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CAMPOS DE RECONTEXTUALIZAÇÃO

1. INTRODUÇÃO

3.5 CAMPOS DE RECONTEXTUALIZAÇÃO

Como referido acima, os textos educacionais transitam por diversos campos do tecido educacional, desde a sua produção até o seu uso na sala de aulas. Entre esses campos de recontextualização, podemos destacar o oficial, o pedagógico e as práticas pedagógicas. Bernstein (1996) concebeu o campo de recontextualização como sendo um conjunto de agentes que atuam dentro do tecido pedagógico com o objetivo de promover ou defender certos ideais específicos no processo da prática educativa. Tais posicionamentos, em norma, são tomados em função das suas áreas de atuação dentro do processo educacional. Tem-se, assim, o seguinte:

3.5.1 Campo Oficial

Bernstein (1996) identificou o campo de recontextualização oficial como sendo criado e dominado pelo Estado e seus agentes especializados. Busca definir um conjunto de conhecimentos, valores e normas que irão nortear todo o processo de produção, distribuição e reprodução da mensagem dentro da estrutura educacional do Estado. É o campo de recontextualização oficial o responsável pela criação e disseminação dos principais valores e ideais nacionais através da rede educacional.

3.5.2 Campo Pedagógico

Bernstein (1996) identificou esse campo como constituído por agentes e instituições responsáveis pela área da pesquisa no campo educacional, podendo estas ser universidades, instituição governamental ou privada ou ainda centro de pesquisa, jornais, periódicos e fundações privadas especializados em pesquisas científicas. Esse campo preocupa-se com os princípios e práticas que regulam o movimento dos discursos do contexto da produção para o contexto de sua reprodução.

A relevância desse campo no processo de ensino-aprendizagem reside no fato de constituir a principal fonte de orientação para maior parte dos professores, visto que, em muitos casos, eles não consultam o currículo e/ou outros documentos produzidos no campo de recontextualização oficial.

É o campo de recontextualização pedagógica responsável pela conquista da autonomia do sistema do educacional de um país em face à influência ideológica do campo de recontextualização oficial na configuração do discurso pedagógico.

3.5.3 Campo das Práticas Pedagógicas

O campo das práticas pedagógicas constitui-se de agentes responsáveis pelo processo de ensino-aprendizagem rede educacional, isto é, pelos professores. Esse campo é responsável pela transformação do discurso pedagógico em práticas pedagógicas que ocorre nas escolas. No âmbito da transmissão, ainda pode ocorrer mais uma recontextualização. Essa consiste na adaptação dos textos vindos dos campos anteriores à realidade da escola e a prática específica do professor.

Embora o processo de construção do currículo seja constituído por disputas pela autonomia entre os diversos participantes do processo, Bernstein (1996) chama atenção para o fato de a sua riqueza residir na dinâmica da interação, isto é, na possibilidade de participação de todos na sua implementação. Com vista a inferir a dinâmica de interação dos atores no processo educacional moçambicano, na sequência apresentamos uma descrição metodológica que permitiu realização do presente estudo.

4 DESCRIÇÃO METODOLÓGICA DO ESTUDO

Conforme referenciado inicialmente, buscamos, com o presente estudo, perceber as várias interpretações dos diferentes atores envolvidos no processo de inclusão digital em curso na sociedade moçambicana através do ensino-aprendizagem das TIC. Para isso, recorremos à análise discursiva em torno dos textos que circulam na rede educacional moçambicana tendo em conta o campo internacional, centrando-se basicamente numa tríade de pontos principais: o campo oficial, o campo pedagógico e as práticas pedagógicas.

No campo oficial, procuramos descortinar a principal mensagem sociológica que o Estado moçambicano prioriza emitir no âmbito do processo da inclusão digital usando como canal o ensino das TIC no sistema educacional. No campo pedagógico, procuramos decifrar como está sendo interpretada a mensagem vinda do campo oficial, isto é, a forma como os diferentes técnicos educacionais do Instituto Nacional de Desenvolvimento de Educação (INDE) e da UP interpretam a mensagem oficial do Estado e, por conseguinte, como eles direcionam tal mensagem na produção do material didático para o uso nas escolas do país, ou como decorre a reprodução do discurso. Finalmente foi analisado como é feita a operacionalização do discurso sobre a inclusão digital na escola face às realidades concretas que elas oferecem.

Com vista à identificação das principais mensagens produzidas ao longo da rede educacional relacionadas com o processo de inclusão digital, o presente trabalho conta com um suporte teórico baseado no estruturalismo de Bernstein (1996) que consiste na análise linguística dos documentos que circulam dentro do tecido social educacional de um determinado Estado, buscando a interpretação das mensagens neles contidos. Resumidamente o estudo apresenta a seguinte estrutura gráfica abaixo.

Figura 7 – Pilares que sustentam o estudo

Com base nessa análise, buscamos a resposta para a questão de fundo de que consiste em gerar novos conhecimentos sobre a percepção que os diferentes intervenientes atribuem às políticas sobre a inclusão digital no Sistema Nacional de Educação, o que a torna uma pesquisa básica quanto à sua natureza, e exploratória quanto à objetividade. (GERHARDT; SILVEIRA, 2009).

O percurso metodológico definido para a satisfação da questão acima colocada passa inicialmente pela definição do objetivo geral do trabalho, que consiste em compreender como os diferentes atores educacionais nacionais interpretam as políticas do uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no âmbito da inclusão digital em curso no país.

Pela natureza do objetivo do trabalho, optamos por uma análise discursiva em níveis distintos, a saber: no plano macro (análise das principais mensagens que circulam na estrutura educacional moçambicana, respectivamente no campo de recontextualização oficial e no campo de recontextualização pedagógica). No plano micro (nas práticas pedagógicas que ocorrem nas escolas) foi usado o multicaso e envolveu quatro escolas, sendo três da cidade do Maputo e uma da província da Matola.

Relativamente ao processo de recolha para posterior análise de dados, tendo em vista a identificação da mensagem vigente nos documentos, aplicamos uma abordagem combinada qualitativa e quantitativa na medida em que, num primeiro momento, procedemos à análise interpretativa dos diferentes documentos, o que corresponde a um procedimento metodológico de natureza qualitativa. Contudo, considerando que a mensagem foi relacionada com outras mensagens de documentos de outros campos de recontextualização, tais dados foram convertidos em quantitativos, valores percentuais, o que corresponde a um procedimento quantitativo. A análise qualitativa e quantitativa dos dados se complementaram e permitiram uma maior compreensão do contexto de análise. (GERHARDT; SILVEIRA 2009).

De início, para a análise do discurso pedagógico existente nos diversos documentos do tecido educacional, tinham sido concebidos instrumentos de análise que se apoiavam na teoria de Bernstein (1996) e que foram inspirados nos estudos do grupo Estudos Sociológicos da Sala de Aula (ESSA), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Todavia, durante o processo de aplicação e devido à dificuldade de separação clara de algumas categorias nos documentos nacionais, foi preciso outra abordagem, isto é, fizemos uma combinação do estruturalismo de Bernstein com a fenomenologia.