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2.1 EMPREENDEDORISMO: CONCEITOS E FUNDAMENTOS

2.1.2 O empreendedor

2.1.2.2 Características do perfil empreendedor

De acordo com as argumentações de Schumpeter (1982), as ações empreendedoras estão relacionadas às características do indivíduo, aos seus valores e a seu modo de pensar e agir. Com base nas definições do autor, empreendedor é o profissional inovador, que tem a percepção necessária para criar novos mercados, produtos, serviços ou processos, e com seu dinamismo é capaz de aproveitar oportunidades, assumir ricos, sobressaindo-se aos concorrentes. O autor destaca que nem todas as pessoas possuem essas características, mas apenas parte da população. Poucos têm o potencial de percepção das oportunidades e a predisposição para enfrentar os obstáculos decorrentes das práticas diferenciadas (SCHUMPETER, 1984). Drucker (1987) também concorda que o espírito empreendedor não está em todos os empresários ou em todas as organizações, mas é uma característica distinta que somente alguns possuem.

De acordo com Farrell (1993), as qualidades mais consistentes e visíveis do empreendedor são a rapidez de suas ações e a sua habilidade em descobrir novos caminhos, características essas que se tornam a principal ferramenta utilizada por esses profissionais para criar vantagem competitiva.

É crescente o número de estudos realizados visando o entendimento do perfil do empreendedor. Veit e Gonçalves Filho (2008) comentam que as discussões acerca do tema têm ganhado cada vez mais espaço no meio acadêmico e empresarial. Entre esses estudos, Lenzi (2008) realizou um levantamento das características (competências) apontadas pela literatura na definição do perfil dos empreendedores, as quais são apresentadas no Quadro 2, acrescidas de contribuições fornecidas por este trabalho.

AUTOR PRINCIPAIS COMPETÊNCIAS Mill (1848) Tolerância ao risco

Weber (1917) Origem da autoridade formal Schumpeter (1928, 1934, 1942,

1949, 1967, 1982)

Inovação, iniciativa, sonho, criatividade, energia, realização pessoal, poder, mudança

Sutton (1954) Busca de responsabilidade Hartman (1959) Busca de autoridade formal McClelland (1961, 1971,

1973)

Tomador de risco, necessidade de realização, necessidade de afiliação

Davids (1963) Ambição, desejo de independência, responsabilidade e autoconfiança Pickle (1964) Relacionamento humano, habilidade de comunicação, conhecimento

técnico

Palmer (1971) Avaliador de riscos

Hornaday e Aboud (1971) Necessidade de realização, autonomia, agressão, poder, reconhecimento, inovação, independência

Winter (1973) Necessidade de poder Borland (1974) Controle interno

Liles (1974) Necessidade de realização Bruce (1976) Tomada de decisões, risco

Shapero (1977, 1980) Inovação, risco, iniciativa, independência Gasse (1977) Orientado por valores pessoais

Timmons (1978) Autoconfiança, orientado por metas, tomador de riscos moderados, centro de controle, criatividade, inovação

Cantillon ( 1978) Inovação

Sexton (1980) Enérgico, ambicioso, revés positivo

Welsh e White (1981) Necessidade de controle, responsabilidade, autoconfiança, corredor de riscos moderados

Dunkelberg e Cooper (1982) Orientado ao crescimento, profissionalização e independência Pinchot (1985, 1989, 2004) Visão, execução, planejamento

Drucker (1986, 2002) Inovação, iniciativa Filion (1988, 1991, 1993,

1999, 2004) Visão, imaginação, oportunidade, objetivos, criatividade, inovação Cooley (1990) Dedicação pessoal, planejamento e metas, persuasão, independência,

comprometimento, iniciativa

Zahra (1991) Renovação estratégica, novos negócios Cunningham e Lischeron

(1991) Liderança, ação, risco, inovação

Farrel (1993) Visão, valores pessoais, rapidez nas ações, habilidade em descobrir novos caminhos

Spencer e Spencer (1993)

Realização, planejamento, persuasão, autoconfiança, persistência, oportunidades, riscos, qualidade, comprometimento, informações, metas

Cossete (1994) Visão, formulação de estratégias

Miner (1998) Realização, rede de relacionamento, novas idéias, administração Sharma e Chrisman (1999) Criação, inovação

Dolabela (1999) Inovação, criatividade, visão, planejamento, iniciativa, oportunidade Fleury (2000, 2002) Ação, mobilização de recursos, entrega, engajamento,

responsabilidade, visão estratégica Dornelas (2001, 2003)

Decisões adequadas, segurança, oportunidade, criação, iniciativa, inovação, gerenciamento do risco, planejamento, persistência, relacionamentos

Klerk e Kruger (2003)

Inovação, criatividade, visão de futuro, condição de assumir riscos, determinação, valores, adaptabilidade, prontidão, firmeza, ambição, suficiência de capital, recompensa

Santos (2004) Criatividade, inovação, novos negócios

Seifert (2004, 2005) Criatividade, inovação, novos negócios, renovação estratégica Dutra (2004)

Capacidade de inovação, comunicação, liderança, resolução de problemas, direcionamento estratégico, negociação, planejamento, relacionamentos, visão sistêmica, orientação para qualidade

Hisrich e Peters (2004) Segurança, risco

Souza (2005) Inovação, busca de oportunidades, propensão a correr riscos, criatividade

Boava e Macedo (2006) Realização

De Toni et al. (2008)

Características da mentalidade empreendedora: conhecimentos técnicos, habilidades emocionais e carismáticas, utilização da mente e do raciocínio linear, exercício do poder, relacionamento, postura ética e uso da verdade, habilidades estratégicas e visionárias, criatividade e inovação, vocação

Hashimoto (2009) Superação, criatividade, iniciativa, energia, capacidade de gerar valor, compromisso, absorção de risco

Ferreira et al. (2010) Aspectos comportamentais: novidade, organização, criação, criatividade, risco, perseguidor de oportunidades, idealizador

Ferrari (2010) Responsabilidade, transformação da sociedade, influência, iniciativa, oportunidades, riscos calculados, liderança, persuasão

Martineli e Fleming (2010) Propensão a assumir riscos, independência

Teixeira et al. (2011) Persistência, perseverança, determinação, dedicação, comprometimento, paixão pelo trabalho, criatividade, visão de futuro Carvalhal et al. (2012) Identificação de oportunidades, motivação, busca de realização

pessoal e independência financeira

Quadro 2 – Competências empreendedoras e profissionais abordadas por diversos autores

Fonte: Adaptado de Lenzi (2008).

Lenzi (2008) informa que as concepções dos autores constantes no quadro resultam das influências do ambiente disciplinar a partir do qual foram desenvolvidos os estudos de cada um deles, o que justifica as diferenças evidenciadas entre as ideias. A explicação pode ser estendida aos autores agregados ao quadro a partir deste estudo. Contudo, analisando as competências elencadas, observa-se que algumas são comuns a muitos dos autores, destacando-se: visão, criatividade, inovação, independência, confiança e iniciativa.

Para autores como Barreto (1998) e Shane e Venkataraman (2000), os empreendedores conseguem identificar oportunidades em situações que representam riscos e insegurança para outras pessoas, o que demonstra que possuem uma diferente percepção sobre a realidade. Dornelas (2001) afirma que ao se depararem com novas oportunidades os empreendedores tomam decisões adequadas de forma segura e no momento oportuno. Essa segurança faz com que esses profissionais sejam aptos a assumir riscos (HISRICH e PETERS,

2004) e determinados a trocar a estabilidade e a acomodação pela perspectiva de transformar suas ideias em realidade (BOAVA E MACEDO, 2006).

Filion (2004) destaca a criatividade e a inovação como características principais da ação empreendedora e define os empreendedores como os profissionais que utilizam tais potencialidades para desenvolver novos negócios, produtos ou serviços.

Souza (2005) considera que as quatro características mais representativas do conceito de empreendedorismo são o potencial inovador, a busca de oportunidades, a propensão a correr riscos e a criatividade. A partir de seu trabalho, ressalta que a inovação é a característica empreendedora mais abordada pelos autores.

Estudo desenvolvido por De Toni et al. (2008, p. 4-5) buscou evidenciar quais são as características da mentalidade empreendedora que podem determinar o comportamento do empreendedor de sucesso. De acordo com o trabalho, são nove as possíveis dimensões de influência, a saber:

(i) conhecimentos de ordem técnica e material; (ii) habilidades emocionais e carismáticas; (iii) a forma de utilização da mente e do raciocínio linear; (iv) crenças sobre o exercício do poder; (v) habilidades de relacionamento; (vi) postura ética e de uso da verdade; (vii) habilidades estratégicas e visionárias; (viii) criatividade [e inovação]; e (ix) vocação.

A propensão dos empreendedores a assumir riscos se relaciona com seu sentimento de independência, o que demonstra que os indivíduos que se arriscam mais no mundo dos negócios são aqueles mais independentes (MARTINELI e FLEMING, 2010). Essa característica, somada à sua criatividade, energia e capacidade de superação, instrumentaliza o empreendedor a gerar valor para a sociedade (HASHIMOTO, 2009) e a transformá-la através de sua iniciativa e de seu poder de influência e persuasão (FERRARI, 2010).

No campo dos riscos assumidos, Ferreira et al. (2010) comentam que os empreendedores se arriscam em aspectos financeiros, sociais e/ou psicológicos/emocionais, devido aos negócios que desenvolvem através das oportunidades que perseguem. O autor também destaca aspectos comportamentais do empreendedor, como a novidade, a organização, a criação, a criatividade.

Outra marca da ação empreendedora é a busca pela qualidade, a qual deve estar presente em todas as fases do processo organizacional, desde o planejamento até a execução, uma vez que impacta em eficiência na utilização de recursos humanos, materiais e financeiros e na eficácia no alcance dos objetivos organizacionais (SALOMON e ROSEMBROCK, 2010).

O estudo sobre o perfil empreendedor, a partir da revisão dos diversos autores, evidencia que muitas das características apresentadas pela literatura são comuns entre os diferentes trabalhos. Contudo, cada autor em suas argumentações enfatiza apenas algumas delas, não existindo um modelo consensual sobre o tema. Sobre isso, Filion (1999) comenta que apesar dos estudos sobre as características empreendedoras ter se iniciado no séc. XIX, ainda existe a dificuldade em delimitar cientificamente o perfil empreendedor. Tal fato se deve à dinâmica da sociedade e da economia, que a cada geração apresenta novos fatores de influência à composição desse perfil. Souza (2005) também considera que o contexto de cada época influencia no comportamento dos empreendedores e afirma que, embora os estudos sobre empreendedorismo tenham se expandido por inúmeras áreas, como a social, a econômica, a política e a comportamental, não existe continuidade e unidade entre as diversas pesquisas realizadas sobre o tema. Yeung (2009) destaca que a literatura ainda não apresenta definição precisa para empreendedor e empreendedorismo e Martineli e Fleming (2010), no mesmo sentido, afirmam que ainda não existem instrumentos válidos capazes de mensurar quantitativamente o perfil empreendedor.

Finalmente, destaca-se que as discussões acerca do perfil empreendedor estão predominantemente focadas no indivíduo, uma vez que as características empreendedoras estão, em sua essência, a ele associadas. Todavia, essas características também podem ser analisadas a partir da organização. Para Drucker (1987) indiferentemente se o empreendedor é um indivíduo ou uma organização, os princípios empreendedores são os mesmos. E, analisando o empreendedorismo a partir do enfoque organizacional, o autor afirma que “não faz diferença alguma se o empreendedor é uma empresa ou uma organização de serviço público sem fins lucrativos, nem sequer se o empreendedor é uma instituição governamental ou não-governamental” (DRUCKER, 1987, p. 199). Em todos esses casos, as características empreendedoras podem ser trabalhadas e os princípios inerentes ao conceito aplicados, devendo ser observadas as particularidades de cada contexto.

Contudo, uma organização se torna empreendedora a partir das ações desenvolvidas pelas pessoas que nela atuam. Portanto, trabalhar o empreendedorismo a partir do contexto organizacional não significa focar exclusivamente em processos e atividades, deixando em segundo plano os profissionais que desenvolvem tais rotinas. São as pessoas que inovam em uma organização. Mesmo pensando o empreendedorismo a partir do enfoque organizacional, o motor propulsor das inovações continua sendo os profissionais empreendedores.

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