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Parte da doutrina refere que a adoção da substituição tributária acaba por agredir regra de competência quando não são restituídos os valores do imposto cobrado quando o preço efetivo de venda ser inferior àquele médio que serviu para a retenção pelo substituto. No caso, a tributação sobre a diferença entre o valor médio e o de venda efetiva acabaria por estar fora do campo de incidência do ICMS, imposto sobre circulação de mercadorias, cujo núcleo da hipótese de incidência é o preço praticado, segundo alegam.

Pandolfo (2010, p. 126) afirma que as competências tributárias constituem a demarcação constitucional que fixa a área dentro da qual cada ente federado poderá, mediante lei, criar hipóteses normativas tributárias por intermédio das quais as materialidades que lhe foram constitucionalmente destinadas servirão de suporte fático (antecedente normativo) para uma norma geral e abstrata que terá como consequência (hipotética) uma obrigação pecuniária, satisfeita, em geral, pelo pagamento.

Prosseguindo nessa linha de raciocínio, Pandolfo (2010, p. 129) sustenta que como se trata de circulação de mercadorias haveria um claro e inequívoco limite quantitativo representado pelo preço fixado no negócio jurídico de compra e venda da mercadoria. Dessa forma, segundo aquele doutrinador, verifica-se com hialina clareza que a título de competência tributária, foi destinada ao ente federado uma parcela do preço recebido pelo vendedor de uma mercadoria.

Já fiz considerações em relação à utilização do valor recebido pelo comerciante e suas consequências no item 2.1, que trata da capacidade contributiva, por isso, faço remissão a ele, e, por esse motivo deixo de tecer, nesse momento, maiores comentários a respeito.

Pandolfo (2010, p. 133) afirma que a exigência tributária sobre a diferença entre o valor da operação efetiva e aquele presumido representa a instituição de um novo imposto, incidente sobre o patrimônio do sujeito passivo, haja vista que haveria uma redução patrimonial pela ausência de possibilidade de repercussão do imposto antecipado na forma de substituição tributária.

Se, singelamente, assim fosse, realmente estaríamos diante da instituição de uma exação fora da competência dos Estados-membros, não obstante, entendo sem razão o ilustre autor pela razões que expus no item que trata da capacidade contributiva (item 2.1), que podem ser resumidos da seguinte forma: há previsão constitucional para aplicação do instituto da substituição tributária, não existe obrigatoriedade de que o preço praticado seja utilizado como o núcleo da hipótese de incidência, permitida a adoção de valores médios, forte em decisões do STF, inclusive por que de outro modo, a Constituição teria a anulado os benefícios de um instituto por ela mesma previsto. Não teria sentido algum prever tal possibilidade e, ao mesmo tempo, esvaziá-la de conteúdo. Cabe aqui, mais uma vez, dizer que a interpretação que eventualmente leve a esse resultado, deve ser afastada, conforme ensinamento de Maximiliano (1996, p. 166), verbis:

179 – Deve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter conclusões inconsistentes ou impossíveis.

Surpreendentemente, Pandolfo (2010, p. 135) entende que seria aceitável a substituição tributária nos moldes de não devolução do imposto em excesso na hipótese de preço praticado ser inferior ao presumido caso fosse uma opção do sujeito passivo. Nessa hipótese, seria opção dele abrir mão da sistemática ordinária de apuração do imposto e ingressar espontaneamente num regime de apuração distinta. Ora, não podemos concordar com tal assertiva haja vista que, conforme argumentação do autor, se de competência estamos falando e, mais especificamente, de criação de um novo imposto, fora da regra-matriz do ICMS, não cabe ao sujeito passivo dar legitimidade a ela ao seu talante. Se ao ente federado estaria defeso tributar pelo valor presumido não importando o valor efetivo de cada operação por estar fora de sua competência, com muito menos razão caberia ser criada tal competência por opção do sujeito passivo. Diversa é a situação quando a legislação oferece opção ao

contribuinte de usufruir de uma isenção condicionada à ação sua ou de estar sujeito à alíquota menor se aceitar não se apropriar de determinados créditos, por exemplo.

Aproveitando a tese exarada acima, que trata do alcance que pode ser concedido a uma opção do contribuinte, calha referir que o chamado Simples Nacional instituído pela LC 123/2006, no nosso entendimento, agride a regra de competência que dá sustentação a instituição do ICMS, haja vista que os Estados da Federação recebem valores recolhidos em guia única repartidos entre os diversos tributos na forma de um percentual calculado sobre o faturamento do contribuinte, enquadrado como microempresa ou empresa de pequeno porte. Nesse caso, podemos dizer que os Estados-membros estão recebendo valores relativos ao ICMS que deste imposto não tem nada, uma vez que está relacionado com o faturamento e não com a circulação de mercadorias e prestações de serviços incluídos no âmbito do imposto estadual. Nesse caso, por ser favorável ao discurso das empresas que pleiteiam pagar menos e de forma simplificada, não se ouve maiores reclamações relacionadas à questão, mas esse fato não afasta a sua inadequação com a competência dos Estados-membros, apesar da doutrina ficar silente. A Constituição Federal no seu art. 146, parágrafo único permitiu a instituição de um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mas não permitiu a alteração da conformação do imposto, nem por força do art. 146, III, “d”, da Carta Política. Calha referir que a Federação Brasileira de Associação de Fiscais de Tributos Estaduais – FEBRAFITE ingressou em 27 jun.2007 com ADI 3910 questionando diversos dispositivos da LC 123/2006, que ainda aguarda manifestação da Suprema Corte, até mesmo do pedido liminar.

Do aqui exposto, em conjunto com o que está contido no item que trata da capacidade contributiva (item 2.1), fica claro que a substituição tributária não implica agressão à competência tributária nem representa a instituição de um novo imposto quando o preço praticado for inferior ao presumido. Como citado em várias passagens deste trabalho, as objeções apresentadas e as supostas agressões a princípios constitucionais tributários são afastadas quando e se o instituto for adequadamente utilizado pela Administração Tributária. Veremos, na sequência, como a substituição tributária acaba influenciando na livre concorrência dos agentes econômicos.