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2.1 A LGUMAS ANÁLISES SINTÁTICAS PARA EXPRESSÕES DE GRAU

2.1.1 Bresnan (1973)

Bresnan (1973) analisa a sintaxe das construções comparativas incluindo as comparativas formadas com expressões de grau do Inglês. Em sua análise, a autora dividide-as em três grupos, conforme expomos a seguir:

i) expressões como as ‘como’, too ‘demais’, that ‘tão’, so ‘tão’, e o morfema comparativo de superioridade –er são caracterizadas como determinantes;

ii) expressões como little ‘pouco (nomes incontáveis)’, few ‘pouco (nomes contáveis)’, much ‘muito (nomes incontáveis)’, many ‘muito (nomes contáveis)’ são quantificadores;

iii) expressões comparativas de quantidade como less ‘menos’ e more ‘mais’ são classificadas como uma fusão morfológica entre o morfema comparativo –er e um quantificador, sendo less resultado de –er + little e more, resultado de –er + much/many.

Os dois primeiros grupos ocupam uma posição sintática diferente cada. O terceiro grupo seria uma fusão morfológica do primeiro com o segundo. A autora propõe que toda construção comparativa tem um sintagma quantificacional subjacente, que ocupa a posição de especificador de AP. Por sua vez, esse sintagma quantificacional possui uma expressão de grau como seu especificador, originando uma estrutura similar a (2.3):

(2.3)

Essa estrutura corresponde ao que Corver (1997) chama de sistema de grau indireto, uma vez que há um sintagma quantificacional que intermedeia a relação entre o sintagma adjetival e o sintagma de grau.

AP ei QP A’ ru 4 DegP Q’ adjetivo g g Deg’ Q | | Deg much | little as many how enough too few that so -er (McNabb, 2012, p. 13)

Capítulo 2 –

Como vimos, para Bresnan (1973), um quantificador ou um partitivo está subjacente em todas as construções comparativas. Assim, as estruturas abaixo seriam equivalentes:

(2.4) a. She has more independence.6 ‘Ela tem mais independência.’ A’. [[-er much]] independence b. She is happier.

‘Ela está mais feliz’ b’. [[-er much]] happy

(Bresnan, 1973, p. 276)

No exemplo acima, então, haveria um ‘much’ subjacente à construção comparativa. Apesar disso, a autora mesmo aponta que essa análise em princípio pode parecer estranha, uma vez que nos dados abaixo ‘much’ não pode coocorrer com ‘too’.

(2.5) a. They think she has too much independence. ‘Eles pensa que ela tem independência demais.’ b. *They think she is too much happy.

‘Eles pensam que ela está feliz demais.’

(Bresnan, 1973, p. 276)

Assumindo uma análise transformacional, Bresnan avalia que essa diferença está apenas na estrutura superficial, mas que em algum passo da derivação na estrutura profunda, as sentenças em (2.5a-b) são equivalentes.

Para argumentar em favor da hipótese de que ‘more’ é a uma realização de ‘-er + many/much’ e que ‘less’ é uma realização de ‘-er + little’, apresenta-se o paradigma abaixo:

(2.6) a. as much bread

6 Sendo o Inglês uma língua de estrutura sintática e morfológica bastante conhecida, as glosas conterão apenas uma

tradução aproximada para o Português Brasileiro. Sempre que essa tradução não for suficiente para explicitar os aspectos sintático-morfológicos de uma expressão, a sentença será seguida de uma explicação acerca de sua estrutura.

b. too much bread c. that much bread d. so much bread

e. –er much bread [=more]

(Bresnan, 1973, p. 277) (2.7) a. as many people

b. too many people c. that many people d. so many people

e. –er many people [=more]

(Bresnan, 1973, p. 277) (2.8) a. as little bread

b. too little bread c. that little bread d. so little bread

e. –er little bread [=less]

(Bresnan, 1973, p. 277) (2.9) a. as few people

b. too few people c. that few people d. so few people

e. –er few people [=fewer]

(Bresnan, 1973, p. 277)

Assim, assumindo o paradigma de combinações possíveis entre quantificadores e expressões de grau, para justificá-lo seria necessário assumir que ‘more’ e ‘less’ são expressões morfologicamente complexas, pois as expressões ‘muchier bread’, ‘manier people’ e ‘littler bread’ não existem no Inglês. A primeira estrutura proposta para essas expressões é a seguinte:

Capítulo 2 – (2.10) QP wo Det Q { � ℎ� − } { �ℎ � � � � } (Bresnan, 1973, p. 277)

Na estrutura acima, as expressões de grau são geradas como determinantes especificadores de QP, enquanto os quantificadores são núcleos de QP. Note-se que, apesar de a literatura mais recente tratar expressões como ‘too’ como Deg, como se observa em Abney (1983), Kennedy (1997), Corver (1997), Neeleman et al. (2004), McNabb (2012), entre outros, Bresnan utiliza originalmente o rótulo Det, pois trata tais expressões como determinantes de QP’s. No entanto, essa distinção não é relevante aqui.

Propõe-se, então, uma regra para dar conta das mudanças morfológicas de ‘more’, ‘less’ e ‘fewer’, formadas da combinação entre determinante e quantificador, como mostra (2.11)7:

(2.11) a. [-er + much] → more b. [-er + many] → more c. [-er + little] → less d. [-er + few] → fewer

Essa proposta para ‘more’ e ‘less’ explicaria a agramaticalidade das construções em (2.12) pelo fato de que ‘more’ e ‘less’ já seriam resultado da combinação de um determinante e um quantificador:

(2.12) a. *as more b. *too more

c. *that more d. *so more e. *as less f. *too less g. *that less h. *so less

Um outro problema apresentado pela autora para essa proposta é o fato de que ‘more’ pode aparecer na estrutura superficial em sentenças em que ‘much’ não pode, como vemos em (2.13):

(2.13) a. Mary is more / so (*much) intelligent. ‘Mary é mais / tão inteligente.’

b. Mary speaks more / so (*much) congently. ‘Mary fala mais / tão convincentemente.’

(Bresnan, 1973, p. 278)

Nas sentenças acima, ‘so’ modifica um adjetivo (2.13a) e um advérbio (2.13b), ‘much’ não ocorrer. Para resolver essa questão, a autora postula uma regra que diz que toda vez que ‘much’ preceder AP ou AdvP, sistematizada abaixo:

(2.14) Apagamento de ‘much’

Much → ɸ / [... _________A]AP

Onde A(P) = (Sintagma) Adjetival ou Adverbial

Para exemplificar a regra (2.13) de apagamento de ‘much’, temos o exemplo em (2.15):

(2.15) a. *as much tall → as tall ‘tão alto’

Capítulo 2 –

‘Eu bebi tanto leite’ c. I ate as much ↛ *I ate as ‘Eu comi tanto’

Em (2.15), portanto, quando a construção comparativa acompanha um adjetivo, haverá apagamento de ‘much’, como em (2.15a), mas como em (2.15b-c) temos respectivamente um VP e um NP/DP, ‘much’ não é apagado. Dessa maneira, explicam- se os dados em (2.16), em que ‘much’ não ocorre com as expressões de grau:

‘ (2.16) a. as (*much) happy b. how (*much) happy c. that (*much) happy d. too (*much) happy e. so (*much) happy

(McNabb, 2012, p. 13)

Nas construções acima em (2.16), temos, portanto, um quantificador ‘much’ subjacente, que foi apagado pela regra em (2.14). Corver (1997), conforme ressaltam Neeleman et al. (2004), aponta que por essa mesma razão, quando precede ‘so’, ‘much’ deve estar presente, como no dado em (2.17), o que corrobora da ideia de um ‘much’ subjacente:

(2.17) John is very fond of Mary. In fact, he is too *(much) so.

‘John é muito apaixonado por Mary. Na verdade, ele é muito assim.’ (Neeleman et al. 2004, p. 1)

No exemplo acima, ‘much’ não é pronunciado antes de ‘fond’, que é um adjetivo, mas precisa ser pronunciado antes de ‘so’. Isso ocorre porque ‘so’ é uma proforma inespecificada categorialmente, podendo substituir expressões nominais, preposicionais e verbais, como mostram os exemplos abaixo:

(2.18) a. John loves Mary, and Peter does so too. ‘John ama Mary e Peter também’.

b. John is still very much on drugs, but he is less so than when he was a teenager.

‘John ainda está muito em drogas, mas está menos assim do que quando era adolescente.’

c. John is a real gentleman – he has always been so. ‘João é um verdadeiro cavalheiro – ele sempre foi assim.

(Neeleman et al. 2004, p. 1)

Em (2.18), temos, respectivamente, casos de ‘so’ substituindo a expressão verbal ‘loves Mary’, a expressão preposicional ‘on drugs’ e a expressão nominal ‘real gentleman’. Isso mostra que ‘so’ não possui as propriedades categoriais de um AP, mas é inespecificado categorialmente. Em (2.17), como ‘too’ não está precedendo AP, mas um item inespecificado, a inserção de ‘much’ torna-se obrigatória. Isso serve como evidência para supor que há um ‘much’ nulo em ‘too much fond of Mary’, que é deletado pela regra dada em (2.14). Ou seja, ‘much’ deverá ser inserido quando expressões de grau precedem predicados, nomes, expressões preposicionais ou adjetivos, mas será deletado apenas quando preceder um adjetivo.

Decorre também da análise de Bresnan (1973), conforme apontam Corver (1997) e Neeleman et al. (2005) que ‘much’ não pode preceder ‘so’ quando há ocorrência de ‘more’ ou ‘less’, como podemos ver em (2.19):

(2.19) a. The weather was hot in Cairo. Indeed, it was very *(much) so. ‘O tempo estava quente no Cairo. Na verdade, estava muito.’ b. John is very fond of Mary. Maybe he is as *(much) so as Bill.

‘John é muito apaixonado por Maria. Talvez ele seja tão assim quanto Bill.’ c. Of all the careless people, no one is more (*much) so than Bill.

‘De todas as pessoas descuidadas, nenhuma é mais assim que Bill.’ d. The police searched the big room carefully, but the small room less (*much) so.

Capítulo 2 –

‘A polícia vasculhou o quarto grande cuidadosamente, mas o quarto pequeno muito menos assim.’

e. John is good at mathematics. He seems enough (*much) so to enter our graduate program.

‘John é bom em matemática. Ele parece assim o bastante para entrar em nosso programa de pós-graduação.

(Neeleman et al. 2004, p. 1)

É preciso observar que a agramaticalidade dos dados acima em que ‘much’ não ocorre com ‘more’ e ‘less’ se dá porque estes são quantificadores formados da fusão de um morfema comparativo ‘-er’ e de um quantificador, significando que a posição de quantificador já está ocupada. Mas a agramaticalidade de (2.19e), em que ‘much’ precede ‘enough’ precisa supor que existe um morfema de grau nulo que se combina a ‘enough’ para explicar porque ‘much’ não pode aparecer nesta sentença. Mais adiante, veremos que a solução de Corver (1997) capta as mesmas generalizações sem precisar lançar mão de uma operação de fusão morfossintática ou de um morfema nulo de grau.

Resumindo, temos em Bresnan (1973) um importante passo para a teoria que é a diferenciação entre tipos de expressões de grau, que irá se mostrar relevante em análises posteriores, ainda que com alterações. Nesta análise pode-se observar vestígios de uma proposta que posteriormente levará à classificação de expressões de grau em duas categorias diferentes.

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