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Características Regionais da Baía de Guanabara e sua Poluição Antropogênica Crônica

Aspectos Teóricos e Revisão da Literatura

Capítulo 3 Área de Estudo

3.1. Características Regionais da Baía de Guanabara e sua Poluição Antropogênica Crônica

A Baía de Guanabara está localizada na região costeira do Estado do Rio de Janeiro, entre 22°40’ e 23°00’ de latitude e 043°00’ e 043°18’ de longitude e abrange diretamente 8 municípios dispostos ao longo de seu contorno: Rio de Janeiro (inclusive Ilha de Paquetá), Duque de Caxias, São João de Meriti, Magé, Guapimirim, Itaboraí, São Gonçalo e Niterói. Já a sua bacia de drenagem (Figura 3.1) possui uma área de 4080 Km2 (Kjerfve et al., 1997) e é composta por 15 municípios, contando também com Belford Roxo, Nilópolis, Tanguá, Nova Iguaçu, Cachoeiras de Macacu, Rio Bonito e Petrópolis.

A Baía de Guanabara possui atualmente uma área superficial de aproximadamente 400 Km2, uma linha de costa de 156 Km e profundidade variável, chegando até 50 metros na área do canal central. A baía apresenta 46% de sua área, principalmente ao longo de seu contorno em profundidade abaixo de 5 metros (linha tracejada na Figura 3.2) e uma variação de maré até 1,2 metros. É uma baía tipicamente de baixa energia, podendo ser dividida em três áreas: zona externa influenciada pela ação das ondas e correntes de maré; zona interna caracterizada por baixa energia (mais influenciada pelos ventos); e uma área de transição (Batista Neto et al., 2006). Apesar disso, a média da taxa de renovação de água da baía (50% de seu volume) é significativa, cerca de 11 dias (Kjerve et al., 1997).

Figura 3.2. Características socio-fisico-econômica da Baía de Guanabara. Ilha de Paquetá

Polo Petroquímico

Ilha Governador

A granulometria do sedimento da Baía de Guanabara varia de areia grossa a argila, com teores de carbono orgânico na faixa de 2% a 6% (Mendonça Filho et al., 2003, Batista Neto et al., 2006). A entrada da baía e a área do canal principal até a ponte Rio-Niterói são constituídas de areia grossa à muito fina e é uma região que está sujeita às ações intensas de ondas e correntes de maré. A partir da região do Aeroporto Santos Dumont, a baía se alarga e a velocidade das correntes diminuem, acarretando a deposição de sedimentos finos nos dois lados do canal. Estes sedimentos contêm até 2% de carbono orgânico e são caracterizados pela presença de silte e argila. As regiões central e norte da baía são mais rasas e mais protegidas das ações de ondas e correntes, apresentando baixa energia hidrodinâmica. O sedimento lamoso é constituído de, predominantemente, silte e argila, e possui carbono orgânico na faixa de 4 a 6% (Batista Neto et al., 2006). Este alto teor de carbono orgânico é resultado da elevada produtividade da água desta região da baía (produção primária líquida de 0,17 mol C m-2 dia-1 segundo Rebello et al., 1986) e do grande aporte de despejos domésticos não tratados, correspondendo a uma introdução anual de 3,2x109 mol P e 6,2x1010 mol N na baía (Wagener, 1995). Resultante da intensa atividade microbiológica local, o sedimento da baía apresenta um predomínio de matéria orgânica amorfa (Mendonça Filho et al., 2003).

Dados da literatura científica indicam uma divisão da Baía de Guanabara em quatro a cinco regiões com níveis de poluição distintos para suas águas e sedimentos (Batista Neto et al., 2006). A área noroeste da baía e a área portuária do Rio de Janeiro, onde deságuam os rios mais poluídos, depositários dos rejeitos da região mais urbanizada e industrializada, registram as maiores concentrações de poluentes, no caso, metais. A região nordeste da baía, que conta em seu contorno com uma área de manguezal mais preservado (Área de Proteção Ambiental de Guapimirim desde 1984 – Amador, 1997), apresenta menor nível de poluição por metais que área noroeste, apesar da semelhança destas áreas em termos granulométricos e hidrodinâmica. Na entrada da baía (região sul), que apresenta sedimentos arenosos e alta energia hidrodinâmica, a concentranção de metais é baixo. Na região de transição, entre as regiões nordeste, noroeste e sul da baía, a poluição por metais é variável (Batista Neto et al., 2006).

A região norte/nordeste da Baía de Guanabara conta com uma área de manguezal remanescente de cerca de 82 Km2 (Amador, 1997), dos quais 65 Km2 estão localizados dentro da “Área de Proteção Ambiental” (APA) de Guapimirim (Bentz, 2002) O delineamento das regiões de manguezais na baía está ilustrado na Figura 3.2. A superfície atual de manguezais na Baía de Guanabara corresponde a apenas 31% da área original existente no ano de 1500 (262 Km2), tendo passado por sucessivos processos de destruição pela ocupação humana (Amador, 1997). O desmatamento e a invasão imobiliária descontrolada dos últimos 100 anos tem contribuído para a constante modificação dos ecossistemas da baía, aumentando os fluxos dos rios e a elevação das taxas de sedimentação e transporte para a baía, hoje na faixa de 1 a 2 cm ano-1 (Godoy et al., 1998). Na região rasa norte/nordeste da baía, encontram-se distribuídos cerca de 350 currais de peixe que compõem um dos artefatos de pesca da comunidade pesqueira artesenal da Baía de Guanabara.

A ampla região de drenagem da Baía de Guanabara abriga cerca de dez milhões de habitantes, o equivalente a 80% da população do estado e apresentou no período 1980 a 1991, a maior taxa de crescimento do país (JICA, 1994). Cerca de 55 rios e riachos deságuam na baía numa taxa de aproximadamente 350 m3/s (Amador, 1997), com alta contribuição de efluentes domésticos brutos ou parcialmente tratados, águas pluviais e efluentes industriais de mais de 14.000 estabelecimentos industriais. Com isto, a introdução de carga orgânica na baía situa- se na faixa de 465 toneladas/dia, onde 17 m3 s-1 correspondem a efluentes domésticos (Feema, 2006).

O aporte dos hidrocarbonetos na baía, considerando-se todas as fontes (transporte de produtos de petróleo, deposição atmosférica dos produtos de combustão incompleta de combustível fóssil automotivo e industrial e escoamentos de rejeitos domésticos e industriais), encontra-se em torno de 6588 toneladas/ano. A contribuição de escoamento de rejeitos municipais é responsável pelo maior aporte de hidrocarbonetos para a baía e encontra-se em torno de 3770 toneladas de hidrocarboneto/ano (50% do total), seguido do escoamento urbano (runoff) com 1802 toneladas de hidrocarbonetos/ano (27%), enquanto a contribuição das refinarias é de 460 toneladas de hidrocarbonetos/ano (7%) (Ferreira, 1995).

Atualmente, após instalação de um sistema de recirculação e reuso da água de refrigeração da refinaria Duque de Caxias, esta contribuição é menor que a reportada por Ferreira em 1995 (Revista Alpina em Ação, 2004). A Figura 3.2 ilustra os pontos de escoamento de esgoto doméstico e industrial da Baía de Guanabara.

Os efluentes industriais que chegam à baía são compostos de inúmeros tipos de poluentes, inclusive aqueles de características persistentes e extremamente tóxicas como bifenilas policloradas (PCBs), pesticidas, compostos de estanho (TBT), entre outros. Das 13.000t/dia de lixo sólido oriundas da região do Grande Rio, 8.000 são encaminhadas para o aterro de Gramacho, localizado próximo à margem da baía, sendo um foco de contaminação do solo e poluição das águas superficiais e subterrâneas (Feema, 2006). As demais 5.000 t/dia de lixo, constituídas dos mais diversos tipos de materiais (televisores, sofás, colchões, sacos plásticos, garrafas PET, dentre outros) são dispersas na bacia de drenagem da baía.

Vale ressaltar que já no final do século XIX, já eram reportados problemas com relação à descarga de esgotos domésticos in natura na baía e sinais de poluição industrial, particularmente associada às atividades da indústria naval e têxtil. Finalmente, os maiores níveis de degradação ambiental são encontrados no século XX, a partir da Primeira Guerra Mundial, e, mais recentemente, a partir dos anos 50-60, quando ocorreu um crescimento exponencial da população, sem o devido acompanhamento de infra-estrutura urbanística e sanitária básica. Este processo foi acompanhado por aterros sucessivos na linha de costa da baía e um desmatamento desordenado de seus bosques de manguezais. Nesta ocasião consolida-se o parque industrial do Rio de Janeiro, que se estende pela região periférica da Baía de Guanabara (Pereira, 1996; Amador, 1997). A baía é atualmente um retrato de um processo crescente de degradação ambiental que, no entanto, tem demonstrado surpreendentemente, grande resiliência (Mayr, 1998).

Compõem também o ecossistema da baía a presença de dois aeroportos, 14 terminais marítimos de carga e descarga de produtos oleosos, dois portos comerciais, diversos estaleiros, um grande número de embarcações de transporte de passageiros, embarcações de pesca e iates, duas refinarias de petróleo, mais de

mil postos de combustíveis e uma intrincada rede de transporte de matérias-primas, combustíveis e produtos industrializados permeando zonas urbanas altamente congestionadas (FEEMA, 2006; SEMA et al, 1998). O porto do Rio de Janeiro é o segundo maior do Brasil, onde mais de 2000 navios comerciais atracam por ano.