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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.3. INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR DA PERFORMANCE DAS LINHAGENS E ESTUDOS DE TOLERÂNCIA

4.3.1. Efeito do estresse pela ferrugem nas correlações

O estudo das correlações entre todos os caracteres e índices mensurados nas linhagens F5:6 está

disponível na Figura 15. Inicialmente, nota-se uma alta associação entre a performance das linhagens avaliadas no Man.1 e Man.2 para 13 caracteres (diagonal em rosa), com exceção da produtividade e circularidade das sementes que apresentaram baixa correlação, dos índices STI, YSI que utilizam dados de ambos os manejos no cômputo e da AACPD que foi avaliada apenas no Man.2 e, por isso, apresentam correlação igual a unidade. Em relação a produtividade, foram identificadas correlações de alta magnitude com o caráter valor agronômico em ambos os manejos da doença (ρ ≥ 0,50; P > 0,01). O valor

agronômico refere-se a um escore generalista dos atributos de qualidade que compõe um genótipo no campo, sendo um escore igual a cinco (máximo) aquele em que o material genético avaliado se assemelha a uma cultivar ideal. É frequentemente utilizado por melhoristas na triagem de genótipos candidatos e que irão avançar ao longo das fases do programa de melhoramento, sendo uma métrica do “olho do melhorista”, expressão rotineiramente empregada pelos profissionais de melhoramento.

A duração do enchimento de grãos (EG) foi outro caráter positivamente associado a produtividade, principalmente no ambiente estressado [P < 0,05] (Figura 15). Também, a correlação entre as médias das linhagens pertencentes a cada cruzamento para o enchimento de grãos × produtividade foi igual a 0,35 [P < 0,05] (dados não mostrados). O comprimento do período de enchimento de grãos é um importante determinante da produtividade de culturas nas quais o interesse encontra-se nas sementes, incluindo a soja (Egli, 1998). Eventos de estresse durante esse período têm potencial de causar reduções significativas na produtividade e no tamanho das sementes (Brevedan e Egli, 2003). Board et al. (2010) simularam níveis de desfolha durante o período de enchimento de grãos de cultivares de soja com o intuito de reproduzir o progresso da ferrugem asiática no dossel. Os autores concluíram que a redução da produtividade pela desfolha está intimamente associada a menor porcentagem de radiação solar interceptada e que durante o período de R5 a R6, a redução significativa da produtividade só foi observada quando a desfolha foi suficiente para diminuir em 18 a 23% a interceptação da radiação. Por fim, os autores concluíram que as perdas em produtividade foram máximas quando altos níveis de desfolha ocorreram no início do enchimento de grãos e que o impacto foi gradualmente diminuído a medida em que o estresse ocorreu mais tarde.

A inexistência de correlação entre a produtividade mensurada no experimento protegido da ferrugem e no experimento com a presença da doença remete a existência de uma elevada interação genótipos × manejos da ferrugem. Resultado similar foi relatado por Tschanz et al. (1986) no qual salientam que a seleção de linhagens com alta produtividade em condições protegidas da ferrugem pode não garantir alta produtividade na situação oposta. Em adição, os autores salientam que a seleção para alta produtividade na presença da ferrugem não pode prevenir a posterior identificação de linhagens de alta produtividade em baixa pressão ou ausência da doença.

Na presença do estresse, os caracteres relacionados ao tamanho e a conformação das sementes tenderam a apresentar correlações de magnitude superior com a produtividade do que aquelas observadas na ausência, especialmente para a largura de semente [W] (Figura 15). O caráter W foi levemente mais associada com o peso de cem sementes (PCS) em comparação ao comprimento (L). Resultado similar foi reportado por Wang et al. (2011) em estudo avaliando a aparência das sementes de 235 acessos chineses de soja. A média desses acessos foi de 7,80 mm, 5,40 mm e 13,10 g para L, W e PCS, respectivamente, enquanto que no presente estudo foram obtidas médias de 7,70 mm, 6,52 mm e 16,50 gramas, respectivamente, na ausência de estresse, i.e., sementes de comprimento semelhante, porém, mais largas e pesadas. De fato, no presente estudo, W mostrou-se levemente mais correlacionado com PCS do que L. Os caracteres indicativos de tamanho de sementes (PCS, AS, PL, L e W) foram todos altamente

correlacionados entre si nas duas condições de estresse. Portanto, em caso de necessidade de substituição do caráter PCS, sugere-se o uso de W. A existência de alta correlação entre os caracteres mencionados é também reportada na literatura (Niu et al., 2013; Hu et al., 2013).

Os caracteres dias da emergência a maturação (DEM), EG e dias para o estádio de R7 (DR7), componentes da duração do ciclo fenológico, também se mostraram altamente correlacionados (Figura 15). Os três caracteres foram correlacionados negativamente com a área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD), i.e., quanto maior a severidade da ferrugem e sua evolução no decorrer do tempo, maior a redução em dias no comprimento dos estádios fenológicos. Isso tem impacto negativo na produtividade, como mostra a correlação entre AACPD × PS na presença do estresse. A existência de correlação negativa e de magnitude similar entre AACPD e produtividade (ρ = -0,30, P < 0,0001) foi reportada em experimentos de soja conduzidos em três países por Mueller et al. (2009). Ressalta-se que, caso não houvesse tolerância no germoplasma avaliado, seria esperada uma alta correlação entre produtividade × AACPD. Em adição, as correlações negativas entre AACPD e os caracteres DEM, EG e DR7 na ausência do estresse, de fato mostram que os genótipos de ciclo tardio são os mais propensos a apresentarem severidade elevada devido ao maior período de exposição. Isso anulou a correlação entre DEM × PS na condição de estresse que era positiva na ausência da ferrugem. Portanto, a correlação entre EG e PS em ambas as condições de estresse fomenta a importância da utilização da duração no período de granação como um caráter chave para a seleção de genótipos de soja produtivos na presença da ferrugem. A importância desse resultado é ainda maximizada pela correlação positiva entre EG e o índice de tolerância a estresses (STI) para a produtividade. Esse índice mede a habilidade de um genótipo em ser tolerante e ao mesmo tempo apresentar alta produtividade na ausência do estresse (Fernandez, 1992). Esse índice tem sido utilizado em soja em estudos com estresses abióticos (Mengistu et al., 2018) e bióticos devido a insetos (Rocha et al., 2014).

O segundo índice testado, estabilidade da produtividade (YSI), foi negativamente correlacionado com a produtividade na ausência da doença, i.e., a medida que se eleva a produtividade no ambiente estressado em comparação ao não estressado, há uma forte tendência de redução da produtividade nessa última condição (Figura 15). Obviamente, essa correlação passa a ter sinal positivo no ambiente com a presença da ferrugem, i.e., genótipos que apresentam tendência de performar de maneira similar entre as duas condições de estresse são os mais produtivos na presença do estresse. Portanto, esse índice não é interessante para o melhoramento visando produtividade e tolerância simultaneamente. Como a severidade de epidemias não é constante ao longo dos anos, há a necessidade de que genótipos sejam tolerantes em situações de alta pressão da doença, mas que apresentem o menor custo de alocação possível, de maneira que possam performar de forma satisfatória em anos agrícolas de ausência ou menor pressão da doença. Nesse sentido, a seleção baseada no índice STI é mais adequada, visto que esse índice apresenta correlações positivas com a produtividade em ambas as condições de estresse. Além disso, o índice está associado positivamente ao VA e ao EG e negativamente a AACPD, AP e ao ACM.

Os caracteres ACM e altura de plantas AP foram altamente correlacionados entre si e também apresentaram um padrão semelhante de correlações com os demais caracteres (Figura 15). Ambos os

caracteres foram correlacionados com L e não com W e, portanto, positivamente correlacionados com LWR. Esse resultado mostra que genótipos altos e, assim, passíveis de acamamento, apresentam sementes mais compridas. Em estudos de mapeamento associativo e mapeamento de QTL (quantitative traits loci), resultados mostram a existência de QTLs controlando o comprimento de sementes de soja posicionados na mesma região cromossômica que os caracteres altura de planta e acamamento (Mansur et al., 1993; Zhang et al., 2004). A ocorrência de acamamento conduz a modificações na conformação de sementes. Essa afirmação também é comprovada pela correlação positiva entre ACM e DS. Desta forma, a ocorrência de acamamento tende a resultar em sementes visualmente semelhantes as mostradas na Figura 14 para alto DS. Por fim, as correlações entre o grupo de caracteres determinantes do tamanho de semente com o grupo de caracteres determinantes da conformação foram baixas comparadas as correlações dentro do primeiro grupo. De acordo com Hu et al. (2013), esses dois grupos de caracteres são controlados por arquiteturas genéticas distintas.

Finalmente, o caráter avaliado referente ao volume de folhas da parcela (EAF) foi correlacionado com o índice STI para produtividade (dados não mostrados). A correlação observada foi igual a 0,40 (P < 0,01). Como destacam Ney et al. (2013) em revisão sobre a arquitetura das culturas e a tolerância a doenças causadas por fungos e herbivoria, os diferentes mecanismos associados a tolerância a estresses bióticos operam em três níveis (órgão, planta e cultivo). Ao nível de planta, a tolerância pode ocorrer devido a maior relação fonte × dreno, i.e., alto índice de área foliar por unidade de grão. Em outras palavras, plantas com maior biomassa tendem a acumular mais reservas que, por sua vez, podem ser remobilizadas para as sementes à medida que o fungo inicia o processo de infecção e a doença avança. Além disso, um maior índice de área foliar permite com que os primeiros ciclos infectivos tenham menor impacto na capacidade de interceptação de radiação comparado a genótipos com pouca área foliar, i.e., existe um efeito de plasticidade. De fato, EAF teve correlação de -0,33 (P < 0,01) com a severidade da doença (segunda avaliação; dia anterior a avaliação de EAF), mas essa correlação foi praticamente inexistente para a terceira e quarta avaliações de severidade. Isso é um indicativo de que genótipos com maior área EAF conseguiram sustentar por mais tempo uma porção considerável do tecido foliar sadio, favorecendo a produtividade na presença da doença.