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3 ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL E DESLIGAMENTO NA MAIORIDADE:

3.4 Conclusões parciais e possíveis hipóteses

3.4.3 Atuação do Poder Judiciário

As alterações trazidas pela Lei n° 12.010, de 2009, ao Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) promoveram uma reestruturação da política pública de acolhimento com foco na excepcionalidade e provisoriedade da medida, redirecionando a articulação das ações, passando o Poder Judiciário a assumir uma posição de centralidade na condução das múltiplas intervenções que visam à efetivação e/ou à restituição de direitos ameaçados ou violados de crianças e adolescentes.

atribuições dos atores na política de acolhimento e procedimentos a serem observados, estabelecendo ao Poder Judiciário que passe a exercer controle, monitoramento contínuo e reavaliações das situações de cada criança e adolescente acolhido. Visando a operacionalização da atuação jurisdicional e efetivação de garantias processuais, cada acolhimento passou a exigir a formalização de um processo.

A decisão de acolhimento é competência da autoridade judiciária. Competência atribuída com o objetivo de assegurar que as intervenções do sistema de garantia de direitos ocorram por meio de procedimentos previamente estabelecidos que garantam o contraditório e a ampla defesa dos atores envolvidos. A proteção integral das crianças e dos adolescentes requer um compromisso mútuo de corresponsabilidade entre os atores da rede de proteção, no qual o Poder Judiciário, pela atual sistemática, deve assumir um papel proativo.

As Orientações Técnicas para a elaboração do Plano Individual de Atendimento apontam as audiências concentradas como um momento “que pode proporcionar, a partir da discussão conjunta de cada caso, acordos mútuos e pactuações entre a Justiça e rede, para atualização e efetiva implementação do PIA” (BRASIL, 2009).

As questões agora analisadas têm como fio condutor a pergunta norteadora do presente estudo: Qual a participação do Poder Judiciário Tocantinense na preparação dos adolescentes para o desligamento na maioridade?

3.4.3.1 Homologação do Plano Individual de Atendimento

O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) não traz previsão expressa da necessidade de homologação do Plano Individual de Atendimento pelo Poder Judiciário. Confere a atribuição da equipe técnica do programa de acolhimento para elaboração (art. 101, § 5º, do Estatuto da Criança e do Adolescente), e que a autoridade judiciária deve exercer supervisão direta das ações previstas no Plano e das desenvolvidas (art. 101, § 6º, inciso III, do Estatuto da Criança e do Adolescente).

A homologação judicial visa conferir força executória, ou mesmo reconhecer a regularidade formal e a validade jurídica a atos realizados. No âmbito do Plano Individual de Atendimento, reforça o compromisso de cumprimento dos objetivos e

ações, confere força executiva e possibilita a fiscalização e a responsabilização dos atores da rede que participaram da pactuação.

Nos processos analisados foram homologados os Planos Individuais de Atendimento das adolescentes Jade e Ametista, acolhidas na comarca de Palmas. O Plano da adolescente Esmeralda, acolhida em Porto Nacional/TO, não foi homologado. Como pontuado, o programa de acolhimento não tinha elaborado os Planos das adolescentes acolhidas Pérola e Ágata.

3.4.3.2 Acompanhamento/fiscalização da execução do Plano Individual de Atendimento quanto à preparação para o desligamento

Como pontuado, a Lei n° 12.010, de 2009, conferiu à autoridade judiciária o controle, o monitoramento e o dever de reavaliar, continuamente, a situação de cada criança e adolescente acolhido, seja com vista à reintegração familiar, colocação em família substituta ou preparação para o desligamento.

As ações, objetivos e estratégias para o desligamento devem estar contempladas no Plano. O planejamento do desligamento neste deve ser concebido como uma fase de um caminhar que envolve as abordagens realizadas com a família biológica ou extensa, considerando a situação familiar, a identificação da melhor medida para o desligamento, a preparação da criança/adolescente, o desligamento e o acompanhamento após desligamento (BRASIL, 2009).

No contexto de desligamento por maioridade o planejamento do Plano Individual de Atendimento deve conferir especial atenção às ações voltadas ao fortalecimento da autonomia, “tanto no que se refere ao autocuidado quanto à autonomia financeira e capacidade de gestão autônoma dos diversos aspectos da vida adulta” (BRASIL, 2009).

Buscou-se, assim, verificar se a autoridade judiciária acompanha e/ou fiscaliza a execução do Plano Individual de Atendimento quanto à preparação para o desligamento.

Nos processos analisados não foram encontrados elementos que permitem

afirmar que há uma atuação concreta e proativa da autoridade judiciária no acompanhamento/fiscalização da execução das ações e objetivos pactuados no Plano na preparação para o desligamento.

concentradas trazem descrições das ações desenvolvidas pelo serviço de acolhimento. Em situações em que o perfil do adolescente aponta dificuldades em ser adotado em razão do critério etário, por exemplo, e indica uma permanência mais prolongada em situação de acolhimento, o Plano deve contemplar ações a serem desenvolvidas em longo prazo.

Os Planos Individuais de Atendimento e relatórios das acolhidas Esmeralda e Jade descrevem apenas ações de caráter prospectivo, sem indicação de que os objetivos tenham sido alcançados. Já o segundo Plano da acolhida Ametista há dados informando o seu ingresso em programa de profissionalização, sem referencias quanto às demais ações.

Em nenhum dos processos analisados, à exceção da homologação do Plano, foram identificadas atuação, deliberação ou decisão, por parte da autoridade judiciária, voltadas ao acompanhamento e/ou à fiscalização da execução do Plano no processo de preparação para o desligamento por ocasião da maioridade.

Tais dados permitem afirmar que a consecução dos objetivos e a execução das ações permanecem centralizadas no serviço de acolhimento, não tendo a autoridade judiciária se apropriado do seu papel de tensionador e coordenador das ações voltadas à garantia/restituição de direitos dos adolescentes acolhidos em processo de desligamento por maioridade.

3.4.3.3 Deliberações/ações do juiz nas audiências concentradas voltadas ao desligamento por maioridade

O processo de desligamento do serviço de acolhimento pode ocorrer por reintegração familiar – com a família biológica ou extensa –, colocação sob guarda com pessoa significativa da comunidade, adoção e maioridade.

Como abordado no 1º Capítulo, o Provimento n° 32 do Conselho Nacional de Justiça instituiu as audiências concentradas a serem realizadas a cada seis meses, preferencialmente nos meses de abril e outubro, nas entidades de acolhimento e com a participação dos atores do sistema de garantia de direitos, para reavaliação da medida protetiva de acolhimento em face do seu caráter excepcional e provisório (art. 1º do Provimento n° 32 do Conselho Nacional de Justiça), homologação, avaliação e, se houver indicação, revisão do Plano Individual de Atendimento.

medida protetiva de acolhimento, é um momento privilegiado de vivência dialógica entre os atores do SGDCA protagonizado pelo Poder Judiciário que podem provocar a articulação da rede de proteção e uma decisão colegiada homologada judicialmente, em que as obrigações pactuadas passam a ter força de título executivo judicial e podem ser o gatilho de ações intersetoriais efetivas para resolução das situações fáticas que ensejaram a aplicação da medida protetiva de acolhimento.

A revisão do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), pela Lei nº 12.010, de 2009, conferiu centralidade à Justiça da Infância e Juventude ao lhe atribuir o papel de regente de intervenções múltiplas, com vista à efetivação e/ou à restituição de direitos de crianças e adolescentes. As previsões normativas consolidam a garantia dos direitos, desligando-se por completo do modelo tutelar e assistencialista.

Nas situações de desligamento do serviço de acolhimento na aquisição da maioridade, é importante que o Poder Judiciário conduza a articulação entre o serviço de acolhimento e a rede das variadas políticas públicas na preparação para o desligamento e no acompanhamento pós desligamento.

Sendo as audiências concentradas um momento dialógico e de tomada de

decisões, buscou-se verificar se nas audiências concentradas há

deliberação/decisão do juiz e/ou ações voltadas à preparação do adolescente para o desligamento; se sim, quais.

Nos processos analisados nas comarcas de Palmas/TO e Porto Nacional/TO, as audiências concentradas, realizadas no período temporal delimitado pela pesquisa, não houve decisão judicial, pedido do Ministério Público ou orientações da equipe técnica do serviço de acolhimento, tampouco ações voltadas para o desligamento.

Os direcionamentos das ações nas audiências concentradas tiveram como foco a reintegração familiar, mesmo nas situações estudadas em que as possibilidades de reintegração familiar ou colocação em família substituta eram quase inexistentes.

Os pareceres do Ministério Público e as decisões judiciais se vinculavam às sugestões das equipes técnicas dos serviços de acolhimento institucional e do GGEM, não havendo indicativo nas atas das audiências de deliberações/ações das autoridades judiciárias que conduziam os atos voltadas à preparação para o

desligamento por maioridade.

No caso da adolescente Ametista, acolhida na comarca de Palmas/TO, o Plano Individual de Atendimento contemplava ações com vista à preparação da adolescente para o desligamento. O Plano foi homologado judicialmente, mediante parecer prévio do Ministério Público. No caso, o processo não traz ações da autoridade judiciária voltadas à execução ou fiscalização, visando a implementação do Plano.

As informações obtidas com as pesquisas permitem afirmar, a partir de uma indução, que nas audiências concentradas não são tomadas decisões, tampouco o Poder Judiciário articula ações entre o serviço de acolhimento e a rede de políticas públicas na preparação para o desligamento por maioridade dos adolescentes acolhidos no estado do Tocantins.

A limitação das decisões à possibilidade de reintegração, ou não, da criança ou do adolescente em situação de acolhimento, sem manifestação quanto às situações de preparação do adolescente para o desligamento por maioridade nas situações em que são reduzidas as possibilidades de reintegração familiar ou colocação em família substituta, deixa de considerar o contexto de cada acolhido e reduz o momento de vivência dialógica entre os atores do SGDCA na busca por uma solução articulada com o serviço de acolhimento e a rede de proteção, pactuando obrigações que, homologadas, passam a ter força de título executivo judicial.

Contexto que indica não ter a Justiça da Infância e Juventude no Tocantins, na preparação para o desligamento na maioridade, assumido a centralidade do SGDCA, tampouco incorporado o papel de regente das intervenções múltiplas objetivando a efetivação/restituição de direitos de adolescentes sob medida de proteção de acolhimento, na preparação para o desligamento em razão da maioridade, e ações de acompanhamento após do desligamento institucional.