatassem sobre suas atribuições e a rotina de trabalho.

Algumas atividades desenvolvidas pelas terapeutas ocupacionais membros das equipes de medidas socioeducativas em meio aberto correspondem às atribuições verificadas no mapeamento realizado neste estudo, ou seja, aquelas exercidas pelos técnicos em geral, como: interpretação de medida, atendimento individual e grupal, reuniões de família, visita domiciliar, formações externas e internas, elaboração de relatórios, estudo e discussão de casos. Nas palavras de uma das entrevistadas:

Faço atendimentos com adolescentes, familiares, amigos e companheiros, atendimentos individuais e grupais, contatos com a rede de atendimento do município e outras localidades quando necessário, reuniões com esta rede, reuniões na instituição de equipes e com todos os funcionários, supervisão institucional mensal, reunião mensal com o CREAS, diante da municipalização das medidas em meio aberto (E8, p.96).

Além dessas atribuições vinculadas ao trabalho socioeducativo em si, as terapeutas ocupacionais também coordenam grupos de atividades e fazem seus planejamentos, arrumam a sala de atividades, desenvolvem grupos temáticos que perpassam pelo “universo infracional” (E8), tais como drogas, sexo, carros, motos, tatuagens, mulheres, e grupos sobre trabalho, internet e informática. Tais atividades não são exclusivamente executadas pelos terapeutas ocupacionais, mas compõem também suas atribuições, assunto que será discutido mais adiante. A coordenação de grupos parece ser uma função recorrente entre as terapeutas ocupacionais, sejam eles compostos por famílias ou adolescentes:

Eu tenho um grupo de mães, um grupo que faz o patchwork, costura, o grupo hoje já tem dois anos, está tentando ser um grupo de geração de renda, geração de complemento de renda porque eu acho que a gente não gera renda, cem reais por mês para mim não é renda, então, é um complemento (E3, p.45-46).

Deste modo, parece que os grupos se constituem em um importante recurso de acompanhamento, haja vista que ele proporciona a possibilidade de trocas entre os seus membros, assim como a de um complemento de renda.

Duas das terapeutas ocupacionais participantes não desempenhavam as funções supracitadas, uma vez que ocupavam o cargo de coordenadoras do serviço. Uma delas elencou suas atribuições da seguinte forma: gestão, previsão orçamentária, levantamento dos projetos, discussão com as secretarias, elaboração de relatórios, formação e organização da equipe, supervisão de estágios, articulação interna e externa, reuniões, discussão e

planejamento de propostas para os atendimentos, mediação de conflitos com a rede, suporte e cuidado para a equipe.

A outra coordenadora relata que além do acolhimento inicial do adolescente, a ela cabe “olhar para a instituição como um todo”:

Nesse papel, tenho que olhar pra instituição como um todo, diante de uma visão macro, de articulação, do papel do técnico, do trabalho da medida. Então, uma rotina assim, tem dias que você consegue estabelecer um fluxo de agenda, e conforme as demandas que vão aparecendo, mas com muitos

links. Eu vejo que o papel da coordenação tem que estar “linkada” o tempo

inteiro e com tudo, mediando todas essas questões, então assim, tem sido um grande desafio pra mim, um aprendizado (E5, p.66).

Então, ambas as coordenadoras se consideram, de certo modo, “mediadoras” de situações, seja com a “rede” de serviços, com a própria equipe, ou mesmo na integração entre o “macro” e os acompanhamentos em seu nível mais próximo. Sobre essa integração, é necessária ao terapeuta ocupacional, sobretudo no campo social, a dedicação ao fortalecimento e criação das redes sociais de suporte, no aspecto “individual e coletivo, a partir do contexto microssocial que o sujeito está envolvido, realizando o trilhar sempre constante com a macroestrutura presente” (MALFITANO, 2005, p.2).

Vale destacar que na instituição em que E5 atua há um revezamento entre os membros da equipe técnica para compor a coordenação. Este rodízio oferta a todos os técnicos a oportunidade de atuar, tanto na prática direta com os adolescentes quanto, num outro momento, na coordenação do serviço, democraticamente. Deste modo, acredita-se que esse “olhar pro macro”, que pode ser proporcionado pela assunção do cargo de coordenador, pode contribuir para a atuação daqueles que, em outro momento, estarão nos atendimentos diretos e vice-versa.

Então, é muito interessante você passar por esse papel de coordenação, que tem outros problemas, você para de atender no seu tempo de coordenadora e só fica coordenadora, então, a E518, a partir desse ano, de dois de janeiro é coordenadora e não está atendendo, mas atendeu três anos, quatro (E3, p. 47).

Além dos técnicos, destacamos também a importância da participação dos adolescentes na gestão dos programas, conforme salienta o SINASE (BRASIL, 2006). E1

relatou que tem um desejo de que haja uma maior presença dos adolescentes na coordenação do serviço:

O desejo é o de que os adolescentes participem mais da gestão do programa, a gente tem tentado caminhar pra isso, é difícil porque tem uma rotatividade grande, pela própria natureza da medida. Então, eles permanecem pouco tempo no programa, mas a gente tem buscado escutar os desejos, aquilo que eles acreditam que pode ser interessante ou não no programa, então também como uma atividade minha de trabalho (E1, p.9).

Mediante esta colocação, a entrevistada acrescenta que, dentre as suas atribuições, ela também deve escutar e atender aos desejos dos adolescentes. Todavia, vale ressaltar a diferença existente entre eles serem escutados pela coordenação e terem “poderes” de voto para promoção de mudanças de fato, principalmente no que concerne às decisões do serviço.

Assim, verifica-se que são diversas as atribuições conferidas aos técnicos, em geral, com a predominância de coordenação de grupos e atividades pelos terapeutas ocupacionais, especificamente. Mas, para aqueles profissionais que estão na gestão dos serviços, seus papeis se mostraram diferenciados dos demais, sendo apontados alguns desafios relativos à participação conjunta dos adolescentes.