Ainda que os traços gerais se assemelhem, as espécies de rinoceronte existentes no
continente africano diferem fenotipicamente em algumas características, assim como diferem
as suas preferências por habitat e os seus hábitos sociais. Para não tornar esta secção
demasiado extensa, optei por descrever apenas algumas das características mais evidentes:
cor, tamanho, forma dos lábios, tamanho dos cornos e hábitos sociais. A cor do rinoceronte
branco é cinzento claro, enquanto a coloração do rinoceronte preto é cinzento acastanhado
escuro, podendo haver variações de tonalidade em ambas as espécies, sendo que este não é
um factor fiável para a sua distinção. Os nomes foram utilizados pela primeira vez no início
do século XIX , contudo a origem de ambos ainda carece de explicação comumente aceite (L.
C. Rookmaaker 2003).
O rinoceronte branco é marcadamente maior que o preto, pesando 3200 a 3600Kg
(Colin P Groves 1972), enquanto o rinoceronte preto pesa cerca de duas toneladas. Em ambas
as espécies existe dimorfismo sexual, sendo a fêmea relativamente mais pequena do que o
macho. Uma das principais diferenças entre as duas espécies é a conformação dos lábios: os
estreitos e pontiagudos, assemelhando-se a sua conformação a um gancho. Esta diferença é
justificada pelos diferentes hábitos de alimentação de ambas as espécies: o rinoceronte branco
alimenta-se de pasto em planícies pouco arborizadas, tendo uma vantagem em ter os lábios
mais largos para possibilitar a preensão de grandes quantidades de erva (Colin P Groves 1972;
Pienaar 1994); por sua vez, o rinoceronte preto prefere habitats com um coberto vegetal
arbóreo e arbustivo denso, onde se alimenta de folhas, galhos e rebentos de várias plantas
arbustivas e árvores, e daí a conformação dos lábios mais adequada ser em forma de gancho
para lhe permitir escolher as partes vegetais preferidas (Buk 2010; Malan et al. 2012). Em
relação aos cornos, também existem algumas diferenças evidentes. O Rinoceronte branco
apresenta o corno cranial marcadamente maior em relação ao caudal; enquanto no rinoceronte
preto ambos os cornos apresentam um tamanho semelhante. O rinoceronte branco está
descrito como sendo um animal sociável e pacífico que normalmente vive rodeado de mais
alguns membros da mesma espécie, formando grupos que podem exceder uma dezena de
indivíduos (Pienaar 1994). O rinoceronte preto é um animal solitário e tendencialmente
agressivo, sendo que, das únicas vezes que são avistados em grupo, normalmente estes são
constituidos pela mãe com a respectiva cria ou um macho e uma fêmea (quando em estro)
(Adcock 1994).
Factores como a destruição de habitat e conflitos políticos entre os países africanos têm
tido um papel importante no declíneo de muitas espécies, contudo, no caso do rinoceronte, a
principal causa que está a levar à extinção é o seu abate furtivo (Beech e Perry 2011; Maggs e
Greeff 1994; Lockwood 2010). Para além do homem, este animal não tem predadores naturais
no seu estado adulto, ainda que exista a ameaça de ser depredado, enquanto cria, por leões ou
acções furtivas para que lhes sejam retirados os cornos. Ao contrário dos cornos de outros
mamíferos, os de rinoceronte são estruturas constituídas por filamentos de queratina
compactados que se destacam da epiderme do animal. Estes não possuem uma projecção
óssea no seu interior (West, Heard, e Caulkett 2007) e o seu valor no mercado ilegal
ultrapassa o valor do ouro. O corno de rinoceronte é utilizado de duas formas distintas: no
Médio-Oriente, onde possui um valor cultural quando incrustado em cabos de adagas; e na
Ásia, nomeadamente na China e no Vietname, pelas inúmeras propriedades medicinais que
lhe são atribuídas, cujos primeiros registos datam de há cerca de dois milénios atrás em
compêndios de medicina asiática. Já foram feitos estudos que comprovam o efeito anti-
pirético como sendo uma das propriedades do corno de rinoceronte, ainda que quando
administrado em grandes quantidades (But, Lung, e Tam 1990), sendo que as outras
propriedade medicinais atribuídas ainda não foram confirmadas.
Têm vindo a ser desenvolvidas estratégias no sentido de maximizar a eficácia dos
esforços empregues no combate ao furtivismo, no sentido de prestar uma vigilância
particularmente especial aos indivíduos destas espécies, reforçando o patrulhamento das áreas
onde ainda existem (Ferreira et al. 2012; Patton 2013). Todos os recursos despendidos nesta
causa levaram a uma especialização das unidades anti-furtivismo no sentido de reforçar as
estratégias de segurança aplicadas às áreas de conservação, contudo toda a logística associada
às acções furtivas também tem evoluído consideravelmente. Hoje em dia a rede furtiva está
completamente dispersa pela sociedade envolvente abrangendo desde as camadas mais
desfavorecidas da população local (trabalhadores dos empreendimentos turísticos), indivíduos
especializados nas acções de conservação da natureza (tais como veterinários, ecologistas,
e Greeff 1994). As redes furtivas de tráfico de corno de rinoceronte cada vez mais recorrem à
alta tecnologia tais como o uso de helicópteros, aparelhos de visão nocturna, armas de grande calibre e mesmo sistemas de contenção química, o que leva ao aumento da sua eficácia e consequentemente ao aumento do número de animais abatidos (Montesh 2012).
O número de rinocerontes abatidos furtivamente nos últimos anos foi: 333 em 2010,
448 em 2011, 668 em 2012. Até ao dia 5 de Setembro de 2013 foram reportados 618
rinocerontes abatidos furtivamente («Minister Molewa commends law enforcement agencies
for work well done in the fight against rhino poaching | Department of Environmental
Affairs» 2013).
Apesar de nos últimos anos o abate furtivo ter sido crescente, colocando ambas as
espécies sob uma pressão antropogénica constante, a população de rinocerontes africanos no
estado selvagem evidenciou um aumento. Uma das últimas estatísticas, efectuada em
Dezembro de 2012, indica que o número de rinocerontes brancos do sul (Ceratotherium
simum simum) passou de 17475 (em 2007) para 20165 indivíduos; enquanto a população de
rinocerontes preto (Diceros bicornis spp.) aumentou de 4230 (em 2007) para 4880 indivíduos
(R. Emslie 1999; R. H. Emslie, Milliken, e Talukdar 2012).
Para além do aumento dos serviços de vigilância e segurança, também têm sido
aplicadas outras medidas nos esforços de preservação da espécie, tais como:
-remoção cirúrgica dos cornos por especialistas (Milner-Gulland 1999);
-injecção do corno com substâncias tóxicas (para que o consumidor seja afectado
PINK to keep poachers away in revolutionary scheme in South Africa» 2013);
-tentativas de legalizar o comércio do corno sob normas pré-definidas (de modo a ter
mais controlo sobre o mercado) (Loon 1997; Biggs D 2013; Ferreira S.M e Okita-Ouma B
2012);
-campanhas de sensibilização em comunidades locais e estabelecimentos de ensino
(«STOP RHINO POACHING NOW!» 2013).
As acções furtivas têm-se tornado cada vez mais frequentes, sendo practicamente
imprevisível a sua evolução nos próximos anos. Têm vindo a ser empregues medidas com o
objectivo de atenuar o impacto furtivo, contudo o panorama geral não se mostra promissor
quanto ao futuro de ambas as espécies de rinoceronte africanas, ainda que as respectivas
populações tenham evidenciado um ligeiro aumento nas últimas décadas. Não parece haver
indícios de que haja uma preferência pelos consumidores quanto à espécie, sendo que os
cornos de ambas atingem um elevado valor no mercado negro. Para além disso, já foi
reportado que até os rinocerontes aos quais o corno foi removido cirurgicamente podem ser
abatidos furtivamente para que lhes seja retirada a base do corno (deixada para que seja
possível o crescimento deste), sendo que ainda não foi encontrado o conjunto de medidas
mais adequadas à protecção desta espécie (R. Emslie 1999; Beech e Perry 2011; Milner-