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A Avaliação Diagnóstica Inicial

No documento SERGIO LUIZ DA CUNHA (páginas 81-84)

5. O PROFESSOR E AS AULAS DE ARTE

5.2. A Avaliação Diagnóstica Inicial

No início do mês de março realizamos o primeiro encontro de formação, onde foram convocados os professores especialistas de arte, o diretor e o assessor pedagógico de cada uma das escolas. Neste encontro discutimos sobre a concepção para o ensino de Arte que permeia a Rede de Ensino de Cajamar, sobre a formação continuada dos professores e também sobre a possibilidade de ampliar a reflexão sobre a avaliação diagnóstica inicial.

Como já elencado anteriormente nossa concepção trata a arte enquanto conhecimento e linguagem. Como um conjunto de manifestações simbólicas de uma determinada cultura, como um conhecimento elaborado historicamente que nos coloca que a arte é uma forma de produção e reprodução cultural. Como linguagem que nos permite infinitas possibilidades de ler, observar e apreciar o mundo, que nos permite lidar com os signos e códigos artísticos construídos ao longo do tempo, o que nos possibilita (re)significar o mundo.

A avaliação é parte importante e fundamental em qualquer projeto pedagógico, seus princípios e funções é que orientam e definem as atividades e ações que garantiram a aprendizagem dos alunos. O primeiro passo para a concretização de um projeto educativo é investigar e diagnosticar o repertório dos alunos, conhecer sua realidade, o que já conhecem ou sabem dos assuntos que iremos abordar, neste caso, o que já sabem, conhecem, pensam sobre arte.

A avaliação diagnóstica inicial é condição preliminar para o planejamento de projetos, pois ela nos dá pistas para a determinação de objetivos, para a seleção de conteúdos e conceitos a serem aprendidos e ainda sobre a metodologia que podemos utilizar. Ela possibilita a caracterização da classe, quer seja no coletivo ou individualmente, bem como os conhecimentos prévios do grupo no que diz respeito à arte e suas linguagens.

Conhecer o aluno, o que ele já sabe sobre a área de arte é essencial para a organização do trabalho com projetos.

Para tanto, orientamos os professores para que nos primeiros dias de aula realizassem esse tipo de avaliação com seus grupos de alunos, que elaborassem atividades que envolvessem as linguagens da arte, levantando conhecimentos já adquiridos pelos alunos. Orientamos também que os professores realizassem registros, tanto individuais quanto coletivos apontando estes conhecimentos.

Transcrevo aqui um desses relatórios de avaliação diagnóstica na área de artes visuais, realizado por um dos professores especialista de arte.

“No que concerne às artes visuais, o contato principal dos alunos tem sido através da escola, o que não quer dizer que esse contato tenha sido o ideal. Em minhas conversas, pude perceber que a maior parte deles identifica a idéia de arte com afazeres manuais e com a bidimensionalidade, mormente desenho e pintura. Não mencionaram nada sobre tridimensionalidade ou técnicas reprodutivas, nem sobre audiovisual. E em um primeiro momento, não relacionaram a música, o teatro ou a dança com a idéia que tem de arte. Foi necessário que eu interferisse com essa lembrança, no que eles concordaram com o caráter artístico dessas linguagens.

Algumas meninas se referiram também a técnicas como tricô e crochê, e alguns meninos citaram coisas como ”artes marciais”, um claro equívoco desfeito durante as conversas. Os alunos de várias classes também mencionaram o exercício de cópias de reproduções de arte. Segundo as crianças, o professor trazia uma imagem de alguma obra famosa, e pedia para que eles tentassem copiar, sem nenhum objetivo didático específico e sem nenhum conteúdo a ser trabalhado. Apesar de pobre, essa prática lhes proporcionou algum repertório: ao serem questionados por mim a respeito dos artistas que conheciam, citaram Picasso, Leonardo da Vinci e, principalmente, Tarsila do Amaral, mas não foram mais longe que isso. Os primeiros anos foram os que apresentaram menor familiaridade com a idéia e a prática da arte, não só pela pouca idade, mas também porque viveram poucas situações artísticas anteriormente. Em contrapartida as quartas séries fugiram à média. Muitos meninos me fizeram perguntas extremamente pertinentes e demonstraram um repertório bem mais complexo (técnico e conceitual) que as demais crianças. De fato, essas exceções foram quase todas masculinas, inclusive nos trabalhos produzidos a partir das propostas trazidas por mim: os desenhos e colagens mais complexos, inventivos e que demonstraram traços de um estilo pessoal, foram realizados quase todos por meninos. Lembro-me apenas de duas meninas que apresentaram soluções interessantes para as propostas. Esses alunos demonstraram ter uma compreensão maior do espaço representacional, um uso consciente de repertório formal anterior, acionado pela memória, liberdade de ação e criação, preocupação com a composição, com a “qualidade” de sua produção. Já a grande maioria das meninas recorreu, na maior parte das vezes, a estereótipos gráficos de todo tipo, como sóis sorridentes, arvorezinhas, e casinhas, flores, corações e mesmo slogans de igrejas neopentecostais (mesmo quando esses não faziam nenhum sentido

na composição do desenho ou da colagem), além de terem apelado para “enfeites” e “decorações” na finalização de seus trabalhos, como fitas penduradas nas bordas das folhas dos desenhos, compondo molduras em si estranhas aos produtos gerados a partir das propostas apresentadas.”

Este relatório de avaliação diagnóstica é uma importante bússola para o desenvolvimento do trabalho do professor, pois, elenca além da relação das crianças com a área de arte, o que conhecem, pensam sobre ela, as dificuldades que têm no percurso de produção, na relação de uma linguagem com outra, como se expressam oralmente, como se colocam frente ao grupo, como se organizam em sua produção e como apreciam seus trabalhos e os dos colegas.

A avaliação diagnóstica proporcionará a identificação de distintas faixas de desenvolvimento nas linguagens artísticas, conhecer esta realidade, ou seja, o conhecimento prévio desses alunos possibilita ao professor a utilização de estratégias de atendimento diferenciado, que atenda as necessidades dos alunos e amplie seu repertório artístico/estético.

No documento SERGIO LUIZ DA CUNHA (páginas 81-84)

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