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O atual conceito de excelência

No documento Uma filosofia para a cidadania (páginas 33-37)

1 A SOCIEDADE, A EDUCAÇÃO E A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA

1.2 OS PROBLEMAS QUE AFASTAM O HOMEM DA EXCELENCIA, DA

1.2.2 O atual conceito de excelência

A concepção clássica de excelência aristotélica difere muito do modelo atual

de excelência. Assim, pelos esportes, negócios, concursos, etc., percebemos que

nossa cultura está completamente influenciada por uma idéia de excelência como um

modelo de vitória competitiva. O vitorioso, aquele que sai triunfante na competição, é

aquele que atinge a excelência.

O atual conceito de excelência é maquiavélico. Neste conceito de excelência

não se consideram os meios, a atitude dos indivíduos, o processo como um todo

para alcançar os objetivos, unicamente se avalia o cumprimento das metas

estabelecidas. O ser humano faz parte dos meios, dos instrumentos para obter as

metas, os objetivos. Nesta competição, o esforço, os méritos pessoais, a satisfação e

a intenção dos indivíduos são irrelevantes. A excelência se identifica com a avaliação

do produto de forma isolada, ligada unicamente a estatísticas e comparação de

dados impessoais.

No modelo de vitória competitiva da vida moderna é considerado natural e

justo obter este tipo de excelência. A definição de justiça fica darwiniana, é o triunfo

pela sobrevivência dos fortes sobre os débeis. A concepção darwinista nos torna

exclusivos, elitistas e preconceituosos, nada mais contraditório que pregar inclusão

nesta sociedade. O máximo que se pode exigir é tolerar ou suportar aos débeis

porque a lei exige, mas respeitar, admirar ou apreciar, nunca. Talvez por isso é que

Esta noção de excelência nos é cultivada desde a escola mediante a forma

convencional de avaliação, a pontuação nos concursos públicos, no vestibular, a

ordem de méritos escolar, as avaliações profissionais. Isto se evidencia como um

jogo que estabelece regras para vencer o outro. Este modelo de avaliação não se

concebe sem um vencedor (a qualquer custo) e um vencido ou grupo de vencidos.

Nesta situação consideramos os outros como rivais, com os quais temos que

competir. Esta atitude já é contemplada por Platão quando compara o proceder do

justo e do injusto, e assim nos diz:

O homem justo não quer obter vantagem sobre seu semelhante, porém, sobre seu contrário; o injusto quer obtê-la tanto sobre os semelhantes como sobre seus contrários (PLATÃO, 2000, 349 d).

O semelhante, neste caso é a pessoa que tem interesses, ideais, afins aos

nossos, isto é, é a pessoa com a qual podemos conviver na sociedade e, o contrário

é aquele indivíduo com o qual não podemos conviver, porque fere, trai e prejudica

aos demais, a ele temos que vencer.

O modelo de excelência competitiva nos faz tratar a nossos semelhantes

como se fossem nossos adversários e exige um vencedor sobre todos os que

estiverem competindo, sem observar se estamos combatendo um semelhante ou um

contrário. O modelo competitivo não nos remete unicamente aos esportes, à guerra;

ele está referido a todos os âmbitos humanos, desde a empresa, a comunidade, a

competitivo está exercendo um padrão na conduta humana e a justificação para ser

aceito é que, foi proposto como uma seleção natural.

A conduta competitiva, de luta indiscriminada sobre os demais, adquiriu na

sociedade uma importância tal que, desta competição diária depende nosso futuro, a

estabilidade no trabalho, a posição social, a realização pessoal, a segurança

econômica e, depende também, a satisfação da família. Todos esperam que nos

tornemos vencedores em uma contenda, e passamos a reforçamos este modelo de

conduta através da educação. Nesta contínua competição não tem lugar a

colaboração, a solidariedade, a satisfação pelo êxito alheio.

Se formos coerentes com este raciocínio temos que deixar a ética do lado de

fora desta produção. O que se avalia são resultados, não condutas. O que tem valor

é o produto final, não o produtor nem o processo. O homem se converte em um

homem máquina e o seu produto é o que interessa, a máquina pode ser substituída

por qualquer outra.

A promoção do comportamento competitivo em detrimento da cooperação é

uma das principais manifestações de tendência auto-afirmativa em nossa sociedade.

Tem suas raízes na concepção errônea da natureza, defendida pelos darwinistas

sociais do século XIX, que acreditavam que a vida em sociedade deve ser uma luta

pela existência regida pela “sobrevivência dos mais aptos”. (CAPRA, 1982).

Como conseqüência desta competição a sociedade se tornará intolerante, não

qualidades que não são necessárias para vencer uma competição. Todo aquele que

não se adequar ao ritmo da produção, que a avaliação exige, é deixado de fora. Esta

forma de produção despreza a felicidade, no sentido aristotélico, e o prazer, no

sentido estético, que cada um pode sentir pela atividade que realiza.

Este tipo de sociedade não pode considerar-se equilibrada, ela não permite

que os seus membros sejam indivíduos satisfeitos, que desenvolvam as diversas

atividades que eles gostam. O fordismo, por exemplo, traduz uma filosofia onde o

menos importante são as necessidades e interesses das pessoas (SANTOMÉ,

1998). Sobre a satisfação que nos inspira nosso trabalho, lembremos que Aristóteles

destaca que atuar de acordo à justiça é agir de acordo à excelência, e isto nos

produz prazer “porque o que é conforme a excelência moral é agradável”

(ARISTOTELES, 2001, 1120 b).

Se considerarmos que a finalidade de nossa existência está ligada à

felicidade, será possível que possamos alcançá-la tendo como meio para obtê-la

unicamente na competição? Com este meio, se vencermos obteremos prazer, ao

final até os sádicos obtêm prazer com suas ações. Mas, isto se pode considerar

felicidade? Para Platão a felicidade e o conceito de cidadania estão unidos, de tal

maneira que se “o que estamos formando é a cidade mais feliz, não no sentido de

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