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Método Eletromagnético de muito baixa frequência (Very Low Frequency Electromagnetics (VLF-EM))

Capítulo 5. Testes de Traçagens Com Traçadores Artificiais

5.4. Avaliação e interpretação

5.4.1. Qualidade dos dados, análise de erros e fundo

A aplicabilidade dos dados obtidos de uma experiência de traçagem depende da periodicidade de amostragem e dos procedimentos analíticos utilizados (Smart, 2005). A amostragem integrativa (p. e. carvão ativado ou resinas) fornecerá dados de acordo com o tempo de exposição. As medições em contínuo, por sua vez, fornecem uma melhor resolução temporal. Na prática, os erros nos testes de traçagens são dominados por questões relacionadas com o fundo e contaminação, perda de traçador (p.e. adsorção) e insuficiência na periodicidade de amostragem (Benischke et al., 2007). Smart (2005) e Meus (2008) fazem uma compilação dos principais erros detetados nos testes de traçagens, com traçadores fluorescentes, consoante a técnica utilizada.

O fundo pode ser definido como parte da concentração de traçador medido não proveniente da sua injeção, sendo resultado de traçadores externos (contaminação), outras substâncias medidas com o traçador ou erros instrumentais (Benischke et al., 2007). Vários autores apresentaram trabalhos nesta área, tentando caracterizar a proveniência do fundo: Smart & Simpson (2002); Smart & Karunaratne (2002); Meus et al., (2006). Alguns traçadores fluorescentes são hoje em dia

Metodologias utilizadas no estudo do escoamento em aquíferos cársicos e o caso prático da captação do Olho Mira (Maciço Calcário Estremenho)

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encontrados no meio ambiente, pelo facto de serem introduzidos pelo homem como resultado da sua atividade (p.e. na indústria automóvel ou detergentes domésticos). A utilização de bacteriófagos marinhos nas experiências de traçagens com traçadores biológicos ultrapassa esta questão na medida que a probabilidade da sua existência no aquífero é muito reduzida (Reis et al, 1998).

5.4.2. Curva de restituição, tempo de trânsito e velocidade

A curva de restituição relaciona a concentração do traçador no tempo obtido através de monitorização em contínuo ou das análises das amostras colhidas num determinado instante, representando assim o comportamento do traçador durante um determinado trajeto. A curva típica de restituição é composta por um troço ascendente, por um pico e por um troço descendente da curva (Figura 5.3). A sua assimetria deve-se a processos de transporte, como a dispersão. A curva de restituição reflete também a estrutura por onde o escoamento se processa e é influenciada pela variação temporal da recarga (Benischke et al., 2007).

Figura 5.3 - Exemplo de uma curva de restituição resultante da injeção instantânea. As principais características são: tempo da primeira deteção (t1), tempo e concentração do pico (tp, Cp), tempo de concentração do centróide cc (tc), tempo onde

metade do traçador recuperado já passou (t50), fim do período de observação (te). A curva de recuperação mostra

cumulativamente a fração de traçador injetado que chegou. Neste caso, o total recuperado no final do tempo de observação foi de 72%, então o t50 é o tempo com 36% de recuperação (Adaptado Benischke et al., 2007).

O primeiro momento de chegada do traçador depende do limite de deteção do método utilizado e da estabilidade do fundo, pelo que é mais correto chamar-lhe primeira deteção. A média do tempo de trânsito situa-se entre o tempo máximo de concentração e o tempo em que 50% do traçador já passou o local de amostragem. O centróide da concentração da curva de restituição fornece uma boa

Capítulo 5 – Testes de Traçagens Com Traçadores Artificiais

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aproximação da média do tempo de trânsito. Quando a curva de restituição provém de uma amostragem deficiente ou com erros, o tempo do pico fornece a melhor estimativa do tempo de trânsito (Benischke et al., 2007). O tempo de trânsito pode ser convertido para a respetiva velocidade se for conhecida a distância percorrida (p. ex. através de exploração espeleológica) ou então a distância linear entre o ponto de injeção e de monitorização pode ser usado para calcular a velocidade linear. A velocidade de fluxo corresponde a diferentes tempos que são a velocidade máxima de fluxo (primeira deteção), a velocidade de fluxo modal (pico), a velocidade de fluxo efetiva (tempo do trânsito médio) e a velocidade média (50% da massa de traçador recuperado) (Schlulz, 1998). Alguns programas de computador podem ajudar na interpretação das curvas de restituição como, por exemplo, o QTRACER (Field, 2002).

Para o cálculo da massa de traçador recuperado é necessário os valores do caudal assim como as concentrações em todos os locais monitorizados. É possível colocar os valores cumulativos de traçador recuperado (massa ou %) no mesmo diagrama da curva de restituição permitindo assim definir o tempo em que metade do traçador passou e calcular a velocidade média (Figura 5.3) (Benischke et al., 2007). A massa recuperada de traçador é frequentemente menor que 100% devido a vários fatores como, por exemplo, a sua chegada a locais não monitorizados (p.e. nascentes submarinas ou outras bacias de drenagem). Meus et al., (2006) apresentam vários motivos e possíveis consequências pela perda excessiva de traçador.

5.4.3. Caracterização da rede de galerias

A aplicabilidade primária de um teste de traçagem consiste na definição dos locais por onde o escoamento subterrâneo se faz preferencialmente. É possível obter as características hidráulicas da rede de galerias dos aquíferos cársicos com testes totalmente configurados onde a massa de traçador injetado e o caudal de injeção possam ser comparados com a massa de traçador recuperado e o caudal no local de amostragem. Os traçadores conservativos são preferenciais para este tipo de interpretação (Benischke et al., 2007).

Quando o caudal no ponto de injeção é similar ao caudal no ponto de amostragem e a massa de traçador recuperada é próxima dos 100%, então a conexão entre estes dois pontos é direta, sem divergência ou confluência de fluxo. Conceptualmente é útil determinar a geometria de uma galeria equivalente conectada por dois pontos, completamente cheia de água e com uma área da secção transversal constante (ver p.e. Benischke et al., 2007). Na maioria dos casos, o caudal no ponto de amostragem é diferente do caudal no ponto de injeção e a massa de traçador recuperado é inferior a 100%, indicando um fluxo divergente e/ou convergente entre os dois pontos.

A curva de restituição pode fornecer informações adicionais sobre as condições em que se processa o escoamento subterrâneo. Um único pico sugere uma única galeria que pode ser caracterizada

Metodologias utilizadas no estudo do escoamento em aquíferos cársicos e o caso prático da captação do Olho Mira (Maciço Calcário Estremenho)

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geralmente usando modelos interpretativos apropriados. Múltiplos picos na curva de restituição podem sugerir múltiplas direções de escoamento (Smart, 1988).

A combinação dos testes de traçagens com observações geológicas, hidrogeológicas (p.e. hidroquímica, isotópica) ou espeleológicas, tem ajudado à compreensão do escoamento subterrâneo: Goldscheider et al., 2008; Lauber et al., 2014; Pronk et al., 2006; Miller, 2010.