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A 7ª Bienal Internacional do Livro e o III Seminário Latino-americano de Literatura

CAPÍTULO 4 ATIVIDADE CRIADORA DOS PRATICANTES DO ORDINÁRIO:

4. A 7ª Bienal Internacional do Livro e o III Seminário Latino-americano de Literatura

A sétima edição da Bienal Internacional do Livro foi realizada no período de 19 a 29 de agosto de 1982, no Pavilhão da Bienal do Parque do Ibirapuera em São Paulo. A edição contou com 147 estandes de várias editoras, com exposição de cerca de 70 mil títulos e uma projeção de público de mais de 500 mil pessoas. Segundo Mário Fittipaldi, presidente da Câmara Brasileira do Livro e membro da comissão organizadora do evento, a 7ª edição foi denominada como a "Bienal da Afirmação" em função dos índices de produção e vendas do mercado editorial naquele momento, demonstrando que o setor respondera satisfatoriamente à crise econômica no final do regime militar205. Relativamente a isto, o presidente da CBL associava o cenário

205 A Câmara Brasileira do Livro foi fundada em São Paulo, a 20 de setembro de 1946, por um grupo de

editores e livreiros, visando à divulgação e promoção do livro no país. Em 1948, a CBL promoveu o 1º Congresso de Editores e Livreiros do Brasil e reuniu editoras (ao todo, 56 casas), livrarias, agências literárias, gráficas e sindicatos. Em 1951, a CBL organizou a 1ª Feira Popular do Livro, na Praça da República em São Paulo, buscando introduzir no país eventos como as tradicionais feiras de livros que existiam na Europa. Em 1961, houve uma parceria da CBL com o Museu de Arte de São Paulo para a realização da 1ª Bienal Internacional do Livro e das Artes Gráficas, evento que se repetiu em 1963 e 1965. Em 1970, foi realizada a 1ª Bienal Internacional do Livro organizada pela CBL, reunindo um número expressivo de editoras e que contou com um público significativo. Em 1996, a Bienal passou a ser realizada na Expo Center Norte. Somente em 2006 passou a funcionar no espaço de exposições do Anhembi, também na cidade de São Paulo. Desde a década de 1960, a CBL participa de feiras no exterior representando o setor editorial do Brasil. Em 1971, a CBL organizou o primeiro estande brasileiro na Feira de Frankfurt e, passada mais de uma década, a organização do evento elegeu o Brasil como tema geral e reservou uma área de 2200 metros quadrados para exposição de livros publicados no Brasil. Na ocasião, vários escritores, artistas e intelectuais brasileiros estiveram presentes em reuniões do evento principal e em mostras paralelas. Cabe também lembrar que foi a CBL que, em 1957, instituiu o Prêmio Jabuti dedicado àqueles que se destacam em várias categorias ligadas ao livro — escritores, ilustradores, editores, jornalistas entre outros. Autores como Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade, Celso Furtado, João Cabral de Melo Neto, Antônio Candido, Dalton Trevisan, Celso Lafer, Milton Santos, Mário Chamie, Ruth Rocha figuram na lista de agraciados com o Prêmio Jabuti. A 7ª edição da Bienal Internacional do Livro, em 1982, no trigésimo sexto ano de existência da CBL, contou com a participação de 527 editoras, tanto nacionais quanto estrangeiras. Entre os selos estrangeiros, que, ao todo, representaram 18 países, havia casas editoriais de Portugal, da França, Espanha, Inglaterra, Suíça,

favorável do mercado editorial ao processo de abertura política vivido no país naquele momento, e que proporcionava ao público consumidor o contato com obras antes censuradas pelo regime. De fato, essas expectativas otimistas foram corroboradas pela sétima edição da Bienal Internacional do Livro, especialmente quando consideramos a presença de um público estimado em 700 mil pessoas, o que representou um crescimento de quase 50% em relação ao evento anterior e um volume de vendas que chegava a 85 milhões de cruzeiros, o que representava quase o dobro do volume de vendas da edição de 1980 (FOLHA DE SÃO PAULO, 1982, p.63).

Todavia, a recomposição desse panorama sobre a sétima edição da Bienal Internacional do Livro — que representa também a trajetória da Câmara Brasileira do Livro, marcada pela militância em prol do livro e da leitura — seria lacunar se verificamos apenas os números que compuseram seu sucesso comercial. A sétima edição da Bienal Internacional do Livro teve uma programação cultural marcada por comemorações significativas na literatura brasileira como a celebração de 80 anos da primeira edição de Os Sertões, de Euclides da Cunha; o aniversário do poeta Carlos Drummond de Andrade completara 80 anos no dia 31 de outubro daquele ano; os 60 anos da Semana de Arte Moderna de 1922. O lançamento de uma edição fac-similar da primeira edição de "A menina do nariz arrebitado", produzida a partir do exemplar original que pertencia ao empresário e bibliófilo José Mindlin, marcou as comemorações pelos cem anos de nascimento de Monteiro Lobato; além disso, a produção e trajetória do escritor foi um dos temas eleitos para estudos e discussões nos grupos de trabalho do III Seminário Latino-americano de Literatura Infantil e Juvenil, uma das atividades paralelas desenvolvidas na Bienal. O aniversário de 70 anos de Jorge Amado e seus cinquenta anos de atividade literária (seu romance de estreia, O país do

carnaval, é de 1931) motivaram uma exposição que reuniu mais de 600 reproduções das

capas de edições de seus livros publicados em vários países, destacando-se, por exemplo, a edição italiana de Terras do sem fim, de 1949, acompanhada de uma sobrecapa assinada por Pablo Picasso206. Houve também a mostra de fotografias

Alemanha Ocidental e Oriental, Moçambique, México entre outros. Para informações sobre o evento em questão, vide "Mês do livro em São Paulo: duas Bienais com exposições, palestras e prêmios", In: O Globo, 31/07/1982.

206 Dados retirados do catálogo do acervo da Fundação Casa de Jorge Amado, p. 305. (Fundação Casa de

Jorge Amado: catálogo do acervo de documentos/ Myriam Fraga, apresentação, Salvador, BA: Fundação Casa Jorge Amado, 2009)

intitulada Reportagem incompleta, com acervo de autoria da esposa do escritor, a escritora Zélia Gattai207.

Um aspecto importante a se considerar nesse painel de homenagens à história da cultura brasileira no século XX é o reconhecimento dos ícones da cultura nacional que destoavam do senso nacionalista difundido por duas décadas de regime militar. A homenagem feita ao escritor Jorge Amado, por exemplo, cuja militância política no Partido Comunista Brasileiro foi de grande importância, seria impensável alguns anos antes. Esse mesmo tom dissonante e de questionamento pode ser observado no III Seminário Latino-americano de Literatura Infantil e Juvenil que teve como tema "Literatura e Ideologia" e realizou mesas-redondas com convidados como o educador Paulo Freire, após exílio de mais de vinte anos208.

A Associação de Leitura do Brasil marcou sua presença na sétima Bienal Internacional do Livro, representada pelo professor Ezequiel Theodoro da Silva como coordenador de um dos grupos de estudo do III Seminário Latino-americano de Literatura Infantil e Juvenil. A ALB também ocupou um estande ofertado à entidade no Pavilhão da Bienal209. Embora já amadurecida pelas experiências anteriores dos COLEs e das Feiras do Livro, a Bienal representou um novo desafio à capacidade de mobilização tanto da diretoria da ALB, ainda naquele momento uma diretoria

207

"É a Bienal Internacional do Livro em São Paulo", In: O Globo, 19/08/1982.

208 O Seminário Latino-americano de Literatura Infantil e Juvenil foi realizado em parceria com a

Fundação Nacional de Literatura Infantil e Juvenil no período de 16 a 19 de agosto. A proposta geral era aprofundar o estudo sobre a literatura infantil e juvenil e, para esse fim, foram organizados grupos de estudos que contemplaram subtemas como a análise das obras em literatura infantil e juvenil; os aspectos visuais das obras infantis; literatura e educação com ênfase nos problemas e propostas voltados para a formação do leitor infantil. Lembrando o centenário do escritor Monteiro Lobato, um grupo de estudos sobre a história da literatura infantil no Brasil ocupou-se da produção literária infantil do escritor. Os trabalhos nos grupos previam aulas expositivas do coordenador de grupo, o desenvolvimento do tema proposto e, posteriormente, um debate. Cabe notar que, em evento paralelo à 5ª Bienal Internacional do Livro, em 1978, teve lugar a primeira edição do Seminário Latino-americano de Literatura Infantil e Juvenil. O evento foi realizado pela comissão organizadora da Bienal em parceria com a FNLIJ e registrou a participação de delegações da Argentina, Bolívia, Venezuela e de El Salvador. A segunda edição foi realizada em 1980 com participações de escritores brasileiros, argentinos, bolivianos e uruguaios. Os encontros e seminários sobre literatura infantil e juvenil aconteciam desde a década de 1970 com a participação das seções nacionais da IBBY da América Latina. O primeiro encontro registrado foi realizado na Venezuela, em 1973, que sediava a associação Banco del Libro, primeira seção IBBY na América Latina, criada e 1960, com a participação de Ruth Villela, uma das fundadoras da FNLIJ. Em 1978, o 14º Congresso da IBBY foi realizado no Brasil na cidade do Rio de Janeiro com a organização da FNLIJ com a participação de mais de 400 pessoas e marcou o primeiro evento da IBBY fora do continente europeu. (Seção Notícias 9, FNLIJ, setembro de 2013, site: http://www.fnlij.org.br , acesso em 20/01/2017)

209 Por meio de um ofício da Bienal Internacional do Livro enviado à ALB em 02 de junho de 1982, a

comissão organizadora oficializou o convite ao professor Ezequiel para coordenar os trabalhos de um dos grupos de estudos do Seminário e, visando contribuir para a divulgação da entidade, ofertou o espaço no Pavilhão. Arquivo de correspondências recebidas, ofício Bienal Internacional do Livro, de 02/06/1982.

provisória, quanto dos sócios e dos diversos colaboradores, como podemos depreender das discussões dos membros da diretoria provisória registradas nas atas das reuniões que antecederam a Bienal. A constituição de uma equipe que garantisse o funcionamento do estande durante todo o período da Bienal (ao longo de uma semana) foi um desses desafios; outra demanda veio da logística necessária para o funcionamento do estande — mobiliário, decoração, material impresso e de divulgação; enfim, todo um conjunto de ações exigidas para a ocupação de um espaço em evento tão grandioso. Uma das soluções que viabilizaram a participação da entidade veio da parceria com a Editora Lisa Livros Irradiantes, do editor Leonídio Balbino da Silva210, membro participante da fundação da ALB, que permitiu a impressão de folhetos de divulgação da ALB e fichas de inscrição para a adesão de novos associados. Também foi possível a constituição de um acervo de edições sobre o tema leitura, com destaque para títulos como Leitura em crise na escola: as alternativas do professor, organizado por Regina Zilberman reunindo autores como Marisa Lajolo, Lígia Morrone Averbuck, Hakira Osakabe, Ezequiel Theodoro da Silva, alguns dos quais associados da ALB. Também constavam do acervo ofertado no estande da ALB as edições dos Resumos dos Congressos de Leitura do Brasil211. Os cartazes das três edições do COLE serviram como material de divulgação do evento e como decoração do estande.

O ritmo intenso e o grande fluxo de visitantes da Bienal Internacional requisitaram esforços para que o estande da entidade cumprisse o cronograma do evento. Na avaliação da diretoria212, a participação da ALB fora positiva, considerando alguns aspectos como a divulgação dos propósitos da entidade para um público mais abrangente e que possibilitou a distribuição de 4 mil folhetos sobre a entidade. Também em relação às aquisições de livros expostos no estande o saldo foi positivo. Leitura em

crise na escola: as alternativas do professor alcançou uma procura que ultrapassou o

100 exemplares. Embora a participação tenha alcançado números positivos havia, entre os membros da diretoria, uma dúvida sobre a eficácia da divulgação da entidade. Independentemente de seu caráter cultural, a Bienal era um evento voltado ao aspecto comercial da atividade editorial; as atividades culturais realizadas visavam muito mais a atrair o público para o evento do que propriamente estabelecer um foro de debates a

210 Leonídio Balbino da Silva participou da fundação da ALB, em 1981, e fez parte do Comitê Provisório

como tesoureiro até abril de 1982.

211

Ata de reunião da diretoria provisória, 31/07/1982.

respeito de tema de relevância em relação ao livro e à leitura. Por essa razão, algumas opiniões dos membros da diretoria provisória questionavam a participação, da entidade julgando não ser a forma de divulgação necessária para a entidade naquele momento. A avaliação da diretoria, embora contasse com um saldo positivo, apontava outra dificuldade enfrentada durante o evento em função da localização do estande da ALB. Localizado no final da exposição, dificultava o interesse e disposição dos visitantes, pois a maioria chegava exaurida no final da exposição. Esse seria um dos aspectos negativos apontados em artigo publicado na Folha de São Paulo do dia 30 de agosto de 1982 cujo objetivo era um balanço das atividades da Bienal. Crítico do artigo da Folha expunha os interesses e uma hegemonia das editoras de grande porte. De acordo com o jornal, até mesmo a organização espacial do evento estava pautada por estratégias comerciais agressivas. Exemplo disso viria dos estandes destinados às grandes editoras ficarem localizados no início do Pavilhão. Isto, claro facilitava a visita do público, enquanto as editoras de menor projeção no mercado ocupavam estandes mais distantes, cujo acesso dos visitantes era sempre dificultado

(...) mas enquanto os expositores instalados no início do circuito anunciavam bons resultados comerciais, os que ficaram da metade para o fim mostravam desânimo: "já vi gente passar por aqui até com sapato na mão, de tanto cansaço. A turma fica desesperada com a extensão da feira (...) quanto a nós ficamos com um movimento que mal dá para pagar as despesas".

A disposição do pessoal da Moderna (Editora) – estande 3 – e da Ática – estande 30 – era diferente. Na primeira, Maria Cecilia Campos se dizia até surpresa com tanto sucesso, especialmente na linha infantil e juvenil. Na segunda, Vera Helena reconheceu que o movimento dobrou (FOLHA DE SÃO PAULO, 1982, p.21).

5. O 1º Seminário Regional de Leitura e Redação de Passo Fundo, o