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Caracterização da Loja do Cidadão

PARTE II – Estudo Empírico

Capítulo 6 – O Caso da Loja do Cidadão

6.2. Caracterização da Loja do Cidadão

A estrutura das Lojas do Cidadão centra-se, essencialmente, em torno de três ideias- chave: velocidade de resposta, qualidade do serviço e relação com o cliente, pondo a tónica na satisfação do utente e não no custo, pretendendo ser “um novo modelo” de “relacionamento da Administração Pública com o administrado”, no sentido de avançar para “uma maior desburocratização, racionalização e simplificação de estruturas e procedimentos administrativos, apontando para uma Administração Pública moderna ao serviço das pessoas, com vista a satisfazer as expectativas da sociedade, garantindo aos cidadãos e agentes económico maior atenção, maior comodidade, maior participação e audição, informação célere e precisa” (preâmbulo da Resolução do Conselho de Ministros nº 176/97, que autorizou uma equipa de missão a planear e colocar em funcionamento o projecto da Loja do Cidadão).

A Loja do Cidadão surge no final dos anos 90, inspirada numa experiência bem sucedida no Estado brasileiro da Bahia (“Poupa Tempo”), tendo sido adaptada à

sociedade portuguesa. Na prática, a Loja do Cidadão é um serviço de interesse público que segue a lógica dos centros comerciais, onde o cidadão/utente pode encontrar num só espaço, amplo e moderno, uma considerável variedade de serviços com grande importância no seu quotidiano, procurando tornar a vida mais fácil para quem usa os serviços públicos2. Na verdade, todas as partes envolvidas beneficiam deste modelo de distribuição de serviços públicos. Por um lado, o cidadão economiza tempo e dinheiro, evitando múltiplas deslocações na cidade, sem ter que incorrer em custos adicionais, pois os serviços são os mesmos a que recorre nos outros locais, sem taxas acrescidas. Por outro lado, está agora mais próximo da Administração e sente-se mais familiarizado com o exercício e reconhecimento da sua cidadania. Por seu turno, a Administração consegue racionalizar os seus recursos, uma vez que as organizações prestadoras poderão partilhar certas infra-estruturas (zonas de refeição, parqueamento e ainda fotocópias, telecomunicações, etc.) e, simultaneamente, vê a sua imagem melhorada junto de público em geral. A entidade gestora da Loja – o Estado – garante uma diminuição significativa de custos de funcionamento, nomeadamente com o património (seja aluguer ou investimento directo nas instalações), equipamentos e recursos humanos. Por último, o funcionário público vê o seu trabalho mais estimulado, qualificado e dignificado.

Este centro de atendimento pretende modernizar a Administração Pública, através da melhoria da qualidade dos serviços prestados ao cidadão, num ambiente de maior conforto, comodidade e acessibilidade, promovendo o atendimento personalizado e a avaliação da qualidade do serviço pelo próprio utente. Por outro lado, assenta numa gestão baseada em parcerias, entre entidades públicas, e também com serviços do sector privado, sendo, também nessa medida, um factor de inovação e indução da modernização da Administração Pública, e introduziu de forma mais consistente e pronunciada a utilização das novas tecnologias da informação e comunicação, bem como novos procedimentos e práticas de trabalho. Estas novas tecnologias asseguram o acesso a bases de dados, disponibilizando aos funcionários informação actualizada e precisa e permitindo ainda, à medida que são desenvolvidas aplicações mais complexas e interactivas, economizar recursos, dado que os formulários passam gradualmente a ser

electronicamente preenchidos, eliminando a duplicação de trabalho com a introdução posterior dos dados no sistema.

Assim, decorridos dezoito meses de trabalho, a equipa de missão responsável pela cooperação com o Estado da Bahia com vista à implementação da Loja do Cidadão pôs em funcionamento a primeira Loja, no dia 27 de Abril de 1999. Foi, assim, inaugurada a Loja das Laranjeiras, em Lisboa. Desde então mais dez Lojas foram criadas nos principais centros urbanos do país, perfazendo actualmente um total de onze Lojas – Açores, Aveiro, Braga, Coimbra, Laranjeiras, Madeira, Odivelas, Porto, Restauradores, Setúbal e Viseu. Está prevista para muito breve a abertura da Loja de Faro, que, à semelhança da de Odivelas, a mais recente do conjunto acima enunciado, inaugurada no final de 2007, terá uma lógica de funcionamento um pouco distinta, como explicamos mais adiante.

Algumas das Lojas funcionam em edifícios próprios, outras em instalações arrendadas. Em todos os casos procurou-se criar um espaço amplo e moderno, com um lay-out interior circular para maior facilidade e comodidade dos utentes. Muito embora nem todos os serviços públicos estejam representados nas Lojas, nomeadamente por motivos relacionados com alguma resistência à mudança, foi estabelecido um importante conjunto de parcerias com entidades públicas presentes nas Lojas, que gerem as condições, processos e colaboradores, estando ainda representados alguns serviços de carácter privado, de utilidade pública. Actualmente, existe um total de 910 serviços disponíveis, subdivididos por diversas categorias, das quais se destacam as seguintes: água, electricidade, gás e telefones; bancos; certidões e registos; correio; documentos pessoais; impostos; relações laborais e formação profissional; segurança social; saúde; serviços para funcionários públicos transportes; comunicações; serviços para estrangeiros. Assim, as Lojas do Cidadão integram um vasto conjunto de serviços públicos, mas também disponibilizam serviços prestados por entidades privadas (nomeadamente utilities, banca e telecomunicações). Acresce que a utilização extensiva das TIC permite a execução de opções até há bem pouco tempo vedadas à maior parte dos balcões tradicionais.

A proporção dos atendimentos nas Lojas é de cerca de 60% para os serviços públicos, 38% para as entidades privadas e os restantes 2% dizem respeito a atendimentos efectuados pelo Posto de Atendimento Múltiplo (PAM). Do conjunto dos serviços públicos, a Segurança Social, os Impostos e Serviços de Identificação Civil perfazem a maioria dos atendimentos (51%). No que diz respeito ao tipo de serviços prestados, a solicitação de informação representa cerca de 20% dos atendimentos das Lojas do Cidadão. Complementarmente, são ainda oferecidos serviços de apoio, como cafetaria, caixas ATM’s, serviços de fotografias e fotocópias, parques de estacionamento e, em alguns casos, parques infantis.

Para maior conveniência do utente, nas Lojas de maior afluência foi desenvolvido um projecto de carácter transversal, o Posto de Atendimento Múltiplo, que consiste na instalação de um ponto único de contacto nas Lojas do Cidadão onde, por recurso a atendimento personalizado, é possível solicitar e obter alguns serviços de entidades que não estão presentes nas Lojas do Cidadão, sendo igualmente possível proceder à alteração de morada junto de diversas entidades, num só acto. Podemos considerar que foi o primeiro projecto de balcão multi-serviços nas Lojas do Cidadão. Em todas as Lojas existe também uma recepção genérica de encaminhamento (Balcão de Informação), onde os funcionários informam sobre a disponibilidade e localização dos serviços pedidos. Por outro lado, dadas as preocupações com a acessibilidade, disponibilizou-se um balcão exclusivo ao atendimento a deficientes motores, onde poderão ser encaminhados com prioridade para os serviços que procuram. Instalou ainda um elevador para sua exclusiva utilização e construíram-se rampas em alternativa a escadas.

No sentido de integrar os serviços ao utente com o canal electrónico e de voz, foi criado um site na Internet com a possibilidade de se prestarem alguns serviços, bem como informações de localização, disponibilidade de serviços e entidades e funcionamento (estado da fila de espera no momento exacto e horários) para cada Loja. Existe, também, uma linha verde de âmbito nacional e em funcionamento 24 horas por dia. Mais recentemente, foi ainda criado para as Lojas de maior afluência um serviço informativo por sms que permite ao utente saber qual o tempo estimado para ser

atendido no serviço em que requisitou senha. O atendimento nas Lojas é feito mediante um sistema de senha, com a qual o utilizador é desde logo informado do número da sua vez, bem como da hora prevista para o atendimento. Para maior conveniência do utente, o horário de abertura ao público é mais alargado que o da Administração tradicional3.

No que diz respeito aos recursos humanos, apesar de alguns serem funcionários públicos requisitados aos seus serviços de origem, a maior parte são colaboradores contratados. Sendo a qualidade do atendimento um dos factores de sucesso das Lojas, existe uma ênfase especial no recrutamento e selecção, baseados nas habilitações e competência, regularmente melhorados pela formação, promovida pela Loja e pelas entidades presentes. Em condições ideais, todos os funcionários deverão ter acesso a formação especial – técnica e de formas de relacionamento e atendimento – e possuir um horário laboral por turnos. No sentido de promover um atendimento excelente, tanto as Lojas, através das Unidades de Gestão, como as próprias chefias das entidades respectivas, dão grande relevância à motivação dos funcionários, procurando manter uma atmosfera de competitividade entre as entidades presentes, e entre estas e os balcões tradicionais. As preocupações com o estilo e apresentação também se reflectem nos colaboradores, que usam uniforme e estão identificados. “O pessoal em serviço nas Loja do Cidadão está obrigado, quando no exercício de funções, ao uso de indumentária específica” (Decreto-Lei nº 189/99, artº 13º, nº 1).

Aquando do início do projecto, e até 2007, data em que as suas incumbências foram transferidas para o âmbito da AMA – Agência para a Modernização Administrativa (Decreto-Lei nº 116/2007, de 27 de Abril – Lei Orgânica da AMA), as Lojas do Cidadão eram serviços locais geridos pelo IGLC – Instituto para a Gestão das Lojas do Cidadão, um instituto público com autonomia administrativa, financeira e patrimonial, então sob tutela do Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, instituído e regulamentado pelo Decreto-Lei nº 302/99, de 6 de Agosto. Por sua vez, o Decreto-Lei nº 187/99 de 2 de Junho define o regime de funcionamento dos postos de atendimento das entidades que prestam serviço na Loja do Cidadão, bem como o regime e condições do pessoal a elas afecto. “Os postos de atendimento são extensões ou

delegações das respectivas entidades” (artº 3º, nº 1). Desta forma, os postos de atendimento das entidades participantes nas Lojas do Cidadão funcionam como delegações do serviço de origem e asseguram as prestações de serviços que lhes são próprios, ao abrigo das suas disposições estatutárias e do acordo com o IGLC, pelo que os funcionários dos postos de atendimento mantêm a vinculação hierárquica e funcional com o seu serviço, estando a remuneração dos funcionários a cargo da entidade a que pertencem, à excepção do suplemento remuneratório de trabalho por turnos, que é da responsabilidade do IGLC. Aquele diploma ainda define o horário de atendimento e o regime de trabalho aplicável ao pessoal em serviço nos postos e atendimento, com sendo “o que decorre das correspondentes disposições legais aplicáveis às entidades a que os mesmos estão vinculados” (artº 10º nº 1). Por outro lado, o diploma explica ainda que “o pessoal em serviço nos postos de atendimento depende hierárquica e funcionalmente das entidades a que está vinculado” (artº 10º, nº 2), e que o suplemento remuneratório é abonado pela entidade gestora da Loja do Cidadão (artº 12º, nº 2).

As Lojas são geridas por uma Unidade de Gestão, responsável pela gestão do espaço físico e pelo fornecimento às entidades presentes do equipamento, nomeadamente meios informáticos e mobiliário, sendo igualmente responsável pela manutenção, limpeza e gestão dos espaços públicos. As funções de gestão, supervisão, secretaria e recepção têm também vinculação técnica à Unidade de Gestão de cada Loja, sendo este o centro de custos das suas remunerações. A Figura 6.1. representa o organigrama da Unidade de Gestão das Lojas.

As relações entre as Unidades de Gestão e o IGLC/AMA são informais, envolvendo o contacto directo entre o Gerente da Loja e o Presidente daquela entidade, e muito próximas, pois que, não tendo as Lojas autonomia de decisão, financeira ou orçamental, todos os factos e decisões relevantes devem ser relatados e colocados à consideração da entidade supervisora. Todavia, a flexibilidade de gestão e alocação de recursos é maior nas Lojas do Cidadão do que nos balcões tradicionais, dado que a entidade gestora responsável tem autonomia administrativa e financeira.

Figura 6.1 – Organigrama da Unidade de Gestão (Fonte: Unidade de Gestão)

O controlo da qualidade, nomeadamente em termos dos tempos médios de espera e de atendimento, é efectuado pela Unidade de Gestão de cada Loja, através do sistema de gestão das filas de espera. Porém, cada serviço procede à recolha e tratamento de estatísticas de carácter mais específico, como sejam, o número de documentos específicos solicitados, renovações, alterações de morada, etc. Por outro lado, a entidade gestora das Lojas procede periodicamente a estudos da qualidade, nomeadamente junto dos utentes das Lojas, centralizando posteriormente a informação obtida e reunindo com as Unidades de Gestão respectivas a fim de debater os resultados obtidos.