• Nenhum resultado encontrado

2.2 – Caracterização dos Regimes Cambiais Brasileiros

Araújo e Silveira Filho (2002) formularam uma periodização do câmbio real brasileiro, apresentada na Tabela 9. Essa tabela permite visualizar de forma comparativa os dois primeiros momentos da distribuição das taxas reais de câmbio da economia brasileira. Observa-se que o período de maior depreciação do câmbio real ocorreu entre 1983 e 1990. Por outro lado, o câmbio real manteve-se fortemente apreciado no período que vai da introdução do Plano Real até o fim das bandas cambiais.

Tabela 9 – Estatísticas de média e volatilidade do câmbio real em seis períodos selecionados

Período Média da Taxa de câmbio real (*)

Desvio padrão da taxa de câmbio real

Coeficiente de variação relativo à taxa

de câmbio real Jan69 – Nov79 1,13 0,04 3,8% Dez79 – Jan83 1,27 0,09 6,8% Fev83 – Fev90 1,54 0,22 14,3% Mar90 – Jun94 1,19 0,13 10,9% Jul94 – Dez98 0,89 0,04 4,3% Jan99 – Set01 1,34 0,13 9,5%

Fonte: Araújo e Silveira Filho (2002). Notas: todos os índices foram calculados a partir de oito medidas diferentes de câmbio real para a economia brasileira, a partir de combinações entre índices de inflação brasileiros e norte-americanos, com câmbio de final de mês e média do período. Os resultados reportados correspondem à média das oito medidas obtidas para o período. Para mais detalhes, ver Araújo e Silveira Filho (2002). (*) Média das médias para o período.

Os pontos a seguir fornecem algum detalhamento sobre os movimentos no interior da periodização proposta por Araújo e Silveira Filho (2002).

1. Janeiro de 1969 a novembro de 1979. O regime de minidesvalorizações da taxa nominal de câmbio, inaugurado em 1968, foi consolidado neste período. Perseguia-se informalmente o diferencial entre a inflação brasileira e a norte-americana. A política foi efetiva no sentido de manter baixa volatilidade no preço do dólar comercial, mas Edmar Bacha argumenta que parte importante da volatilidade pode ter sido transferida a um prêmio pago pelos importadores sobre as taxas oficiais. O primeiro choque do petróleo obrigou a uma mudança de estratégia de ajuste do câmbio nominal a partir de 1973.

2. Dezembro de 1979 a janeiro de 1983. O segundo choque do petróleo, seguido de um período de política monetária contracionista nos Estados Unidos, levou a uma maxidesvalorização da moeda brasileira em 30%, em 10/12/1979. Esse ajuste causou elevação tanto no nível quanto na volatilidade do câmbio real.

3. Fevereiro de 1983 a fevereiro de 1990. A moratória mexicana de setembro de 1982 gerou condições adversas para o financiamento do déficit em conta corrente. Uma nova maxidesvalorização de 30% foi implementada em

21/2/1983. O nível do câmbio real foi mantido através de uma política de ajuste mínimo pelo diferencial entre a inflação doméstica e externa. O desvio padrão aumentou não apenas pelo forte ajuste inicial, mas também pelo aumento da inflação e pelos vários planos de estabilização do período. Para Araújo e Silveira Filho (2002), “surpreende que mesmo sob um regime

de câmbio nominal administrado, a volatilidade do câmbio real tenha superado à registrada após a adoção do regime de câmbio nominal flutuante em jan/99”.

4. Março de 1990 a junho de 1994. Iniciou-se um movimento de liberalização do mercado cambial a partir de 1989, com a criação do câmbio flutuante. Em 1990, o Plano Collor bloqueou ativos financeiros e congelou preços, implantando um regime de câmbio flutuante sujo. Foi anunciado um regime de intervenção baseado no nível das reservas internacionais. O efeito inicial do novo regime foi no sentido da apreciação da moeda e redução da volatilidade, especialmente em função da restrição da liquidez da economia, mas o movimento inicial se reverteu a partir de setembro de 1990 em direção a um nível e volatilidade relativamente altos. O período foi marcado ainda por um movimento unilateral de abertura comercial e por turbulências políticas associadas ao impedimento do presidente Fernando Collor de Mello.

5. Julho de 1994 a dezembro de 1998. Na época da introdução do Real, em junho de 1994, a economia experimentava um momento de forte ingresso de capital estrangeiro, amplificado por expectativas positivas quanto à introdução da nova moeda. Logo o Banco Central abandonou a estratégia de esterilizar esses fluxos, o que vinha causando um aumento da dívida mobiliária, e permitiu, durante um curto período, livre movimentação no mercado cambial. A taxa de câmbio nominal apreciou-se sensivelmente a partir de então. Entre setembro e outubro de 1994, o Banco Central voltou a adquirir divisas no mercado cambial e introduziu regulamentações sobre fluxos de capital, de forma a evitar uma apreciação da moeda ainda mais significativa. A partir de novembro de 1994, os efeitos das medidas

anteriores foram intensificados pela eclosão da crise mexicana, que reverteu a trajetória de apreciação cambial. O Banco Central passou a intervir na ponta contrária, tendo vendido cerca de US$ 4 bilhões entre novembro e dezembro de 1994. Em 6 de março de 1995, o Banco Central anunciou nova mudança na política cambial. Após promover uma pequena desvalorização de 7%, foram introduzidas bandas cambiais. O regime de câmbio administrado implantado em 1995 foi defendido com uma gama de instrumentos, especialmente a contração da política monetária durante períodos de menor liquidez para o financiamento do déficit em conta corrente (essa tática foi usada logo em seu início), a emissão de dívida pública cambial e a intervenção direta através de compras e vendas no mercado de câmbio pronto. O período foi marcado por crises internacionais com efeito relevante sobre a oferta de capitais para o financiamento do déficit em conta corrente brasileiro, que potencializaram a volatilidade do câmbio. Mesmo assim, o Banco Central conseguiu defender o nível e manter uma volatilidade relativamente baixa através da utilização intensiva de seus instrumentos de intervenção.

6. Janeiro de 1999 a setembro de 200132. Em janeiro de 1999 o Banco Central abandonou a defesa do regime de câmbio administrado. Com a introdução do regime de câmbio flutuante, em janeiro de 1999, o setor externo inicia um ajuste em direção a um superávit em conta corrente. Houve uma tríplice mudança de regimes de política econômica, envolvendo os regimes cambial, monetário e fiscal. O período ainda foi marcado por fortes turbulências. Em especial, o ano de 2001 assistiu a uma combinação de choques externos – a desaceleração da economia norte-americana, escândalos contábeis envolvendo grandes empresas internacionais com reflexos sobre o mercado de capitais, o colapso do regime de conversibilidade argentino, os atentados terroristas de 11 de setembro contra os Estados Unidos – e, internamente, a crise de oferta de energia elétrica conhecida como “apagão”. Em 2002, as

32 Araújo e Silveira Filho (2002) concluem o seu período de análise em 2001, mas o regime permaneceu com

eleições presidenciais foram cercadas de grande incerteza quanto a mudanças bruscas na política econômica, gerando expectativas inflacionárias e financeiras que se converteram em mudança importante do nível e da volatilidade da taxa de câmbio. A turbulência cedeu gradualmente quando o novo presidente eleito em 2002 passou a reafirmar a continuidade do modelo de política econômica que havia sido implantado entre 1998 e 1999.