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Caracterização da tolerância na interação soja × P pachyrhizi

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.3. INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR DA PERFORMANCE DAS LINHAGENS E ESTUDOS DE TOLERÂNCIA

4.3.2. Caracterização da tolerância na interação soja × P pachyrhizi

Altos níveis de tolerância em detrimento da habilidade reprodutiva (fitness) na ausência do estresse, também referido como custo de alocação (Stowe et al., 2000) tem sido reportado na literatura para situações de interação planta × patógeno (Simms e Triplett, 1994). De maneira a verificar a existência de custo de alocação na interação soja × P. pachyrhizi, foi correlacionada a tolerância estimada para cada genótipo com a performance na ausência do estresse (Figura 16). Em adição, o conjunto de genótipos foi subdividido em três classes de acordo com o ciclo (DEM), objetivando minimizar o impacto da exposição diferenciada ao estresse na correlação (Figura 16A). Nota-se que, com o aumento do ciclo, a correlação entre a tolerância e a performance na ausência da doença se torna mais negativa, mudando de -0,81 (P <

0,01) nos genótipos precoces para -0,92 (P < 0,01) naqueles de ciclo tardio. Para as linhagens precoces, a diferença média entre a performance produtiva na ausência e na presença do estresse foi de -841,43 kg ha- 1, passando para -1.141,69 kg ha-1 nas linhagens de ciclo médio e -1.526,29 kg ha-1 nos genótipos tardios.

Isso demonstra que a diminuição no tempo de exposição ao estresse é uma importante estratégia de manejo da doença. Todavia, como revelam os dados, há uma relação tênue entre ciclo e a produtividade que deve ser contabilizada pelo melhorista, em que genótipos com ciclo maior tendem a ser mais produtivos. Neste estudo, o conjunto de linhagens de ciclo tardio produziu 14,40% a mais em comparação ao conjunto de linhagens de ciclo precoce.

Na Figura 16B, foi explorada a existência do alto grau de parentesco [irmãos germanos; 𝜃𝑋𝑌=

1 4⁄ ] entre as linhagens derivadas de cada cruzamento biparental para contornar o problema estatístico da dependência entre os vetores sendo correlacionados na Figura 16A. O efeito da amostragem mendeliana (mendelian sampling) nesse caso foi diluído pelo cômputo das médias e permitiu a realização das análises de correlação entre a tolerância × a performance na ausência do estresse para um universo de 64 cruzamentos. Os resultados da análise confirmam a relação negativa e significativa (P < 0,01) entre a performance na ausência do estresse e a tolerância. Em outras palavras, genótipos altamente produtivos na ausência do estresse não necessariamente são os mais produtivos na presença. De fato, os dados mostram que essa associação segue sentidos opostos (Figura 16). Isso indica a existência de custo de alocação na interação soja × P. pachyrhizi. De acordo com Raberg et al. (2009), o custo de alocação é esperado simplesmente porque existe um requerimento de energia para sustentar os mecanismos responsáveis pela tolerância. Do ponto de vista evolucionário, é esperada a existência de custos ao hospedeiro atrelados a tolerância, caso contrário, alelos que aumentam a tolerância seriam rapidamente fixados na população (Tiffin, 2000). A existência de custo de alocação também foi observada em Arabidopsis lyrata para tolerância a geada (Wos e Willi, 2015), em Ipomoea purpure para tolerância ao fungo Colletotrichum dematium (Simms e Triplett, 1994). Por outro lado, em pesquisa avaliando a interação entre a planta Mimulus guttatus × vírus do mosaico do pepino, Carr et al. (2006) relatam a existência de correlação positiva, em que indivíduos com alta performance na ausência do estresse são os que melhor performam na presença, indicando que a seleção irá favorecer os mesmos genótipos independentemente se estão ou não infectados, no caso de estresse por patógenos. Portanto, os dois cenários estão presentes na natureza, mas os resultados aqui apresentados demonstram que a interação soja × P. pachyrhizi produz custos ao hospedeiro.

Na existência de custo de alocação, selecionar para alta produtividade na presença do estresse irá implicar em baixa produtividade em ambientes não estressados. Entretanto, o conjunto de resultados abordados nesse estudo aponta para a existência de variabilidade genética suficiente para o melhoramento simultâneo da produtividade e da tolerância. Para provar isso, foi realizada a correlação entre a tolerância e a performance na ausência do estresse utilizando apenas os dados das linhagens derivadas de cruzamentos com os genitores 30 e 31, identificados na sessão 4.2 como bons combinadores em gerar progênies tolerantes e com alta produtividade. A correlação média baixou de aproximadamente -0,49 (P < 0,01) para 0,31ns. Também, foi computada a correlação com os dados remanescentes, i.e., após retiradas as linhagens

nas quais um dos pais era o genitor 30 ou o 31. Nesse novo cenário, a correlação subiu para 0,54 (P < 0,01). Esses resultados mostram ser possível o melhoramento para tolerância aliado a alta produtividade na ausência da ferrugem desde que seja realizada a triagem dos genitores, buscando aqueles com alto efeito de CGC para o índice STI.

A Figura 16B traz ainda resultados para a AACPD média das linhagens que compõem cada cruzamento. Notam-se alguns pontos tendendo a cor azul, o que é um indicativo da menor ocorrência de sintomas da ferrugem. Os cruzamentos envolvendo os genitores 28 e 34 são aqueles em que a tendência ao azul é mais forte. O genitor 34 apresentou um dos menores efeitos de CGC para o caráter AACPD (Figura 8). Esses resultados também revela a provável existência de resistência quantitativa no germoplasma avaliado. Na natureza, é esperado que genótipos resistentes experienciem pouca seleção para o aumento da tolerância e genótipos com alta tolerância experienciem baixa seleção para resistência (Carr et al., 2006). Isso conduz a uma correlação genética negativa entre tolerância e resistência. Por fim, a Figura 16B também traz resultados de tolerância para o caráter peso de cem sementes. Nota-se que a medida em que a produtividade na ausência do estresse (eixo x) aumenta, a quantidade de círculos de menor diâmetro expande, indicando baixa tolerância nesses cruzamentos. De fato, a correlação entre a produtividade na ausência do estresse e a tolerância para o caráter peso de cem sementes foi de -0,47 (P < 0,01). Esse resultado também sustenta a hipótese de que, no contexto geral do germoplasma avaliado, genótipos tolerantes à ferrugem mostram desempenho baixo na ausência do estresse.