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3. SER OU NÃO SER? O QUE PARECE SER NOTÍCIA

3.4 As Câmaras de Eco

No começo da década de 1990, onde as pesquisas e o avanço da internet começam a ser notados em todo mundo, começam a surgir previsões, em revistas, do que este novo mecanismo seria capaz de fazer.

“Os futuristas e tecno-otimistas da Califórnia que escreviam aquelas páginas estavam inteiramente convictos de que uma revolução inevitável e irresistível chegaria a qualquer momento, uma revolução que nivelaria a sociedade, desbancaria as elites e traria uma espécie de utopia global libertadora” (PARISER, 2012, p. 9).

Porém a previsão dessas páginas, como podemos ver hoje, esbarra em problemas que dificultam a internet ser uma utopia global libertadora. Com isso, Sunstein (2001) afirma que é fácil encontrarmos pessoas que compartilham da nossa visão, o que faz nós auto afirmarmos dentro de uma determinada situação, especialmente na política, foco dos estudos do pesquisador. Fazendo um contraponto com aqueles veículos que consideram

o receptor passivo de uma informação, o autor faz a comparação de que com a internet seria possível encontrar indivíduos com a mesma opinião, onde promoveria a liberdade. Enquanto muitas pessoas buscam a internet com o intuito de expandir horizontes, muitas pessoas utilizam para se manterem cercadas de seus interesses e próprios preconceitos, fazendo reafirmar as suas visões de mundo, excluindo aqueles que pensam de forma diferente. Segundo Sunstein, esse sistema pode ser “um sistema de “condomínios fechados” é tão prejudicial para o ciberespaço quanto para o mundo real” (SUNSTEIN, 2001, p. 2)26. Ainda conforme o autor, a internet pode ser um lugar benéfico para

encontrar informações em forma de tópicos especializados ou pontos de vistas em comum com aquilo que acreditamos, reafirmando pensamento já existentes.

Desta forma, é preciso compreender que as máquinas e os algoritmos são peças importantes para compreendermos como recebemos mais informação daquilo que temos mais afinidade ou o que mais queremos saber/ver. Os algoritmos podem contribuir para restringir algum conteúdo, isolando alguns indivíduos de algum conteúdo que possa vir a desafiar a sua crença, eles fazem com que as recomendações personalizadas sejam feitas com base em cliques, marcações e compartilhamentos feitos anteriormente. Os algoritmos podem fazer com que o indivíduo receba um conjunto mais fragmentado de fontes de notícias, ou seja, pode fazer com que afaste desses indivíduos os veículos tradicionais de notícias, levando-os para fontes relacionadas as suas preferências (NEUCHUSTHAI; LEWIS, 2018, p. 300).

Nesse contexto, pensando na polarização de grupo em que estamos expostos, na visão dos chamados veículos de comunicação de massa, “se os programas de rádio ou televisão mostrarem pontos de vista "pró" e "contra", expressos por pessoas que não confiam uns nos outros e atacam os motivos uns dos outros, a polarização política será intensificada, pois os espectadores tendem a se identificar com um lado e a caricaturar a visão oposta”27 (SUNSTEIN, 2001). Isso mostra que esses programas podem confirmar

uma opinião sobre um determinado assunto ou mesmo caricaturar uma opinião oposta, mantendo uma polarização, sendo esse um perigo para o futuro da democracia e não permitem a discussão, sendo que na internet o ambiente se torna mais ativo. Neste trabalho, podemos definir a polarização de grupo como aquela que “se refere ao fato de

26 Tradução do autor para: a system of “gated communities” is as unhealthy for cyberspace as it is for the real world

27 Tradução do autor para: if radio or television programs show “pro” and “con” views expressed by people who distrust one another and attack each other’s motives, political polarization will be intensified, as viewers tend to identify with one side and caricature the opposing view

que, quando pessoas de ideias afins se juntam, muitas vezes acabam pensando em uma visão mais radical do que pensavam antes de conversar umas com as outras” (SUNSTEIN, 2010, p. 11).

A internet tornou a comunicação, de modo geral, melhor. Um espaço onde todos podem serem emissores e receptores: todos podem construir, dizer, escrever, falar e serem ouvidos, vistos e lidos (RECUERO, 2000, online), ao menos essa definição que se tinha quando a internet estava se desenvolvendo. Com o tempo, percebemos problemas nesta definição. Dentre esses problemas, podemos citar a possível formação de grupos homogêneos, que somente ampliam uma visão já existente nestes grupos, criam-se diários individuais que podem ser de interesses e de preconceitos. A formação de grupos homogêneos traz consigo alguns problemas, como a versão mais extrema de um fato. Sunstein (2018), cita como exemplo o Daily Me, onde um pacote de assuntos de interesse seria feito pelo próprio usuário, contornando os veículos de comunicação tradicionais. Com uma opinião formado sobre um determinado tema, pessoas que participam de determinado grupo, tendem a reforçar sua opinião e, com isso, os grupos se direcionam mais ao extremo do que ao centro de uma discussão. Esse fechamento em grupos é prejudicial tanto dentro da internet como na vida real dessas pessoas. Expostos a mesma opinião que já temos de determinado assunto, torna-se impossível imaginarmos que floresça uma “república” (SUNSTEIN, 2001, p. 2) sem uma diversidade de informações. Tudo isso colabora para sustentar uma polarização em nossa sociedade. Para Sunstein (2001) existem duas explicações para a polarização de grupos, que envolvem dois diferentes mecanismos. O primeiro é baseado em argumentos persuasivos, onde os indivíduos respondem aos argumentos de outros, com alguma disposição inicial em grupos, onde será mais inclinado a essa opinião. O segundo é relacionado com a influência social, onde uma pessoa que tem uma opinião radical sobre um tema, confrontado com pessoas que tem o mesmo pensamento, pode-se se tornar mais radical sobre o assunto. Neste segundo mecanismo, para manter o autoconceito e a reputação perante a um grupo, pode-se mover de sua posição declarada. A visão de que estamos expostas a opiniões que confirmam o que pensamos é chamada de câmara de eco (SUNSTEIN, 2001).

As câmaras de eco podem ser traduzidas nos espaços que conhecemos dos blogs, que podem exercer um poder de polarizar qualquer tipo de questão. Podemos dizer que os blogs seriam a exemplificação do conceito de Sunstein. Mas não somente os espaços oferecidos por uma informação postada em um blog, o espaço para a interação, por vezes,

reúne pessoas com o mesmo pensamento (GILBERT, BERGSTROM, KARAHALIOS, 2009). O público nesses espaços não divergem em seu pensamento principal, podemos também associar esses espaços de interação com os espaços que temos para o comentário nas mídias sociais, visto que é possível, e popular, compartilhar links de notícias nesses espaços para a circulação de uma informação.

Segundo o conceito de Sunstein (2018), os próprios seres humanos se mostram com tendência a “homophily”, ou seja, com uma forte tendência a para se conectar a pessoas que são iguais a elas mesmas., podendo assim serem “rebanhos” (SUNSTEIN, 2018, p. 2). É nesse ambiente de saber mais do que já se tem convicção, segundo o autor, que muitas das supostas notícias são falsas. E os algoritmos corroboram para cada vez mais pessoas ficarem sem exposição de uma opinião contrária. Sites como o Google e mídias sociais, como o Facebook, são responsáveis pela curadoria de conteúdo que passa pelas pessoas durante o dia e aprendem o que vamos querer saber ou gostar. Assim, podemos perceber que as câmaras de eco podem ser formadas pelo interesse das pessoas em buscar mais sobre um tema, mas esse interesse, captado por algoritmos, faz um usuário receber determinadas informações que não deseja, mas que também está de acordo com o que pensa, agora não baseado em sua busca, mas entregue pelos algoritmos. Ao buscar saber mais e querer se relacionar com aquilo que pensa, estando dentro de uma câmara de eco a possibilidade de acreditar em algo não verdadeiro é bastante grande. Uma notícia com um só lado, aquele que agrada ao indivíduo, pode ser replicado inúmeras vezes para que o discurso vigente seja aquele no qual este indivíduo tenha maior afinidade, seja ele falso ou polarizado. Porém o conceito de câmara de eco não anula outros, como o dos filtros-bolha, que veremos a seguir. Assim, o conceito das câmaras de eco está ligado as noções de polarização a qual podemos estar expostos. E conviver em grupos, neste caso polarizados, pode fazer com que as pessoas se importem com o que os outros falam ou agem, confiando nas opiniões emitidas por terceiros. Por muitas vezes pessoas com uma opinião não definida de determinado assunto, passam a acreditar no que outras pessoas influentes acreditam.