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MAPA D AS D IVISAS AD MIN ISTRATIVAS

5.3 CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DA ENCOSTA DO VALE DAS PEDREIRAS

5.3.2 Caracterização geológico-geotécnica

Segundo Leroueil (2001), uma caracterização geotécnica constitui uma importante ferramenta para a análise de movimentos de massa e sua importância se deve aos seguintes aspectos: conhecimento de movimentos de massa sob diferentes contextos geomorfológicos, geológicos e climáticos, bem como no comportamento dos materiais; na descrição geral de uma encosta e na análise da suscetibilidade e do risco.

A seção da encosta estudada, onde ocorreram os deslizamentos, possui dimensões aproximadas de 117,0 m x 130,0 m, com cotas variando entre 27,7 m e 51,5 m e cobertura vegetal por cultivo de macaxeira. A caracterização dos materiais da área foi realizada a partir de investigações de campo, instrumentação e ensaios laboratoriais.

Em campo, além do levantamento topográfico, as investigações consistem de sondagens a percussão e rotativa, análise geológica, perfis de umidade, ensaios de condutividade hidráulica “in situ” (Guelph), coleta de amostras deformadas (em saco) e indeformadas (blocos e amostrador Denisson) e, ainda, a avaliação do descarte das águas servidas. Na campanha de instrumentação foram instalados piezômetros Casagrande, piezômetros de máxima, medidores de nível d’ água, verticais de inclinômetros e um pluviômetro na área de estudo. A localização das investigações de campo e instrumentação estão apresentadas na Figura 5.30.

Em laboratório foi realizada a caracterização física, química e mineralógica, análise da microestrutura dos solos, ensaio de condutividade hidráulica (Triflex), determinação da curva característica, ensaios edométricos, cisalhamento direto convencionais em condição inundada e na umidade natural, cisalhamento direto com reversão múltipla, ensaios “ring shear” e cisalhamento direto com controle de sucção.

5.3.2.1 Investigações de campo

Para a investigação da subsuperfície foram realizados 12 verticais de sondagem, sendo 10 a percussão e 2 mistas (SPT e rotativa), com profundidades variando entre 10,0 a 15,0 m, com exceção de três furos (SM-01, SM-02 e SP-02) que atingiram profundidades da ordem de 20,0 m. A caracterização geológica dos materiais ocorreu através da análise de todas as amostras coletadas dos furos de sondagem a cada 0,5 m e validou-se que a área é constituída pela Formação Barreiras sobreposta, em sua maioria, ao solo residual de granito, o qual constitui o embasamento local.

Figura 5.30 – Mapa topográfico da área e locação das investigações

Fonte: Silva (2007).

Na seção principal do escorregamento (SM-01 e SM-02), obteve-se uma espessa camada de areia argilosa de 7,5 m, com valores de SPT variando de 2 a 17 golpes, crescentes com a profundidade. Nas camadas de argila siltosa e areia siltosa, verifica-se uma mudança brusca nos valores de SPT, variando de 65 golpes/20 cm a 15 golpes/1 cm, até a profundidade de 11,0 m no furo SM-01 e média de 33 golpes/18 cm, na profundidade de 7,0 m, no furo SM- 02; coincidindo com o contato entre as duas formações geológicas presentes na área. A partir da profundidade de 11,0 m (SM-01) e 7,0 m (SM-02), fez-se necessária a utilização de sondagem rotativa devido a elevada resistência dos solos nesta profundidade.

Como resultado da sondagem e caracterização geológica, obteve-se o perfil geotécnico representado na Figura 5.31. A linha azul representa o contato da Formação Barreiras com o solo residual de granito, justamente onde há mudança significativa do SPT, com exceção do furo SP-02 onde há afloramento do solo residual de granito.

Figura 5.31 – Perfil geotécnico da encosta

Fonte: Silva (2007) e Coutinho et al. (2016).

Observa-se uma variabilidade das camadas ao longo da vertical do terreno, com alternância de solos argilosos, siltosos e arenosos de espessuras variáveis e descontínuas, com predominância de materiais arenosos. As camadas argilosas se intercalam nas camadas arenosas em toda a encosta. Os siltes encontram-se nas camadas mais inferiores, delimitados por uma camada de areia siltosa presente na base da encosta.

Foram obtidos perfis de umidade próximos aos furos de sondagem, em diferentes estações do ano permitindo a observação da sua variação em cada época. Até a profundidade de 2,0 m as umidades são bastante influenciadas pelas estações, com mínima de 9% no período seco e máxima de 36% no período chuvoso. De modo geral, a partir de 3,0 m de profundidade ocorre uma pequena variação do teor de umidade médio, de 20 a 30%, independentemente das

estações do ano e possivelmente devido ao elevado nível d’ água encontrado no local, mesmo em períodos secos.

Para a determinação da condutividade hidráulica (Kfs) foi utilizado o permeâmetro

Guelph, com ensaios próximos aos furos de sondagem e chegando a 1,5 m de profundidade. Nos solos da Formação Barreiras (SP-01), os resultados de permeabilidade variaram de 2 a 6 x 10-6 m/s, com valores mais elevados a partir de materiais com maior percentual de fração areia (Figura 5.32). Nos solos residuais de granito, especificamente os presentes no nível da superfície, os resultados de permeabilidade são da ordem de 2 x 10-7 m/s, 10 vezes menor do que o correspondente da Formação Barreiras.

Figura 5.32 – Resultados do ensaio “Guelph” do furo SP-01, Formação Barreiras

Fonte: Silva (2007) e Coutinho et al. (2016).

O potencial mátrico do fluxo do solo (ϕm), corresponde a habilidade de um solo “puxar”

água por capilaridade e relaciona-se diretamente com a sua umidade. Os resultados indicam a tendência do decréscimo do potencial de fluxo mátrico com o aumento das umidades.

A amostragem realizada constou da coleta de materiais indeformados tipo bloco, deformados armazenados em saco em profundidades de até 1,5 m e na coleta de material utilizando o amostrador Denisson, em profundidades próximas à superfície de ruptura.

Para finalizar, durante a pesquisa de campo de Silva (2007), procurou-se junto aos moradores informações a respeito do direcionamento do descarte das águas residuárias e de posse destas informações foi possível a identificação dos caminhos preferenciais e dos pontos de concentração dos descartes das águas (Figura 5.33).

Figura 5.33 – Direcionamento das águas residuárias na área de estudo

Fonte: Silva (2007).

As setas vermelhas indicam a direção do fluxo das águas residuárias e as setas amarelas ilustram a direção do fluxo de águas antrópicas descarregadas na encosta. Observou-se que as águas tendem a se encontrar em uma vala construída pelos próprios moradores, com o intuito de não terem suas casas invadidas pela água. Verificou-se, também, que as casas situadas no topo do local onde ocorreu o movimento de massa, descartam suas águas diretamente na encosta (seta azul). O círculo vazado ilustra a área de concentração de escoamento e, de um modo geral, todo o descarte é direcionado para o eixo principal do movimento de massa ocorrido.

5.3.2.2 Campanha de instrumentação

O programa de instrumentação contemplou 25 piezômetros tipo Casagrande, 18 piezômetros tipo máxima, 6 medidores de nível d’ água, 5 verticais de inclinômetros e 1 pluviômetro.

Os níveis piezométricos e níveis d’ água encontrados são bastante elevados, mesmo em períodos secos, na faixa de 3,5 a 4,0 m de profundidade. Em épocas de maiores precipitações, verifica-se os níveis d’ água e piezométricos em profundidades variando entre 0,5 m a 1,0 m e, inclusive, aflorando na encosta.

Área de influência do descarte antrópico

As informações obtidas através dos piezômetros associados ao perfil geológico, possibilitaram a interpretação do comportamento do fluxo subterrâneo na encosta, representado na Figura 5.34.

Os níveis piezométricos denominados de máximos 1 e 2, referem-se aos níveis piezométricos máximos obtidos dos piezômetros instalados nas menores (P1) e maiores (P2) profundidades. O nível piezométrico mínimo da encosta foi obtido através dos piezômetros instalados nas maiores profundidades (P2), denominado de nível piezométrico mínimo 2.

Obteve-se um fluxo de água subterrâneo descendente no furo SP-01, onde ocorre um fluxo ascendente. No furo SP-02 o fluxo retorna a ser descendente chegando quase paralelo ao nível do terreno no furo SP-03. A mudança de direção do fluxo subterrâneo entre SP-01 e SP- 02, ocorre, provavelmente, em virtude da mudança de formação geológica associada à permeabilidade dos materiais.

Figura 5.34 – Perfil geotécnico com indicações dos níveis piezométricos e níveis d’ água máximos e mínimos e provável direção do fluxo subterrâneo

No eixo do movimento de massa ocorrido foram instalados inclinômetros que monitoraram os deslocamentos horizontais de novembro de 2004 a agosto de 2007. Os resultados apresentaram deslocamento em forma de bloco, com valor máximo acumulado de aproximadamente 140 mm no furo SP-02, representado na Figura 5.35. A instrumentação foi implantada após a ocorrência da ruptura, portanto o deslocamento horizontal refere-se à fase de reativação. Os resultados obtidos com as verticais de inclinômetros mostram que a superfície de ruptura encontra-se próxima ao contato entre as formações geológicas (profundidade 7,0 m), à exceção do furo SP-02, no qual ocorre afloramento do solo residual de granito.

Figura 5.35 – Deslocamentos horizontais referentes à vertical do furo SP-02

Fonte: Silva (2007) e Coutinho et al. (2016).

A Figura 5.36 apresenta as precipitações mensais ocorridas no município, registradas no pluviômetro instalado no posto da prefeitura e na área de estudo. A distância entre os equipamentos é de aproximadamente 3,5 km. O clima da região é classificado por Köppen como As’, tropical úmido com estação chuvosa de outono-inverno e verão seco. A temporada de chuvas está concentrada nos meses de março a agosto, com precipitação de níveis médios máximos mensais que variam de 150 a 600 mm. O mês de junho apresenta precipitações acima de 500 mm, considerado o período crítico para deslizamentos de terra.

Figura 5.36 – Precipitações mensais registradas de 2000 a 2007 pelos pluviômetros da prefeitura e da encosta

Fonte: Silva (2007) e Coutinho et al. (2016).

Para verificar a influência das águas de chuva na aceleração dos movimentos horizontais, a Figura 5.37 apresenta a variação dos deslocamentos com o tempo, relacionados com a chuva acumulada de 25 dias. Este período de antecedência da chuva foi escolhido baseando-se em exemplos da literatura nacional, os quais apresentam bons resultados (SCHILLING, 1993; LACERDA, 1997; FONSECA, 2006 apud SILVA, 2007). Durante o período de baixas precipitações pluviométricas (novembro de 2004 a março de 2005) os deslocamentos observados são praticamente nulos. No final do mês de abril de 2005 coincidindo com chuvas acumuladas da ordem de 100 mm, foi observada a primeira reativação do movimento com deslocamentos horizontais na faixa de 36 a 47 mm. A movimentação ocorreu até o mês de julho, com acúmulo de deslocamentos horizontais de 80 a 100 mm. Uma segunda reativação do movimento ocorreu entre maio e agosto de 2006, com deslocamentos na faixa de 40 mm. A movimentação ficou estabilizada durante o período seco até meados de março de 2007, quando houve nova reativação com deslocamentos de 10 mm.

5.3.2.3 Ensaios de Laboratório

As amostras indeformadas (tipo bloco), deformadas (em saco) e coletadas através do amostrador Denisson, foram submetidas aos ensaios de laboratório, comentados nesta seção.

F igu ra 5 .37 – D es lo ca m ent o s h o ri z o n ta is do m o v im ent o de m a ss a re la ci o n a do s co m a c huv a a cu m ul a da de 2 5 d ia s F o n te : S il v a (2 007) .

Inicialmente foi realizado o ensaio granulométrico, com e sem adição de defloculante. Na análise com defloculante (Tabela 5.2), os materiais da Formação Barreiras apresentaram predominantemente grossos, com menos de 50% dos grãos passando na peneira nº 200. A fração que prevalece é de areia, com percentual de 57% a 62,5%. O solo residual de granito é classificado predominantemente grosso na profundidade de 1,5 m, com domínio da fração areia, e na profundidade de 2,5 m torna-se argiloso, classificado como textura fina com mais de 50% dos grãos passando na peneira nº 200. Nos ensaios sem defloculante (Tabela 5.3), houve redução nos percentuais das frações argila e aumento dos percentuais de silte e areia fina, indicando que a argila tende a apresentar-se agregada em seu estado natural nas duas formações geológicas. Na Figura 5.38, como exemplo, é apresentada a curva granulométrica para solos residuais de granito com e sem defloculante.

Tabela 5.2 – Resumo dos ensaios de caracterização física com defloculante