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5.1 A disciplina

5.1.3 Aulas intermediárias

Nas aulas intermediárias, os momentos em que se discutiram assuntos próximos ou relacionados ao ensino e à aprendizagem foram mais freqüentes do que nas aulas inicias da disciplina.

Na oitava aula, discutiu-se indiretamente sobre o ensino. Destaca-se o momento no qual a professora revelou aspectos de sua concepção de ensino, relacionados aos elementos sociológicos presentes no espaço escolar. Ela apontou que, para ensinar, o professor deve conhecer seus alunos e estar atento a questões como o favorecimento ou o desfavorecimento propiciados dentro de sala. No entanto, como mais questões de cunho sociológico foram ponderadas no restante da aula, não houve outros momentos em que se abordaram o ensino e a aprendizagem de maneira pontual.

Na nona aula, as concepções prévias ou iniciais foram foco de discussão. Tanto a professora como os licenciandos explicitaram concepções de ensino e aprendizagem, ao debaterem sobre as razões que justificam a abordagem deste tema em sala de aula. Eles concordaram que o professor, ao ensinar, precisa considerá-las, pois elas exercem uma influência importante no processo de aprendizagem do aluno. A participação ativa dos licenciandos, na discussão sobre formas e estratégias específicas de trabalho com as concepções prévias, aponta para um provável consenso sobre a relevância das mesmas. As opiniões manifestadas por licenciandos e professora convergiram para a consideração de que, num processo de ensino- aprendizagem, é indispensável ao professor explorar e integrar as idéias trazidas pelos alunos. O sentido de integração, nesta perspectiva, é oposto ao de substituição das idéias prévias pelas idéias da ciência. Conforme destacam Driver et al. (1999), as concepções prévias dos alunos evidenciam, muitas vezes, um raciocínio de senso comum. Aprender ciências, no entanto, não é abandonar este tipo de raciocínio, mas integrá-lo a outras formas de pensamento predominantes nos vários e diferentes contextos sociais em que se vive. Professora e licenciandos, de fato, discutiram sobre

os reais motivos que os fazem abordar as concepções prévias dos estudantes no processo de ensino de ciências.

Na décima aula, ocorreu a atividade dos cartões proposta juntamente pela professora e pela pesquisadora. Nessa ocasião, certamente, revelaram-se várias concepções de ensino e aprendizagem, já que o objetivo era propiciar uma discussão sobre diferentes estratégias didáticas para o ensino de conteúdos diversos. De maneira geral, os alunos se imaginaram propondo atividades as quais enfatizassem mais a prática, a investigação na ciência, e a relação da sala de aula com a vida do aluno. Eles mostraram-se mais inclinados ao desenvolvimento de atividades estimuladoras da criatividade e da participação do aluno, e também favorecedoras do trabalho em grupos. Revelaram-se menos propensos a sugerirem exercícios, nos quais o professor é o detentor do saber e o aluno somente escuta e reproduz o ensinado. A escolha do cartão de número nove, por oito licenciandos, como o mais representativo daquilo que eles gostariam de desenvolver, sugere uma possível influência da opção da professora pelo “ensino investigativo”. Mais ainda, a seleção deste cartão como o melhor exemplo de atividade didática parece refletir uma tendência do ensino de ciências, conforme assinala Azevedo (2004).

Foi possível perceber que a maior parte dos licenciandos utilizou como critérios, para o agrupamento dos cartões, fatores ligados à aprendizagem do aluno. Neste sentido, constata-se que, no grupo 1, os licenciandos reuniram atividades que explicitavam o papel ativo do estudante em seu processo de aprendizagem, e a importância de situações problematizadoras em sala de aula. Já no grupo 2, eles listaram atividades geradoras de cansaço ao aluno, e com caráter de transmissão de conceitos. No grupo 3, os licenciandos apontaram para atividades de pequena contribuição à aprendizagem do aluno, ou que poderiam requerer condições especiais de tempo, por exemplo. A utilização de situações concretas de ensino de Biologia/Ciências, explicitadas nos cartões, possibilitou aos licenciandos, portanto, revelarem algumas de suas concepções. Além disso, a atividade tornou visível, para eles, a importância de refletirem sobre suas futuras escolhas pedagógicas.

Na décima primeira aula, foi retomado o assunto iniciado na nona: as concepções prévias ou iniciais. Verifica-se, nesse momento, o tratamento do ensino e da aprendizagem, já que estas concepções são consideradas fatores influentes na aprendizagem do aluno. Sobre isso, vale retomar as pontuações de teóricos, tais como Ausubel (1968) e Piaget (1998). Conforme ambos destacam, é necessário que o aluno,

para aprender, relacione a nova informação a um elemento já existente em sua estrutura cognitiva. Conseqüentemente, é tarefa do professor abordar as concepções prévias. Ainda nesta aula, o debate sobre os transgênicos foi indicado como uma possível atividade a ser realizada no ensino médio. A professora comentou sobre sua aplicabilidade neste nível de ensino.

Durante a décima segunda aula, houve várias ocasiões nas quais ela expôs novamente suas concepções de ensino e aprendizagem. A aula estava direcionada para o papel da linguagem em sala de aula. Para justificar a abordagem deste tema, a professora sublinhou a importância da linguagem usada pelo professor e suas implicações no processo de aprendizagem dos alunos. Ao pontuar elementos da teoria de Vygotsky, ela também assumiu suas escolhas teóricas e explicou algumas de suas opções didáticas. De acordo com a concepção exposta, a linguagem é fator estruturante do pensamento humano. Na perspectiva vygotskiniana, de fato, a linguagem é definida como uma ferramenta de transmissão cultural e, também, como uma ferramenta psicológica, fundamental para a construção do pensamento.

É interessante destacar o momento em que a professora comentou suas idéias acerca da aprendizagem de ciências. Segundo ela, para o aluno aprender ciências, ele precisa se apropriar não apenas de conceitos, mas também de certas práticas particulares da ciência. Dentre estas, estariam determinados modos de fala e de ação específicos da prática científica. Por isso, seria tão importante o professor estar atento às suas escolhas discursivas em sala de aula: elas podem influenciar na construção do pensamento e na aprendizagem do aluno. Retoma-se, neste ponto, o trabalho de Driver et al. (1999), para quem a aprendizagem das ciências envolve a iniciação do aluno nas formas científicas de se conhecer. Este aprende ciências quando se apropria de idéias e práticas da comunidade científica. Nesta direção, o papel do professor de ciências é também atuar como mediador entre os conhecimentos científicos e os estudantes, inclusive por meio de suas escolhas discursivas.