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PARTE I – Revisão da Literatura e Modelo de Análise

2.4. Satisfação do Cliente

2.4.1. Satisfação e Qualidade

Actualmente, a satisfação do cliente é um tema central da investigação em marketing. Na verdade, a orientação para a satisfação do cliente não é um fenómeno recente. O artigo de Cardozo, um dos pioneiros na investigação da satisfação na área do marketing, procurando compreender o seu impacto no comportamento de compra futuro, data já de 1965. Com efeito, a importância atribuída à satisfação dos clientes é enorme, pois é reconhecido o seu impacto no futuro da organização. De acordo com Keiningham et al. (2003, p. 37), “tanto os gestores como os académicos têm aceite a premissa de que a satisfação dos clientes resulta em padrões de comportamento dos clientes que afectam os resultados do negócio positivamente”.

O desempenho percebido, a qualidade e a satisfação são, então, requisitos críticos para assegurar a compra, lealdade do cliente e vantagem competitiva (Stradling, Anable e Carreno, 2007). Mais especificamente, a satisfação do cliente é reconhecida como antecedente da lealdade e repetição da compra (Dabholkar et al., 2000; Seiders et al., 2005), da rentabilidade (Anderson et al., 1984; Rust et al., 2002), da eficiência da publicidade e promoção e do desempenho do capital humano (Luo e Homburg, 2007) e do valor para o accionista (maior cash flow com menor volatilidade) (Gruca e Rego,

2005; Fornell et al., 2006), pelo que tem assumido relevância crescente na gestão orientada para o cliente num conjunto muito diversificado de indústrias (Mittal e Kamakura, 2001; Szymanski e Henard, 2001). De acordo com Vavra (1997), a satisfação do cliente é o principal critério para determinar a qualidade efectivamente prestada aos clientes. Luo e Homburg (2007, p. 134) apresentam uma sistematização muito completa dos impactos (outcomes) da satisfação do cliente e respectivos artigos académicos.

Porém, não existe uma definição consensual de satisfação. Peterson e Wilson (1992, p. 62) sugerem mesmo que “os estudos sobre a satisfação do cliente são talvez melhor caracterizados pela sua falta de padronização de definições e a nível metodológico”. Por sua vez, Yi (1990), defendendo a importância de uma definição clara e universal de satisfação do cliente, discute mesmo se a satisfação é um processo ou um resultado. De facto, enquanto alguns autores destacam a satisfação como um processo de avaliação (cf. Hunt, 1977; Oliver, 1981; Fornell, 1992), outros consideram que a satisfação é a resposta a um processo de avaliação (cf. Howard e Sheth, 1969; Oliver, 1981, 1997; Westbrook e Reilly, 1983; Tse e Wilton, 1988). Ainda assim, a maior parte das definições considera a satisfação como uma resposta a um processo de avaliação. No entanto, também não existe consenso se a satisfação é uma resposta cognitiva (cf. Howard e Sheth, 1969; Tse e Wilton, 1988; Bolton e Drew, 1991;) ou afectiva (Westbrook e Reilly, 1983; Cadotte et al., 1987). Giese e Cote (2000) apresentam uma sistematização das definições conceptuais e operacionais da literatura da satisfação do cliente. Assim, se por um lado perante a inexistência de uma definição consensual de satisfação o investigador deve explicitar o que entende pelo constructo, por outro esta variedade de definições coloca entraves na investigação da satisfação do cliente, nomeadamente na operacionalização da definição e na comparabilidade dos resultados.

Mas o que vem primeiro: a qualidade percebida ou a satisfação? Alguns estudos defendem que a satisfação antecede a qualidade (Parasuraman et al., 1988; Bitner, 1990; Bolton e Drew, 1991). Inversamente, no seu artigo de 1994, Parasuraman, Zeithaml e Berry alteraram a sua perspectiva de satisfação e qualidade do serviço comparativamente a publicações anteriores: em vez de defenderem que a satisfação se

relaciona com as transacções e a qualidade do serviço com uma atitude global do serviço, sugerem agora que a qualidade precede a satisfação e que esta também pode ser medida para diferentes transacções. Oliver (1993), Cronin e Taylor (1994), Fornell et al. (1996), Brady et al. (2002), entre outros, também defendem que a qualidade é um antecedente da satisfação. Da mesma forma, para Liljander e Strandvik (1995), a qualidade também precede a satisfação, quer o cliente avalie numa base episódica, quer de relacionamento.

É uma discussão muito alargada, mas para Grönroos (2000) desnecessária: primeiro vem a percepção da qualidade, depois a percepção da satisfação ou insatisfação com essa qualidade. A qualidade é percebida pelos clientes através da comparação que estes fazem entre expectativas e experiências, relativamente a uma série de dimensões da qualidade. Da comparação desta qualidade obtida pelo cliente com a qualidade esperada resulta a qualidade total percebida: “uma boa qualidade percebida é obtida quando a qualidade experimentada vai de encontro às expectativas do cliente, ou seja à qualidade esperada” (Grönroos, 2000, p. 67). Verifica-se, então, uma confirmação ou desconfirmação das expectativas do clientes, resultando, ou não, em satisfação do cliente. Daí que seja vital gerir bem as expectativas para assegurar a percepção da qualidade - “it’s better to underpromise and overdeliver” (Grönroos, 2000, p. 68).

Na verdade, uma das principais questões relativas à satisfação diz precisamente respeito à confusão entre os conceitos de qualidade do serviço e satisfação e da forma como se relacionam entre si. Anderson et al. (1994) citam quatro importantes distinções entre os dois constructos. Desde logo, a avaliação da satisfação com um produto ou serviço pressupõe o seu consumo, enquanto que a percepção da qualidade pode existir sem consumo efectivo (Oliver, 1993). Em segundo lugar, a satisfação do cliente depende do conceito de valor (Howard e Sheth, 1969; Kotler e Levy, 1969), e este pode ser visto como o rácio entre a qualidade percebida e o preço, ou o total dos benefícios obtidos relativamente aos custos totais incorridos (Zeithaml, 1988; Holbrook, 1994), pelo que enquanto que a satisfação depende do preço, a qualidade não está directamente relacionada com este. Um outro factor distintivo tem a ver com o facto de a qualidade poder ser encarada como a percepção do cliente relativamente a um dado bem ou

serviço, enquanto que a satisfação se baseia não somente na experiência corrente, mas também em todas as experiências passadas, bem como nas experiências futuras antecipadas. Finalmente, os autores argumentam a existência de um forte apoio empírico à hipótese de a qualidade ser um antecedente da satisfação (cf. Churchill e Surprenant, 1982; Oliver e DeSarbo, 1988; Cronin e Taylor, 1992; Fornell, 1992; Anderson e Sullivan, 1993).

Ou seja, muito embora os conceitos de qualidade do serviço e satisfação sejam muito próximos, não são coincidentes, sendo a avaliação da qualidade do serviço e da satisfação do cliente uma questão muito complexa. De seguida, são sumariamente apresentados os principais modelos de avaliação da satisfação em serviços.