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2. Histórico

3.3 Caracterização dos sujeitos

O recorte metodológico da pesquisa para reproduzir o perfil das entrevistadas, mulheres negras na base da pirâmide social, contemplou as variáveis sexo, cor, classe social, incorporando ainda idade, como um possível fator de diferenciação. Essas variáveis definem a pertinência da participação da entrevistada, identificando-a (ou não) ao recorte.

Em relação ao sexo foram entrevistadas apenas mulheres. No que tange à cor foram escolhidas aquelas que são apontadas em seu meio social como negras, definição que engloba mulheres pretas e pardas, segundo os critérios adotados pelo IBGE. Em relação à classe social foram selecionadas aquelas que em função de sua escolaridade e bens inscrevem-se nas classes “D” e “E”, tal como define a Associação Brasileira de Institutos de Pesquisa de Mercado (ABIPEME) 156.

Não obstante a especificidade da definição desses parâmetros é necessário tecer ainda algumas considerações sobre eles, sobretudo em relação àqueles que mesmo obedecendo a um critério classificatório amplamente reconhecido se revelam controversos, como é o caso do quesito cor e da definição de classe social. Além destes, considera-se pertinente considerar também a aspectos relativos às variáveis idade, escolaridade e estado civil.

No que diz respeito à idade as entrevistadas foram selecionadas segundo três faixas etárias, definidas pela OMS para classificação de grupos

etários: as jovens, até 24 anos de idade, as idosas, a partir dos 60 anos e as adultas, com idades compreendidas no intervalo entre essas duas faixas limite. Em relação ao quesito cor, como recorte desta pesquisa buscou levantar a qualidade de vida de mulheres que poderiam sofrer discriminação em decorrência de sua cor, participaram do grupo estudado mulheres que assim eram definidas em seu meio social, mesmo nos casos daquelas que não se definiram como negras no momento inicial da entrevista, mas e que ao longo da conversa identificaram-se como vítimas de discriminação por cor. Deve-se ressaltar, no entanto, que a participação de cada entrevistada foi sugerida à entrevistadora por uma habitante local, pessoa que se define como negra.

Em relação à definição de classe social aqui utilizada também se faz necessário apontar o porque da escolha de um parâmetro tão distante da extensa produção sociológica, que, partindo de distintas perspectivas teóricas e ideológicas, formalizou o uso do conceito ainda no Século XIX e vem discutindo intensamente sua aplicação ao longo de todo Século XX 96. Longe de negar tal tradição, a escolha dessa definição decorre, na verdade, de uma opção minimalista, haja vista que para os propósitos do trabalho de campo e da análise posterior dos dados levantados era necessário apenas limitar a seleção das entrevistadas segundo critérios econômicos e sociais que permitissem defini-las como pertencendo ao segmento social que se encontra na base da pirâmide social no país. A forma de classificação escolhida atende a esses requisitos, pois define o pertencimento a uma determinada classe, a partir de critério socioeconômico, que enquadra as pessoas nas classes A, B, C, D ou E,

televisor, geladeira e automóvel, assim como a possibilidade de contar com o trabalho de empregados domésticos 156. Tal associação permite inferir ainda uma relação indireta entre consumo e renda, suficiente para alinhar as especificações do recorte a essa forma de caracterização do perfil. Não obstante essa forma de classificação faz-se referência à classe das entrevistadas utilizando, em alguns momentos, a categoria classes populares

96.

Quanto à variável etária, as entrevistas foram feitas com mulheres entre 13 e 63 anos de idade, intervalo etário que permite perceber algumas das transformações na conjuntura do país neste período de tempo. As idosas nasceram na década de 1940 e as condições de sua infância revelam muito da moralidade que pautava o país rural que o Brasil ainda era naquele período. As adultas, nascidas em pequenas cidades do interior, revelam a transformação nas moralidades, ocorrida nas décadas seguintes, decorrente das mudanças na estrutura social, que definia tradicionalmente a construção das identidades e os padrões de pertencimento. As jovens, que já nasceram em capitais de Estados ou no DF, demonstram em suas falas o impacto dessas transformações. Na comparação entre esses três conjuntos de respostas é possível estabelecer os aspectos das moralidades que se mantiveram estáveis na sociedade brasileira ao longo desse período, como a subordinação do sexo feminino na esfera doméstica, assim como outros que se alteraram, como a inserção das mesmas no mundo do trabalho e na esfera pública.

As perguntas sobre local de nascimento e procedência permitem retratar com clareza a migração para as áreas urbanas, correlacionando-se aos

indicadores dos fluxos demográficos nacionais. Nesse sentido, a relação entre idade e local de nascimento das entrevistadas permite perceber o processo migratório como um fluxo, que se desloca das áreas rurais para as urbanas, dos pequenos para os grandes centros.

Também a escolaridade da entrevistada e a escolaridade, idade e sexos de seus filhos, podem refletir o aumento da escolaridade da população em geral e das mulheres em específico. O número de filhos e sua idade podem mostrar a tendência à diminuição no número de filhos, retratado por instrumentos censitários e amostrais. Por fim, a pergunta sobre quantos filhos estão vivos, que inevitavelmente desencadeia o relato de como e quando morreram, permite estabelecer paralelo com indicadores de mortalidade infantil, mortalidade por agravos externos e expectativa de vida ao nascer.

As variáveis estado civil e quantos casamentos completam a tipificação do perfil, contribuindo para levantar a moralidade que orienta a visão de mundo da entrevistada. É importante salientar que, nesta pesquisa, estado civil corresponde à situação conjugal, sendo definidas como casadas todas as mulheres com vínculos estáveis e que vivem em regime de coabitação, sendo legalmente casadas ou não. Tal classificação, que espelha a moralidade em relação à fidelidade conjugal, sopesa e contrapõe padrões de comportamento pautados pelo exercício da liberdade individual e a esfera do compromisso social 157.

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