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2 A EXPERIMENTAÇÃO NO ENSINO QUÍMICA

2.3 ATIVIDADES EXPERIMENTAIS LÚDICAS

Em linhas gerais, as disciplinas de ciências naturais são pouco populares no ensino médio. Professores, em geral, procuram alternativas que venham trazer a atenção e o interesse dos alunos. Na lista de alternativas encontra-se a experimentação. Os experimentos que envolvam mudança de coloração ou pequenas explosões são os mais escolhidos. É incrível perceber como os alunos ficam vislumbrados com o show de cores e fumaça, eles até mesmo chegam a buscar explicações científicas para entender os fatos observados. Contudo, essa forma de tratar o experimento didático possui alguns sérios problemas, os quais serão discutidos no decorrer desse tópico.

Segundo Oliveira (2009), a ludicidade está relacionada com algo que venha a gerar prazer, divertimento, alegria e dentre outras sensações. A satisfação é o objetivo de qualquer atividade de caráter lúdico, e essas atividades como jogos e brincadeiras estão presente na vida do indivíduo desde a primeira infância.

34 Nesse sentido, o brincar para o ser humano é algo que está na sua essência, desde o ventre materno, onde a criança ao brincar com seu corpo, ao fazer movimentos, começa a construtor sua história. Assim, a escola não pode ficar alheia a esse fato, devendo dar continuidade a esse processo, auxiliando o aluno a construir conhecimento escolar a partir de atividades que lhe permita conciliar a brincadeira com a aprendizagem de tal forma que o processo formal se torne prazeroso (OLIVEIRA, 2009, p. 57).

A fragilidade desse discurso é facilmente observada e comunga muito bem com as ideias do movimento construtivista. Uma das características desse movimento é justamente trazer o foco do processo educativo para o aluno, logo, a escola precisa se tornar um ambiente onde o aluno queira estar e sinta-se feliz por estar ali – a aquisição do conhecimento clássico fica em segundo plano. Segundo Rossler (2006), para o construtivismo, o aluno é a referência básica em todo processo, o centro de qualquer reflexão ou ação pedagógica, sendo assim, ele precisa estar satisfeito. Se a concepção de indivíduo para o construtivismo é feliz, criativo, curioso, ativo e que constrói seu próprio conhecimento, a escola então precisa ser um ambiente que contribua efetivamente para o desenvolvimento dessas habilidades no indivíduo.

Não estamos aqui defendendo que escola precisa ser chata e desinteressante, mas precisamos refletir mais sobre esta concepção de espaço escolar. Trazer o lúdico para o ensino é uma opção extremamente válida, quando ele aparece com foco no conhecimento e com uma objetivação clara e concreta. O produto final sempre deverá ser o conhecimento, não apenas o divertimento.

Rossler (2006), ao trazer à tona alguns dos aspectos retóricos e ideológicos inerentes ao conteúdo do construtivismo, nos mostra alguns aspectos que são amplamente difundidos em sua bibliografia. Um dele é o chamado “hedonismo: o prazer e o lúdico” (ROSSLER, p.217, 2006). O hedonismo está relacionado com o prazer como sendo o bem maior da vida, logo, ele precisa estar em tudo, em todos os ramos de atividades que venhamos a desenvolver. Assim sendo, o construtivismo entende que o prazer precisa estar presente em qualquer atividade que seja desenvolvida no contexto escolar. O conceito de atividades lúdicas aqui é tido como atividades que envolvam brincadeiras, jogos, divertimento (prazer), essas atividades são consideradas fundamentais no processo de ensino aprendizagem. O entendimento do conceito fica em segundo plano, ao passo que tudo que seja considerado não lúdico é desqualificado, maçante, chato, pesado etc. Segundo o

35 autor, essa valorização está relacionada com o caráter individualista do indivíduo capitalista, que está refletido nessa teoria.

[...] trata-se, mais uma vez, de enfatizar o indivíduo (sua felicidade, sua satisfação, seu bem-estar, etc.) como categoria máxima de todo e qualquer processo social, inclusive dos processos educativos. Na verdade, as ideias hedônicas e pragmatistas do construtivismo casam-se perfeitamente bem com os ideias liberais de nosso tempos, que têm na ideia de indivíduo seu pilar de sustentação central[...] (ROSSLER, p.223, 2006).

Autores defendem a inserção da ludicidade no processo de ensino, nessa perspectiva, a experimentação didática é uma alternativa para vir a trazer esse lúdico para dentro das salas de aulas.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1999) propõe que o ensino (em todas as áreas) deve ser trabalhado em sala de aula de forma mais dinâmica e divertida, quebrando o hábito escolar da aula tradicional e chamando a atenção do aluno. Tal aspecto também foi evidenciado nas Orientações Curriculares Nacionais (Brasil, 2006). Nesse sentido, uma série de trabalhos diferenciados, que vão desde experimentos, dinâmicas, softwares e jogos, vêm sendo propostos com o intuito de melhorar o ensino de química, disciplina que, segundo Chassot (1995), difícil de aprender e, segundo os próprios alunos, em muitos aspectos ainda continua descontextualizada, asséptica e sem sentido algum para eles e até mesmo para os professores (OLIVEIRA; SOARES; VAZ, 2015, p. 285).

Mas nem todo experimento é lúdico, segundo Oliveira (2009), uma atividade experimental para ser considerada lúdica precisa ser dotada de algumas características especificas como: entreter e divertir o aluno, a participação ativa do aluno, incitar a liberdade investigativa do aluno, o interesse do aluno é espontâneo (afinal ninguém deve se sentir obrigado a se divertir) dentre outras características.

Segundo Messeder Neto (2015), ao fazer uma análise apurada a essas características das chamadas “atividades experimentais lúdicas (AEL)” (OLIVEIRA, 2009, p. 114), podemos perceber o quanto ela se assemelha das atividades experimentais investigativas e vêm trazendo em seu bojo fortes características do movimento construtivista, ao exemplo da valorização da liberdade investigativa e espontaneidade do aluno.

O ensino de ciências bem respaldado precisa estar alicerçado em três características básicas: entender a ciência, entender sobre a ciência e entender como fazer ciência (HODSON, 1992, apud MESSEDER NETO, 2015). Se o recurso utilizado pelo professor não abraçar essas características sua forma de utilização deve ser repensada. É uma condição sine qua non de que a experimentação seja utilizada de maneira objetiva e intencional, superando concepções simplistas como “instigar o caráter investigativo do indivíduo”, ou “atrair a atenção de alunos em uma

36 aula densa de conteúdos”. Infelizmente, estas concepções simplistas estão permeando o ensino de química fortemente na atualidade.

O caráter lúdico e visual do experimento, muitas vezes supera o ensino e os alunos saem da aula sem saber, de fato, qual transformação química estava atrelada ao experimento que acabaram de realizar. Por exemplo, em um experimento simples como identificação de substâncias ácidas e básicas através da utilização de indicadores como: suco de repolho, azul de bromotimol ou fenolftaleína. O aluno estará atento, geralmente, a mudança de coloração das substâncias (geralmente líquidos presentes no cotidiano dos alunos como: vinagre, água sanitária, água, água com gás, leite etc.) em contato com os respectivos indicadores e isso é normal, pois as cores sempre chamam muito atenção.

Mas, por que há alteração na coloração? O que diferencia um meio ácido de um meio básico? Qual reação química está envolvida na mudança de coloração? E se diluída a substância, mudará a coloração? Os alunos devem ser capazes de responder a todos esses questionamentos depois da aula, ou seja, a aula precisa ser planejada de modo que o conteúdo químico seja o foco e a objetivação. O experimento, seja demonstrativo ou manipulativo, é uma das alternativas que o professor escolheu para transmitir o clássico, aquilo que já está posto e aceito pela comunidade científica. A partir dessa aula o aluno irá se munir de artifícios científicos para entender a diferença entre um ácido e uma base. Se ao fim da aula o estudante não for capaz de responder a esses tipos de questionamentos, entendemos que o caráter visual superou o conteúdo, logo, esse experimento precisa ser repensado.

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