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Caminhando pela história: as nuances das políticas de formação de professores e de

Capítulo 2 A INTERLOCUÇÃO ENTRE O CONTEXTO HISTÓRICO DA FORMAÇÃO

2.3 Caminhando pela história: as nuances das políticas de formação de professores e de

A educação, no contexto das reformas políticas, torna-se um instrumento fundamental para o desenvolvimento econômico e meio da formação de ―capital humano‖ que possa servir, sobretudo aos interesses do mercado. Com essa lógica, ocorrem as reformas no campo educacional com forte incidência na formação do docente que se tornou protagonista principal do cenário das reformas e políticas educacionais (MAUÉS, 2003).

Para ilustrar essa constatação, podemos citar os marcos históricos que a elucidam, tais como a conferência em Lisboa, quando a Comissão Europeia estipulou ―que a qualidade da educação e da formação seja conduzida ao nível mais elevado e que a Europa seja uma

referência mundialmente conhecida pela qualidade, o valor de seus sistemas e estabelecimentos de educação e de formação‖. Para tanto, criou-se o programa de trabalho

Educação e Formação 2010, que ressaltava três aspectos básicos: (i) melhorar a formação inicial dos professores; (ii) recrutar e manter os professores mais bem qualificados; (iii) assegurar o desenvolvimento profissional. Além do mais, o Comitê externa preocupações com a formação em nível superior e o equilíbrio entre a pesquisa e a prática, com as condições de trabalho e de emprego do docente (MAUÉS, 2003).

A autora aponta ainda que, em 2005, o Comitê Sindical Europeu da Educação (CSEE) publicou um relatório no qual reforça a evidência que o continente carece de quadro docente e ressalta a importância do professor no processo socioeconômico, com a recomendação principal de que a formação dos professores ocorra em nível de mestrado. No mesmo ano, a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) elaborou o documento O papel crucial dos professores: atrair, formar e reter os professores de

qualidade, como resultado de pesquisa realizada em 25 países-membros (Alemanha, Áustria,

Bélgica, Canadá francês, Chile, Coreia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Israel, Itália, Japão, México, Noruega, Países Baixos, República Eslováquia, Reino Unido, Suécia e Suíça). No documento, a OCDE apresenta a importância que se estabelece entre a qualidade do ensino e a formação dos professores, como também enfatiza as mudanças ocorridas na profissão docente, tendo em vista a sociedade do conhecimento.

Em relação às mudanças para o trabalho docente e para a profissão docente, Esteve (1995, p. 100-108) aponta aspectos fundantes desse processo, tais como: (i) políticas educacionais representadas pelas reformas na área da formação de professores, iniciadas na década; (ii) ampliação das exigências em relação ao trabalho do professor, muito além das relacionadas ao domínio cognitivo; (iii) implantação nas escolas de novas tecnologias da informação e da comunicação que obrigam o professor a deixar o papel de transmissor de conhecimentos; (iv) preocupação com uma formação para a transformação da sociedade e busca da justiça social; (v) modificações nos apoios recebidos da sociedade ao sistema educativo, tendo em vista serem responsabilizadas pelas mazelas de um sistema de ensino transformado pela mudança social; (vii) fragmentação do trabalho docente; (viii) mudanças curriculares que exigem novos conhecimentos dos professores.

Em nosso país, a formação de professores, no contexto descrito, também faz parte da agência de governo como um forte dispositivo de regulação para melhor gerência da educação. Segundo Aguiar (2006), na década de 1970, a implantação da Reforma

Universitária nas Universidades Federais (1968) e do Ensino de 1º e 2º Graus (1971) sob a perspectiva do mercado, definiram um modelo de formação dividido em dois lócus de formação: ―de um lado, a faculdade de educação ou unidade acadêmica equivalente, responsável pelo curso de pedagogia e a formação pedagógica dos licenciandos, e, de outro, os institutos de conteúdos específicos, onde se formavam bacharéis e licenciados‖ (AGUIAR, 2006, p. 822). Na época, com base nas diretrizes e na fundamentação das referidas leis tentou- se impor um ―pacote pedagógico‖ 36, na linha da racionalidade técnica, da gestão eficiente e

da ação calcada na competência, que versava sobre a preparação de recursos humanos para os docentes e não docentes de 1º e 2º graus.

Para Brzezinski (2002), tal medida foi veementemente negada pelos educadores, que, mobilizados nacionalmente, resistiram ao poder instituído e ao desconhecimento, por parte deste, das práticas, das pesquisas e dos estudos dos profissionais que lidavam com essas questões em seu cotidiano. Ademais, o movimento posicionava-se também contra a descaracterização do curso de Pedagogia e a extinção da profissão do pedagogo. Na lógica da autora, o marco inicial da resistência foi a realização do I Seminário de Educação Brasileira (1978), ocorrido na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Historicamente, a questão da formação de professores emergiu de forma explícita no Brasil, após sua independência. Saviani (2009) afirma que tal fato ocorreu em virtude da cogitação da organização da instrução popular e, por conseguinte, em razão da necessidade de maior número de professores para atuarem como docentes no novo contexto, mais especificamente, no ensino ―das primeiras letras‖37. Com o intuito de atender a essa demanda,

ainda no século XIX, foi criada a primeira Escola Normal no Brasil, no ano de 1835, em Niterói. A partir dessa experiência, outras províncias criaram suas escolas normais, com o objetivo de formar professores para atuarem em suas estâncias. As escolas normais

36 O Pacote Pedagógico é de autoria de Valnir Chagas, à frente do Conselho Federal de Educação (CFE). Apesar

de não ter sido aprovado na íntegra, consegue passar algumas indicações relativas à formação de professores que discorriam sobre ―Estudos Superiores de Educação, Formação Pedagógica das Licenciaturas, Preparo de Especialistas em Educação e Formação de Professores de Educação Especial‖. 59º Relatório produzido para UNESCO, em 1996, pela Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, sob a coordenação de Jacques Delors (LIPOVETSKY, 2010, p. 110).

37 Essa expressão advém do Decreto (de D. Pedro I) de 15 de outubro de 1827 que determinava a criação das

escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império. Esse decreto ficou conhecido na história como o Decreto de 15 de outubro de 1827, primeira lei nacional sobre a Instrução Pública, até 1946 (SAVIANI, 2009).

permaneceram, por longo período, como espaço exclusivo de formação de professores para as séries iniciais (TANURI, 2000).

Posteriormente a essa empreitada, a preocupação voltou-se para a formação de professores para atuarem no ensino secundário, o que se concretizou somente a partir do século XX, quando esse nível de formação passou a fazer parte das políticas públicas. Dessa forma, foi criada a Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil em 1939, com o objetivo de formar professores para atuarem nesse nível de ensino. Inicialmente, a organização curricular do curso de formação seguia a fórmula conhecida popularmente por 3+1, que se constituía em três seções fundamentais: Filosofia, Ciências, Letras e Pedagogia, e uma seção especial chamada Didática. Podemos, então, afirmar que as disciplinas de conteúdo específico eram oferecidas nos primeiros três anos e, após cursá-las, o aluno recebia o certificado de bacharel, podendo exercer a função de Técnico em Educação. Contudo, para tornar-se licenciado, o estudante teria que cursar mais um ano de estudo de Didática para poder atuar como docente.

Muitos fatos ocorreram na dinâmica evolutiva do processo de formação de professores, no Brasil. Todo esse movimento foi sintetizado por Saviani (2009, p. 3)38 em

quatro períodos históricos, estabelecidos de acordo com a relevância dos fatos que os marcaram e os demarcaram, que são:

1. Ensaios intermitentes de formação de professores (1827-1890). Esse período se inicia com o dispositivo da Lei das Escolas de Primeiras Letras, que obrigava os professores a se instruírem no método do ensino mútuo, às próprias expensas; estende-se até 1890, quando prevalece o modelo das Escolas Normais.

2. Estabelecimento e expansão do padrão das Escolas Normais (1890-1932), cujo marco inicial é a reforma paulista da Escola Normal, tendo como anexo a escola-modelo.

3. Organização dos Institutos de Educação (1932-1939), cujo marco são as reformas de Anísio Teixeira no Distrito Federal, em 1932, e de Fernando de Azevedo em São Paulo, em 1933.

4. Organização e implantação dos Cursos de Pedagogia e de Licenciatura e consolidação do modelo das Escolas Normais (1939-1971).

38 Pedagogia e formação de professores no Brasil: vicissitudes dos dois últimos séculos - IV Congresso

5. Substituição da Escola Normal pela Habilitação Específica de Magistério (1971-1996).

6. Advento dos Institutos Superiores de Educação, Escolas Normais Superiores e o novo perfil do Curso de Pedagogia (1996-2006) (SAVIANI, 2009, p. 3).

Embora os períodos sejam apresentados de forma linear, muitos conflitos, avanços e impasses políticos se fizeram presentes nas entrelinhas de seu processo histórico. Não podemos desconsiderar que no processo histórico das políticas de formação no Brasil permeiam inúmeras controvérsias, conflitos e resistências, visto que emergem da sociedade capitalista e das contradições a ela subjacentes.

Relembramos, portanto, que o trabalho do professor e, consequentemente, sua formação estão estritamente relacionados ―aos modelos organizacionais do trabalho produtivo e à regulamentação dos comportamentos e atitudes que sustentam a racionalização das sociedades modernas pelo Estado‖ (TARDIF, 2002, p. 24). A característica principal do sistema capitalista é a divisão social do trabalho39, portanto, a docência não pode ser analisada

de forma descolada da análise contextual, pois ela não é estática e muito menos imune à intervenção. Pelo contrário, ela é permeada pelos processos sociais, pelos elementos que a fundamentam e pela permanente construção e reconstrução conceitual.

Conforme nos alerta Freitas (1999), as reformas educacionais em nosso país, desde a década de 1970, apresentam como objetivo a adequação do sistema educacional ao processo de reestruturação do Estado. A formação de professores nesse contexto ora é abordada como elemento impulsionador e realizador dessas reformas, ora como elemento que cria condições para a transformação da própria escola, da educação e da sociedade.

Além disso, essa década foi marcada pelo modelo de produção capitalista de internacionalização do capital e pela ascensão da racionalidade técnica na área educacional. Vale lembrarmos que, nesse tempo, ocorreu também a expansão do acesso ao Ensino Fundamental, o que implicou a carência de professores para atuarem nesse nível de ensino. Para atender às novas demandas, foi necessária a criação, por parte das universidades, das Licenciaturas Curtas, processos aligeirados de certificação docente, cujas consequências são hoje por nós conhecidas (DIAS-DA-SILVA, 2005).

39 A divisão social do trabalho determina as duas classes fundamentais do sistema capitalista: o trabalhador e o

capitalista. Essas classes são antagônicas nas relações que se estabelecem entre as forças produtivas e as relações de produção (FREITAS, 1996).

Outro adendo é que, no novo cenário político e social que se descortinava, a educação passou a ser defendida em diferentes perspectivas. Por um lado, na perspectiva humanista e emancipatória era tida como direito social e, por outro, na perspectiva neoliberal, como propiciadora da melhoria da qualidade da mão de obra para o mercado de trabalho. Em virtude da expansão do campo da educação e de sua ampliação social, ocorreram mudanças também na pesquisa em educação. Esta passou, a partir de então, a agregar novas metodologias e a considerar as relações existentes entre a forma de organização da escola e os objetivos da sociedade como elementos determinantes dos fins da educação, segundo Gatti (1996), Tanuri (2000), Brzezinski (2002), Pimenta (2002), Saviani (2009), Toledo (2011), entre outros.

Esse foi um tempo também de fortalecimento do movimento dos educadores, que, além da busca pelo reconhecimento como categoria profissional, reivindicava a participação mais efetiva nas decisões políticas referentes à formação de professores. Segundo Romanowski (2011), essa época pode ser considerada como a do início da mobilização docente pela profissionalização e, consequentemente, pelo reconhecimento social e por mais espaço político. Com isso, a luta e os movimentos articulados dos educadores geraram mudanças na concepção do professor, que deixou de ser reconhecido como passivo e começa a assumir-se como sujeito histórico. O professor passa a adquirir um novo papel político- social, como nos explica Fernandes et al. (1996):

O professor precisa colocar-se na situação de um cidadão de uma sociedade capitalista subdesenvolvida e com problemas especiais e, nesse quadro, reconhecer que tem um amplo conjunto de potencialidades, que só poderão ser dinamizadas se ele agir politicamente, se conjugar uma prática pedagógica eficiente a uma ação política da mesma qualidade (FERNANDES et al., 1996, p. 31).

Diante da intensificação do movimento pela democracia, os professores, de maneira mais articulada, passaram a reivindicar mudanças nas políticas de formação, principalmente em relação ao curso de Pedagogia. Com o intuito de assegurar maior representatividade e participação nas reformas educacionais, em 1980, a categoria constituiu o Comitê Pró-Formação do Educador. Posteriormente, em 1983,esse Comitê foi transformado na Comissão Nacional de Reformulação dos Cursos de Formação do Educador (CONARCFE).

Mais fortalecidos e organizados, em 1990, no V Encontro Nacional sobre Reformulação dos Cursos de Preparação de Recursos Humanos para a Educação, realizado em Belo Horizonte, os educadores transformaram o CONARCFE na Associação Nacional

pela Formação dos Profissionais de Educação (ANFOPE), entidade que até os dias atuais permanece bastante atuante e participativa nas discussões acerca da formação de professores. O cenário mais aberto para o debate propiciou que o trabalho pedagógico e a própria avaliação fossem vistos de forma diferente no interior da sala de aula. Na formação do docente, o papel da avaliação também começou a ser mais valorizado.

A partir desse fato, tido como um marco histórico no movimento de luta dos educadores, a Comissão Nacional de Reformulação dos Cursos de Formação do Educador, por meio das Conferências Brasileiras de Educação (CBEs) e da realização de vários e importantes congressos, caminhou na direção de repensar a educação como um todo. Inclusive, considerando a reformulação dos cursos de Pedagogia e de Licenciatura como forma de contrapor-se – por meio de novas propostas de formação – às imposições das reformas educacionais definidas nas instâncias oficiais, tão deslocadas do mundo real. Na visão de Aguiar (2006),

o Movimento dos Educadores toma vulto e demonstra sua força, como resistência ao poder instituído, durante toda a década de1980, por meio de debates, embates e manifestações públicas por intermédio de ações sob o ponto de vista epistemológico, político e didático-pedagógico. Sob o enfoque epistemológico, as ações dos educadores visavam à redefinição e à busca da identidade do curso de pedagogia no elenco dos cursos de formação de professores. Sob o ponto de vista político, em face do processo de abertura democrática40, os educadores acreditavam na transformação político-social da sociedade brasileira, historicamente necessária [...]. Sob a perspectiva didático-pedagógica pretendiam apresentar uma proposta nacional de mudanças estruturais no curso de pedagogia, que rompesse com a camisa-de- força imposta pelo currículo mínimo (AGUIAR, 2006, p. 823).

Nas discussões realizadas e nos documentos elaborados por esse fórum representativo, eram enfatizadas as necessidades de superação das inúmeras dicotomias com as quais conviviam os cursos de formação: a teoria e a prática, o ensino, a pesquisa e a extensão, o conteúdo específico e o conteúdo pedagógico, o conteúdo e a forma, entre outras. Foi com base nessa defesa que surgiu a proposta da ―docência como base da formação profissional de todos aqueles que se dedicam ao estudo do trabalho pedagógico‖ (ANFOPE, 1998, p. 10)41. Nesse documento, a avaliação foi tratada mais na perspectiva de avaliação de

cursos, porém não sendo enfatizada como conteúdo da formação do docente.

40 Grifo da autora.

41 Para os que defendem a docência como base da formação, o significado associa-se a uma dimensão de

articulação entre o trabalho específico da escola e o conjunto de conhecimentos que contribuem para a compreensão, análise e crítica mais ampla, como realidade social, política, econômica, cultural etc. Nessa concepção, a docência ultrapassa a restrita relação pedagógica que ocorre em sala de aula.

Ressaltamos que a redefinição e a ampliação do conceito de docência, dentro desse novo contexto, têm suscitado interesse de diversos pesquisadores que buscam compreender a docência com base em novas perspectivas. Entre esses estudos, destacamos o de Veiga (2009). Nele, a autora reconhece a docência como uma atividade profissional que exige conhecimentos específicos para seu exercício ou, no mínimo, a aquisição de habilidades e conhecimentos vinculados à atividade nela exercida. Referenda o sentido epistemológico da docência, como um construto coletivo e social e aponta a dinamicidade como uma de suas peculiaridades. A autora também nos alerta quanto à importância da docência nos processo de formação de professores, uma vez que estamos formando estudantes que irão desempenhar a tarefa de educar. Nesse sentido, advoga que, nos cursos de formação, a docência deve estar ligada à inovação, aos rompimentos e à constante busca de superação de dicotomias entre conhecimento científico e senso comum, ciência e cultura, educação e trabalho, teoria e prática etc.

Politicamente, em meio à efervescência das discussões sobre a formação, ocorreu a promulgação da Lei 5.692/71, trazendo alterações substanciais na estrutura de ensino, criando novas denominações para o ensino primário, ginasial e secundário que, a partir de então, passaram a ser reconhecidos como ensino de 1º e 2º graus. No bojo dessas mudanças, a Lei extinguiu também o sistema de ensino baseado em curso de profissionalização, propondo uma rede única de ensino. Assim, foi instituída a iniciação profissional e a profissionalização em todo o ensino de 1.º e 2.º graus (MACHADO, 1989b).

Nessa perspectiva, pelo Parecer 349/72, aprovado em 6 de abril, as Escolas Normais foram substituídas pela habilitação específica de 2º grau para o exercício do magistério de 1º grau (HEM) em duas modalidades básicas: uma com a duração de três anos (2.200 horas), que habilitaria a lecionar até a 4ª série; outra com a duração de quatro anos (2.900 horas), habilitando ao magistério até a 6ª série do 1º grau. Até então, a formação de professores para as séries iniciais era realizada nas escolas normais que, embora correspondessem ao ensino de 2º grau e tivessem certas limitações, constituíam-se em um espaço específico para esse tipo de formação. No entanto, segundo Saviani (2009), com a promulgação da Lei e em decorrência das mudanças por ela implantadas, a formação de professores para esse nível de ensino se diluiu em meio a tantas outras habilitações, causando um quadro de enorme precariedade.

Saviani (2009, p. 145) depreende que ―o currículo do curso, em virtude dessas alterações, passa a ser constituído de um núcleo comum, obrigatório em todo o território nacional para todo o ensino de 1º e 2º graus, destinado a garantir a formação geral; e uma

parte diversificada, visando à formação especial‖. Em relação a essa constatação, para Tanuri, a reformulação acima descrita, embora bastante alardeada, não apresentou grandes inovações. Pelo contrário, preservou o distanciamento entre a teoria e a prática, já evidenciado anteriormente nos cursos de formação de professores, ―resultante não só da ausência de disciplinas voltadas para a análise das questões educacionais brasileiras, como também do tratamento científico, universal, ‗neutro‘ dos demais componentes‖ (TANURI, 2000, p. 79). A avaliação, no contexto da reforma, embora se tenha tornado mais abrangente conceitualmente, estava atrelada aos objetivos educacionais e aos domínios cognitivos afetivos e psicomotores.

A autora acrescenta ainda que, preocupado com a fragilidade da formação decorrente da imposição da Lei em 1982, o MEC criou os Centros de Aperfeiçoamento para o Magistério (Canas), com o objetivo de revitalizar as Escolas Normais e ampliar suas funções. Essas instituições, grosso modo, se tornaram centros de referência para a formação inicial e continuada para os professores da pré-escola e para os do ensino das séries iniciais. No entanto, mesmo com a implantação de tais centros, poucos avanços foram obtidos.

É relevante destacar que, nessa época, o paradigma que prevalecia nos processos de formação se sustentava na racionalidade técnica e nas tendências pedagógicas que dela faziam parte. Essa vertente se baseava na epistemologia da prática, herdada do positivismo, que prevaleceu ao longo de todo o século XX, servindo de referência para a educação e para a formação dos profissionais em geral. Nessa concepção, a atividade do profissional é totalmente técnica e predomina a aplicação de princípios gerais do conhecimento científico derivados da investigação. A avaliação, segundo Dias Sobrinho (2003), mantinha suas bases no campo da psicologia, mais especificamente na área da psicometria42, o que tornava o conceito de avaliação e de mediação como intercambiáveis.

Em relação à pesquisa em educação, nesse tempo, o foco se desloca da ação pedagógica do professor para o processo de ensino e aprendizagem, na perspectiva de

processo (comportamentos do professor) e de produto (aprendizagem do aluno). Predominava então a perspectiva da racionalidade técnica, sustentada nos princípios do positivismo tanto no campo científico como no educacional. No que se refere à pesquisa sobre a avaliação, foi

42 Etimologicamente, a psicometria representa a teoria e a técnica de medida dos processos mentais,

especialmente aplicada na área da Psicologia e da Educação. Fundamenta-se na teoria da medida em ciências em geral, ou seja, do método quantitativo que tem como principal característica e vantagem, o fato de representar o conhecimento da natureza com maior precisão do que a utilização da linguagem comum para descrever a