• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III – REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA, CAMPOS CONCEITUAIS E

3.4 AS SITUAÇÕES COMO REFERÊNCIA NA APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA ESCOLAR,

3.4.2 Campos Conceituais

Conforme a TCC, os campos conceituais são organizados e construídos a partir de três argumentos primordiais. O primeiro argumento é a idéia de que um conceito não se forma dentro de um só tipo de situação; o segundo, refere-se ao fato de que uma situação não pode ser analisada a partir de um só conceito. E, finalmente, o terceiro argumento baseia-se na premissa de que a construção e apropriação de todas as propriedades de um conceito ou todos os aspectos de uma situação é um processo longo, que requer analogias, rupturas, incompreensões entre situações, entre concepções, procedimentos e significantes.

Para Vergnaud, um Campo Conceitual (CC) é, em primeiro lugar, um conjunto de situações. As características seguintes, extraídas de Vergnaud (1985, 1990, 1996), evidenciam mais precisamente a definição de CC:

- o estudo do desenvolvimento e do funcionamento de um conceito, no decurso da aprendizagem ou quando de sua utilização, deve considerar, ao mesmo tempo: o plano das situações, o dos invariantes operatórios e o das representações simbólicas;

- não há em geral bijeção entre significantes e significados, nem entre (esquemas) invariantes e situações;

- um conceito se constitui através de uma variedade de situações, e diferentes invariantes estão envolvidos em diferentes situações;

- ao mesmo tempo, uma situação não pode ser analisada pela via de um único conceito, pois sua resolução mobiliza, como já vimos, vários esquemas.

Partindo dessas idéias, Vergnaud (1996) define a Teoria dos Campos Conceituais como uma psicologia dos conceitos, assentada num princípio de elaboração pragmática dos conhecimentos. A TCC possui, como primeira entrada, as situações e, como segunda, os conceitos e teoremas. Vemos, então, a importância dada ao conjunto de situações na teoria de Vergnaud. A definição de campo conceitual das estruturas aditivas auxilia-nos a dimensionar tal importância:

O campo conceitual das estruturas aditivas é, ao mesmo tempo, o conjunto das situações cujo tratamento implica uma ou várias adições ou subtrações, e o conjunto dos conceitos e teoremas que permitem analisar essas situações como tarefas matemáticas. São assim constitutivos das estruturas aditivas os conceitos de cardinal e de medida, de transformação temporal por aumento ou diminuição (perder ou gastar 5 escudos), de relação de comparação quantificada (ter mais 3 bombons ou mais 3 anos que), de composição binária de medidas (quantos são ao todo?), de composição binária de medidas (quantos são ao todo?), de composição de transformações e de relações, de operação unária, de inversão, de número natural e de número relativo, de abcissa, de deslocação orientada e quantificada (VERGNAUD, 1996, p. 168).

Sendo assim, os exemplos colocados na seção 3.3 podem ser relacionados com um campo conceitual. Os registros de representação semiótica

8

1, e

0,125 formariam o conjunto R, das representações simbólicas, do qual falamos anteriormente, ou seja os significantes do conceito; os invariantes operatórios nesse caso seriam as propriedades e teoremas envolvidos no campo conceitual das estruturas multiplicativas e formariam, então, o conjunto I , como as propriedades do isomorfismo da função linear:

( )

( )

(

n1x1 n2x2

)

n1f

( )

x1 n2f

( )

x2 f x nf nx f − = + =

e a sua generalização à relações não

inteiras às propriedades relativas ao coeficiente constante entre duas variáveis linearmente ligadas:

( )

( )

( )

x f a x x a x f 1 = = (VERGNAUD, 1996, p. 168-169).

O conjunto S, nesse caso, seria as situações que forneceriam algum sentido ao conceito, por exemplo, problemas que se relacionam à idéia de parte/todo, porcentagem.

Vergnaud (1996, p.168) define o campo conceitual das estruturas multiplicativas como sendo

o conjunto das situações cujo tratamento implica uma ou várias multiplicações ou divisões e o conjunto dos conceitos e teoremas que permitem analisar estas situações: proporção simples e proporção múltipla, função linear e n-linear, relação escalar direta e inversa, quociente e produção de dimensões, combinação linear e aplicação linear, fração, relação, número racional, múltiplo e divisor, etc.

Assim, Vergnaud não analisa isoladamente, como o faz Duval, as representações

8 1

, 0,125 e , mas sim em termos de situações onde tais registros são as representações do conceito envolvido, e que possibilitam o acesso ao significado dessas situações e à operacionalidade. Então, esses registros estariam relacionados ao campo conceitual multiplicativo, já que representam números racionais. Nesse campo conceitual, o aspecto caracterizador central seria uma estrutura quaternária, uma vez que os problemas que envolvem a multiplicação e a divisão “[...] implicam em uma proporção simples de duas variáveis, uma relativamente à outra” (VERGNAUD, 1996, p. 174).

Segundo Franchi (1999, p. 164), “[...] a teoria dos campos conceituais visa à construção de princípios que permitam articular competências e concepções constituídas em situação, e os problemas práticos e teóricos em que essas competências e concepções se constituem”.

Vergnaud (1990, 1996) sublinha a importância da ação do sujeito em aprendizagem, nas situações, ou seja, nos domínios da experiência, nos quais o conceito faz referência como fonte e critério no processo de conceitualização em matemática. Nesse processo, um ponto decisivo seria a passagem dos conceitos como instrumento aos conceitos como objetos em uma apropriação consciente. Esta transformação significa, entre outras coisas, que as funções proposicionais (que não são suscetíveis de serem verdadeiras ou falsas, como os conceitos de cardinal e de coleção, os de estado inicial, de transformação e de relação quantificada, indispensáveis à conceitualização das estruturas aditivas) podem ser transformadas em argumentos. Nesta transformação, a nominalização é uma operação lingüística fundamental (VERGNAUD, 1996).

O CC é considerado por Vergnaud como uma unidade de estudo para dar sentido às dificuldades dos alunos no processo de conceitualização do real. Isso porque supõe que a conceitualização é a essência do desenvolvimento cognitivo.

Vergnaud (1990) não compreende sua proposta sobre os campos conceituais como uma teoria didática. No entanto, a considera de extremo interesse para esse campo porque possibilita a análise da relação dialética presente na educação, entre a ação na situação e a verbalização teórica. É também neste sentido que compreendemos sua utilidade para nossa pesquisa: na dimensão da ação do sujeito no tratamento das situações que referenciam os objetos matemáticos na aprendizagem da matemática escolar.

3.5 A NATUREZA DAS TAREFAS MATEMÁTICAS COMO PONTO DE