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2. A FORMAÇÃO DO MST E A LUTA POR EDUCAÇÃO

3.1 O CAMINHAR DO PESQUISADOR

Antes de se iniciar a análise propriamente dita do Curso, é interessante historiar como se deu o desejo de estudar e compreender uma formação específica para educadores do campo. O primeiro contato com a turma de Pedagogia da Terra do MST ocorreu em agosto de 2005, quando integrava a equipe de Coordenação do PRONERA/UNEB. Como membro da coordenação, tinha a tarefa de acompanhar e avaliar a realização das atividades desenvolvidas no Curso. Esse foi o primeiro contato, literalmente, com uma turma composta por educandos pertencentes ao MST. A primeira impressão foi de encantamento pelas diferentes atividades realizadas pela turma: a mística, o cantar do hino do movimento, a música, a participação dos estudantes nas atividades.

Outra característica marcante da turma é a organização das tarefas, tudo é bem definido, não existem privilégios para determinadas pessoas, todos têm os mesmos direitos e deveres, tanto homens quanto mulheres, o trabalho coletivo é realizado efetivamente.

Dessa forma, o acompanhamento da segunda etapa do Curso Pedagogia da Terra em agosto de 2005, foi a primeira aproximação com o objeto de estudo. A partir dessa experiência, aumentou o interesse de compreender mais sistematicamente a proposta de educação de um movimento que se coloca como revolucionário e perceber como a educação pode ajudar nesse processo de transformação social. Daí que o trabalho como pesquisador

teve o objetivo de compreender a educação defendida pelo movimento e como acontece o processo de formação dos professores do MST.

Outra questão importante é como se dá o diálogo entre um movimento que possui as suas referências e concepções próprias, como é o caso do MST, e a Universidade que neste caso específico se trata da UNEB. Portanto, há essa relação entre o saber científico e o saber popular, por isso o saber das lutas perpassará por todo o nosso trabalho.

Ainda em 2005, a participação como aluno especial da disciplina Movimentos Sociais e Educação, ministrada pela Professora Celma Borges, foi decisiva, pois fez perceber essas experiências vivenciadas com um olhar de pesquisador. Como nada é por acaso, mas decorrência de escolha, é por isso que a professora que contribuiu com a escolha do objeto de pesquisa, hoje, é a orientadora do trabalho de dissertação.

A pesquisa está dividida em três fases: a primeira fase foi o levantamento de materiais sobre o curso, bem como uma bibliografia atualizada das discussões sobre Educação do Campo e sobre os movimentos sociais, mais especificamente sobre o MST; segunda fase da Pesquisa corresponde à realização dos questionários e das entrevistas; e a terceira fase corresponde à análise dos dados obtidos.

A primeira fase da pesquisa começa em 2007. No primeiro semestre desse ano, houve disciplinas interessantes e que ajudaram na formatação do objeto de estudo, principalmente a disciplina ministrada pelo Professor Roberto Sidnei, em que se discutiam as questões metodológicas de uma pesquisa. As leituras e as discussões proporcionadas por essa disciplina, acrescidas do processo de orientação, delinearam as perspectivas teórico- metodológicas deste trabalho.

No segundo semestre de 2007, também houve disciplinas que contribuíram para a obtenção dos créditos necessários para composição do currículo. Nas disciplinas cursadas, destaca-se a disciplina Projeto de Dissertação, ministrada pela Professora Dora Leal. Essa disciplina oportunizou a discussão e análise do projeto de Pesquisa pelos colegas e pela professora, sendo um momento rico e extremamente importante, pois suas contribuições ajudaram no processo de construção e re-construção do Projeto.

Chegou o ano de 2008! Ano em que foi colocado no cronograma do Projeto para a realização da Pesquisa. No período de 26 de fevereiro de 2008 a 02 de março de 2008, iniciou-se a investigação empírica, com o acompanhamento do Tempo Escola11, no Centro de Formação Carlos Marighela, no município do Prado. Nesse período foi possível observar

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todas as atividades desenvolvidas pelos educandos, o acompanhamento das místicas12 e das aulas.

O primeiro contato com a turma foi muito proveitoso, eles já sabiam da ida de um pesquisador até o curso, pois, antes de viajar para o Prado, foi necessário solicitar da Coordenação Estadual do MST a permissão para acompanhar as atividades da turma Pedagogia da Terra. Um fato interessante foi que, logo após a chegada em sala de aula, o líder da turma daquele dia solicitou que o pesquisador se apresentasse e falasse sobre o objetivo da visita. Esse momento foi importante pelo fato de ter a oportunidade de explicitar a intenção da pesquisa e solicitar dos educandos a contribuição para a realização desse trabalho. A observação do diário de campo demonstra como foi o primeiro contato:

Saí de Salvador às 18h30m do dia 25 de fevereiro de 2008 e cheguei no Assentamento 1º de Abril no dia 26, às 9h. O difícil não foi chegar, mas, logo no primeiro momento, explicar as minhas intenções de pesquisador. A dificuldade não era em explicar os objetivos da pesquisa, mas convencê-los de que se tratava de uma pesquisa séria e importante para o Curso. (Diário de Campo, 26 de fevereiro de 2008)

Após o primeiro contato, buscou-se observar as atividades desenvolvidas pela turma, participando das aulas, das místicas, de conversas com os educandos. A receptividade da turma foi muito boa, é uma turma bastante alegre e de fácil acesso. Para alguns, a presença desse pesquisador era como a de um fiscal, pois a imagem que eles tinham era como o membro da Coordenação Central do PRONERA. Entretanto, nas conversas, foi possível esclarecer de que este pesquisador era um estudante do Curso do Mestrado da UFBA, não mais um coordenador, até porque não pertencia mais à coordenação do PRONERA.

Após os esclarecimentos, a relação melhorou, pois a preocupação de alguns educandos era o que seria escrito sobre o movimento. Esse debate sobre as preocupações dos estudantes é descrito no diário de campo.

Quando eu falo para os estudantes que estou como pesquisador, eles me aceitam e falam que têm interesse de seguir a carreira acadêmica também. Entretanto, é visível a preocupação que esses educandos têm com o trabalho dos pesquisadores, pois como disse um estudante: “o movimento já sofreu muito com esses pesquisadores, não é o seu caso Fábio, estou falando porque têm alguns que vêm pra cá passam dois dias e saem escrevendo o que quer como o conhecedor do movimento. Isso é muito ruim pra gente, não significa que o movimento tem que se fechar e não deixar os pesquisadores estudarem o movimento, até porque o MST precisa ser estudado e discutido, mas já têm alguns que já vêm com a intenção de destruir o trabalho da gente, são esses que devem ser impedidos de participar das nossas atividades”. (Diário de Campo 27 de fevereiro de 2008)

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Dessa forma, foi possível estabelecer o contato com a turma, respeitando sempre o seu espaço. Nesse período foi aplicado um questionário com os educandos, dentre as várias questões contidas nesse instrumento, havia algumas com o objetivo de analisar o seu perfil e como eles avaliavam a importância do curso para eles e para o movimento. Solicitou-se ao líder da turma e à professora um tempo para aplicar esse questionário.

O campo de pesquisa é muito rico e complexo pra ser estudado e entendido. Para os positivistas, o campo de pesquisa é um elemento perturbador, pois essa corrente de pensamento prega a objetividade acima de tudo. O campo de pesquisa é perturbador pra quem define com objetividade a sua pesquisa e não permite que ela possa ser mudada, reformulada ou alterada no decorrer de sua realização em função de interpretações da realidade que alterem seu problema. Mas esse mesmo campo pode ser um elemento extremamente importante para o pesquisador, no sentido de tentar conhecer esse objeto na sua perspectiva histórica e no movimento das suas relações.

O pensamento de Heráclito de Êfeso :“um homem não entra duas vezes no mesmo rio. Da segunda vez não é o mesmo homem nem o rio é o mesmo” é a síntese da relação entre pesquisador e campo pesquisa, pois aquele não é o mesmo, após sua atuação.

O trabalho de campo motivou mais o estudo e a compreensão do objeto. No cronograma, a sétima etapa estava prevista para o segundo semestre de 2008, no entanto não aconteceu por alguns motivos: a greve do INCRA; o não repasse dos recursos do INCRA para a UNEB; a realização das eleições municipais, A causa que mais dificultou a realização da etapa foi o término dos recursos e a não liberação do aditivo para a continuidade do Curso. Essa etapa só começou a ser realizada em março de 2009, quando esta pesquisa estava em sua redação final.

A não reallização da sétima etapa dificultou a coleta de dados e gerou uma angústia enorme no pesquisador, pelo fato de que o prazo estabelecido para defender uma dissertação de Mestrado são dois anos, mas o objeto de estudo tem o seu próprio tempo e não respeitou o tempo imposto para ser estudado.

Inicia-se 2009! Não era mais possível esperar, optou-se em ir atrás dos sujeitos da pesquisa onde eles estivessem para entrevistá-los. Visitaram-se alguns assentamentos a fim de entrevistar os educandos, professores e coordenadores. .

No primeiro momento da pesquisa, o número de entrevistados era maior do que foi possível realizar, entretanto o conteúdo do trabalho não ficou comprometido, pelo fato de que

as entrevistas realizadas ajudaram na compreensão e na resposta da pergunta orientadora do trabalho.

Assim foi o caminho trilhado para a realização desta pesquisa. Agora se faz necessário detalhar as técnicas e os procedimentos de coleta de dados. Com vistas a responder o problema da pesquisa, é necessária a escolha criteriosa das técnicas e dos instrumentos de coleta de dados, pois são importantes para a captação da realidade estudada. Nesse sentido, o trabalho se configura como um Estudo de Caso e os instrumentos definidos para pesquisa foram: a observação participante, a entrevista semi-estruturada e a análise documental.