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Capítulo III: Diferenciais salariais entre os gêneros no setor público brasileiro no período 1992-

3 Causas do diferencial de rendimentos entre os gêneros no setor público

3.1 Atributos individuais

O hiato salarial entre homens e mulheres no setor público reflete, em certa medida, a diferença nos atributos produtivos médios e no tipo de inserção profissional dos servidores de cada sexo.

Os servidores do sexo masculino, por exemplo, trabalham, em média, 39,4 horas por semana, ao passo que a jornada semanal de trabalho das mulheres, é de, em média, 34,3 horas, 13,1% menor, portanto. Esta diferença de médias pode estar sendo influenciada, no entanto, pela elevada proporção de mulheres nos serviços de ensino, em que frequentemente se declaram apenas as horas-aula trabalhadas. Entre os profissionais do ensino com formação de nível superior, por exemplo, a proporção de mulheres é de 84,4% e o número de horas semanais de

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Tal como na seção anterior, foram excluídos da amostra os indivíduos que não declararam o valor do rendimento mensal do trabalho principal e aqueles que apresentaram rendimento nulo. Entretanto, não se eliminou os indivíduos residentes nas áreas rurais de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá, pois não serão realizadas comparações com os dados anteriores a 2004. Foram, porém, excluídos os de cor e idade ignorada, os de escolaridade não determinada ou sem declaração, os que não declararam o número de horas trabalhadas por semana no trabalho principal, a área do emprego e se pertenciam ou não a algum sindicato no mês de referência da pesquisa e ainda os que, em relação à ocupação, declararam pertencer a outras categorias além das constantes no formulário de entrevista, não souberam responder a este quesito ou cuja resposta foi mal definida. Tais exclusões não afetaram a validade dos resultados, verificando-se que a magnitude do hiato salarial por sexo no setor público permaneceu a mesma, com as mulheres auferindo rendimentos em média 31,7% inferiores aos dos homens em 2008.

trabalho declaradas é 31,4. Os professores leigos e de nível médio, por seu turno, declaram trabalhar, em média, 29,0 horas semanais e 87,0% deles são mulheres. Excluindo estas duas categorias ocupacionais da amostra de servidores e recalculando as médias do número de horas semanais de trabalho para cada sexo, a diferença no tamanho das jornadas laborais diminui, mas continua elevada, com as mulheres trabalhando 10,3% menos que os homens em sua ocupação principal.

Em relação à educação, as mulheres apresentam, em média, maior grau de escolaridade que os homens. Cerca de 30% dos servidores do sexo masculino completaram, no máximo, o ensino fundamental, ao passo que entre as mulheres esta porcentagem é de 17,1%; em contrapartida, o percentual de indivíduos que completaram ao menos a 4a série de um curso superior é mais de dez pontos superior para as mulheres (ver gráfico 3.4).

Gráfico 3.4: Distribuição de homens e mulheres ocupados no setor público segundo o maior grau escolar obtido. Brasil, 2008. 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 % Não-alfabetizado 3,14 1,48 Alfabetizado 3,88 2,04 Ensino elementar 10,97 6,32 Ensino fundamental 12,06 7,28 Ensino médio 45,37 47,48

Concluída pelo menos a 4ª série de um curso superior

24,58 35,41

Homens Mulheres

Já a idade média dos funcionários públicos é praticamente a mesma para homens e mulheres, ao redor de 40 anos. A distribuição dos indivíduos por faixa etária (gráfico 3.5) também é semelhante nos dois casos, revelando que mais de 50% dos servidores têm entre 30 e 49 anos.

A idade pode ser utilizada como uma medida aproximada do tempo de experiência profissional acumulada pelos trabalhadores. É preciso reconhecer, no entanto, que esta medida tende a superestimar a experiência profissional feminina face à masculina, pois não considera o eventual afastamento da função por ocasião da licença-maternidade, que pode durar entre quatro e seis meses no setor público. Em alguns casos, as dificuldades para conciliar o emprego e os cuidados com os filhos acarretam inclusive a retirada temporária da mulher do mercado de trabalho. Como a PNAD não capta informações que permitam calcular o tempo de inatividade feminina por ocasião da maternidade, manteremos a idade como aproximação da experiência profissional, embora tendo estas limitações em mente.

Gráfico 3.5: Distribuição de homens e mulheres ocupados no setor público por faixa etária. Brasil, 2008.

0 5 10 15 20 25 30 35 Homens Mulheres %

19 anos ou menos 20-29 30-39 40-49 50-59 60 anos ou mais

Fonte: Microdados PNAD de 2008. Elaboração própria.

A tabela 3.3 mostra a distribuição de homens e mulheres ocupados no setor público segundo categorias de diversas variáveis, em 2008.

Observa-se que 68,4% dos servidores homens chefiam suas famílias, ao passo que apenas 33,2% das servidoras assumem esta condição em seus lares. Este fato se coaduna com a menor

jornada semanal de trabalho das mulheres, evidenciando a persistência da divisão sexual do trabalho, que atribui ao homem o papel de principal responsável pelo sustento da família, cabendo às mulheres a maior parte dos afazeres domésticos e dos cuidados com os filhos.

Em relação à localização do domicílio, a maior parte dos funcionários públicos — 63,8% — reside em áreas urbanas não-metropolitanas. Nota-se, porém, uma fração um pouco maior das servidoras residindo em área rural não-metropolitana (8,7%), face aos servidores (5,4%). Isto se deve à grande proporção de mulheres — 80,5% — entre os profissionais de ―educação, saúde e serviços sociais‖, os quais, por seu turno, constituem a maioria — 62,2% — dos postos de trabalho do setor público no meio rural não-metropolitano.

No que tange à cor do indivíduo, percebemos que os dois grupos de servidores apresentam o mesmo perfil, ou seja, compõem-se de proporções de brancos, indígenas, pretos, amarelos e pardos muito semelhantes. Há predominância de trabalhadores brancos (51,5% dos homens e 54,9% das mulheres), que são seguidos de pardos (39,4% e 37,1%, respectivamente) e de pretos (8,1% e 7,0%, respectivamente).

Em relação à localização geográfica dos servidores dos dois sexos, constata-se padrão semelhante de distribuição espacial, com elevada proporção de funcionários públicos no Sudeste (quase 40%, repartidos entre SP e MG+ES+RJ) e no Nordeste (cerca de 26,2% dos homens e 28,3% das mulheres). Para uma análise mais detalhada das diferenças regionais e estaduais encontradas na distribuição dos servidores do país, ver o apêndice A deste capítulo.

Quanto à distribuição das servidoras entre as esferas de governo, observa-se que apenas 9,6% delas estão ocupadas no governo federal, 32,8% nos governos estaduais e a maioria, cerca de 57,6%, empregam-se em postos de trabalho municipais. Os servidores do sexo masculino, por outro lado, estão distribuídos de forma um pouco mais equilibrada entre os três níveis de governo: aproximadamente 22,0% deles ocupam funções em nível federal, 34,3% em nível estadual e 43,7% em âmbito municipal.

No tocante aos ramos de atividade econômica que compõem o setor público, se tomarmos o total de funcionárias públicas, encontraremos aproximadamente 64,6% delas ocupadas em atividades relativas a ―educação, saúde e serviços sociais‖ e quase 28,7% na administração pública. A distribuição dos servidores do sexo masculino é completamente distinta, com cerca de 60,5% deles alocados na administração pública, 20,7% no grupamento ―educação, saúde e serviços sociais‖ e os 18,8% restantes distribuídos entre os demais ramos de atividade. Por conta

disso, 38,6% dos postos de trabalho em administração pública são ocupados por mulheres, face à proporção feminina de 80,5% em ―educação, saúde e serviços sociais‖.

Não se observam diferenças expressivas quanto ao grau de sindicalização dos servidores de cada sexo. Em ambos os casos, pouco menos de ⅓ declarou estar associado a algum sindicato em setembro de 2008.

Considerando os nove grupamentos ocupacionais definidos pelo IBGE, encontramos mais de 90% das mulheres concentradas em quatro tipos de ocupações: profissionais das ciências e das artes, técnicos de nível médio, trabalhadores de serviços administrativos e trabalhadores dos serviços. Em contrapartida, elas são praticamente inexistentes entre os trabalhadores da produção de bens e serviços e de reparação e manutenção e entre os membros das forças armadas e auxiliares. Os servidores do sexo masculino, por seu turno, estão distribuídos de maneira relativamente equilibrada entre estes seis grupos ocupacionais mencionados. Observa-se ainda que aproximadamente 6,2% dos homens e 4,3% das mulheres ocupados no setor público executam funções de direção, seja no poder público propriamente dito ou em empresas e organizações controladas pelo setor público. São desprezíveis os percentuais de servidores, de ambos os sexos, entre os vendedores e prestadores de serviço do comércio e os trabalhadores agrícolas.

Tabela 3.3: Distribuição de homens e mulheres ocupados no setor público em categorias de diversas variáveis (%). Brasil, 2008.

Variável Homens Mulheres

Indígena 0,25 0,30 Branco 51,54 54,92 Preto 8,09 7,04 Amarelo 0,68 0,66 Pardo 39,43 37,08 Urbana não-metropolitana 63,80 63,82 Rural não-metropolitana 5,35 8,65 Região metropolitana 30,86 27,53 Demais 31,60 66,84 Pessoa de referência 68,40 33,16 Norte 10,90 9,18 MG+ES+RJ 22,17 20,88 SP 17,13 18,33 Sul 14,24 14,67 MS+MT+GO 6,21 6,58 DF 3,17 2,11 Nordeste 26,19 28,25 Federal 21,96 9,62 Estadual 34,34 32,79 Municipal 43,70 57,59 Administração pública 60,52 28,66

Educação, saúde e serviços sociais 20,72 64,62

Outros 18,76 6,72

Dirigentes em geral 6,15 4,34

Profissionais das ciências e das artes 15,17 32,33

Técnicos de nível médio 14,23 23,67

Trabalhadores de serviços administrativos 15,58 18,64

Trabalhadores dos serviços 20,77 19,73

Vendedores e prestadores de serviço do comércio 0,21 0,16

Trabalhadores agrícolas 0,26 0,02

Trabalhadores da produção de bens e serviços e de

reparação e manutenção 13,07 0,42

Membros das forças armadas e auxiliares 14,57 0,68

Sim 31,01 32,72

Não 68,99 67,28

Área do emprego público

Ramo de atividade econômica

Grupamento ocupacional

Sindicalização

Fonte: Microdados PNAD de 2008. Elaboração própria. Localização do domicílio

Cor

Condição na família

Região

A análise realizada nesta seção permitiu constatar que as diferenças de escolaridade e de idade — considerando esta última uma aproximação para o nível de experiência profissional dos

indivíduos — observadas entre os servidores públicos dos dois sexos não justificam o hiato salarial que faz com que as mulheres aufiram rendimentos, em média, 31,7% menores que seus colegas homens. Se elas eventualmente acumulam menos tempo de experiência profissional em virtude do afastamento de suas funções por ocasião da licença-maternidade, isto é contrabalançado pelo fato de apresentarem, em média, maior grau de educação formal que seus colegas homens. Os dados sugerem, assim, não ser por falta de qualificação profissional que elas ganham menos.

Tampouco em relação à distribuição por cor, por localização do domicílio e por região do país ou quanto ao grau de sindicalização observam-se diferenças substanciais entre os sexos capazes de explicar a magnitude do hiato salarial observado.

Por outro lado, o padrão bastante diferenciado de inserção nas três áreas do emprego público e as diferenças quanto à distribuição por ramo de atividade podem explicar ao menos em parte as diferenças salariais observadas entre os sexos, já que, como se viu na seção anterior, as médias salariais praticadas em cada segmento do setor público são bastante distintas.

A jornada de trabalho média das servidoras também pode justificar seu menor rendimento médio, já que elas trabalham cerca de 13,1% menos que seus colegas do sexo oposto.

Para avaliar em que medida a escolaridade e a experiência profissional das pessoas, as diferenças quanto à jornada de trabalho, as discriminações do mercado de trabalho, as segmentações do setor público e as diferenças regionais explicam o valor do rendimento auferido pelos servidores públicos em 2008, na próxima seção estimamos equações de rendimento com base nas variáveis que acabamos de observar.