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1.1 Revisão bibliográfica

1.1.8 Carbonatação de resíduos industriais e urbanos

Resíduos industriais e urbanos são fontes alternativas de cálcio ou magnésio para a carbonatação mineral. Eles são materiais de baixo valor agregado, que não precisam ser extraídos da natureza por uma atividade mineradora. Eles apresentam maior reatividade do que os silicatos naturais, logo, o processo tem um menor custo, devido a um menor consumo de energia e reagentes, e devido ao maior rendimento na formação dos produtos. Esta maior reatividade pode ser explicada pelos seguintes fatores: i) Em geral, os resíduos industriais e urbanos possuem elevadas concentrações de cálcio. A cinética de carbonatação do cálcio é mais rápida do que a do magnésio, que está presente nas fontes de silicatos naturais mais adequadas para a carbonatação mineral. ii) Os resíduos tendem a possuir maior porosidade, maior área superficial e maior instabilidade química. Muitos deles são formados pelo resfriamento rápido em altas temperaturas (OLAJIRE, 2013).

Além destas características dos resíduos industriais e urbanos, se a planta de carbonatação mineral localizar-se próxima das indústrias geradoras dos resíduos e das fontes emissoras de CO2, o custo de transporte dos resíduos e do CO2 podem ser

drasticamente reduzidos. Apesar destas vantagens, os resíduos industriais e urbanos são produzidos em pequena quantidade, quando comparados as emissões totais de CO2. Porém, a implementação da carbonatação mineral para resíduos industriais e

urbanos pode ser o primeiro passo para a viabilização técnica e econômica desta tecnologia em escala industrial (BOBCIKI et al., 2012).

Página | 28 Diversos resíduos têm sido estudados para o uso na carbonatação mineral ex- situ: rejeitos de mina (crisotila e níquel), cinzas de processos de combustão, resíduos de incineradores, resíduos de cimento e concreto, pó de forno de clínquer, lama vermelha, escórias da siderurgia, resíduos da indústria de papel e resíduos de gesso (KIRCHOFER et al., 2013; BOBCIKI et al., 2012; LEE et al., 2012; YADAV et al., 2010; PAN, et al., 2012).

A capacidade de carbonatação depende da concentração de cálcio ou magnésio destes resíduos, pois concentrações mais elevadas destes metais podem produzir mais carbonato. Porém, a formação de carbonatos depende das substâncias químicas presentes no resíduo, porque óxidos e hidróxidos de cálcio ou magnésio são mais reativos do que os silicatos de cálcio ou magnésio, Figura 21.

Fonte: adaptado de Pan et al., 2012 Figura 21: Capacidade de conversão de CO2 em carbonato dos resíduos

industriais e urbanos com maiores concentrações de cálcio.

Além da sua composição química é importante analisar a quantidade, o local de produção e as propriedades físicas de cada resíduo, pois o ideal para a carbonatação mineral é que o resíduo tenha um baixo custo de transporte e de pré- tratamento (britagem, moagem, etc.), e que seja produzido em grande quantidade para ser usado na carbonatação em escala industrial (BOBCIKI et al., 2012).

Neste trabalho, foram utilizadas para a carbonatação mineral escórias de aciaria ácida e básica, pó de forno de clínquer, resíduo de gesso da construção civil, resíduo de gesso da produção de ácido fosfórico e resíduo de gesso da dessulfurização de gases industriais.

Página | 29 1.1.8.1 Resíduos da indústria siderúrgica

Na produção do aço, existem dois tipos de usinas: integradas e semi- integradas. Nas usinas integradas, o minério de ferro é reduzido pelo monóxido de carbono gerado na combustão de coque ou carvão vegetal em um equipamento chamado de alto forno. É gerado o ferro gusa líquido, liga de ferro e carbono com teor elevado de carbono, e a escória de alto forno (0,2 a 0,3 t de escória/t de ferro gusa) (ARCELOR MITTAL TUBARÃO, 2014), que contém as impurezas presentes nos minérios. O ferro gusa líquido é enviado para a aciaria, onde ele é refinado em um forno de gás oxigênio, produzindo o aço e a escória de aciaria (impurezas do ferro gusa). Por fim, o aço é lingotado e laminado para confecção dos produtos finais. Nas usinas semi-integradas, não há a etapa de redução do minério de ferro. O aço é produzido pelo refino de sucata metálica reciclada ou ferro gusa adquirido de terceiros em um forno de arco elétrico, Figura 22.

Fonte: INSTITUTO AÇO BRASIL, 2014 Figura 22: Fluxo simplificado de produção de aço.

Dessa forma, a emissão de CO2 da siderurgia depende do processo de

obtenção do aço. As usinas integradas são as maiores emissoras de CO2, porque as

principais fontes de emissão de CO2 na siderurgia estão no alto forno, na sinterização,

na coqueificação, no forno de cal, na aciaria e na queima dos gases no flare. Em 2013, as principais usinas brasileiras emitiram 52,7 milhões de toneladas de CO2

(INSTITUTO AÇO BRASIL, 2014), com uma emissão média de 1,54 t CO2/t aço bruto.

Além da grande quantidade de CO2, as usinas siderúrgicas também produziram 378

kg escórias/t aço, o que correspondeu a 11,2 milhões de toneladas de escórias (INSTITUTO AÇO BRASIL, 2013).

Página | 30 No Brasil, a escória de alto forno da produção de ferro-gusa é totalmente vendida para a indústria cimenteira para produção de cimento Portland. No entanto, a escória de aciaria não pode ter a mesma aplicação, devido a maior concentração de ferro e manganês e menor concentração de alumínio (DAS et al., 2007; JUNIOR, 2012). Após seu resfriamento, beneficiamento e controle de qualidade, a escória de aciaria gerada no processo de refino do ferro gusa ou da sucata metálica (0,13 a 0,2 t escória/t de aço), passa a ser classificada como agregado siderúrgico e pode ser comercializada como lastro ferroviário, bases e capas asfálticas de pavimentos rodoviários, estradas vicinais, gabiões2 e rip-raps3 (CENTRO DE COPRODUTOS

AÇO BRASIL, 2014; YU e WANG, 2011). Porém, a indústria siderúrgica não consegue doar ou comercializar a totalidade da escória de aciaria, sendo assim, mais de 6 % da escória de aciaria é armazenada como resíduo nos pátios das indústrias siderúrgicas, Figura 23. As empresas evitam a disposição final das escórias, devido a seu custo elevado. Ela deve ser feita em aterro industrial contratando-se empresas especializadas para realização do transporte.

Fonte: INSTITUTO AÇO BRASIL, 2013 Figura 23: Destinação e aplicação dos agregados siderúrgicos no Brasil em 2012.

2 Gabiões: Muros formados por gaiolas de redes de aço zincado preenchidas com pedras de

mão ou agregado siderúrgico.

3 Rip-raps: Técnica de estabilização de taludes e contenção de encostas, que utiliza sacos

Página | 31 A escória de aciaria é um resíduo composto por óxido de cálcio e óxido de magnésio, além de silicatos de cálcio e alumínio. A relação entre as concentrações de CaO/SiO2 maior que 1 classifica a escória como básica, já a relação CaO/SiO2 menor

que 1 classifica a escória como ácida (ARAUJO, 2008).

Portanto, a carbonatação mineral tem um grande potencial para ser aplicado na indústria siderúrgica, porque ela é responsável por 6 a 7 % das emissões globais antropogênicas de CO2 e gera uma grande quantidade de resíduos ricos em óxido de

cálcio (32 a 58 % m/m) (KIRCHOFER et al., 2013). Além disso, a produção de carbonato de cálcio pode ser usada na própria indústria como matéria-prima para produção do aço. Estima-se que a captura de CO2 de gás de alto forno tenha um custo

de 20 a 30 US$/t CO2 (IPCC, 2007; KIM, et al., 2013).

1.1.8.2 Resíduos da indústria cimenteira

O cimento Portland é fabricado pela mistura de clínquer com algumas adições: gesso, escória de alto forno, material pozolânico ou calcário. A adição escolhida e a proporção usada é que definem a aplicação dos vários tipos de cimento. O clínquer é o constituinte principal do cimento, composto basicamente por uma mistura de silicatos e óxidos de cálcio (Ca3SiO5, Ca2SiO4, Ca3Al2O6 e 4 CaO.Al2O3Fe2O3). Ele é

obtido pelo aquecimento a 1450 °C de calcário (90 %) e argila (10%) em um forno rotativo, Figura 24 (POCKLINGTON e LEESE, 2010; ABCP, 2014).

Fonte: MDIC, 2013 Figura 24: Fluxo simplificado de produção de cimento.

A produção do cimento é intensa em energia e grande emissora de CO2, devido

Página | 32 de calor para a produção do clínquer (40%). Os 10 % restantes da emissão de CO2

estão relacionados ao transporte e beneficiamento (britagem e moagem) dos materiais (MDIC, 2013) . A indústria cimenteira brasileira emite em média 600 kg CO2/t

de cimento (DE LIMA, 2010; VOTORANTIM CIMENTOS, 2012). Em 2013, ela teve uma emissão total de aproximadamente 40 milhões de toneladas de CO2 (SNIC,

2013).

Outro resíduo importante da indústria cimenteira é o material particulado (pó) coletado na saída do forno de clínquer, denominado de pó de forno de clínquer. É uma mistura de carbonato e óxido de cálcio, que é produzida em uma taxa de 0,15 a 0,20 t/t de cimento (BOBCIKI et al., 2012; KIRCHOFER et al., 2013) para controlar as emissões de material particulado da indústria. A RESOLUÇÃO CONAMA n° 382/2006 estabelece um limite máximo de emissão de pó do forno de clínquer de 50 mg/Nm3

para as indústrias de cimento. As fábricas reutilizam este resíduo totalmente ou parcialmente no próprio processo, de acordo com a composição química do resíduo, que pode variar em função da composição das matérias-primas, do combustível usado no forno e da operação da planta industrial (HUNTZINGER et al., 2009).

Portanto, a indústria cimenteira tem um potencial elevado para aplicação da carbonatação mineral, pois ela é responsável por 5 % das emissões globais antropogênicas de CO2 e gera quantidades elevadas de resíduos ricos em óxido de

cálcio (38 a 50 % m/m) (KIRCHOFER et al., 2013). O pequeno tamanho de partícula do pó de forno de clínquer torna-o muito vantajoso, pois dispensa a moagem do resíduo para aumentar a sua reatividade. Além disso, a produção de carbonato de cálcio pode ser usada na própria indústria como matéria-prima na produção do clínquer. Estima-se, que a carbonatação mineral é capaz de reduzir 65 a 70 % das emissões de CO2 da indústria cimenteira a um custo de 50 a 250 US$/t CO2 (IPCC,

2007).

1.1.8.3 Resíduos da indústria de fertilizantes

Fertilizantes com elevados teores de fósforo (> 20 % m/m) utilizam o ácido fosfórico como insumo básico na sua produção industrial. O ácido fosfórico pode ser produzido por via seca através da redução do fósforo em um forno de arco elétrico em uma primeira etapa, ou por via úmida através do ataque com ácido sulfúrico. A via úmida é usada mundialmente, em 90 % dos casos, devido ao seu menor custo, porém

Página | 33 ela gera um grande passivo ambiental denominado fosfogesso (5 t de fosfogesso/t de ácido fosfórico). A produção de fosfogesso mundial é variável e estimada em 100 a 280 milhões de toneladas por ano. Apenas 15 % da produção mundial é reciclada como material na construção civil, como fertilizante e condicionador de solo e como adição na produção de cimento Portland (TAYIBI et al., 2009). O restante é estocado em grandes pilhas a céu aberto ocupando imensas áreas e causando graves problemas ambientais de contaminação química (metais tóxicos) e radioativa (presença de 226Ra e 210Po) (PAPASTEFANOU et al., 2006; SAUEIA, 1998;

RUTHERFORD et al., 1994). No Brasil, há um estoque estimado de 170 milhões de toneladas e uma produção anual de aproximadamente 5 milhões de toneladas (MME/BIRD, 2009; CETEM, 2010).

O fosfogesso é a mistura de sulfato de cálcio dihidratado (CaSO4.2H2O) e

hemihidratado (CaSO4.0,5H2O) produzida pela reação do ácido sulfúrico (H2SO4) com

o principal mineral do minério de fósforo, a fluoroapatita (Ca10(PO4)6F2). Os outros

produtos da reação são o ácido fosfórico (H3PO4) e o ácido fluorídrico (HF), equação

11.

Ca10(PO4)6F2(s) + 10 H2SO4(aq) + 20 H2O(l) → 10 CaSO4.2H2O(s) + 6 H3PO4(aq) + 2 HF(aq) Eq. 11

Por outro lado, na produção de fertilizantes nitrogenados, há o consumo de aproximadamente 1,2 % da energia mundial (IPCC, 2010), sendo que mais de 90 % dessa energia é utilizada na produção de amônia (NH3). Além disso, há uma emissão

de CO2 de aproximadamente 1 % das emissões globais de gases de efeito estufa,

devido a produção de gás hidrogênio (H2). Metade do CO2 produzido é utilizado

internamente para a produção de ureia, porém a outra metade é descartada na atmosfera (IPCC, 2007), Figura 25.

Fonte: FOSFÉRTIL, 2014 Figura 25: Processo simplificado de produção de fertilizantes da Fosfértil em Uberaba/MG.

Página | 34 Portanto, a indústria de fertilizantes é uma candidata potencial para aplicação da carbonatação mineral, pois apresenta uma emissão de CO2 de alta pureza, o que

facilita a sua captura, e além disso possui grande quantidade de resíduo de fosfogesso rico em cálcio.

1.1.8.4 Resíduos de combustão de processos industriais

A queima de combustíveis fósseis em processos industriais produz grande quantidade de CO2. Porém, também são gerados em menor quantidade óxidos de

enxofre (SO2) e nitrogênio (NO), que podem ser oxidados e formar ácido sulfúrico e

ácido nítrico, respectivamente, ao reagir com a água da atmosfera. Estes ácidos são responsáveis pela maior acidificação da chuva, o que provoca danos ao meio ambiente e aumenta a corrosão de construções (IQ/USP ON LINE, 2015).

A RESOLUÇÃO CONAMA n° 382/2006 estabelece os limites máximos de óxido de enxofre e nitrogênio, que as fontes fixas podem emitir em seus processos de combustão. Para atender a legislação ambiental é preciso usar combustíveis isentos de enxofre e usar gás oxigênio puro ao invés de ar atmosférico nos processos de combustão. Estas soluções, em muitos casos, aumentam o custo do processo industrial. Logo, é comum controlar a emissão de óxidos de enxofre através de tecnologias de dessulfurização das emissões gasosas. A técnica de dessulfurização mais usada consiste em uma lavagem dos gases com uma suspensão aquosa de cal (CaO) e calcário (CaCO3), que produz gesso, de acordo com as equações 12, 13 e 14

(DOS SANTOS, 2007).

SO2 (g) + H2O (l) → H2SO3 (aq) Eq. 12

H2SO3 (aq) + 1/2 O2(g) → H2SO4 (aq) Eq. 13

H2SO4 (aq) + CaCO3(s) + 2 H2O (l) → CaSO4.2H2O (s) + H2O (l) +CO2 (aq) Eq. 14

A composição química do resíduo de gesso da dessulfurização de gases de combustão depende do calcário e das condições de operação usadas na lavagem dos gases, além da própria composição química dos gases de emissão industrial. Todavia, o principal componente deste resíduo é sempre o sulfato de cálcio dihidratado (CaSO4.2H2O), o que lhe confere uma concentração de óxido de cálcio (CaO) maior

que 30 % m/m (LEE et al., 2012).

A carbonatação mineral de resíduos de gesso da dessulfurização de gases de combustão é fortemente indicada para diminuir as emissões de CO2 de processos

Página | 35 industriais convertendo-o em carbonato de cálcio (CaCO3), que pode ser reciclado na

própria dessulfurização de gases de combustão.

1.1.8.5 Resíduo de gesso da construção civil

Estima-se que o gesso corresponda entre 1 a 15 % dos resíduos sólidos da construção civil (PINHEIRO, 2011). Esta é responsável pela geração de aproximadamente 50 % dos resíduos sólidos urbanos no Brasil (SINDUSCON CE, 2011). Portanto, uma grande quantidade de resíduos é gerada pela construção civil, devido ao desperdício na aplicação por falta de planejamento das atividades e treinamento da mão-de-obra ou devido à demolição de obras, que usaram o gesso como revestimento.

A disposição do gesso no meio ambiente pode causar a contaminação do solo e lençol freático com excesso de enxofre, devido a sua lixiviação pelas chuvas (PINHEIRO, 2011). Assim, a RESOLUÇÃO CONAMA n° 431/2011, que altera a RESOLUÇÃO CONAMA n° 307/2002, classifica o gesso como resíduo reciclável, que deve ser usado novamente em outros processos industriais. Ele não deve ser disposto em aterros sanitários como os demais resíduos sólidos urbanos (PORTAL RESÍDUOS SÓLIDOS, 2014).

O gesso da construção civil é composto por sulfato de cálcio anidro (CaSO4) e

hemihidratado (CaSO4.0,5H2O). Ele é proveniente da calcinação entre 150 °C e 200

°C do mineral gipsita (CaSO4.2H2O), equação 15.

2 CaSO4.2H2O (s) → CaSO4 (s) + CaSO4.0,5H2O (s) + 3,5 H2O (l) Eq. 15

Na aplicação do gesso na construção civil é necessária à sua hidratação através da adição de água. Logo, o resíduo de gesso da construção civil é composto por sulfato de cálcio dihidratado (CaSO4.2H2O) e pode ser usado para a carbonatação

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