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Do ponto de vista geográfico, a estrutura política da educação no Brasil caracteriza-se por dois espaços de existência: um no campo e outro na cidade. Ao longo de sua história, os espaços urbanos tiveram prioridade de atendimento quanto à infraestrutura e serviços em relação ao campo. Com o passar do tempo, o campo veio a ser visto como um local atrasado, e, portanto, sem prioridade de financiamento e inovação, ficando distante do universo das políticas públicas e trazendo consigo índices alarmantes de analfabetismo e carência de uma política séria de educação. Diante dessa questão, Chaves (1997) afirma que:

O Estado é, pois, produto das relações sociais, é resultado das correlações de força. As relações de força vão definir, instituir, planejar e programar as políticas públicas. O Estado tem uma base territorial, cultural, histórica popular (cidadãos); logo, tem que promover políticas que atendam às necessidades dessa população. (CHAVES, 1997, p. 31).

Frente às demandas sociais por melhores condições de vida, principalmente no que tange à educação, começam a se originar no campo movimentos sociais que reivindicam políticas públicas para a educação do campo, fora dos moldes até então pensados para o meio rural.

Os sujeitos do campo passaram, recentemente, a reivindicar não mais uma educação para o campo, e sim uma educação do campo e no campo, pautada na transformação dos sujeitos e da sociedade tendo em vista uma maior qualidade de vida; uma educação que desafie e dê condições para os camponeses viverem dignamente em seu chão e que busque romper com as imposições de políticas arcaicas; uma educação que pactue com a dignidade humana de viver melhor e dignamente. Caldart (2004) assevera que:

Trata-se de uma educação dos e não para os sujeitos do campo. Feita sim através de políticas públicas, mas construídas com os próprios sujeitos dos direitos que a exigem. A afirmação deste traço que vem desenhando nossa identidade é especialmente importante se levarmos em conta que, na história do Brasil, toda vez que houve alguma sinalização de política educacional ou de projeto pedagógico específico, isto foi feito para o meio rural e muitas poucas vezes com os sujeitos do campo. Além de não reconhecer o povo do campo como sujeito da política e da pedagogia, sucessivos governos tentaram sujeitá-los a um tipo de educação domesticadora e atrelada a modelos econômicos perversos. (CALDART, 2004, p. 151).

A partir do exposto, pode-se afirmar que o campo não está estagnado, bem pelo contrário: é dinâmico. A luta dos movimentos sociais do campo é um processo ativo, no qual está envolvida a ação dos sujeitos que deles fazem parte. Para entender o radicalismo e o impacto ideológico dos movimentos, basta observar como são colocados em face do imaginário social e político do país. E isto é tão impactante que nos leva a crer, de modo peremptório, na projeção concreta de transformação da realidade, da vida no campo, de maneira positiva que aponta para um novo rumo na educação do país.

E este movimento cada vez mais se fortalece, notemos, as primeiras e formalizadas ações de sistematizações políticas para a educação do campo, tendo em vista a luta organizada de muitas entidades, materializadas nos eventos mais expressivos dessa história, também chamados de marcos históricos. Sobre os acontecimentos mais relevantes para educação do campo, Molina (2006) destaca: I Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária – ENERA,

em 1997, em Brasília; I Conferência Nacional de Educação do Campo – 1998 – Luziânia/ GO, e a II Conferência Nacional “Por Uma Educação Básica do Campo”, em 2004, também na cidade de Luziânia, Estado de Goiás. Em 1998, a criação do PRONERA, como política pública responsável para financiar os cursos em educação do campo.

Outra conquista importante foi a criação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo – 200215,

ação que culminou para a criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade - SECAD e do setor de Coordenação em Educação do Campo junto ao MEC (2004), responsável por promover programas, como foi o caso do “Saberes da Terra” (EJA para agricultores familiares) vinculados ao Ministério de Educação/MEC, Ministério do Desenvolvimento Agrário/MDA, Ministério do Trabalho e Emprego/MTE – 2005.

Também relevantes foram congressos que aconteceram em muitos estados brasileiros, destacamos: I Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo – MEC/MDA/PRONERA - Brasília – (2005); II Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo–Brasília– (2008) e III Encontro Nacional sobre pesquisa em educação do Campo- Brasília-(2010), entre outros. Essas articulações impulsionam o avanço das políticas públicas direcionadas para o campo e a construção de um projeto de educação que possa se comprometer com a transformação da realidade social, política, econômica e humana das populações que vivem no e do campo. (BRASIL, 2004, p.13).

Estas ações partem de uma problemática relacionada à ampliação e inclusão da população do campo na rede pública de ensino, que contemple uma organização curricular e metodológica adequada à realidade do campo. Para isso é necessário a existência de profissionais da educação do campo capazes de contribuir com a formulação dessa organização curricular, isso implica dizer que não basta a apropriação do conhecimento científico, mas também, o estabelecimento do vínculo permanente com os conhecimentos sociais e culturais dos sujeitos envolvidos no processo. (BRASIL, 2012, p.33). Por isso, um Plano de Formação desses Profissionais precisa basear-se numa metodologia

15 A criação dessas Diretrizes assegura direitos aos povos do campo de ter uma

educação, a partir de sua realidade. O fato de não se constituir como um programa apenas, o qual poderia ser revogado, ou extinto, à medida que mudasse o governo, se assim fosse o desejo, o torna marco histórico.

particular16 que já seja indutora e experimentadora das escolas do campo

que se deseja construir / transformar.

No final do ano de 2012, o MEC, via SECAD/SESU/SETEC, lançou o edital PROCAMPO/MEC, cujo objetivo central é consolidar os cursos de Licenciatura em Educação do Campo nos IFE´s17 também.

Essa iniciativa, dentre outras, reforçou o quadro de docentes das instituições e seu compromisso com o campo. (BRASIL, 2012, p.37). É importante destacar que as ações não aconteceram sem dificuldades ou tensões de diversas ordens – tão comuns nos processos de luta pela posse da terra no país.

Por isso a materialização desses cursos são conquistas expressivas do Movimento Por uma Educação do Campo. Todavia, a formação continuada – também chamada de verticalização do ensino para alguns setores – ainda é muito precária, visto que existem poucas especializações, mestrado e doutorados na área. (BRASIL, 2012, p.27).

A educação do campo é cotidianamente um desafio. No momento atual, observa-se uma demanda expressiva pela educação em todos os segmentos, em especial, o acesso ao ensino superior. Os programas governamentais para formação de professores são ilustrativos disso, e, ao mesmo tempo, contribuem para uma tomada de consciência da importância deste nível educacional. Para Rabelo (2008) esse panorama está em sintonia com o desenvolvimento sociocultural e econômico do país, tendo em vista uma exigência de mobilização de novos conhecimentos, saberes, competências, e ideais nas diferentes esferas sociais. Por ser a universidade o lócus por excelência da produção de conhecimento, esta é conclamada a definir novas abordagens resultantes da investigação científica com o propósito de atingir a formação profissional mais adequada para o mundo atual.

Em função disso, surge mais forte ainda o debate sobre educação do Campo, além de problematizar o acesso e permanência no ensino superior de comunidades, camponesa, quilombola, indígenas, ribeirinhos, extrativistas, pescadores, imigrantes, grupos esses que historicamente estiveram excluídos do uso dos bens culturais e materiais do país. (MAHER, 2007).

16 Referimo-nos aos princípios didáticos metodológicos Pedagogia da

Alternância, em seção apropriada falaremos ao leitor com mais precisão.

17 Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia, existentes na maioria

Na tentativa de firmar as especificidades pertinentes a formação do educador do campo, faz-se necessário apresentar a concepção metodológica recorrente nos cursos em educação do campo, desde os de nível fundamental às especializações. No quadro dessas questões, expomos algumas considerações sobre o campo da pedagogia da