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Apresentaremos agora osc´odigos estabilizadores, desenvolvido por Gottesman em 1996 [16], o qual unificou em uma ´unica classe todos os c´odigos que iremos trabalhar. A constru¸c˜ao dos c´odigos estabilizadores est´a baseada na teoria de grupos, e por isso, antes de definirmos esses c´odigos quˆanticos apresentaremos alguns conceitos e propriedades de grande importˆancia para a sua compreens˜ao. Para maiores informa¸c˜oes dos conceitos de teoria de grupos recomenda-mos ao leitor [4], [12] e para maiores informa¸c˜oes sobre c´odigos estabilizadores recomendamos [9], [17], [24].

Defini¸c˜ao 2.15. Considere os operadores de Pauli em um ´unico qubit {I, X, Y, Z}. Defini-mos o grupo de PauliGn como sendo o grupo formado pelos elementos da forma ikP1⊗P2

· · · ⊗Pn, onde Pi ∈ {I, X, Y, Z} e k ∈ {0,1,2,3}.

Exemplo 2.16. O grupo de PauliG1 ´e formado pelos elementosikP1, ondeP1 ∈ {I, X, Y, Z}

e k ∈ {0,1,2,3}, ou seja, G1 ={±I,±iI,±X,±iX,±Y,±iY,±Z,±iZ}.

Como j´a vimos na se¸c˜ao 1.4, duas matrizes de Pauli comutam ou anticomutam. Por esse motivo, dados dois elementos M, N ∈ Gn temos que [M, N] = 0 ou {M, N} = 0. Pelo fato das matrizes de Pauli serem Hermitianas e unit´arias, temos que os elementos do grupo de Pauli s˜ao unit´arios, ou seja,M M=I e o quadrado de qualquer elemento do grupo de Pauli

´e igual a ±I, ou seja, M2 =±I ∀M ∈Gn.

Definiremos agora o que ´e um operador estabilizador e grupo estabilizador.

Defini¸c˜ao 2.17. Sejam |ψi um estado qualquer e M um operador qualquer que age em

|ψi. Dizemos que |ψi ´e estabilizado pelo operador M se M|ψi = |ψi. Chamamos M de estabilizador.

Exemplo 2.18. Seja |ψi= |00i+|11i2 um estado de dois qubits. Note que X1X2|ψi=X1X2

|00i+|11i

√2

= |11i+|00i

√2 = |00i+|11i

√2 =|ψi e

Z1Z2|ψi=Z1Z2

|00i+|11i

√2

= |00i −(−|11i)

√2 = |00i+|11i

√2 =|ψi.

Assim, |ψi ´e estabilizado pelos operadores X1X2 e Z1Z2.

Defini¸c˜ao 2.19. Sejam S um subgrupo de Gn e VS o conjunto de todos os estados de n qubits que s˜ao estabilizados por todos os elementos de S. Chamamos VS de espa¸co vetorial estabilizado por S e chamamos S de estabilizador (ou grupo estabilizador) do espa¸co VS se todo elemento de VS ´e estabilizado pelos elementos de S.

Exemplo 2.20. Seja S = {I, Z1Z2, Z2Z3, Z1Z3} um subgrupo de G3. Como (Z1Z2)2 = I e (Z1Z2) (Z2Z3) =Z1Z3, temos que, S =hZ1Z2, Z2Z3i, ou seja, S ´e gerado por Z1Z2 e Z2Z3. Assim, para determinarmos VS, basta determinarmos os estados que s˜ao estabilizados pelos geradores deS. Veja que Z1Z2 estabiliza o subespa¸co gerado por|000i, |001i, |110i e |111i, e Z2Z3 estabiliza o subespa¸co gerado por |000i, |100i, |011i e |111i. Sem grandes dificuldades podemos ver que VS =h|000i,|111ii.

Podemos obter algumas vantagens utilizando os estabilizadores, como por exemplo:

(i) Descrever alguns estados quˆanticos de uma forma mais f´acil utilizando os operadores que os estabilizam;

(ii) Descrever muitos c´odigos quˆanticos de maneira mais compacta utilizando apenas os estabilizadores;

(iii) Descrever de maneira mais f´acil os erros nos qubits e algumas opera¸c˜oes, como por exemplo, a porta de Hadamard e at´e mesmo as medi¸c˜oes na base computacional.

Exemplo 2.21. Considere os 6 operadores a seguir:

Elemento Operador g1 IIIXXXX g2 IXXIIXX g3 XIXIXIX g4 IIIZZZZ g5 IZZIIZZ g6 ZIZIZIZ

O subgrupo S = hg1, g2, . . . , g6i ´e o estabilizador para o c´odigo de Steane, ou seja, S estabiliza VS =h|0Li,|1Lii (exemplo 2.14). Observe que, descrever o c´odigo de Steane por S

´e muito mais simples do que descrevˆe-lo utilizando os estados l´ogicos |0Li e |1Li.

Observa¸c˜ao 2.22. Se −I ∈ S, ent˜ao dado um estado qualquer |ψi, temos que −I|ψi =

|ψi ⇔ |ψi= 0. Logo, VS ser´a o espa¸co vetorial nulo. Portanto, para qualquer grupo estabi-lizador S, exigimos que −I 6∈S, o que implica que ±iI 6∈S.

Proposi¸c˜ao 2.23. Seja S o estabilizador do espa¸co VS. Se VS ´e n˜ao trivial, ent˜ao:

(i) Os elementos de S comutam;

(ii) −I n˜ao ´e um elemento de S.

Demonstra¸c˜ao. (i) Seja |ψium estado n˜ao nulo de VS e sejamM eN elementos deS. Logo, M e N estabilizam |ψi. Suponha que M e N anticomutam, ou seja, M N = −N M. Desse modo, −|ψi = −N M|ψi = M N|ψi =|ψi. Assim, |ψi ´e o vetor nulo, o que ´e um absurdo.

Portanto, M eN comutam.

(ii) ´E imediato pela observa¸c˜ao 2.22.

Queremos que os geradores g1, . . . , gl sejam independentes, ou seja, se tirarmos qualquer um dos geradoresgi, o grupo gerado se tornar´a menor.

Utilizando o conceito de matriz de verifica¸c˜ao que definiremos a seguir, temos um resultado que nos garante quando os geradores ser˜ao independentes.

Defini¸c˜ao 2.24. Seja S =hg1, . . . , gli um subgrupo de Gn. Considere uma matriz de ordem l×2n, onde cada linha corresponde a um dos geradores de S. Essa correspondˆencia ´e dada da seguinte forma: as primeirasn entradas de cada linha ter˜ao 1 na posi¸c˜ao onde temos um operadorX no gerador e as n ´ultimas entradas de cada linha ter˜ao 1na posi¸c˜ao onde temos um operador Z no gerador. Se tivermos um 1 nas n primeiras e nas n ´ultimas entradas, na mesma posi¸c˜ao, ent˜ao quer dizer que temos um operador Y no gerador. Essa matriz ´e chamada de matriz de verifica¸c˜ao.

Exemplo 2.25. A matriz de verifica¸c˜ao para o c´odigo de Steane tem a seguinte forma:

 independentes se, e somente se, as linhas da matriz de verifica¸c˜ao correspondente s˜ao L.I.

Proposi¸c˜ao 2.27. Seja S =hg1, . . . , gn−ki gerado por n−k geradores independentes e que comutam entre si tal que −I 6∈S. Ent˜ao VS ´e um espa¸co vetorial de dimens˜ao 2k.

A demonstra¸c˜ao de ambas proposi¸c˜oes pode ser vistas em [24].

Definiremos agora o c´odigo estabilizador.

Defini¸c˜ao 2.28. Um c´odigo estabilizador [n, k] ´e definido como sendo o espa¸co vetorial VS estabilizado por um subgrupo S de Gn tal que−I 6∈S e S tem n−k geradores independentes e que comutam, ou seja,S =hg1, . . . , gn−ki ´e abeliano. Denotamos esse c´odigo por C(S).

Agora falaremos dos tipos de erros que podem ser detectados usando um c´odigo C(S) e quando podemos executar a recupera¸c˜ao.

Sejam C(S) um c´odigo estabilizador e E ∈Gn um erro agindo em C(S).

SeE ∈S, ent˜aoE n˜ao ir´a corromper C(S) e assim n˜ao precisamos nos preocupar.

Se E anticomuta com algum elemento do estabilizador, ent˜ao E leva C(S) para um subespa¸co ortogonal. Desse modo, atrav´es de uma medi¸c˜ao projetiva apropriada, podemos detectar o erro e possivelmente corrigi-lo.

Os erros perigosos s˜ao quando E comuta com todos os elementos de S, mas E 6∈S.

Defini¸c˜ao 2.29. O conjunto formado por todos os elementos E ∈ Gn tal que Eg = gE

∀g ∈S, ´e chamado de centralizador deS emGne denotado porZ(G). E, o conjunto formado por todos os elementosE ∈Gn tal que EgE ∈S ∀g ∈S, ´e chamado de normalizador de S e denotado porN(S).

Observa¸c˜ao 2.30. Se −I 6∈S, onde S ´e subgrupo de Gn, ent˜ao N(S) = Z(S).

O teorema a seguir nos diz as condi¸c˜oes de corre¸c˜ao de erros para os c´odigos estabiliza-dores.

Teorema 2.31. (Condi¸c˜oes de corre¸c˜ao de erros para c´odigos estabilizadores):

Seja S o estabilizador para um c´odigo estabilizador C(S). Suponha que {Ej} ´e um conjunto de operadores em Gn tal que EjEk6∈N(S)\S para todo j e k. Ent˜ao {Ej} ´e um conjunto corrig´ıvel de erros para o c´odigo C(S).

A corre¸c˜ao de erros ´e realizada da seguinte forma:

SejaS =hg1, . . . , gn−kio estabilizador de um c´odigo estabilizador C(S) [n, k] e seja{Ej} um conjunto de erros corrig´ıveis deC(S). Para detectarmos o erro que ocorreu, realizamos a medi¸c˜ao dos geradores g1, . . . , gn−k, obtendo a s´ındrome do erro β1 at´e βn−k, que s˜ao os resultados das medi¸c˜oes.

Suponha que ocorreu o erroEj. Ent˜ao a s´ındrome de erro ´e dadaβltal queEjglEjlgl. Se Ej for o ´unico erro com a s´ındrome βl, ent˜ao basta aplicarmos Ej

que recuperamos o estado do erro. SeEj eEj0 s˜ao erros distintos e possuem a mesma s´ındrome βl, recuperamos o estado do erro aplicando Ej

ap´os o erro Ej0 ter ocorrido, pois considerando P o projetor sobre o espa¸co c´odigo, temos queEjP Ej=Ej0P Ej0, logoEjEj0P Ej0Ej =EjEjP EjEj = IP I =P, onde Ej

Ej0 ∈S.

Por fim, a distˆancia de um c´odigo quˆantico ´e definida de maneira semelhante ao caso cl´assico.

Defini¸c˜ao 2.32. Seja E ∈Gn. Chamamos o n´umero de termos no produto tensorial que s˜ao diferentes da identidade de peso do operador E.

Defini¸c˜ao 2.33. O peso m´ınimo de um elemento de N(S)\S ´e chamado de distˆancia do c´odigo estabilizador C(S) e denotado por d. Logo C(S) ´e um c´odigo estabilizador [n, k, d].

Observa¸c˜ao 2.34. Como no caso cl´assico, um c´odigo quˆantico com distˆancia de pelo menos 2t+ 1 pode corrigir erros arbitr´arios em quaisquer t qubits.

C´ odigos Quˆ anticos Topol´ ogicos

Segundo [23], os c´odigos quˆanticos topol´ogicos surgiram a partir do c´odigo t´orico de Kitaev, desenvolvido por Alexei Yu Kitaev em 1997 [21]. Como veremos, esse c´odigo ´e um exemplo dos c´odigos de superf´ıcies. Os c´odigos quˆanticos topol´ogicos s˜ao considerados c´odigos locais, isto ´e, todos os geradores estabilizadores agem apenas em um pequeno n´umero de qubits pr´oximos. Os qubits dos c´odigos que trabalharemos s˜ao colocados em alguma tessela¸c˜ao bidimensional, as quais s˜ao fixadas em alguma superf´ıcie fechada orient´avel e conectada, como por exemplo, a esfera e o g-toro, onde g ´e o gˆenero da superf´ıcie. Como poderemos perceber, a topologia dessas superf´ıcies ´e de grande importˆancia.

Este cap´ıtulo est´a dividido da seguinte maneira. Na Se¸c˜ao 3.1, falaremos brevemente sobre alguns conceitos de homologia e do primeiro grupo de homologia. Em seguida, na Se¸c˜ao 3.2, faremos a constru¸c˜ao dos c´odigos de superf´ıcie, no qual iremos apresentar o c´odigo t´orico de Kitaev como um exemplo de c´odigo de superf´ıcie. Por fim, na Se¸c˜ao 3.3, apresentaremos os c´odigos quˆanticos coloridos.

3.1 Homologia

Nesta se¸c˜ao definiremos o primeiro grupo de homologia de uma superf´ıcie, onde seus ele-mentos formar˜ao uma base para os estados codificados. Assim como a caracter´ıstica de Euler, esse grupo tamb´em ´e um invariante topol´ogico. Para mais detalhes sobre homologia recomendamos ao leitor [7], [14], [19].

Defini¸c˜ao 3.1. Considere uma tessela¸c˜ao qualquer em uma superf´ıcie M. Chamamos os v´ertices de 0-cells, as arestas de 1-cells e as faces de 2-cells.

Defini¸c˜ao 3.2. Considere uma tessela¸c˜ao qualquer em uma superf´ıcieM eAi o conjunto de qualquer de arestas. A soma formal

c=X

Podemos somar as i-cadeias formando novas i-cadeias, onde a soma ´e feita m´odulo 2.

Usando essa opera¸c˜ao de soma, formamos um grupo abeliano aditivo Ci, para i = 0,1,2, onde o elemento neutro corresponde ao conjunto vazio.

A partir desses grupos abelianos introduzimos trˆes homomorfismos de grupos ∂i para i= 0,1,2, chamados de operadores bordo, onde

2 :C2 →C1, ∂1 :C1 →C0 e ∂0 :C0 → {0}.

Esses homomorfismos ∂i levam uma i-cadeia na soma das fronteiras de todas as i-cells que fazem parte dessai-cadeia.

Exemplo 3.4. Seja f uma face qualquer de G tal que sua fronteira ´e formada pelas arestas {e1, . . . , ek}, ent˜ao ∂2f = e1 +· · ·+ek. Do mesmo modo, seja e uma aresta tal que seus pontos extremos s˜ao os v´ertices v1 e v2, ent˜ao ∂1e=v1+v2.

Para ficar ainda mais claro, observe a Figura 3.1.

Antes de definirmos o primeiro grupo de homologia precisamos definir dois subgrupos de C1.

Defini¸c˜ao 3.5. Sejam Z1 e B1 subgrupos de C1 tais que Z1 ´e o n´ucleo de ∂1, ou seja, Z1 ={z ∈C1; ∂1z = 0}, onde seus elementos s˜ao chamados de ciclos, e B1 ´e a imagem de

2, ou seja, B1 ={b∈C1; ∃ c∈C2 tal que b=∂2c}.

Figura 3.1: A¸c˜ao dos operadores bordo ∂2 e∂1.

Observa¸c˜ao 3.6. Toda fronteira de uma 2-cadeia s˜ao ciclos. Dessa forma, B1 ⊂Z1. Definidos esses subgrupos de C1, podemos definir agora o primeiro grupo de homologia.

Defini¸c˜ao 3.7. O primeiro grupo de homologia de uma superf´ıcieM ´e definido pelo quociente H1 = Z1

B1

.

Um resultado importante que ser´a usado e pode ser visto em [14] ´e que H1 'Z22g, onde g ´e o gˆenero da superf´ıcie. Assim, independente da tessela¸c˜ao que usarmos, teremos que H1

depende apenas da topologia da superf´ıcie. Desse modo, H1 ´e um invariante topol´ogico.

Outro invariante topol´ogico que usaremos ´e a caracter´ıstica de Euler.

Defini¸c˜ao 3.8. (Caracter´ıstica de Euler) Dada uma tessela¸c˜ao qualquer, considere V, E e F o n´umero de v´ertices, arestas e faces, respectivamente. A caracter´ıstica de Euler ´e definida como a quantidade χ≡V −E+F.

Usaremos tamb´em a rela¸c˜aoχ= 2(1−g) para superf´ıcies fechadas orient´aveis e conecta-das.

Considere a Figura 3.2, onde tesselamos o toro com uma tessela¸c˜ao quadrada, onde as bordas opostas s˜ao identificadas. As 1-cadeias s˜ao classificadas da seguinte forma:

A 1-cadeiaa´e homologicamente trivial. J´ab,c,d,eef s˜ao homologicamente n˜ao triviais.

As 1-cadeias b e c s˜ao homologicamente equivalentes, pois juntando as duas, elas envolvem a regi˜ao B. Essas s˜ao as classifica¸c˜oes para curvas fechadas. J´a as 1-cadeias abertas e e f envolvem a regi˜aoC, e dizemos que s˜ao hom´ologas.

Figura 3.2: a ´e homologicamente trivial, enquanto b, c, d, e e f s˜ao homologicamente n˜ao triviais. b ec s˜ao homologicamente equivalentes. J´a e e f s˜ao ditas hom´ologas.

Note que a = 0, b=c e b 6=d6= 0. Como H1 'Z22g e g = 1, ent˜aoH1 ' Z2×Z2, logo, H1 tem dois geradores. Considere b e d esses geradores, assim, os elementos de H1 s˜ao 0, b, d eb+d.

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