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BR AN RIO, 84 397.M2246 GAL A.

No documento Download/Open (páginas 153-156)

consistem em feito, mas ainda das que estão em rigor de Direito, e guardarão os actos judiciaes, como são obrigados de os guardar os Juizes ordinários e delegados. E os arbitradores conhecerão sómene das cousas, que cosistem em feito; e quando perante elles for allegada alguma cousa, em que caiba duvida de Direito, remettel-a-hão aos Juizes da terra, que a despachem e determinem, como acharem per Direito; e dahi em diante, havida sua determinação, procederão em seu arbitramento, segundo lhes bem parecer, guardando sempre o costume geral da terra, que ao tempo de seu arbitramento for costumado. (ALMEIDA, 2012: 580).

Observou-se que nas alegações do curador, além de utilizar-se das leis especiais que já regulavam os escravos, buscou também de forma subsidiária nas Ordenações Filipinas um dispositivo legal para alicerçar seus argumentos, qual seja, de que o laudo precisava ser reformado. Ao final, requereu que fosse realizado um novo arbitramento, tornando nulo o já realizado; ou que fosse o valor reduzido pelos 400$000 réis já depositados pelo escravo quando do ajuizamento da ação.

Ao afirmarmos que a aplicação das Ordenações Filipinas se dava de forma subsidiária foi porque, dos 35 processos analisados, pode-se verificar apenas a menção de 08 dos seus dispositivos, conforme tabela abaixo:

Tabela 12

Ordenações Filipinas Quantidade de vezes

Terceiro Livro, Título XVII, n.2 02

Quarto Livro, Título XLII 02

Terceiro Livro, Título XVII, n.1 01

Quarto Livro, Título XI, n.4 01

Terceiro Livro, Título LXXVI e LXXVIX, n.5

01

Terceiro Livro, Título I, n.3 01

Diante dos dados da tabela 12 pode-se afirmar, ainda, que a partir de 1871, as Ordenações Filipinas não eram utilizadas como fundamento jurídico principal das demandas de liberdade, pois eram mencionadas como dispositivo legal a ser aplicado quando a interpretação da lei não lhes fosse favorável ou era omissa quanto ao caso em litígio.

O processo seguiu o tramite legal regular, ou seja, o de dar vistas ao procurador da Coroa, que assim dispôs:

Parece realmente excessivo o laudo de fl. 65 dando a um escravo de avançada idade o valor de 900$000 réis como bem pondera o Curador à lide desta Instância. Rio 09 de agosto de 1882.O Procurador da Coroa Conselheiro J. B. Gonçalves Campos (BR. AN RIO,84.397 M2246, p.16).

E assim foi decidido no Tribunal da Relação:

Accórdão em Relação e que annullão o processo desde fl.61, e mandão que se proceda de novo ao arbitramento do valor do preto Affonso com outros arbitradores, uma vez que já se manifestarão a respeito os que foram escolhidos pelas partes e desta sorte estão impedidos. O arbitramento de fl. 65 não está nas condições legais por isso que não consta dos respectivos termos que fosse feito em Juízo e achando-se prezente o arbitrando. Rio, 14 de novembro de 1882. Desembargador Tavares Bastos. Desembargador Pindahiba de Mattos. Desembargador Villaboim. (BR. AN RIO,84.397 M2246 p.18).

Não sabemos e nem saberemos qual foi o novo valor encontrado na nova avaliação do escravo Afonso, porém nos chamou atenção que os julgadores na segunda instância estavam atentos aos procedimentos ocorridos durante a instrução do processo desde a primeira instância, como visto neste caso, em que se observou que o escravo sequer estava presente durante a sua avaliação pelos árbitros, fato este que sequer foi mencionado pelo curador na segunda instância.

Outro aspecto foi com relação ao curador ter se valido não só dos dispositivos legais que regulavam a matéria, como ter se socorrido das Ordenações Filipinas em dispositivo que determinava que, em caso de dúvidas na avaliação, fosse utilizado o “juízo do bom varão”, prova de que, ainda que fosse uma legislação subsidiária para o Império brasileiro, era ferramenta manuseada pelos profissionais do direito.

Por fim, a análise nos trouxe um ponto polêmico da época, ou seja: poderia ou não o Tribunal da Relação alterar o valor da avaliação procedida pelos árbitros na primeira instância? A resposta a esta questão suscitou algumas discussões naquele período e nos faz entender o por que não já não ter sido decidido o destino do escravo Afonso quando do julgamento do recurso.

Disse Fernando42, escravo de Manoel Monteiro de Avillez Carvalho que, tendo juntado pecúlio no valor de 350$000 réis, ajuizou uma ação por depósito em 21/08/1883, pois pretendia obter sua plena liberdade segundo o disposto pela Lei de 28 de setembro de 1871. O senhor, em sua defesa, alegou que foi outorgado uma carta de liberdade em 30/03/1883, ou seja, quase cinco meses antes do mesmo ter ajuizado a querela por depósito.

No entanto, a carta de liberdade outorgava a liberdade sob condição. Isto é, o senhor de Fernando outorgava a liberdade a ele e a vários outros escravos, desde que continuassem a cumprir os serviços que prestavam durante os próximos cinco anos.

Não nos deteremos às alforrias dadas sob condição neste tópico, o que será abordado posteriormente, mas sim à questão do arbitramento.

Com isso determinou-se que fosse o escravo avaliado, uma vez que o valor depositado referia-se ao valor dos serviços pelo prazo estipulado na condição quando da outorga da liberdade, o que não foi aceito pelo senhor de Fernando.

Há uma nuance nesse caso: o que pretendia Fernando era indenizar o seu senhor do período que ainda faltava para cumprir a condição determinada na carta de liberdade e não sua liberdade, que já havia sido obtida, restava apenas cumprir a condição.

Feito o arbitramento, foram os serviços avaliados em 350$000 réis, porém o árbitro nomeado pelo senhor avaliou os mesmos em 800$000 réis, mais uma vez estava- se diante da questão do preço. Nesse contexto, foram os autos remetidos ao juízo prolator da sentença, que homologou os serviços pelo valor ofertado pelo escravo, o que certamente deflagraria uma apelação ao Tribunal da Relação, como de fato ocorreu.

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