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Um dos maiores desafios da toxicologia consiste no desenvolvimento de modelos que permitam estudar os efeitos da associação de substâncias, nomeadamente observar se a sua combinação aumenta a toxicidade ou diminui a eficácia.

Os efeitos possíveis após a exposição do organismo a, pelo menos, dois compostos em simultâneo podem ser:

- Aditivos: se a toxicidade combinada dos compostos é igual à soma dos seus efeitos quando administrados isoladamente;

- Sinérgicos: se o efeito combinado dos compostos é maior do que a soma de cada um administrado isoladamente;

- Potenciados: se um composto que não apresenta toxicidade em determinado órgão ou sistema se torna tóxico quando em associação com outro. Alguns autores defendem que este conceito pode ser englobado no conceito de aditividade (Dias da Silva et al. 2013b; Silva et al. 2002);

- Antagónicos: se dois compostos associados apresentam um efeito tóxico menor do que a soma dos efeitos tóxicos obtidos após a sua administração isolada (Klaassen, 2001; Timbrell, 2009).

De uma forma realista, realizar ensaios de toxicidade em todas as hipotéticas combinações de drogas é de impossível execução, pelo que todas as aproximações que

43 possam ser realizadas, previsões de aditividade, sinergismos ou antagonismos são de extrema importância para a toxicologia.

Ao longo das últimas décadas, vários estudos de toxicidade de mistura têm comparado dois modelos de cálculo que prevêm os seus efeitos aditivos (Dias da Silva et al. 2013b; Drescher 1995; Payne et al. 2000): modelo de adição de concentrações (AC), proposto por Loewe e Muchnik (1926) e o modelo de acções independentes (AI), descrito por Bliss (1939).

O conceito de AC ou “adição de doses”, é baseado no pressuposto de que os componentes da mistura provocam o mesmo efeito por mecanismos de ação semelhantes, isto é, produzem o mesmo efeito tóxico no órgão alvo atuando de forma similar, o que significa que qualquer componente da mistura pode ser substituído, parcial ou totalmente, por outro dos componentes sem alterar o efeito final (Backhaus et al. 2000; Dias da Silva et al. 2013b). Ou seja, cada componente individual contribui para o efeito conjunto agindo proporcionalmente à sua concentração, mesmo em concentrações que não produzam efeito.

Este modelo é representado pela equação 1, sendo n o número de compostos na mistura; pi a fração do composto i na concentração total da mistura; ECmix a concentração da mistura que produz o efeito E, e ECi a concentração do composto i que isoladamente provoca o efeito E.

(Equação 1)

O modelo de previsão alternativo, o modelo AI, também designado por “Bliss Independence” (Bliss 1939) ou ”joint independente action” (Plackett and Hewlett 1948), assume que os componentes da mistura provocam os mesmos efeitos mas por mecanismos de ação distintos, atuando cada substância em locais de ação específicos e, como tal, um componente da mistura não interfere com a ação dos outros (Backhaus and Boedeker 2000). Neste caso, a resposta de cada composto é independente das respostas induzidas pelos outros componentes da mistura, assumindo-se que quando um componente está presente em concentração que não apresenta qualquer efeito não vai contribuir para o efeito da mistura.

Este modelo é representado pela equação 2, sendo ECmix o efeito E da mistura; Emax o efeito máximo da mistura ou dos seus componentes isoladamente, neste caso 100% de morte; n o número de compostos na mistura; e Mi(Ci) o efeito do composto i na concentração Ci (Dias da Silva et al. 2013b).

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⌈ ∏

⌉⌉

(Equação 2)

As derivações matemáticas destes modelos de previsão (AC e AI) foram descritas por Payne e colaboradores (2000).

Regra geral, o modelo AC prevê efeitos de maior toxicidade que o modelo AI (Backhaus 2000a; Faust et al. 2003). Por este motivo, uma vez que não subestima a toxicidade das misturas de substâncias e dado que em estudos mais recentes demonstrou ser adequado também na previsão da toxicidade de misturas compostas por substâncias com diferentes mecanismos de ação ou mecanismos desconhecidos (Evans et al. 2012; Zhang et al. 2010), em caso de dúvida relativamente à aplicabilidade destes modelos, recomenda-se a aplicação do modelo AC na avaliação dos efeitos tóxicos de todas as misturas, independentemente do modo de ação de cada um dos seus componentes individuais.

Vários estudos demonstram que a previsão da toxicidade de uma mistura de substâncias num organismo tão complexo como o do ser humano não é corretamente realizada usando como única base o conhecimento da toxicidade individual de cada componente e o seu respetivo mecanismo de ação, uma vez que outros fatores tal como mecanismos de ação secundários, transporte, distribuição, metabolismo e excreção estão presentes, podendo contribuir de forma considerável para os efeitos tóxicos (Cedergreen et al. 2008; McCarty and Borgert 2006). Por este motivo, outros modelos de previsão de efeitos tóxicos mais completos têm sido estudados, nomeadamente modelos que têm em consideração a toxicocinética e a toxicodinâmica das substâncias. No entanto, até à data não foi validado e implementado nenhum modelo que constitua melhor opção que os modelos AC e AI, apesar das suas limitações.

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3- OBJETIVOS

46 A presente dissertação pretende contribuir para a caracterização in vitro da citotoxicidade da BZP e da TFMPP quando incubadas isoladamente e em simultâneo, utilizando as condições experimentais mais adequadas para representar o que se verifica a nível hepático nos indivíduos humanos que consomem as substâncias isoladamente ou em associação. Adicionalmente, pretende-se verificar a aplicabilidade de dois modelos para a previsão de toxicidade de misturas, o modelo de adição de concentrações (AC) e o modelo das acções independentes (AI), bem como conhecer os mecanismos que conduzem à toxicidade e aferir a influência da metabolização destas drogas de abuso na sua ação toxicológica, e em particular nas interações observadas.

Assim, os estudos realizados no âmbito da presente dissertação tiveram como principais objetivos:

- A caracterização do perfil de citotoxicidade da BZP e da TFMPP quando incubadas isoladamente e em associação, utilizando modelos in vitro de células metabolicamente competentes, nomeadamente a linha celular humana HepaRG e hepatócitos primários de rato;

- Avaliar a capacidade de previsão da citotoxicidade da mistura das duas substâncias de dois modelos farmacológicos (modelo AC e AI);

- Estudar os mecanismos subjacentes à toxicidade da BZP, da TFMPP e da mistura das substâncias na razão de 2:1, em hepatócitos primários de rato;

- A caracterização do perfil metabólico das duas drogas isoladamente e em associação em hepatócitos primários de rato;

- Correlacionar eventuais alterações verificadas no perfil de metabolização das drogas com eventuais alterações no respetivo perfil de citotoxicidade.

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4- METODOLOGIAS

UTILIZADAS NOS TRABALHOS

48 De forma a tornar possível a concretização dos objetivos propostos para a presente dissertação foram selecionadas as metodologias mais adequadas à obtenção de resultados, tendo em consideração a disponibilidade dos equipamentos, recursos e condições do laboratório. A sua descrição encontra-se pormenorizada nas secções seguintes, de forma a permitir uma eventual reprodução do trabalho experimental desenvolvido.

4.1- Caracterização do perfil de citotoxicidade da