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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.4. Percepções e vivências da pré-eclâmpsia: profissionais de saúde

4.4.1. Conhecimento dos profissionais sobre as gestantes

4.4.1.1. Características das gestantes

“São pacientes mais inseguras porque têm muito mais dúvidas têm mais muito mais medo quanto ao dia de amanhã, na gestação e requer mais cuidados, de perto.”

No início das entrevistas foi solicitado que os profissionais descrevessem como percebiam a clientela que atendiam. Para eles, as gestantes possuíam características emocionais, sócio-econômicas e de saúde que as diferenciavam das demais gestantes.

Os profissionais percebiam que elas tinham medo, eram ansiosas, preocupadas com os riscos que corriam e desinformadas sobre a doença. O medo foi o aspecto mais destacado e segundo os profissionais era relacionado ao medo de morrer, de perder o bebê, de engravidar novamente ou medo a respeito do que poderia acontecer até o final da gravidez. Provavelmente em decorrência deste medo, as mulheres também eram preocupadas como os riscos que corriam juntamente com os bebês, uma vez que, segundo a opinião dos próprios profissionais, mesmo que elas não soubessem que estavam com pré-eclâmpsia, elas tinham consciência que corriam riscos.

“[...] elas chegam assim até um pouco assim, atordoadas, elas têm aquela preocupação, mas que elas sabem que ali é uma coisa que tá arriscando a vida [...] tem uma característica marcante, que eu acho que é essa preocupação delas a maioria delas sabem que é uma coisa grave e podem nem saber o que é mas sabem que é grave [...]”

A desinformação também foi bem comentada pelos profissionais. As gestantes desconheciam sua própria doença e não tinham informações suficientes sobre as condutas que seriam tomadas para o tratamento da mesma, o que gerava segundo os profissionais mais ansiedade e medo.

“Muito inseguras e preocupadas com o desconhecido, medo do que vai acontecer com elas, né? [...] são pessoas realmente que... tem umas que não sabe nem o que é eclâmpsia”.

“Pacientes que chegam e nem sabem se tem o problema não tem a mínima percepção do problema. Normalmente as que já tem conhecimento chegam bem mais ansiosas [...]”

As gestantes eram vistas como carentes tanto do ponto de vista emocional, por não terem muita assistência e apoio, quanto social, por serem pessoas com situação financeira precárias. O estresse na gravidez pode vir tanto da falta de suporte emocional, que faz com que a gestante se sinta pouco amada e amparada, quanto da falta de condições financeiras favoráveis21.

“[...] em termos emocionais são muito carentes, geralmente são pessoas assim, que não têm um fator financeiro bom, são dependentes muito da família, assim, eu vejo muito isso... são muito carentes, em termos gerais”.

As precárias condições sócio-econômicas foram citadas como um fator que dificultava tanto a compreensão, por parte das mulheres, do que estava acorrendo com elas, quanto o andamento do tratamento, pois era mais difícil o acesso a determinados procedimentos, pela questão financeira e até mesmo pela distância, pois muitas vinham de cidades distantes da capital.

“Condição social desfavorável, não tem acesso aos exames que a gente precisa, dificuldades de entender o que se passa, por uma má informação nossa e por uma falta de compreensão delas; e persistente, são muito persistentes. [...] apreensão; são mais ansiosas, intranqüilas”.

A deficiência da assistência pré-natal na rede básica foi levantada por muitos profissionais, principalmente em relação à inadequação do diagnóstico e encaminhamento dos casos para a MEJC.

“[...] Com um acompanhamento no serviço básico um pouco precário, isso a gente vê bastante, deixa passar muita... muitas

coisas durante a gestação, principalmente nas pacientes hipertensas e pré-eclâmpsia”.

Serruya et al. (2004)118 evidenciaram baixa qualidade na atenção pré- natal básica segundo critérios mínimos de atendimento. Se estes serviços não estão conseguindo atender a contento nem os procedimentos mínimos do pré- natal de baixo risco, como esperar eficiência no diagnóstico e referência correta dos casos de gravidez de alto risco?

“[...] O pior é quando elas vêm com diagnóstico e não se fez nada [...] sabe o que é, vem convulsionando e não fizeram a medicação da onde veio até aqui. É que você mandou pra cá referenciou pra cá é porque sabe você sabe que tem alguma coisa de...de...errado”.

Os profissionais percebiam estas falhas e muitas vezes recebiam as gestantes no ambulatório ou no internamento com sinais de agravamento da doença e tinham que lidar com situações emergenciais que aumentam tanto o estresse de quem está doente quanto de quem está atendendo. Embora não esteja em discussão a qualidade da atenção básica, vale destacar que boa parte dos profissionais que atende na MEJC também atende em unidades básicas de saúde, da capital e do interior do estado, portanto esta percepção pode servir para uma auto-reflexão.

O edema e a obesidade foram mencionados por alguns profissionais como características típicas das gestantes com pré-eclâmpsia. Excesso de peso foi um problema realmente detectado em mais da metade das gestantes deste estudo. Tal situação requer uma intervenção mais direta e dinâmica e

não apenas pontual, como a que acontece rotineiramente neste serviço, onde o profissional nutricionista espera que o médico encaminhe as gestantes com excesso de peso ao seu consultório. Caso o profissional não encaminhe, a gestante provavelmente ficará sem orientação.

Segundo uma profissional as mulheres comiam em excesso para fugir dos problemas pessoais que as afligiam.

“São obesas, naturalmente, é impressionante porque elas me chegam aqui acima de 100 quilos [...] Então elas são emotivas, elas tem muito medo, porque na verdade a gente sabe que elas usam a comida como uma fuga [...] às vezes briga com o marido, às vezes até a própria vida que elas levam não é satisfatória e a comida é o escape delas”.

Os profissionais percebiam que as gestantes atendidas na MEJC reuniam características que as colocavam em situação de vulnerabilidade social e emocional, que aumentava ainda mais o risco que elas já apresentavam devido à pré-eclâmpsia.