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PROIBIÇÃO DE UTILIZAR IMPOSTO COM EFEITO DE CONFISCO

Difini (2007, p. 19) trata com propriedade do tema e apresenta a fundamental diferença entre ocorrência de confisco e a utilização de tributo com efeito confiscatório, matéria atinente ao nosso estudo. Após discorrer sobre a dificuldade de conceituar aquilo que deve ser apreendido por “efeito ou alcance confiscatório”, Difini (2007, p. 27) chega à conclusão que a expressão refere-se ao aspecto quantitativo da exigência. A questão configura um daqueles pontos nos quais o quadro ou moldura que a Ciência do Direito pode oferecer é muito vago, segundo Machado (2000, p. 212). Conforme Amaro (2004, p. 143), o princípio da vedação do tributo confiscatório não é um preceito matemático; é um critério informador da atividade do legislador e é, além disso, preceito dirigido ao intérprete e ao julgador, que, à vista das características da situação concreta, verificarão se um determinado tributo invade ou

não o território do confisco. Para dar sustentação a sua afirmativa de que o crucial é o aspecto quantitativo da exigência, Difini (2007, p. 27) apresenta o seguinte exemplo: “o imposto de renda à alíquota de 10% certamente não é confiscatório, e a de 80% é; o STF [em sede de Medida Cautelar na ADI 2010, julgada em 30 set. 1999, DJ de 12.abr.2002] decidiu que a contribuição previdenciária de 11% não é confiscatória, e a de 25% é”. No aresto mencionado, o STF acabou por se pronunciar no sentido de que a elevação da contribuição previdenciária dos servidores federais de 11% para 25% acrescida das outras exações, como Imposto sobre a Renda, acarretava um subtração de mais de 50% da renda do servidor, caracterizando utilização de imposto com efeito de confisco. Acrescenta o doutrinador gaúcho que a quantidade do gasto público exerce influência na quantificação do limite além do qual a tributação passa a ter efeito confiscatório. O Estado Social e Democrático de Direito é um estado caro; multiplicam-se as demandas sociais a que é instado a responder. Tornando-se cada vez mais dispendioso seu financiamento; tenciona-se o conflito entre o princípio do Estado social e outros como direito de propriedade, trabalho, indústria, profissão e livre iniciativa, conforme assevera Difini (2007).

Então, a avaliação da utilização de tributo com efeito confiscatório é de conotação quantitativa, restando os limites qualitativos vinculados as regras de competência, que estariam alheios ao princípio do não-confisco previsto no art. 150, IV, da Constituição Federal.

Entretanto, o instituto da substituição tributária suscitou a alegação de ocorrência de utilização de imposto com efeito confiscatório. Para o substituto, haja vista que dele é exigido valor por conta de fato gerador que não seria protagonista e que, deste modo, não existiria indício de capacidade contributiva. Para o substituído quando o valor de venda fosse inferior àquele que serviu de base para a antecipação do imposto, haja vista a apenas parcial repercussão do tributo até o consumidor final.

Em relação ao substituto, não há qualquer fundamento na alegação uma vez que ao realizar a operação de circulação de mercadoria, além do preço cobrado do destinatário dele é exigido o imposto corresponde à substituição tributária calculada por conta do fato gerador presumido. Ou seja, em nada altera o seu patrimônio, pois o imposto próprio foi repassado ao preço por ele praticado e o de responsabilidade por substituição tributária foi recebido do destinatário. Mesmo que se sustente que nasce obrigação tributária sem que tenha ocorrido fato gerador, ainda presumido, não há nenhum prejuízo para o substituto haja vista que exige do destinatário da mercadoria o imposto correspondente. O STF nos autos do RE 213.396, já referido, afastou tal alegação de ocorrência de confisco nos seguintes termos:

Quanto ao confisco, não é difícil demonstrar a impossibilidade de sua ocorrência, tendo em vista o reembolso, pelo substituto do imposto pago, quando do recebimento do preço das mãos do substituído, reembolsando-se esse, de sua vez, ao receber o preço final das mãos do consumidor.

Então, em relação ao substituto, insofismável a ausência de fundamentação para tal alegação, corroborada pela decisão do Pretório Excelso.

Em relação ao substituído, o fato da tributação ter sido realizada antecipadamente por um valor médio, acarretaria, segundo boa parte da doutrina, uma tributação excessiva quando o preço realmente praticado fosse menor do que o presumido e, se esse excesso não fosse restituído pelo Estado, haveria a utilização de imposto com efeito de confisco, pois agrediria a capacidade contributiva e haveria decréscimo patrimonial. O STF afastou essa interpretação nos autos da ADI 1851 ao considerar constitucional cláusula do Convênio ICMS 13/97 que estabelecia a inexistência de restituição ou cobrança suplementar de ICMS quando a operação ou prestação subsequente à cobrança do imposto, sob a modalidade de substituição tributária, se realizasse com valor superior ou inferior àquele utilizado para determinação do imposto devido por substituição tributária. Ora, com essa decisão, clara a inexistência de utilização de imposto com efeito de confisco de acordo com o intérprete autorizado da Constituição.

Mas, mais importante do que a decisão em si, é a conclusão de que a técnica de antecipação por via da substituição tributária nos moldes em que adotada não caracteriza desconformidade com a ordem jurídica e, assim, não ocorre utilização do imposto com efeito confiscatório, ao contrário do sustentado pela doutrina. Aliás, como dito acima, aferição de utilização de imposto com efeito confiscatório é questão afeita à quantificação da exação.

O instituto da substituição tributária progressiva aplicada a imposto sobre consumo traz ínsito em seu nascimento que a tributação seja sobre uma base de cálculo presumida. No dizer de Difini (2007, p. 183) se de média se trata, em condições de livre concorrência, haverá necessariamente preços efetivamente praticados ora superiores, ora inferiores. Não há ilegalidade ou efeito confiscatório se a operação for tributada pela base de cálculo presumida e esta, correspondendo ao preço médio praticado, for superior ao preço efetivo da operação, no caso concreto. Mas, segundo o doutrinador gaúcho, haverá ilegalidade, passível de controle judicial, preventivo ou reparatório, e efeito confiscatório, se a base de cálculo presumida não corresponder à média de preços no mercado, mas for superior a este preço médio (não ao preço praticado no caso concreto).

Pelo exposto, vemos que não há como caracterizar efeito confiscatório tão só pela adoção da substituição tributária quando o valor presumido for superior ao realmente

praticado haja vista que se o valor é médio, obviamente há valores acima e abaixo dele. Diversa é a situação se a base de cálculo presumida não corresponder à média de preços no mercado e for superior a este preço médio, mas, independentemente dos motivos que levaram a existir essa base de cálculo elevada, esse fato caracteriza má aplicação do instituto. Como afirmado em momento anterior, e muitas vezes repetido ao longo deste trabalho, as objeções apresentadas e as supostas agressões a princípios constitucionais tributários são afastadas quando e se o instituto for adequadamente utilizado pela Administração Tributária.

Entretanto, outro questionamento é levantado pela doutrina quando a tributação for além do preço praticado pelo substituído, situação que configuraria a ocorrência de tributação fora da regra de competência. Analisaremos na sequencia essa suposta transgressão à regra de competência, especialmente quando não é restituído o imposto cobrado com base no valor presumido na hipótese de ser superior àquele calculado tomando por base o valor realmente praticado.