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Foto 2 Vista aérea de Maragogi, porção Sudoeste

3.2 Breve histórico de Maragogi

3.2.2 Turistificação: A inserção do turismo no território de Maragogi

3.2.2.2 Barra Grande e Peroba

O Povoado de Barra Grande, localizado a três quilômetros da cidade de Maragogi, e a praia de Peroba, nas proximidades do rio Persinunga, na divisa de Alagoas e Pernambuco, apresentam a predominância de condomínios horizontais de

alto padrão, autodemoninados “Privê”, e casas de veraneio (Figura 12). A presença destes empreendimentos com seus muros denotam a segregação espacial sendo sofrida pelos povos preexistentes à atividade turística nesses lugares.

Diferentemente da sede municipal, onde houve certo tipo de resistência à especulação imobiliária por parte de pescadores, o mesmo não ocorreu em Barra Grande-Peroba. Essa diferença na forma pela qual a especulação imobiliária ocorreu se deve às dificuldades socioeconômicas vividas pelas pessoas localizadas nestes povoados. As circunstâncias relacionadas à qualidade de vida existentes no passado em Barra Grande e Peroba se apresentavam piores que a dos residentes da sede municipal. Por exemplo, na sede municipal em nenhum comentário dos entrevistados verificaram-se indícios da existência de fome endêmica, como ocorrera nas falas dos entrevistados de Barra Grande. Apesar de em ambos os lugares as pessoas viverem basicamente da pesca artesanal, a distância espacial em relação às facilidades de serviços e comércio piorava o contexto social dos últimos. Além disso, a grande quantidade de terras ocupadas pela população de Barra Grande, mas sem intitulamentos necessários para a sobrevivência, favoreceu a espacialização de condomínios fechados horizontais e segundas residências.      

Figura 12 - Condomínios de veraneio   

      a) e c) localizados em Peroba; b) e d) Condomínios de veraneio localizados em Barra Grande 

Fonte: Manuela Kaspary, outubro/novembro de 2011.

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A intensificação desse tipo de ocupação provocou o remanejamento de antigos moradores que foram morar em aglomerados periféricos, próximos a margens de rios e áreas de mangues. Esse tipo de transferência foi mencionada por uma esposa de pescador e moradora do povoado de Barra Grande. Segundo esta entrevistada, antes da chegada dos veranistas todos os pescadores residiam à beira-mar, em casas de taipa de precárias condições.

Os veranistas pioneiros, interessados nas localizações privilegiadas junto à praia, primeiramente construíam casas de alvenaria em áreas afastadas da praia, para, logo após o término da construção, oferecer em troca das casas dos pescadores. Inúmeros residentes aceitaram esta troca pela possibilidade imediata de uma moradia melhor. A perda locacional foi ignorada, diante das condições precárias em que viviam, e essa perda se refletiu negativamente nas condições de vida das pessoas desse lugar. Se antes as casas eram precárias, pelo menos eles estavam localizados em amplos terrenos e localizados próximos ao mar, ambiente no qual exerciam a pesca. Os novos locais de moradia além de distantes do mar as condições locais são insalubres, consequência da alta densidade de ocupação e por se localizarem, frequentemente, em áreas úmidas. Essa situação é muito diferente da situação da população que anteriormente vivia na atual sede municipal, na qual as relações de trabalho e de renda trouxeram vários benefícios. No caso de Barra Grande-Peroba as conquistas obtidas pela população local resumiram-se a trabalhos serviçais em segundas residências e em algumas poucas pousadas.

A atual escassez do pescado é outro fator que tem contribuído para o redirecionamento para atividades distintas da pesca. Para os que permanecem exercendo a atividade pesqueira em Barra Grande, gradativamente está sendo necessário ir à procura de áreas piscosas em outras partes da costa alagoana, como Barra de Santo Antônio e Paripueira. A deterioração ambiental é identificada pelos entrevistados como responsável por esta realidade. Relata-se que nos rios e riachos que fazem parte do município de Maragogi existia farta quantidade de camarão. Atualmente, eles estão extintos pela poluição causada pela acelerada ocupação sem o devido cuidado sanitário, despejo de lixo e aterramentos de manguezais para ocupação urbana, um fenômeno influenciado pelo turismo. A própria Associação de Pescadores de Barra Grande, bem como a residência da família do Presidente desta associação, está localizada nas proximidades do mangue juntamente com um aglomerado de outras famílias, que vivem em situações semelhantes.

O aterramento e ocupação de áreas de manguezal são as causas principais para o afastamento e redução dos estoques de espécies que compõem a cadeia alimentar costeira, fundamental para o desenvolvimento socioeconômico de pescadores artesanais (ADRIÃO, 2003, p.94-95). Os fatores acima citados são limitantes para a prática da pesca e influenciam na busca por atividades econômicas alternativas, como aquelas voltadas para o trabalho em atividades de veraneio, meios de hospedagem e demais atividades turísticas o município.

A troca e/ou associação do trabalho de pescador com o de caseiro16, e a inserção da mão de obra feminina em atividades domésticas nestas residências e/ou em pousadas, transformou as características culturais e naturais daquele território, além de criar certo grau de dependência econômica em relação à atividade. Esta situação não tem se mostrado como real fator de mudança social e econômica significativa para as comunidades de Barra Grande e Peroba, a ponto de possibilitar o seu desenvolvimento.

Outra característica marcante em Barra Grande e Peroba é a influência pernambucana no turismo de segunda residência. São inúmeros os condomínios com anúncios de aluguel com prefixo telefônico do estado vizinho. Os comentários de moradores entrevistados também denunciam a procedência pernambucana da maioria dos veranistas frequentadores daquela localidade. A Secretaria de Turismo de Maragogi apresentou uma relação de 11 destes condomínios sendo que 80% deles são de administração ou propriedade de pessoas de Pernambuco (Figura13). O número apresentado pela secretaria encontra-se desatualizado e segundo a Secretária municipal de turismo, há a possibilidade desse número ser superior ao apresentado.

Figura 13 - (a – c) Placas de condomínios sazonalmente fechados localizados em

Barra Grande e Peroba

Fonte: Manuela Kaspary, novembro/2011.

      

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Caseiros são pessoas que guardam, cuidam e fazem a manutenção da segunda residência, na praia ou campo, nos períodos em que elas não estão em uso pelo moradores temporários. São os responsáveis por aquele imóvel na ausência dos proprietários.

Os condomínios fechados se configuram como enclaves no território litorâneo urbano, que se localizam em áreas anteriormente esparsamente ocupadas, mas sem conexões culturais ou funcionais com a sociedade local. Estes enclaves são reflexos de uma autosegregação por classes sociais dominantes que em parte ignoram os problemas da cidade e voltam-se para o atendimento de seus interesses e necessidades imediatos. Segundo Luchiari (1999), a segregação residencial relacionada a condomínios fechados faz parte das práticas sociais contemporâneas, que ocupam áreas seletas do tecido urbano e possuem características comuns: concebe um conjunto de habitações, isoladas por muros, cercas, cancelas e guaritas, que apresentam um sistema de segurança diverso e infraestrutura de lazer. Este tipo de autosegregação exercida por classes dominantes é antagônica a segregação espacial ocorrida por populações marginalizadas que são levadas pela pobreza e pela escassa opção de moradia a se alojarem em localidades periféricas.

A multiplicação destes condomínios de forma desordenada é reflexo da ausência de mecanismos para impedir a dominação do território pelos especuladores imobiliários e para a proteção dos direitos e interesses da população local antecedente ao turismo. Essa situação trouxe mais vantagens econômicas para os veranistas e, conforme mencionado anteriormente, diversos problemas para a comunidade local. A população, atualmente em desvantagem diante das perdas sofridas, não consegue visualizar elementos que favoreçam o seu real desenvolvimento e a consequente melhoria da sua qualidade de vida. O fato de a vida econômica estar melhor e de não haver mais risco de fome, como outrora, tornou a atual realidade apenas um pouco mais cômoda, porém não plenamente satisfatória.