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4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

4.3. CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO PESQUISADA

É interessante destacar que, sendo um curso de licenciatura a tendência seria a turma ser formada por maioria feminina, porém, o estudo demonstrou que, os surdos do sexo masculino representam 75%. É importante destacar que, para além da questão de gênero, a aceitação do desafio de enfrentar o contexto universitário, de acordo com Bisol et. al. (2010, 152) está ligada as “suas características pessoais, habilidades, de sua história e da forma como encara esse período de desenvolvimento próprio da faixa etária do jovem adulto, marcado pela construção da identidade, da autonomia, de ideais e de relações interpessoais”. Assim, inferimos que, quanto mais a educação de surdos aproxima-se de práticas que contemplem a cultura e as identidades surdas acolhendo-os em sua diferença, maiores as chances de que se sintam capazes de adentrarem nesses espaços.

Como vimos, no primeiro capítulo, existem diversas identidades que permeiam esse grupo por isso, houve a necessidade em saber como eles identificam-se. Diante disso, 87% assinalaram a opção “surdo” e 13% “deficiente auditivo”. Partimos do princípio que, segundo o Decreto 5.626/05, é considerada pessoa surda “aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras”. Então, conhecer a forma de identificação do indivíduo não tem como objetivo estabelecer uma distinção, mas sim agregar as diferentes práticas e relações sociais, pois são experiências que resultam em comportamentos e atitudes diferenciados no ciberespaço.

A idade também pode influenciar na formação do perfil do sujeito que transita pelo espaço social digital, pois as diferentes gerações apropriam-se desse ambiente de maneiras distintas. Nesse ínterim, 50% dos partícipes apontaram o intervalo de 26-30 anos e em iguais 25% os intervalos entre 21-25, 36-40.

Gráfico 1 - Idade

Esses dados nos permitem coletar vivências de diferentes gerações51 que se encontram no ciberespaço sendo, de acordo com Neto e Franco (2010, p. 13), as seguintes: baby boomers (1946 e 1964), geração X (1965 e 1978), geração Y (1979 e 1992) e a geração Z.

Quadro 4 - Perfil das gerações

Geração Nascimento Características

Baby Boomers entre 1946 e 1964 Esta geração viu o aparecimento da televisão e foi marcada pela aceleração das transformações culturais com o aperfeiçoamento técnico dos meios de comunicação de massa.

51 De acordo com Neto e Franco (2010, p. 12) “a proposição das características das diferentes gerações [...] tem efeito aproximativo”.

Geração X entre 1965 e 1978 Cresceram em culturas já completamente afetadas pelos meios de massa.

geração Y 1979 e 1992 Marcada pela expansão do consumo por meio da tecnologia e preocupação com o sucesso profissional

Geração Z ou “Geração silenciosa”

a partir de 1993 rápidos e ágeis com os computadores, têm dificuldades com as estruturas escolares tradicionais e, muitas vezes, com os relacionamentos interpessoais” devido a presença da intensa da tecnologia.

Nesse sentido, seguindo o raciocínio dos autores, percebe-se que, 25% enquadra-se na geração X, 50% dos participantes pertencem à geração Y (está dentro do intervalo de 24 a 37 anos) e 25% encontram-se entre essa geração e a Z (até 23 anos). Desse modo, o fato do mesmo intervalo contemplar a passagem de uma geração para outra demonstra que, o surgimento de novas formações culturais52 não anula a anterior, como tratou Santaella (2003), na realidade ocorrem diversos reajustamentos e refuncionalizações.

Assim, aqueles informantes que passaram pela cultura das mídias53, por exemplo, tiveram uma postura mais resistente sobre o uso das tecnologias em sala de aula enquanto que, os participantes mais próximos da geração Z sentiram-se estimulados pela possibilidade de uma comunicação mais rápida e em língua de sinais, que já se faz presente fora de sala de aula, de forma simbiótica, quase imperceptível.

Vale destacar que, não se tem a pretensão de aprofundar as características das gerações, mas sim reconhecer e apreender essa heterogeneidade que constituem as tendências de formação dos perfis dos indivíduos que transitam no ciberespaço. Para complementar a constituição desses perfis o estudo verificou a questão da escolaridade. Nesse ínterim, 62% dos partícipes estão fazendo a primeira graduação, 25% possuem ensino superior e 13% não responderam.

52 Para compreender essas passagens de uma cultura à outra, que considero sutis, tenho utilizado uma divisão das eras culturais em seis tipos de formações: a cultura oral, a cultura escrita, a cultura impressa, a cultura de massas, a cultura das mídias e a cultura digital (SANTAELLA, 2003, p. 24).

53 Com o surgimento de equipamentos e dispositivos que possibilitaram o aparecimento de uma cultura do disponível e do transitório [...] essas tecnologias, equipamentos e as linguagens criadas para circularem neles têm como principal característica propiciar a escolha e consumo individualizados (SANTAELLA, 2003, p. 26-27).

Gráfico 2 - Escolaridade

Os dados corroboram que, os surdos estão adentrando nos espaços acadêmicos enfraquecendo a visão de incapacidade devido a redução do seu potencial cognitivo a ausência do som. Vale ressaltar, o importante papel dos Estudos Surdos que tem como princípio fomentar outros olhares sobre os surdos e a surdez, pois de acordo com Rosa e Klein (2012, 189), “o início dos grupos de Estudos Surdos é um marco na história dos surdos. Até então, não havia evidências registradas e analisadas de que os surdos eram capazes de avançar”. E a chegada do Curso de Letras-Libras na UFS pode potencializar o ingresso desse público (62% estão fazendo a primeira graduação) e inspirar outros surdos a realizarem outra graduação que é o caso de 25% dos estudantes. É válido comentar ainda que, esse curso caracteriza-se como um ambiente de produção e circulação de saberes surdos propiciando a aproximação com seus pares e a intensificação dos movimentos em prol da cultura surda e da língua de sinais.

Antes de falarmos sobre o professor deve-se frisar que, o contexto acadêmico na época da pesquisa foi pós-greve sendo, desta forma, um momento de corrida frenética dos professores para encerrar o semestre e dos estudantes para dar conta das atividades. Nesse ínterim, trabalhamos com o docente que se disponibilizou a participar o que nos permitiu agregar as informações na perspectiva de um especialista.

Esclarecida essa questão, constatou-se que o professor é do sexo masculino, ouvinte e com idade entre 31 e 35. Ele pertence, portanto, a geração Y e, ao contrário dos estudantes dessa mesma geração, mostrou-se bastante receptivo e entusiasmado no momento da apresentação do projeto de pesquisa. O docente possui Licenciatura em Letras-Libras o que oportunizou uma formação mais completa tanto para atuar na disciplina de Libras quanto no curso de Letras-Libras (conforme vimos quando tratamos sobre o local da pesquisa).

Nesse momento, é relevante alertar que, os professores sem formação especializada poderão construir suas aulas de forma intuitiva recorrendo aos modelos de seus próprios professores ouvintes, ou seja, irão constituir um fazer pedagógico baseado nas práticas ouvintistas sem levar em consideração a cultura surda e os saberes surdos. Essa postura fortalece a pedagogia do outro que deve ser apagado, como afirma Skliar (2003, p. 200-201),

[...] é a pedagogia de sempre; uma pedagogia que nega duas vezes e que o faz de uma forma contraditória: nega que o outro haja existido como outro e nega o tempo em que aquilo – a própria negação colonial do outro – possa ter acontecido.

E assim, o docente nega a existência do surdo que nunca irá materializar-se como outro em sua alteridade. Tornando-se simplesmente uma repetição da mesmidade, nesse caso, marcada pela busca pelo ideal ouvinte, pois não parece normal ser quem é. Daí a importância de uma formação específica que contemple as questões linguísticas, sociais, políticas e culturais do surdo. Nesse contexto, o professor - além de graduado em Letras-Libras - tem pós-graduação em Língua de Sinais. Isto significa que, ele buscou a atualização da formação. Sobre essa questão, Kenski (2013, p. 53) discorreu que,

[...] a formação ocorre permanentemente. Os tempos se mesclam. As formas flexíveis de atuação e as mudanças dos perfis dos profissionais e dos estudantes nos mostram que, na atualidade, tanto trabalho quanto formação são aspectos relacionados permanentemente, ao longo da vida.

É imprescindível, desse modo, investir em uma formação diferenciada que possa contemplar as novas dinâmicas no processo de ensino e aprendizagem. E isso repercutiu na prática do professor pesquisado, pois era o único ouvinte ministrando aulas 100% em língua de sinais o que permitiu uma outra visão sobre como apresentar os conteúdos, buscar exemplos que surdos e ouvintes pudessem relacionar com a realidade e ainda lidar com o cansaço físico – lembrando que não é a sua língua natural – aproximando-se das perspectivas da Pedagogia Surda. Como resultado, ficou explícito o respeito dos estudantes surdos diante do empenho do professor e o encantamento dos ouvintes, pois estavam tendo a possibilidade de aprender a língua de sinais como prática social. Finalmente, após a caracterização da população, será apresentada a contextualização da metodologia.