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4 PERCURSO METODOLÓGICO

4.4 Caracterização da pesquisa

Esta pesquisa inscreve-se na linha da Linguística Aplicada (LA), que conforme Moita Lopes (1996), é um campo das Ciências Sociais ao compreender que a linguagem está para além de sua investigação em contexto de ensino e aprendizagem de

línguas estrangeiras, mas que se preocupa com a linguagem como uma prática constitutiva da vida social e institucional. Para o autor, a LA também é caracterizada como sendo de natureza interdisciplinar e mediadora ao dar visibilidade aos problemas de uso da linguagem situados nas práxis humanas e pelo estudo dos atores sociais que agem no mundo por meio da linguagem.

Neste sentido, nossa investigação filia-se à esta compreensão, ao analisarmos o discurso do professor em sala de aula e de como a linguagem configura essa prática social e lhe permite refletir sobre o seu agir docente. Por isto, ao enfocar as questões de uso da linguagem, Moita Lopes (2006, p. 20) aponta que a LA visa à “problematizá-los ou criar inteligibilidade sobre elas, de modo que alternativas para tais contextos de uso da linguagem possam ser vislumbrados”. Sendo assim, nossa pesquisa dialoga com essa perspectiva, ao tomarmos o uso da linguagem em uma prática social (a sala de aula) sem ignorarmos dentro desta prática os atores sociais que, de fato, as vivem (os professores) pela necessidade de dar voz a eles, considerando, neste processo, o contexto de produção do seu discurso, que é, para nós, um elemento central para interpretação e análise dos dados da pesquisa.

Segundo Moita Lopes (1996), ao focalizar a linguagem sob o ponto de vista processual, a LA possibilita formulações teóricas e a utilização de métodos de investigação de base qualitativa e interpretativista. O autor destaca, ainda, duas tendências de pesquisa de cunho interpretativista, que são a pesquisa etnográfica e a pesquisa introspectiva. A primeira focaliza a percepção dos usuários acerca da interação linguística e do contexto social que os envolve e a segunda centra-se nos processos e estratégias subentendidos nos usos da linguagem. Desta forma, com base no objetivo geral de nossa pesquisa, entendemos que realizamos uma pesquisa de cunho interpretativista, aproximando-nos da pesquisa etnográfica.

O foco no tipo de pesquisa de cunho interpretativista está no processo de uso da linguagem, sendo também caracterizada como qualitativa. Um dos objetivos da pesquisa qualitativa é entender, descrever e interpretar fenômenos sociais através do contato direto e interativo do pesquisador com o contexto do objeto de estudo. Conforme Bortoni-Ricardo (2008), o pesquisador, neste espaço, possui interesse em um processo situado em um ambiente e deseja saber como os outros sociais participantes desse processo o percebem.

Dentro da pesquisa qualitativa, Godoy (1995, p.21) aponta a existência de, pelo menos, “três diferentes possibilidades oferecidas por esta abordagem: a pesquisa documental, o estudo de caso e a etnografia”. Assim, reafirmamos que nossa pesquisa apenas se aproxima desta última, ao desenvolvermos uma observação inserida no contexto pesquisado, pelos dados serem gerados em situação natural, pelo contato direto marcado pela visão global do todo e por nos preocuparmos com a explicação dos fenômenos. Esta afirmação é justificada a partir da ideia de que

A pesquisa etnográfica visa menos à compreensão dos eventos sociais de produção desses eventos (por exemplo, em uma entrevista), mas sim uma compreensão dos processos sociais de produção desses eventos a partir de uma perspectiva interna ao processo, por meio da participação durante seu desenvolvimento (FLICK 2009, p.31).

Sendo assim, a nossa pesquisa visa à uma compressão de um processo social de um evento – o ensino da gramática em sala de aula de PLE – tendo em vista a participação direta do pesquisador no contexto pesquisado e ao elaborarmos uma transformação pela escrita desta experiência, ou seja, a organização textual do que foi observado, conforme afirma Laplantine (1943 [2004]). Para este autor, a observação etnográfica põe em relação os objetos e os seres humanos, as situações e as sensações que são provocadas no pesquisador, sendo, pois, a descrição uma elaboração linguística desta experiência. Sendo assim, nas pesquisas de natureza etnográfica ou que se aproximem dela, o pesquisador poderá assumir suas escolhas, por meio do uso daquilo que julga ser o seu próprio caminho na esfera da vida em estudo. Assim, nesse estudo, a utilização pragmática de todo tipo de métodos e dados é um componente central. (FLICK, 2009).

Nesse sentido, para termos acesso ao contexto pesquisado, ou seja, à sala de aula de PLE, tivemos como primeira opção o dispositivo da observação, para acessarmos as práticas in loco. Flick (2009) explicita sobre os procedimentos observacionais. O autor classifica-os em cinco dimensões, de um modo geral, que são: observação secreta versus observação pública, observação não-participante versus observação participante, observação sistemática versus observação não-sistemática, observações em situações naturais versus observação em situações artificiais e a auto-observação versus observar os outros.

Tendo em vista tal classificação, podemos dizer que nossa pesquisa está inserida na dimensão de uma observação participante, pois esta forma de observação pode causar intervenções no campo de pesquisa, ao estarmos próximos dos eventos observados

(FLICK, 2009). Sendo assim, na primeira etapa de nosso empreendimento, restringimo- nos as gravações em vídeo das cenas de sala de aula, pois elas tornam acessíveis as próprias práticas do professor, no momento da transcrição pelo pesquisador. Os dias das gravações das aulas eram previamente informadas pelo pesquisador às professoras. Deste modo, a professora comunicava aos seus alunos que teriam, em determinada aula, a presença de um pesquisador. As gravações das cenas de salas de aula se davam de forma mais discreta possível, de forma que a câmera ficava ao fundo da sala, focalizando o movimento da professora.

Entendemos que a observação nos permite acessar a sala de aula em seu funcionamento, porém, não permite que tenhamos acesso ao que não é verbalizado pelo professor durante a aula, tais como as reflexões sobre a sua prática docente. Sendo assim, pensando nos limites da observação, é que optamos por ampliar o conjunto dos dispositivos a serem adotados na pesquisa para geração dos dados, sobre os quais falaremos na próxima seção.

Com base nos objetivos propostos, também podemos classificar nossa pesquisa como descritiva, pois uma de suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de geração de dados (questionário e entrevista), visando a descrição das características de determinada população ou fenômeno: o discurso do professor na mobilização dos saberes em contexto de ensino de gramática.

A fim de explicitarmos como tivemos acesso ao discurso do professor nesta pesquisa é que passamos, a seguir, a descrição dos instrumentos de geração de dados que selecionamos