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BREVES ANTECEDENTES DA LEI 12.010/2009

CAPITULO II – CIRCULAÇÃO DE CRIANÇAS E PRÁTICAS DE PROTEÇÃO

CAPÍTULO 3 – ADOÇÃO, A LEGISLAÇÃO E A POLÍTICA SOCIAL

3.2 BREVES ANTECEDENTES DA LEI 12.010/2009

Seguindo na contextualização da nossa legislação sobre adoção, apresentamos aqui uma compilação dos pontos considerados mais importantes no desenvolvimento desse instituto até a atualidade – com o advento da Lei 12.010 em 2009 –, sem pretensão de analisar o ordenamento jurídico sob o ponto de vista do Direito nesse aspecto.

Segundo o advogado Picolin (2007), no Brasil a adoção não foi sistematizada no Direito anterior ao Código Civil de 1916, mas este veio a acolhê-la. Embora com pouca especificidade, a lei que versava sobre ela era fundada na ideia de legitimar filhos não gerados biologicamente; estava, assim, centrada apenas no interesse dos adotantes.

Nova lei seria publicada no governo de Juscelino Kubitschek, em 1957, com somente três artigos. Um pouco mais flexível que a anterior, permitia a adoção por pessoas maiores de 30 anos de idade (e casadas há mais de cinco anos), diferentemente do Código de 1916, que restringia a adoção apenas para pessoas maiores de 50 anos. Todavia, ainda era possível a dissolução da adoção e a deserdação. O filho (adotivo) deixava de ser ―filho‖, passando a ser um mero ―agregado‖ na família. O Estado não atribuía ao adotado os mesmos direitos da filiação biológica, legitimando valores vigentes da época como o preconceito em relação à filiação adotiva, incluindo-se aí barreira ao direito de herança aos filhos sem laços consanguíneos com os pais.

Oito anos depois, o então Presidente Castello Branco sancionou a Lei 4.655, que dispunha ―sobre a legitimidade adotiva‖, um pouco mais detalhada e específica. Já com doze artigos, previa, entre outras coisas, que os casais poderiam adotar antes de completar cinco anos de matrimônio, desde que comprovada a esterilidade de um deles e a existência de estabilidade conjugal. Apenas um dos cônjuges precisava ser maior de 30 anos. Havia exigências documentais como Certidão de Casamento, atestado de residência, folha de antecedentes, prova de idoneidade moral e financeira, entre outras.

Para o Desembargador Luiz Carlos de Barros Figueiredo30, os primórdios da adoção tiveram caráter privatista, ―com pouca ou nenhuma intervenção estatal [...]‖, e o passar do tempo levou a uma movimentação mundial de ―transmudação do Instituto da adoção do campo do Direito Privado para o Direito Público‖ (FIGUEIREDO, 2010, p.149). O autor considera que as mudanças paradigmáticas com relação à infância e à adoção, observadas em diversos países, impactaram também o Brasil. Do ponto de vista legal, a Constituição Federal de 1988 incorporou dois princípios básicos e fundamentais: o princípio da prioridade absoluta às crianças e adolescentes31 e o fim da discriminação entre adoção simples e plena32.

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Também foi membro participante da Comissão Nacional Pró-Convivência Familiar e Comunitária e das discussões no Congresso Nacional para aprovação da Lei 12.010/2009. (FIGUEIREDO, 2010) 31Segundo artigo 227 da CF de 1988: ―É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.‖

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A adoção simples não estabelece relação de filiação definitiva. Já na adoção plena, o adotado passa a ser irrevogavelmente, para todos os fins, filho legítimo.

Na esteira da nova Constituição, em julho de 1990, foi aprovada a Lei Federal 8.069/90 (o ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente), trazendo importantes avanços para a sociedade brasileira. Já a Lei 12.010, aprovada em 2009, após seis anos de tramitação no Congresso Nacional, alterou o ECA, trazendo valiosos progressos e alguns pontos polêmicos.

Embora conhecida como ―Nova Lei de Adoção‖, a Lei 12.010 também trata de questões referentes à convivência familiar e comunitária. Concordamos com Figueiredo (2010, p.17) quando afirma que ―o ECA ficou desarmônico, com o tratamento exaustivo de uma das facetas, a adoção, em detrimento de outros temas – execução de medidas socioeducativas, por exemplo, que não são contemplados com tal grau de detalhamento‖.

No Livro ―Comentários à nova Lei de Adoção‖, de Figueiredo (2010), há menção de que o projeto de lei que a produziu foi de autoria do Deputado Federal João Matos, pai adotivo. No texto de apresentação do livro, o parlamentar sublinha a participação de deputados e senadores que são pais adotivos, tendo grande influência para a sanção da lei:

É notória a minha afeição à causa da adoção, mercê de ter tido a ventura de ser pai adotivo. Por isso sempre tive fortes vínculos com os grupos de adoção... Dentro desta ótica, sempre fui extremamente preocupado com o fato de haver tantas crianças nas instituições, tantas pessoas querendo adotar e essas filas paralelas nunca se encontrarem. Tentando descobrir as causas e as soluções, criei a Frente Parlamentar da Adoção, com a participação de diversos deputados e

senadores, que são pais adotivos ou simpatizantes da causa.

Tal atitude pode ser caracterizada como uma prática de lobby, processo acerca do qual paira certa dubiedade de interpretação. Segundo Graziano (1997), no aspecto político, tal prática não é corrupção, é um jogo institucionalizado. ―O lobby é a representação política de interesses em nome e em benefício de clientes identificáveis por intermédio de uma panóplia de esquemas que, em princípio, excluem a troca desonesta de favores.‖ O autor cita, por exemplo, que:

[...] alguns dispositivos da Constituição americana podem ser interpretados como oferecendo respaldo à prática do lobby, visto que essa atividade vem sendo cada vez mais entendida como o exercício de liberdades previstas na Primeira Emenda

(1791) — liberdade de expressão, de reunião, e o "direito de petição de desagravo".

No entanto, adiante, ele pondera que a representatividade de grupos de lobby não tem o mesmo grau de legitimidade da representação eleita, e conclui: ―Além disso, por sua própria natureza, o jogo do lobby exclui ou pune severamente muitos interesses sociais.‖

No tocante ao efeito da pressão exercida por parlamentares afetos e participantes de grupos de apoio à adoção da Lei 12.010 de 2009, por exemplo, indagamos: como os interesses das famílias pobres que consentem a adoção do filho (ou são destituídas do poder familiar) foram representados na legislação em questão?