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Caracterização da Fase Orofaríngea da Deglutição

5 DISCUSSÃO

5.4 Caracterização da Fase Orofaríngea da Deglutição

Cada vez mais a fonoaudiologia tem se dedicado ao estudo dos distúrbios da deglutição e o principal instrumento utilizado é a avaliação clínica (VALE-PRODOMO; CARRARA-de ANGELIS; BARROS, 2010).

Assim, este trabalho buscou inicialmente, realizar a avaliação clínica fonoaudiológica do sistema sensório motor oral dos indivíduos e da função de deglutição, como forma de caracterizar a deglutição orofaríngea.

A avaliação clínica deve ser objetiva, segura e responder a alguns questionamentos. O primeiro deles é se realmente existe um distúrbio de deglutição (VALE-PRODOMO; CARRARA-de ANGELIS; BARROS, 2010). No caso da aerofagia e eructação, acredita-se que os pacientes geralmente não apresentem queixas relacionadas à deglutição. Não há estudos sobre a avaliação clínica fonoaudiológica em pacientes com eructação.

O questionário de investigação da alimentação e deglutição demonstrou que, quanto às ocorrências na alimentação, apenas 2 pacientes referiram tosse em algum momento. Quanto a fatores que dificultam a deglutição, 4 disseram que a consistência sólida é pior; 2 referiram que comer rápido demais altera o processo e 5 referiram a eructação como uma dificuldade. Nenhum sujeito do grupo controle referiu ocorrências ou fatores que dificultassem a deglutição.

Durante a avaliação clínica é importante ajudar o paciente a perceber modificações que possam ter ocorrido, voluntária ou involuntariamente, como formas compensatórias. Deve-se, por exemplo, investigar mudanças na seleção dos alimentos em relação à consistência, tamanho e temperatura, o tempo gasto com cada refeição (SANTINI, 1999).

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É importante destacar que, quando questionados inicialmente sobre sintomas disfágicos, os pacientes negaram dificuldades. Porém, quando estes sintomas foram mais detalhados pela pesquisadora, as alterações se evidenciaram. O fonoaudiólogo deve direcionar seus questionamentos, buscando detectar presença de engasgos, tosse, pigarros, sensação de alimento parado, entre outras (VALE-PRODOMO; CARRARA DE ANGELIS; BARROS, 2010). Neste estudo foi importante o detalhamento dos sintomas uma vez que a queixa principal não era disfagia. Um estudo correlacionou as queixas de eructação com disfagia e menos de 10% dos pacientes com eructação referiram sintomas disfágicos (CHITKARA et al., 2005).

Embora a deglutição seja definida por alguns autores como uma função, sua característica está em iniciar o processo digestivo, devendo, portanto ser definida como processo que se caracteriza por conduzir o alimento da boca ao estômago por meio de fases que se interrelacionam (SILVA, 1999). O termo disfagia significa dificuldade em deglutir. Pode resultar de alteração anatômica ou de comprometimento neuromuscular, em qualquer local entre os lábios e o estômago. Também pode ser conceituada como a manifestação clínica que se revela quando ocorre algum comprometimento na deglutição e pode estar relacionada a uma fase isoladamente ou a todas, conjuntamente (MACEDO FILHO, 2005).

A deglutição é, portanto, uma sucessão de fenômenos interrelacionados em que as fases presentes não são acontecimentos isolados, mas sincrônicos (SILVA, 1999).

A literatura refere correlação entre queixas disfágicas e esofágicas: estas podem revelar-se de diversas formas, como dor no peito, sensação de alimento parado, regurgitação, tosse/engasgos ou algum outro tipo de desconforto (SANTINI, 1999).

Clinicamente as disfagias orofaríngeas podem manisfestar-se por meio de uma série de sintomas como: distúrbios na mastigação, dificuldade em iniciar a deglutição, regurgitação nasal, controle de saliva diminuído ou tosse e/ou engasgos durante as refeições (SANTINI, 1999).

Dificuldade em iniciar a deglutição, tosse e engasgos indicam dificuldade na fase faríngea. O relato de tosse predominantemente noturna, associada à sensação de bolo na garganta, pode indicar refluxo gastroesofágico. A percepção

da não progressão do bolo alimentar pode estar associada também à obstrução do trânsito, de causa não neurológica, como tumor, divertículo de Zenker e osteófitos cervicais, entre outras causas (ALVES, 2003).

A queixa de dificuldade inicial com sólido, progredindo para pastosos e líquidos, pode indicar diminuição do diâmetro da luz esofágica causada por obstrução intrínseca ou extrínseca (LORENS et al., 1993).

Apesar dos sintomas serem esporádicos é importante acompanhar tais pacientes. É necessário dizer que todos eles encontravam-se em acompanhamento médico no Ambulatório de Gastroenterologia do hospital ou outro local.

A referência à presença de eructação como fator que dificulta a deglutição orofaríngea é relevante. Nota-se que na fase oral propriamente dita, ocorre a propulsão do alimento; o bolo ou a língua tocam o pilar anterior das fauces e deflagra o reflexo de deglutição, sendo este um momento de transição entre a fase oral, voluntária, e faríngea, involuntária. Inicia-se a fase faríngea, com o fechamento do esfíncter velofaríngeo, direcionamento do bolo para a faringe e iniciados os mecanismos de proteção das vias aéreas inferiores: elevação da laringe e coaptação das pregas vocais e ariepiglóticas. Depois este bolo é direcionado para a região do esfíncter esofágico superior, onde ocorre o “relaxamento” deste e passagem do bolo para a fase esofágica (SILVA, 1999). Portanto, se durante esse processo, as eructações ocorrerem, realmente poderão dificultar principalmente a fase oral, tendo o paciente que esperar para reiniciar a mastigação ou para reintroduzir o alimento na cavidade oral.

A função normal da faringe e do esôfago envolve interações entre estas duas estruturas. Um sistema conceitual útil para considerar estas interações é o transporte do bolo alimentar. Em tal estrutura, a faringe e o esôfago podem ter, em determinado tempo, papéis ativos e passivos no transporte. Por exemplo, durante o transporte ativo do bolo pela faringe, contrações do esôfago são inibidas. Sendo assim, o esôfago serve como um condutor passivo para receber o bolo da faringe. Similarmente, o tônus do esfíncter superior é inibido para permitir a ventilação retrógrada da deglutição de ar que passa do estômago para o esôfago (MASSEY, 1995), ou seja, da eructação gástrica. Possivelmente, o mesmo processo ocorra com as eructações supragástricas.

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Um estudo realizado em 1995 (DUA et al.) observou o mecanismo de fechamento nasofaríngeo e sua relação temporal com outros eventos biomecânicos durante a deglutição e eructação através de três exames: videoendoscopia, videofluoroscopia e manometria. Eles concluíram que o mecanismo de fechamento nasofaríngeo durante a deglutição e a eructação são diferentes. Durante a deglutição, o fechamento tem dois níveis: elevação palatal e adução do músculo faríngeo superior, durante a eructação somente a elevação palatal ocorre; também concluíram que o fechamento nasofaríngeo é rigorosamente coordenado com outros eventos biomecânicos durante a deglutição e eructação. Portanto, deglutição e eructação, apesar de envolverem mecanismos diferentes de fechamento nasofaríngeo, tem razão em ser estudados por fonoaudiólogos, por englobar estruturas e funções presentes na prática desses profissionais.

Iniciada a deglutição a faringe sofre reconfiguração, transformando-se de via aérea em digestiva (COOK; KAHRILAS, 1999; KAHRILAS et al., 1996). Mecanicamente ocorrem uma série de eventos sincronicamente coordenados, que envolvem: elevação e retração do véu palatino, com o fechamento da nasofaringe; abertura do esfíncter superior do esôfago; fechamento laríngeo no nível do vestíbulo laríngeo; elevação posterior da língua com abertura da junção glossopalatal; propulsão da língua e contração da faringe com depuração faríngea (MACEDO FILHO, 2003).

No momento em que ocorre a ação dos músculos supra-hióideos, que elevam e anteriorizam o hióide, ocorre fechamento das pregas vocais no plano da glote e posterior fechamento das bandas vestibulares, o qual segue-se pela passiva abertura do esfíncter superior do esôfago, que dura menos de um segundo, para a passagem do bolo, período que se segue pela abertura vestibular e posteriormente pela adução das pregas vocais, terminando assim a reconfiguração faríngea (SHAKER et al., 1994).

Quanto à avaliação do sistema motor oral, os sujeitos dos dois grupos não apresentaram alterações. O grupo de pacientes com queixas de eructação excessiva não apresentou alterações quanto à mobilidade e sensibilidade de órgãos, início voluntário da deglutição e elevação laríngea. Tais resultados não foram antes descritos na literatura.

Na avaliação da deglutição orofaríngea com introdução de alimento, também não foram observadas alterações, somente a presença de eructação, principalmente pós-prandial, no grupo dos queixosos.

É de competência e dever do fonoaudiólogo traduzir os dados da avaliação clínica, muitas vezes, empírica e subjetiva, em respostas objetivas e com embasamento científico (VALE-PRODOMO; CARRARA-de ANGELIS; BARROS, 2010).

Segundo Alves (2003) a avaliação funcional permite-nos identificar as dificuldades apresentadas no processo da deglutição, a presença ou o risco de penetração e/ou aspiração do alimento deglutido, determinar as causas de dificuldade, se houver. O que avaliar, por que e como é o fundamental e fator determinante para diagnóstico preciso, condutas terapêuticas adequadas e prognóstico confiável.

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