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AVALIAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR

PROTEÍNA C-REACTIVA E INFLAMAÇÃO

6. AVALIAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR

Embora a utilização da CRP e outros indicadores singulares para avaliação de risco cardiovascular seja recomendada, a sua real utilidade não é consensual. A observação de que factores de risco singulares são maus indicadores na previsão de doença cardiovascular pode ser explicada pelo facto de se tratar de uma doença complexa com múltiplos antecedentes. Assim, foram desenvolvidos algoritmos multivariados para previsão do risco absoluto e relativo de ocorrência de eventos agudos em dez anos. Um deles, e possivelmente o mais robusto, é o Framingham Point Score [161]. Os factores de risco tradicionais, considerados em conjunto, fornecem boas aproximações do risco cardiovascular, superiores às fornecidas por indicadores univariados [161]. Desta forma, as estimativas de risco multivariadas devem representar os padrões aos quais novos factores de risco devem ser comparados. As evidências mostram que após ajustamento para idade, sexo e outros indicadores já estabelecidos, a associação de vários marcadores inflamatórios, como a CRP, é bastante atenuada e não fornecem informação adicional aos factores de risco tradicionais [160]. Por esta razão, embora este estudo não tenha carácter predictivo, achou-se relevante comparar o VEGF, Cat-L e MPs com o

Framingham Point Score, Índice Aterogénico do Plasma (AIP) e rácio CT/HDL-C. Em

relação aos dois últimos, nenhuma relação foi verificada com os parâmetros em análise, o que não é de estranhar tendo em conta apenas as MPs CD31+ se mostraram

correlacionadas com variáveis lipidémicas individualmente (CT e LDL-C). O AIP, no entanto, está fortemente associado com a doença estabelecida, o que seria de esperar dado que grande parte dos indivíduos inseridos no grupo com patologia sofreu um enfarte pouco tempo antes da recolha.

Os resultados obtidos em relação ao FPS foram muito mais interessantes. De acordo com os resultados de Albert [217], a hsCRP correlaciona-se de forma positiva e altamente significante (p < 0.01) com o Framingham Point Score, embora as correlações com as componentes individuais do índice sejam mais fracas. Isto poderá indiciar que de facto a CRP sintetiza a contribuição de vários indicadores de risco individuais, embora não responda à questão de haver ou não informação adicional útil. Apesar de esta não ser a temática do estudo, a confiança nos resultados fica reforçada pela reprodução de outros trabalhos publicados e reconhecidos pelos pares. No âmbito deste estudo, o FPS correlaciona-se com a Cat-L e EMPs CD42b-CD144+, dois parâmetros fortemente

70 relacionados entre si (rs = -0.512, p < 0.01). Entre os factores considerados no cálculo

do FPS, o único que se revelou associado de forma individual com os níveis de EMPs CD42-CD144+ foi a idade, e nenhum com a Cat-L, embora exista uma correlação

negativa entre o FPS e a glicemia (rs = -0.454, p < 0.01) que poderá indiciar uma

relação com a diabetes não-controlada que não se verificou possivelmente devido ao número muito reduzido de indivíduos com esta patologia. Convém lembrar que o FPS não considera os níveis de glicose em jejum mas é desaconselhado em diabéticos. Embora a correlação entre as EMPs CD42b-CD144+ e o FPS seja mais forte do que com a idade, é

notório que este componente tem uma importante influência. Forest e colaboradores [218] abordaram muito recentemente a relação entre as EMPs CD144+ e a idade pela

primeira vez. Inesperadamente, e como verificado neste estudo, as EMPs CD144+ estão

significativamente reduzidas em idosos saudáveis comparativamente a controlos jovens. Estas EMPs, como marcadores robustos de uma deficiente vasodilatação mediada pelo endotélio, deveriam aumentar com a idade. No entanto, não é este o caso [218]. Este resultado vem em suporte da teoria que defende um papel protector e reparador das micropartículas. Esta redução no número de EMPs com o avançar da idade pode reflectir uma reduzida regeneração do endotélio e turnover celular, indicadores de um endotélio senescente e menos activo. A mesma hipótese pode ser levantada na correlação negativa entre as MPs CD42b-CD144+ e o FPS. O aumento do risco cardiovascular a dez anos

previsto pelo FPS poderá envolver uma menor capacidade regenerativa e actividade metabólica do endotélio que se reflecte num menor número de EMPs circulantes, independentemente da disfunção endotelial que deverá corresponder a um processo de activação celular, e que não está relacionada com a propensão a eventos agudos com o avançar da idade. Mais difícil de compreender é o papel da Cat-L neste processo, se algum, devido aos poucos estudos efectuados nesta temática. No entanto, como vimos, a Cat-L é necessária em processos neovasculares e regenerativos que poderão estar mais activos em indivíduos de risco. É uma hipótese que fica em aberto e a relação entre as EMPs CD144+, Cat-L e FPS merece ser alvo de estudos mais aprofundados.

As doenças cardiovasculares e a doença coronária aterosclerótica em particular são multifactoriais e compreendem dois tipos de factores de risco: os subjacentes, essencialmente demográficos, genéticos e comportamentais, e os metabólicos, nos quais todos os outros se acabam por reflectir. Entre os factores de risco metabólicos, os mais reconhecidos são a pressão arterial alta, glicose plasmática elevada em jejum e um perfil lipídico aterogénico (TG elevados, HDL-C reduzido e LDL-C elevado). Para estudar a relação entre o VEGF, Cat-L e MPs com os factores de risco referidos foram utilizados quatro dos critérios clínicos para diagnóstico de Síndrome Metabólico propostos pelo NCEP/ATP III e revistos [180, 219], nomeadamente TG elevados (≥ 150 mg/dL), baixo HDL (< 40 mg/dL nos homens e < 50 mg/dL nas mulheres), pressão arterial elevada (≥

71 130 mmHg sistólica e/ou ≥ 85 mmHg diastólica) e glicose em jejum elevada (≥ 110 mg/dL). Para diagnóstico de Síndrome Metabólico é também considerado o perímetro da cintura mas, embora extremamente relevante por avaliar a adiposidade intra-abdominal, não é um parâmetro fisiológico por si só. Embora a recomendação actual para os níveis de glicose plasmática se situem abaixo dos 100 mg/dL, foi utilizado o valor de 110 mg/dL por duas razões. Primeiro, os participantes têm uma idade média avançada e existe uma tendência crescente natural para os níveis de glicose. Segundo, o valor de risco sugerido para a população portuguesa pelo laboratório do Centro Hospitalar de Lisboa é de 110 mg/dL e não 100 mg/dL. Não foi encontrada qualquer relação com significado estatístico com os parâmetros estudados. No entanto, os níveis de EMPs CD42b-CD144+ parecem

ligeiramente influenciados pela HDL e de forma directa (EMPs são mais reduzidas em indivíduos de risco), o que sugere mais uma vez um papel protector e não patogénico destas EMPs no nosso estudo.

Existem evidências crescentes de que a propensão a aterosclerose resulta de uma combinação de factores e não a um em particular. O número de factores de risco presentes pode ter um impacto que se reflecte em indicadores bioquímicos como aqueles avaliados neste estudo. Nós observámos uma tendência decrescente de EMPs CD31+CD144- com o número de factores de risco presentes (tabela 14) e a existência

de pelo menos três em quatro factores de risco, indiferenciadamente, está associada aos níveis destas EMPs de forma decrescente e robusta. Mais uma vez, a relação negativa verificada suporta a hipótese de um papel protector das MPs que se deteriora em certas condições patológicas ou de risco. Curiosamente, a definição de Síndrome Metabólico compadece de um critério de diagnóstico semelhante de pelo menos três factores em cinco, quatro dos quais avaliados no nosso estudo [219]. Isto reforça uma eventual associação entre as EMPs CD31+CD144+ e risco de doenças cardiovasculares, a principal

consequência do Síndrome Metabólico [219] que, numa amostra homogénea em factores de risco, parece evidenciar um défice em mecanismos fisiológicos reparadores e não um papel deletério inerente.

VI. CONCLUSÃO E

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