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CAPÍTULO 2 – Autorregulação da aprendizagem e variáveis do aluno

2. Autorregulação da aprendizagem e variáveis académicas

2.1. Realização do TPC e autorregulação da aprendizagem

O TPC pode ser definido como qualquer tarefa atribuída pelo professor ao aluno com o propósito de ser realizada fora do horário letivo (Cooper, 1989; Cooper & Valentine, 2001). Consiste num processo complexo em que interage uma multiplicidade de agentes e de contextos. Cada um dos agentes envolvidos nesta atividade tem responsabilidades distintas: os professores

planeiam e prescrevem as tarefas; os alunos devem realizá-las; a família, os pares e outros agentes educativos (e.g., educador de um centro de estudos) podem, ou não, colaborar no processo (Rosário et al., 2008). Rosário e colaboradores (2009) consideram que “na execução de tarefas fora do controlo direto do professor, o papel do aluno adquire toda a sua importância” (p. 180).

Desde o princípio do século XX que as atitudes em relação ao TPC, em particular por parte dos educadores e das políticas educacionais, se caracterizam por uma bipolaridade cíclica: ora o consideram benéfico, ora questionam os seus eventuais benefícios, apontando-lhe aspetos negativos (Cooper, 1989; Cooper & Valentine, 2001; Rosário et al., 2008). Cooper (1989), numa síntese sobre a investigação relativa à realização de TPC, condensou em poucos itens os eventuais benefícios e malefícios desta atividade extra aula. Assim, referiu, como aspetos positivos da realização de TPC, (I) a possibilidade de o aluno aprender e ter sucessos imediatos; (II) os efeitos académicos a longo prazo (e.g., melhores competências e hábitos de estudo); (III) os efeitos não académicos (e.g., aumento da autodisciplina e da competência de problematizar); e (IV) o facto de permitir uma melhor avaliação e envolvimento parental no processo de instrução dos seus educandos. Quanto aos potenciais aspetos negativos do TPC, Cooper (1989) sintetizou-os em cinco itens: (I) provocar saciedade (e.g., fadiga emocional e física); (II) impossibilitar o aluno de usufruir de tempo de lazer e de atividades com a comunidade; (III) permitir a interferência parental (e.g., confusão provocada pelo ensino de técnicas diferentes das aprendidas na escola); (IV) dar a possibilidade ao aluno de fazer batota e (V) aumentar as diferenças entre alunos competentes e não competentes.

De acordo com a literatura da especialidade (e.g., Cooper & Valentine, 2001; Corno, 2000), R. Silva (2009) refere que

os ganhos que o TPC pode implicar, sejam eles académicos ou auto- regulatórios, não são, de facto, automaticamente garantidos mas mediados por um conjunto de variáveis (…), como sejam o tempo, a frequência ou a carga do TPC, o esforço, a dificuldade ou a utilidade percebidas pelos alunos nas tarefas prescritas, a tipologia dessas mesmas tarefas ou o feedback de TPC providenciado pelo professor, entre outras. (p. 17)

R. Silva (2004) refere que as principais razões apontadas pelos professores para a prescrição de TPC “resumem-se (…) à prática e treino das matérias e conteúdos abordados nas aulas, à preparação para as aulas subsequentes, possibilitando a participação mais activa [dos alunos] na aprendizagem e, ainda, o desenvolvimento pessoal” (p. 81). Ora o sucesso dessa prática e treino está fortemente associado ao grau de mestria do aluno relativamente às competências autorregulatórias. Daí os processos autorregulatórios serem um importante factor a considerar na realização do TPC (Corno, 2000). Rosário e colaboradores (2008) consideram que “o processo de início e manutenção de um esforço continuado com vista à conclusão de uma tarefa revela a íntima relação do TPC com o desenvolvimento da auto-regulação” (p. 24), o que faz do TPC uma ferramenta promotora de sucesso académico.

Ramdass e Zimmerman (2011) referem que, no processo de realização do TPC, os alunos competentes apresentam diversos comportamentos autorregulatórios, tais como, automotivação, inibição de eventuais distrações, uso de estratégias para finalizar o TPC, gestão do tempo, estabelecimento de metas, reflexão sobre o próprio desempenho e adiamento de recompensas, e ainda, segundo R. Silva (2004), verificação do trabalho realizado e priorização das tarefas. Ramdass e Zimmerman (2011) consideram que a autorregulação da aprendizagem e as crenças motivacionais estão significativamente correlacionadas com a atividade de concretização do TPC, relação esta comprovada por diversas investigações (e.g., Rosário et al., 2009, 2011; R. Silva, 2004).

2.2. Tempo de estudo e autorregulação da aprendizagem

O tempo de estudo pode ser definido como o “total de tempo gasto em casa pelos alunos a trabalhar para a escola, incluindo neste o tempo despendido com a realização dos TPC e com o estudo das diferentes disciplinas” (R. Silva, 2009, p. 109).

A implementação da autorregulação da aprendizagem é essencial para que a atividade de estudo realizada pelos alunos seja eficaz. Paiva e Lourenço (2010) sugerem, num estudo focado na autorregulação da aprendizagem e no comportamento disruptivo em contexto escolar, que “os alunos que investem mais horas no estudo apresentam uma maior frequência de comportamentos auto-regulatórios na sua aprendizagem” (p. 11), tendo estes investigadores chegado à mesma conclusão num estudo posterior (Paiva & Lourenço, 2012). No entanto, Schunk e Zimmerman (1994), citados por Rosário (1999), referem que muitos alunos gastam pouco tempo e esforço “no seu estudo pessoal [e], por vezes, desaproveitam grande parte deste, uma vez que lêem e tiram apontamentos ineficientemente, escrevem deficientemente e preparam os exercícios escritos sem método” (Rosário, 1999, p. 80). Para minorar a ocorrência deste tipo de comportamento de estudo desregulado, Schunk e Zimmerman (1996) referem que as sessões de trabalho individual são frequentemente estruturadas, calendarizadas e andaimadas por pais ou explicadores, que eliminam distratores e monitorizam as tarefas reforçando os avanços escolares. Muito tempo dedicado às tarefas de estudo individual pode ser sinónimo de “uma baixa competência cognitiva do aluno (…), de uma baixa capacidade de autorregulação do ambiente de estudo, de distratores ou de emoções negativas que o desviam da tarefa” (Rosário et al., 2011).

Apesar de o tempo dedicado às tarefas de estudo ser um factor importante na análise das diversas dimensões do processo de aprendizagem do aluno, “por si só (…) não é sinónimo de investimento na tarefa” (Rosário et al., 2008). Há que considerar também aspetos qualitativos da variável tempo, nomeadamente, “a tipologia de tarefas realizadas, a utilização de estratégias de aprendizagem mais eficazes ou uma melhor capacidade de controlo e gestão do tempo” (R. Silva, 2009, p. 129). Van der Hurk (2006) sugere que os alunos que revelam uma maior competência ao nível do planeamento do tempo de estudo e de automonitorização são os mais eficientes na atribuição do seu tempo de estudo individual – uma vez que gastam menos tempo na atividade de estudar –, preparam-se melhor para as reuniões de grupo tutorial e têm uma avaliação superior nos testes cognitivos.

Os resultados de uma investigação realizada por Rosário e colaboradores (2000) sugerem que as raparigas dedicam, em média, mais tempo ao estudo (R. Silva, 2004, e Wagner, Schober & Spiel, 2008, verificam o mesmo) e fazem- no de uma forma mais autorregulada do que os rapazes. No entanto, o seu rendimento académico não é significativamente diferente do dos rapazes, pelo que Rosário e colaboradores (2000) põem a hipótese de a forma de estudar das raparigas não estar adequada “às exigências específicas do processo de avaliação com o qual os alunos são confrontados” (p. 207).

Atualmente, vários autores inserem a variável tempo de estudo nos seus trabalhos de investigação. Alguns autores (e.g., Pereira, 2007; Rosário et al., 2012) solicitam aos alunos que estimem o tempo gasto (por dia ou por semana) nas tarefas de estudo através de uma questão aberta, procedimento igualmente utilizado no presente estudo. Outros (e.g., Rosário et al., 2011; R. Silva, 2009; Wagner et al., 2008) recolhem essa informação através de diários, por considerarem este instrumento mais fidedigno (constitui um instrumento de medida de evento). Além disso, os investigadores tendem a dar maior relevância à análise de múltiplos aspetos qualitativos envolvidos nas tarefas de estudo relativamente aos aspetos quantitativos.