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2 OS CUIDADOS DE SI

2.2 BANHOS PÚBLICOS, BANHOS PRIVADOS

Os banhos ou thermae – como vimos – já eram construídos e consagrados desde a Antiguidade, nas fontes naturais de águas minerais às quais se atribuíam propriedades curativas. Ainda é possível encontrar vestígios das termas construídas pelos imperadores romanos em países como o Reino Unido, Holanda, França, Itália, Alemanha, Hungria, Romênia e Espanha.28 Suas ruínas se transformaram em atrações

turísticas.

27www.istoe.com.br/assuntos/entrevista/detalhe/102755_VIVEMOS+TEMPOS +LIQUIDOS. Consulta em 18 de dezembro de 2013.

28http://201.2.114.147/bds/bds.nsf/061B762100A775E283257664008063D4/$Fi le/NT00042B9E.pdf. Acesso em 6 de julho de 2012.

Ilustração 1 – Detalhe de uma das obras de arte da coleção do Palácio Farnese, no Museu Arqueológico de Nápoles

Fonte: http://manualdoturista.com.br/gabinetto-segreto-do-museu-arqueologico- de-napoles/.

Uma das vantagens da casa de banhos pública, na época dos impérios grego e romano, era a oportunidade de socialização e do contato físico que ela oferecia, em locais tão suntuosos quanto palácios reais. As duas maiores termas romanas, a de Caracala e a de Dioclécio, são reconhecidas como maravilhas de Roma e o destino final das pilhagens nelas efetuadas dá uma ideia de sua magnificência: quando o papa Paulo III tomou as termas de Caracala, no século XVI, foi para decorar seu Palácio Farnese com mármores, medalhas, bronzes e baixos- relevos (a Coleção Farnese, hoje no Museu Arqueológico de Nápoles).

As termas romanas talvez pudessem encontrar nos maiores

shoppings modernos uma sombra como equivalentes à principal atração

das cidades. No século XX, as ruínas de uma única sala de banho quente das termas de Caracala serviram de palco para uma encenação de Aída, de Verdi, acomodando carruagens, cavalos e camelos, bem como o elenco e a plateia. Pelas suas dimensões, pode-se concluir que as termas eram locais muito movimentados e muito frequentados pela maioria das

pessoas que habitavam as cidades da época. As termas eram uma prática democrática, acessível, necessária.

Ilustração 2 – Termas de Caracala (projeção, a partir de suas ruínas), em Roma

Fonte: http://guiaderoma.blogspot.com.br/2011/10/termas-de-caracalla.html.

Detalhes sobre o desfrute das termas romanas nos dão a dimensão de como elas eram apreciadas tanto pelos patrícios quanto pelos escravos, homens, mulheres e crianças, ricos e pobres, que passavam dias inteiros dentro delas. Eram pontos de encontro para inúmeras finalidades, como o são, de fato, muitas termas, ainda hoje. “Local para fazer contatos, fechar negócios, flertar, fazer política, comer e beber” (ASHENBURG, 2008, p. 37). “Prostitutas, curandeiros e esteticistas instalavam-se nos complexos balneários ou nas lojas ao redor deles” (idem).

“Assim, era possível fazer sexo, tratamento médico e cortar o cabelo numa mesma visita”, ressalta Ashenburg. No século I a. C., havia quase 200 casas de banho na capital do Império, quando nove aquedutos

abasteciam Roma com quatro vezes mais água que a média consumida por um estadunidense moderno. Isso dá a dimensão da importância desta prática na época, numa comparação entre o consumo individual de água no império romano e o consumo individual de água numa das maiores economias mundiais da atualidade.

Hoje em dia, muitas das saunas, nas grandes cidades, fazem parte de clubes desportivos, são como uma seção nos centros de natação e hidroginástica, quadras de futebol ou clubes recreativos, de maneira geral. Elas estão presentes em boa parte dos hotéis mais caros, onde a clientela masculina e feminina se reveza para usá-las em horários e dias da semana predeterminados e alternados. É raro que haja saunas, nesses locais sociais, que sejam mistas e usadas concomitantemente por homens e mulheres. Existem, por outro lado, também, e são bastante comuns, nas cidades maiores, saunas mistas e/ou masculinas, daí sim com conotação sexual, tanto para encontros hétero quanto para encontros homossexuais, que podem, ou não, ter o caráter de prostíbulos. Elas são divididas não só por gêneros, mas também pela preferência sexual de seus clientes.

Então, observa-se que, sob alguns aspectos, as termas urbanas sobreviveram e mantiveram algumas das características ancestrais de locais destinados ao prazer sexual. De modo que não se pode dizer que a prática tenha se tornado totalmente asséptica, digamos assim. O que ela passou a ser foi compartimentalizada: algumas saunas (ou termas) servem para determinados fins; outras, para outros. Pouquíssimas para todos, como as termas romanas. Da mesma forma, a limpeza, a higiene e os cuidados com o corpo entraram e saíram de moda ao longo dos séculos. Quando estiveram em alta cotação, os banhos foram prescritos em minúcias e estimulados em tais proporções que há cidades inteiras que ainda hoje podem viver economicamente apenas com a visitação às ruínas de suas termas, como é o caso de Bath (ilustração 3), na Inglaterra, ou mesmo de Roma, já que uma das atrações turísticas mais procuradas são as próprias ruínas das termas de Caracala, pelas suas grandiosas dimensões arquitetônicas e pela sua história.

Pode-se perceber que o hábito dos banhos e dos banhos termais, um de seus desdobramentos, já teve distintas conotações – cura, relax, prazer sexual, higiene, limpeza, socialização, contato humano – ao longo da história e que, de uma forma ou de outra, praticamente todas elas ainda coexistem e subjazem nas práticas termais contemporâneas, ainda que de forma compartimentalizada. São sempre banhos ora públicos, ora privados, ora frios, ora quentes, e, como veremos adiante,

as prescrições intercalavam banhos quentes com banhos frios, cada um com indicações precisas sobre sua administração.

Ilustração 3 – Bath, na Inglaterra

Fonte: Google.