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Base de cálculo nas operações com energia elétrica

IV. BASE DE CÁLCULO DO ICMS

4.6 Base de cálculo nas operações com energia elétrica

As operações com energia elétrica constituíam matéria tributável de competência da União, através do Imposto Único sobre Energia Elétrica. A Constituição de 1988 transferiu para os Estados e o Distrito Federal a tributação da energia elétrica, através do ICMS, atribuindo-lhe a natureza de mercadoria. Todavia, necessitou o Poder Constituinte adequar o antigo Imposto Único à sistemática do ICMS e, para isso, manteve a mesma forma de instituição e arrecadação, sendo que eliminou a tributação nas operações interestaduais com a edificação de uma não-incidência qualificada constitucionalmente, uma imunidade, conforme art. 155, § 2, X, b § 3°. O ICMS da energia elétrica tem modelagem própria, não se inserindo no sistema ordinário do imposto que observa a técnica da não-cumulatividade nas operações intermediárias direcionadas ao consumidor final.

Assentado que o ICMS na operação com energia elétrica é tributo de incidência única, cumpre, agora, investigar qual é precisamente o momento em que surge a obrigação tributária, ou seja, qual o critério temporal da regra de incidência do ICMS e só, assim, se chegará à base de cálculo possível em tal operação.

Já foi dito que o comando constitucional é no sentido de que só pode haver uma única incidência, ou seja, no processo de geração (pelas usinas e hidroelétricas) ou de distribuição (pelas concessionárias ou permissionárias) ou de consumo. Somente uma dessas etapas pode ser gravada pelo ICMS. É um comando constitucional, também, que fornece elementos que apontam, de modo suficiente, qual das operações referidas sofrerá a incidência do imposto estadual. Tal preceito está contido no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 34, § 9°, que dispõe: “até que lei complementar disponha sobre a matéria, as empresas distribuidoras de energia elétrica, na condição de contribuintes ou de substitutos tributários, serão as responsáveis, por ocasião da saída do produto de seus estabelecimentos, ainda que destinado a outra unidade da Federação, pelo pagamento do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias incidente sobre energia elétrica, desde a produção ou importação até a última operação, calculado o imposto sobre o preço então praticado na operação final e assegurado seu recolhimento ao Estado ou ao Distrito Federal, conforme o local onde deva ocorrer essa operação.”

Percebe-se que a opção constitucional é pela operação final, sendo devido o imposto ao Estado onde ocorrer a última operação, o consumo. Desse modo, não assumem relevância para efeito tributário as operações intermediárias com energia elétrica, como operações autônomas, já que o fato gerador alcança sua concretização na operação de consumo de energia. 277

De fato, apenas se pode falar em operação jurídica relativa à circulação de energia elétrica quando o interessado transforma-a em outra espécie de bem da vida (calor, frio, força, movimento ou qualquer outro tipo de utilidade). Assim sendo, tem-se que o vínculo existente entre a usina geradora e a empresa distribuidora não tipifica, para fins fiscais, operação autônoma, constituindo meio necessário à prestação de um único serviço ao consumidor final.

Esta já era, inclusive, a postura adotada para a cobrança do Imposto Único de Energia Elétrica que alcançava apenas a última etapa no processo de geração, distribuição e consumo de energia elétrica, exatamente aquela de fornecimento ao consumidor final, conforme o art. 3° da Lei 2.308/54 que definia a incidência do imposto nestes termos: “a energia elétrica entregue ao consumo é sujeita ao imposto único, cobrado pela União sob a forma de imposto de consumo, pago por quem a utilizar.”

Observe-se que, no plano pragmático, torna-se impossível identificar com precisão o lugar de onde sai a energia elétrica, para se eleger a operação de distribuição/geração como aquela a ser onerada. Pelos critérios adotados pelo Setor Elétrico Brasileiro é impossível identificar qual é a origem da energia que está suprindo determinado comprador, já que todos os geradores de energia a entregam ao Sistema Elétrico e os compradores recebem a energia deste mesmo sistema. Caso os geradores não entreguem a energia ao Sistema nos níveis que lhe forem estabelecidos, outras usinas do Sistema Elétrico o farão, sob a coordenação do Operador Nacional do Sistema (ONS). Não há como se identificar se a energia que tal comprador adquire foi gerada por tal ou qual gerador, o que torna viável apenas a tributação da operação de consumo.

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LIMA NETO, Manoel Cavalcante de: “O fato gerador do ICMS nas operações com energia elétrica e seu reflexo na repartição de receitas”. In Revista da Escola Superior da Magistratura do Estado de

Ives Gandra é quem explana o entendimento exposto, aduzindo que a nova sistemática de comercialização de energia elétrica introduzida no Setor Elétrico Brasileiro, permite que uma geradora venda energia para qualquer concessionária distribuidora conectada ao Sistema Elétrico Interligado. Com o surgimento da figura de "consumidor livre" poderá, também, vender energia a empresas não integrantes do setor elétrico, como já ocorreu com a recente assinatura de contrato com uma empresa de produção de papel e celulose. O gerador, que se compromete, mediante contrato, a fornecer a energia, só poderá fazê-lo por meio do Operador Nacional do Sistema (ONS), nos termos regulados pela ANEEL. O ONS, segundo o contrato, fornece a energia recebida de todos os lugares e de todos os geradores ao comprador. A empresa geradora, portanto, vende a energia contratada e a entrega ao Sistema (ONS) para que seja repassada à empresa contratada. O "modus operandi" do ONS, que repassa a energia, de seu "estoque energético", independente da origem, é matéria alheia à relação "geradora- comprador", que devem considerar como fato gerador do ICMS o local da disponibilidade de energia, de acordo com o ajustado nos contratos.278

Registre-se, entretanto opinião em sentido contrário, encampando a possibilidade de existência de mais de um fato gerador do imposto nas sucessivas etapas entre a geração e o consumo, assumindo a distribuidora a posição de substituta tributária em duas modalidades: para trás, em relação ao ICMS correspondente à venda da geradora para a distribuidora e para frente, no que tange às presumíveis vendas para outras distribuidoras ou à venda direta ao consumidor final.279

No que atine à base de cálculo do ICMS sobre a energia elétrica, o dispositivo constitucional transcrito é expresso, tomando como base imponível o preço praticado na operação final. Será levado em conta para o cálculo do imposto devido, o valor alcançado na última etapa do processo de fornecimento de energia.

Roque Carrazza corrobora o entendimento, afirmando que a base de cálculo possível do ICMS incidente sobre energia elétrica é o valor da operação da qual decorra a entrega desta mercadoria (a energia elétrica) ao consumidor. Em outras palavras

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MARTINS, Ives Gandra da Silva: “A hipótese de imposição do ICMS Nas operações com energia elétrica - Peculiaridades nas operações interestaduais – Parecer.” Disponível em http\\www.fiscosoft.com.br. Acesso em 15.06.04.

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COÊLHO, Sacha Calmon Navarro: “O caso Pará”. In Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 74, novembro, 2001, pp. 130/143.

afirma que é o preço da energia elétrica efetivamente consumida, conforme a dicção do art. 34, § 9°, do ADCT, o preço praticado na operação final.280