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Audiência pública reforça a importância da política de cotas no Brasil

OBSERVATÓRIO PARLAMENTAR DA REVISÃO PERIÓDICA UNIVERSAL

4. COMBATE AO RACISMO

4.2. Audiência pública reforça a importância da política de cotas no Brasil

O número absoluto de homicídios diminuiu 10,8% em 2018 (57.358) e 17,7% em 2019 (47.773), mas voltou a subir no primeiro semestre de 2020. Mas, mesmo com as mencionadas oscilações, a quantidade de negros assassi-nados continuou sendo de aproximadamente 75 para cada grupo de 100 homicídios, ou seja, a probabilidade de um negro ser assassinado hoje no Brasil é 2,7 vezes maior do que um não negro.

Dados do FBSP informam que, de todos os homicídios registrados no Brasil em 2019, 74% eram vítimas negras;

90,2%, homens; e 50%, jovens entre 15 e 29 anos.

A violência armada continua tendo os negros como as principais vítimas: 78% de todas as mortes ocorridas em decorrência de agressão por arma de fogo, no ano de 2018, tinham como vítimas pessoas negras.

O FBSP concluiu que 75,4% das pessoas mortas em intervenções policiais entre 2017 e 2018 eram negras, tendo esse número atingido 79,1% no ano de 2019. Em 2017 foram registradas 5.179 mortes decorrentes de intervenções policiais no Brasil; em 2019 esse número subiu para 6.375 mortes. Isso significa que mais de 17 pessoas morreram por dia vítimas de intervenções policiais, sendo a imensa maioria delas pessoas negras.

O Atlas da Violência 2020 aponta que, entre 2008 e 2018, as taxas de homicídio de negros aumentaram em 11,5%, enquanto para os não negros houve uma diminuição de 12,9%.

Em 2018 e em 2020, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) emitiu notas expressando preocupa-ção com o uso excessivo da força e com o alto índice de letalidade contra a populapreocupa-ção afrodescendente no Brasil.

COVID-19

Durante a pandemia da COVID-19, as desigualdades raciais no que diz respeito à mortalidade materna foram desta-cadas. Entre os casos registrados de mulheres grávidas ou puérperas que apresentaram síndrome respiratória aguda grave (SRAG), o número de mulheres negras que vieram a óbito foi quase o dobro do número de mulheres brancas.

O padrão de maior letalidade se repete na população negra em geral. Entre os casos gerais de SRAG registrados até 18 de maio deste ano, o percentual de pacientes pretos e pardos que vieram a óbito (54,78%) foi maior do que os brancos (37,93%).

“Nós precisamos seguir defendendo a necessidade de uma universidade plural, de uma universidade que seja a cara do povo, que seja, de fato, para a sociedade, e não seja apenas para perpetuar privilégios, apenas para uma elite branca, mas uma universidade em que possa estudar também a filha da trabalhadora doméstica, como eu, a filha da lavadeira, do pedreiro, o filho da manicure”, afirmou a deputada Vivi Reis (PSOL/PA), 3ª vice-presidente da CDHM, que presidiu a audiência diretamente da Universidade do Estado do Pará (UEPA). A parlamentar também reforçou a necessidade da assistência estudantil para garantir que essas pessoas consigam permanecer nas universidades.

Para Bira do Pindaré, é necessário antecipar o quanto antes a garantia de permanência das cotas, devido a retroces-sos vivenciados em diferentes áreas, como na titulação de terras quilombolas e na condução na Fundação Palmares.

“A Lei não produziu ainda todos os seus efeitos, não alcançamos ainda os objetivos de enfrentamento às desigual-dades raciais em nosso país”, reforçou Pindaré.

“São muitas batalhas, vivemos um momento de resistência”, acrescentou o parlamentar, defendendo a importância da implantação de cotas também na pós-graduação.

RESPONSABILIDADE DO ESTADO BRASILEIRO

“Ela [Lei n° 12.711] evidencia a responsabilidade do Estado nacional e a sua capacidade de promover mudanças significativas para nossa sociedade. A Lei nos mostra que as instituições públicas têm condições de implementar políticas públicas abrangendo todo o território nacional. A chamada Lei de Cotas é uma importante demonstração dessa capacidade e responsabilidade do Estado brasileiro”, destacou a ex-ministra Nilma Lino Gomes, da NAPP de Igualdade Racial da Fundação Perseu Abramo.

Para a ex-ministra, a Lei de Cotas e outras ações afirmativas aperfeiçoaram a luta pela democracia e impulsionaram a produção epistemológica, dando nova vida e ânimo à extensão, ao ensino e à pesquisa nas universidades.

“As cotas fazem parte de uma luta corajosa do movimento negro por igualdade, por equidade no ensino superior e se expandiu e foi então compreendida por outros setores da nossa sociedade. E é por isso que a lei abrange a escola pública, indígenas, pessoas com deficiência”, apontou Nilma sobre o alcance da Lei.

AVALIAÇÃO NÃO É INTERRUPÇÃO

“A Lei nº 12.711 não estabelece um prazo de vigência, mas sim um prazo de avaliação. E avaliação não implica descontinuidade”, disse Nilma, reforçando que o PL 1788 é estratégico para o período antidemocrático que viven-ciamos atualmente.

“Nós temos uma lei que tem uma redação extremamente assertiva. Não há o que se falar em encerramento da urgência da lei nº 12.711 em razão do seu artigo sétimo. Pois bem, mas o que que seria essa revisão? Essa revisão

nada mais é do que uma etapa conclusiva das obrigações previstas, que diz que o Ministério da Educação e a Se-cretaria Especial de Política de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República farão acompanhamento e avaliação do programa”, afirmou Rita Cristina de Oliveira, Coordenadora do GT de Políticas Etnorraciais da DPU.

DESIGUALDADES ESTRUTURAIS

“As políticas de ações afirmativas reconhecem as profundas desigualdades desse país e são uma tentativa de enfren-tá-las. Isso serve para sustentar sua legitimidade jurídico/ética e para confrontar argumentos que digam o contrário.

Significa dizer que serão necessárias enquanto persistirem essas desigualdades”, disse Lúcia Isabel da Conceição, Professora e Pesquisadora na Faculdade de Educação e Pós-Graduação em Educação da UFPA.

“Eu quero falar das mudanças subjetivas que as políticas afirmativas provocaram na população preta e pobre des-se país, elas mudaram a expectativa desdes-se grupo, e isso é uma revolução importante. A gente ouvia há dez anos depoimentos de jovens que diziam “Eu acabei meus estudos e agora vou trabalhar”. Hoje a gente vê a aposta de jovens, famílias e comunidades inteiras acreditando que a universidade é o seu lugar e que têm o direito de estar lá”, reforçou Lúcia.

“Estamos falando de uma mudança da realidade das universidades públicas. A universidade pública está deixando de ser o lugar para o filho do empresário que estudou a vida inteira em escola particular. A gente está invertendo a lógica da educação a partir da Lei de Cotas. Ela sozinha será suficiente? Não, não será, mas é preciso ir avançando”, disse Tatiane Cristina Ribeiro, da Rede Emancipa – Movimento Social de Educação Popular.

Tatiane reforçou que só a partir da edição é possível resolver a desigualdade no Brasil. “Apesar da revisão não ser um processo de encerramento da política e sim um processo para que a gente possa ampliar e avançar nos próximos passos que são necessários, por conta do governo, é preciso que a gente se mantenha na luta”.

ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL

Lucia reforçou que as profundas desigualdades raciais do país continuam expressas em inúmeros indicadores, como renda, desemprego e número de homicídios. “É uma demanda civilizatória, uma obrigação, um compromisso que deve ser mantido também porque elas estão contribuindo para mudar o perfil dos estudantes nas universidades públicas brasileiras e com isso muda a cara da universidade brasileira, que vem se tornando menos excludente, menos elitista”, acrescentou.

“É preciso avançar nas políticas de permanência, de acompanhamento, para que esses estudantes concluam com sucesso as suas atividades, para que tenham condições de ter bolsa-pesquisa, extensão, a continuidade na pós-graduação. E a garantia de que participem efetivamente do cotidiano das universidades, das decisões”, comentou Conceição.

“A defesa das cotas, das políticas afirmativas, se junta à defesa do direito à educação pública de qualidade e à defesa da universidade pública, hoje atacada em sua autonomia e em seu fazer de ensino, pesquisa e extensão, diante dos brutais cortes de recursos”, concluiu.

Para Bruna Brelaz, Presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), a participação de pessoas negras, indígenas e de baixa renda no ensino superior permite que eles passem a pensar a universidade. “Se concordamos que a uni-versidade é um dos pilares de pensamento da construção de um novo país, é preciso garantir que o povo brasileiro esteja dentro dessa universidade”.