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Caracterização do trabalho Transdisciplinar

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE (páginas 91-95)

6. TRANSDISCIPLINARIDADE

6.2. Caracterização do trabalho Transdisciplinar

significativa em relação as demais formas de interação entre as disciplinas. Na transdisciplinaridade o objeto de estudo ultrapassa as delimitações existentes nas disciplinas, existindo “um diálogo fundamental entre os diversos níveis de conhecimento científico e filosófico” (CALLONI, 2006, p. 64).

É necessário, portanto, que o currículo flexibilize e contemple práticas pedagógicas que promovam a transdisciplinaridade. Morin ressalta que as disciplinas cada vez mais “[...] se fecham e não se comunicam umas com as outras. Os fenômenos são cada vez mais fragmentados, e não se consegue conceber a sua unidade” (2010, p. 135). No entanto, mesmo a interdisciplinaridade, que usa alguns intercâmbios entre as disciplinas, preserva os seus territórios e não potencializa a sinergia que é necessária para o processo de ensino-aprendizagem. Por isso é necessário ir além, ir à busca da transdisciplinaridade.

A transdisciplinaridade poderá contribuir de forma significativa para melhorar a formação geral do aluno e ampliar o seu campo de conhecimento, pois permite a integração de várias áreas e de novas descobertas, desenvolvendo assim habilidades que poderão levá-lo a continuar aprendendo de forma crítica e reflexiva.

6.2. Caracterização do trabalho Transdisciplinar

A transdisciplinaridade é conceituada por Nicolescu (2001, p. 51) como “aquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina”. Seu objeto é permitir a compreensão do mundo atual, para o qual destaca que um dos imperativos é a unidade do conhecimento. Ela não é entendida como uma nova disciplina, nem como uma hiperdisciplina, mas alimenta-se da pesquisa disciplinar.

De acordo com Nicolescu (op. cit.) a transdisciplinaridade está fundamentada em três pilares: os níveis de realidade, a lógica do terceiro incluído e a complexidade.

O pilar dos diferentes níveis de realidade corresponde à existência em paralelo da realidade macrofísica (o que nossos sentidos não permitem alcançar) e a realidade microfísica (o que nossos sentidos conseguem alcançar com o auxílio de instrumentos tecnológicos potentes), de um terceiro nível de realidade: a realidade virtual. Esse nível de realidade está relacionado à utilização de nossas intuições, percepções e imaginário, que nos permite entrar no mundo do sagrado.

A transdisciplinaridade propõe-se a transcender a lógica clássica, que é caracterizada pela lógica do “sim” ou “não”, segundo a qual não cabem definições como “mais ou menos” ou

“aproximadamente”. Conforme Nicolescu (2001, p. 33), em termos matemáticos, a lógica clássica expressa-se da seguinte forma:

1. O axioma da identidade: A é A;

2. O axioma da não-contradição: A não é não-A;

3. O axioma do terceiro excluído: não há um termo T, que é, ao mesmo tempo, A e não-A.

Baseado nesses axiomas, a lógica clássica admite um único nível de realidade, uma vez que o axioma número 3 exclui a possibilidade de articulação. A lógica quântica introduz inovações, definindo um terceiro termo incluído: “Há um terceiro termo T, que, ao mesmo tempo, é A e não-A” (Nicolescu, 2001, p. 34). A questão do terceiro termo incluído sempre leva a um outro nível de realidade, diferente do nível anterior da lógica da não-contradição, abrindo a possibilidade de uma nova visão da realidade.

Como processo, a lógica do terceiro termo incluído pressupõe o aparecimento de outros elementos contrapondo-se em qualquer nível de realidade. Nesse sentido não existe uma verdade absoluta, mas verdades sempre relativas e passíveis de mudança no decorrer do tempo.

No entender de Moraes (2008) existe uma complexidade em todas as ciências, assim como a possibilidade de uma terceira via, ou de uma terceira forma de representação da realidade e não apenas aquelas que retratam situações dualistas (isto ou aquilo).

O terceiro pilar, a complexidade, desferiu “o golpe de misericórdia na visão clássica do mundo” (Nicolescu, 2001, p. 41). A complexidade nutre-se da explosão da pesquisa disciplinar e, por sua vez, acaba determinando a aceleração da multiplicação de disciplinas.

Morin (2010) esclarece que, para promover a transdisciplinaridade, precisamos romper com o paradigma que determina e controla o conhecimento científico, o paradigma que ele denomina de simplificação (redução/separação), que considera insuficiente e mutilante. Salienta ainda que precisamos de um paradigma de complexidade, que ao mesmo tempo separe e associe, que conceba os níveis de emergência da realidade sem os reduzir às suas unidades elementares.

Para a prática da transdisciplinaridade é necessário entender, separar, distinguir esses diversos conhecimentos, mas sem reduzi-los, simplificá-los, sob o risco de se perder a essência do todo. É necessário entender e respeitar a complexidade.

Sob essa ótica, a racionalidade é entendida como uma característica dinâmica e flexível, diferentemente daquela estabelecida nos moldes tradicionais, partindo do princípio de que dados aparentemente divergentes não devam ser simplesmente eliminados do processo de análise e sim incorporados como aspecto determinante de suas características.

Conforme a Carta da Transdisciplinaridade (Anexo 2) e Nicolescu (2001), a transdisciplinaridade pode estar pautada na ideia de rigor na argumentação e de tolerância ao reconhecer o direito das ideias e verdades contrárias às nossas.

No preâmbulo da citada Carta, considera-se que “somente uma inteligência que se dá conta da dimensão planetária dos conflitos atuais poderá fazer frente à complexidade de nosso mundo e ao desafio contemporâneo de autodestruição material e espiritual de nossa espécie”.

Para que seja possível adquirir essa inteligência planetária precisamos de uma educação transdisciplinar, que considere o homem como um ser integral e que: “[...] Deve ensinar a contextualizar, concretizar e globalizar. A educação transdisciplinar reavalia o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade e do corpo na transmissão dos conhecimentos” (Carta da Transdisciplinaridade, artigo 11).

A transdisciplinaridade apresenta como proposta transcender o universo fechado da ciência e possibilitar o reconhecimento da multiplicidade de indivíduos produtores de conhecimento, chamando a atenção para as tendências heterogêneas, fazendo surgir áreas de tensão com as tendências homogeneizantes.

Para Baggio (2008), não há como pensar em transdisciplinaridade sem pluralidade, sem trabalhar com uma variedade de relações. A tradição do pensamento ocidental tende para a valorização do unívoco, para a hegemonização. A consequência desse pensar e agir é a criação do pensamento dicotômico numa lógica de identidade e oposição. O diverso, que está sempre presente, acaba sendo tratado como adversário, como algo a ser vencido e se possível eliminado.

De acordo com Cardoso e Serralvo (2009), os estudos da área da Administração e das ciências sociais de modo geral, sempre privilegiaram as dimensões de equilíbrio, determinismo e da causalidade linear. No entanto, o mundo das organizações e da sociedade apresentam níveis elevados de complexidade, oscilações, instabilidades, auto-organização e mudança. Dessa forma, segundo os autores, o movimento transdisciplinar se afirma de maneira progressiva, como uma crítica aos artificialismos disciplinares construídos a partir do século XIX no domínio de todas as grandes áreas do pensamento.

Nos dias atuais, não se pode pensar os fenômenos e os objetos da Administração que não seja de forma transdisciplinar e plural. Essa postura permite superar os limites existentes entre especialidades hierarquizadas e fechadas e estabelecer caminhos de análise e interpretação comprometidas com práticas sociais relevantes.

Santos (2008) ressalta que o conhecimento transdisciplinar associa-se à dinâmica da multiplicidade das dimensões da realidade e apóia-se no próprio conhecimento disciplinar. Isso significa que a pesquisa transdisciplinar pressupõe a pesquisa disciplinar, no entanto, ela passa a

ser enfocada a partir da articulação de referências diversas. Desse modo os conhecimentos disciplinares e transdisciplinares se complementam.

Para Nicolescu (2001) a visão transdisciplinar é complementar a visão disciplinar ao fazer emergir dados novos partindo da confrontação das disciplinas e da tentativa de descobrir o que é comum as duas e o que na verdade as ultrapassa.

É importante salientar que a transdisciplinaridade exige, conforme Santos (2008), uma postura de democracia cognitiva, onde todos os saberes são importantes e não existe uma hierarquia a ser respeitada. Esse novo olhar da transdisciplinaridade traz ainda um desafio maior, que é o de transitar pela diversidade dos conhecimentos (biologia, antropologia, física, química, matemática, filosofia, economia, sociologia) livre de preconceitos e de fronteiras epistemológicas rígidas.

Na prática educativa, conforme Santos (2008), os professores desconsideram o princípio da transdisciplinaridade, separando a parte do todo e dando um tratamento mecânico ao conhecimento. Os professores dedicam-se a explicações exaustivas em definições, conceitos e fórmulas e o fazem utilizando uma linguagem voltada para a racionalidade tecnocientífica. Com esse viés, o conhecimento trabalhado em sala de aula acaba perdendo o sentido, por não trabalhar a relação com o todo e com o sujeito do processo cognitivo. Para a autora:

A transdisciplinaridade maximiza a aprendizagem ao trabalhar com imagens e conceitos que mobilizam, conjuntamente, as dimensões mentais, emocionais e corporais, tecendo relações tanto horizontais como verticais do conhecimento. Ela cria situações de maior envolvimento dos alunos na construção de significados para si.(SANTOS, 2008, p. 76)

Na leitura de Cardoso e Serralvo (2009), uma visão transdisciplinar da área de Administração significa buscar novas posturas epistemológicas e metodológicas que não sejam apenas justaposição de ideias e métodos, mas sim uma tentativa na busca de abordagens múltiplas que possam dar conta da essência dos fenômenos da área, que estão conectados com o universo amplo das ciências sociais nos seus diferentes domínios e corpo multidisciplinar.

A transdisciplinaridade é mais que uma escolha, é uma postura didático-pedagógica, que redimensiona o modo como o conhecimento passa a ser construído dentro da sala de aula, estabelecendo uma nova forma de dialogar entre os educandos e educadores e entre os próprios educadores.

A transdisciplinaridade é necessária para o desenvolvimento da área de Administração como um campo de estudo, pois ela funciona como um elemento complementar à aproximação disciplinar, ajudando a superar os formalismos excessivos, a rigidez das definições e o culto à objetividade. Partindo do exposto, a transdisciplinaridade no ensino de Administração é

entendida como uma proposta pedagógica voltada para um processo de ensino-aprendizagem mais adequado para a realidade a ser enfrentada pelos futuros gestores organizacionais.

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE (páginas 91-95)