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CAPÍTULO III – REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA, CAMPOS CONCEITUAIS E

3.2 PARA ENTENDER COMO FUNCIONAM AS REPRESENTAÇÕES SEMIÓTICAS

3.2.4 A Questão do Significado

O termo “significado” tem tomado diversas facetas na investigação matemática e, muitas vezes, utilizado de modo informal nos estudos didáticos. É um termo central também nas teorias sobre a linguagem, filosofia, lógica, semiótica, psicologia, pedagogia, ou seja, nas ciências interessadas na cognição humana.

Para debater esta questão, tomamos as idéias de Godino e Batanero (1994) e Godino (2006), que trabalham com a noção de significado institucional e pessoal dos objetos matemáticos. Ambas as noções são discutidas em termos de sistemas de práticas pessoais, onde prática é considerada como sendo “[...] toda atuação ou expressão (verbal, gráfica, etc) realizada por alguém para resolver problemas matemáticos, comunicar a outros a solução obtida, validá-la ou generalizá-la a outros contextos e problemas” (GODINO, 2006, p. 92).

As preocupações que envolvem a distinção entre o domínio pessoal e institucional e suas relações para entender o significado nos parece apropriado para compreender a funcionalidade da representação semiótica para a aprendizagem.

De acordo com Godino e Batanero (1994), o significado institucional de um objeto é o sistema de práticas institucionais que estão associadas ao campo de problemas de onde emergem os objetos em um determinado momento. Sendo que uma instituição é considerada, pelos autores, como um coletivo de pessoas envolvidas em uma mesma classe de situações, compartilhando de um mesmo compromisso para a realização desses problemas. Em outras palavras, o significado institucional pode ser relacionado a uma unidade cultural, como aponta Eco (2005), definida e aceita por aquela cultura. Por exemplo:

Chamaremos instituição matemática (M) as pessoas que no seio da sociedade estão comprometidas na resolução de novos problemas matemáticos. São, portanto, os produtores do “saber matemático”. Outras instituições (macro-instituições) envolvidas com “situações matemáticas” são os “utilizadores” do saber matemático (matemáticos aplicados) e os “professores” do saber matemático (a escola do saber matemático) (GODINO e BATANERO, 1994, p. 335).

Essa definição de instituição também é apropriada para interpretarmos a diferenciação entre Matemática Científica e Matemática Escolar apresentada no primeiro capítulo, já que os objetos “emergentes” da prática desses coletivos são

distintos em sua essência porque provêm de instituições diferentes, interessadas na resolução de problemas específicos e relacionados ao seu sistema de práticas. No exemplo do objeto matemático reta, mostrado na Figura 3.2, o interpretante (conceito de reta) pode ser relacionado ao significado institucional. No caso da Matemática Científica esse significado institucional estaria mais relacionado às definições e proposições envolvendo o objeto reta; já para a Matemática Escolar, o significado institucional volta-se para as práticas relacionadas à compreensão e uso do objeto reta.

O significado institucional de um objeto, tomado no sentido de um sistema de práticas culturais institucionalizadas, permite-nos pensar em diferentes classes de práticas mais específicas utilizadas em contextos distintos. Cada contexto pode determinar ou ser determinado por representações semióticas específicas, a mais adequada, ajudando a produzir diferentes sentidos. Isso significa que o sentido pode ser entendido como um subconjunto de um sistema de práticas culturais. Daí ser possível estabelecer a idéia de sentido como significado parcial do objeto matemático.

Por isso, é importante considerar, também, no processo de ensino e aprendizagem da matemática, as diferentes representações semióticas dos objetos para evocar os diferentes sentidos com o intuito de possibilitar a realização das práticas diversas necessárias na apreensão dos significados institucionais dos objetos. A questão que se coloca, então é: como considerar estas diferentes representações? Em que tipo de tarefas elas devem ser priorizadas? As respostas a esse questionamento é objeto de reflexões das seções 3.4 e 3.5 deste capítulo.

Em relação ao significado pessoal, este é definido por Godino e Batanero (1994) como um sistema de práticas pessoais, utilizado por um sujeito para resolver um campo de problemas do qual emerge o objeto em um momento determinado. O significado pessoal dos objetos matemáticos é, então, uma conseqüência direta da história do sujeito, de suas experiências e aprendizagens relacionadas àquele objeto, incluindo os seus construtos cognitivos como concepções, esquemas, representações internas. Um dos objetivos do ensino, nesta perspectiva, é aproximar e adequar o máximo possível os significados pessoais dos objetos aos significados institucionais requeridos e implementados na instituição escolar.

Nas duas definições apresentadas e defendidas, o significado dos objetos (para alguém) é relacionado ao uso desses objetos. Gómez (2005) aponta ainda que o significado pode ser dado pela explicação que damos desse objeto. Assim, a explicação de um objeto pode evocar ou expressar o conceito que temos do objeto dado. Em outras palavras, podemos dizer que o significado institucional e pessoal do objeto matemático apresenta duas dimensões: o uso e a explicação do objeto.

Entretanto, o uso de um objeto matemático não está, como poderia parecer, implícito no conceito que se tem do objeto. A esse respeito, Gómez (2005) comenta que “Explicar, por exemplo, a idéia de limite de uma função, não significa que pode ser usada com êxito por essa pessoa para calcular o limite de certas funções (sempre que exista), ou de determinar se existe ou não o limite sob certas condições” (p. 146).

Partindo dessas considerações, como síntese do que foi exposto até agora para refletir sobre o uso desses construtos teóricos para o ensino e aprendizagem da matemática, propomos a ampliação da clássica tríade semiótica (Frege, Peirce, Ogden e Richards) ou triângulo epistemológico (Steinbring) para o esquema abaixo:

FIGURA 3.4 - ESQUEMA DE UMA REPRESENTAÇÃO SEMIÓTICA

Referência (conceito ou significado institucional):

SENTIDO Referente (objeto): Experiências Aprendizagens Contextos culturais Significados pessoais Signo (símbolo ou significante):

Os vértices do triângulo são mantidos no esquema, mas o vértice da referência é acrescido da noção de significado institucional. O sentido aparece na primeira linha pontilhada que permeia o triângulo, indicando que é determinado nas relações estabelecidas entre signo, referente e referência, especificamente quando da escolha do signo para representar um determinado objeto. O significado pessoal, atribuído ao objeto representado, é influenciado pelos significados institucionalizados do objeto e pelas experiências, aprendizagens e contextos a que o sujeito é submetido.

Entender a estrutura, por assim dizer, da representação semiótica de um objeto matemático e as relações que podem ser estabelecidas entre os elementos que compõem a tríade semiótica é relevante quando se pensa no ensino e na aprendizagem desses objetos. Isso não significa que no desenvolvimento de uma aula de matemática, por exemplo, a todo o momento, o professor deverá estar remetendo-se à tríade semiótica, mas deve ter consciência das diferenças entre os signos utilizados para representar o saber matemático e o próprio saber. Essa consciência pode, a nosso ver, auxiliar na escolha de tarefas matemáticas que contribuam para a explicitação dessas diferenças.

A esse respeito, D’Amore (2007) afirma que, para muitos professores do primeiro ciclo da Escola Fundamental, existe identidade entre o conceito que ensina, o signo que o representa e as referências algorítmicas envolvidas, sendo por isso importante demandar esforços (na formação de professores, na elaboração de materiais didáticos e na organização de propostas curriculares) no sentido de alterar essa situação.

Assim, no contexto da escola, quando se tem a intenção explícita de ensinar os objetos da Matemática Escolar, é relevante que se leve em conta as situações de referência dos objetos matemáticos, ou seja, as tarefas escolares que irão permitir e facilitar a atividade do aluno na aprendizagem de determinados objetos.

3.3 A COMPREENSÃO EM MATEMÁTICA SOB O PONTO DE VISTA DE