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4. As perturbações nascidas na fase de gestação

5.5. O caso de Andrea Yates

Quando falamos em perturbações pós-parto e infanticídio é difícil deixar de mencionar o caso mais mediático de todos os tempos, o de Andrea Yates, a mulher que afogou os seus 5 filhos na banheira, em Junho de 2001.

Em Fevereiro de 1999, Andrea deu à luz o seu 4º filho, e em Junho desse mesmo ano sofreu de depressão e tentou suicidar-se. Após uma outra tentativa de suicídio, Andrea frequentou consultas de psiquiatria com a Dr.ª Eileen Starbranch que a reencaminhou para um hospital psiquiátrico, onde confessou que desde o nascimento do seu primeiro filho ouvia vozes e tinha visões. Antes de receber autorização para abandonar os tratamentos no hospital psiquiátrico, a psiquiatra alertou Andrea e o marido, Russel Yates, de que não seria aconselhável que Andrea tivesse mais filhos, pois poderia voltar a sofrer de um episódio psicótico. Após sair do hospital as consultas de psiquiatria deixaram de ser frequentes. Antes do homicídio das crianças, a última consulta com a Dr.ª Starbranch foi em 2000, na qual Andrea confessou que tinha deixado de tomar a medicação em 1999.

Em Novembro de 2000 deu-se o nascimento do último filho. Em Março de 2001 o pai de Andrea faleceu, e esta começou a apresentar comportamentos disfuncionais, e a desenvolver novamente uma depressão. Assim, poucos dias depois, Russel contactou com a Dr.ª Eileen Starbranch que instruiu que Andrea fosse vista imediatamente por ela, contudo, Russel alegou que não a podia levar até à psiquiatra e, por isso, Andrea foi encaminhada para outro hospital. Neste hospital foi tratada pelo Dr. Mohammed Saeed, que observou que Andrea se encontrava em estado catatónico e delirante. Em Abril foi autorizada a abandonar o tratamento do hospital, a pedido da família Yates, mas mantendo o tratamento em casa. Foi aconselhado que Andrea não ficasse sozinha com os filhos, contudo, Russel não considerou que tal não fosse seguro e por isso pediu à sua mãe para que visitasse diariamente Andrea, quando não estivesse em casa. A mãe de Russel descreveu Andrea num estado catatónico, errático e sem resposta.

Um mês antes dos homicídios, Andrea encheu uma banheira com água e quando questionada, disse que talvez pudesse vir a precisar.

101 Em Maio retornou ao hospital psiquiátrico sobre uma nova medicação, sendo libertada poucos dias depois com a indicação de que se encontrava apta para cuidar dos filhos mas com algumas precauções. Em Junho abandonou a nova medicação prescrita e foram reajustadas as dosagens da anterior medicação. Negou a presença de qualquer

sintoma psicótico e pensamentos suicidas455.

A 20 de Junho, entre o tempo em que Russel saiu para o emprego e Andrea esperava a chegada da mãe do marido, afogou os 4 filhos mais novos na banheira e, quando já mortos deitou-os na cama enrolados em lençóis. O filho mais velho do casal assistiu ao afogamento do bebé, fugindo de seguida, contudo, Andrea conseguiu alcançá-lo e agarrá-lo para o levar para a casa-de-banho, apesar das tentativas de fuga do mesmo,

afogando-o e deixando-o na banheira. De seguida, ligou para Russel e para a polícia456.

A casa da família Yates foi descrita pela polícia como muito suja, onde não se poderia encontrar um copo limpo. A família de Andrea relatou que nos dias anteriores aos homicídios esta se encontrava num estado apático e que não alimentava

correctamente os filhos457. Contudo, alguns dias após o acontecimento, a família e

alguns vizinhos descreveram-na como uma mãe carinhosa458.

Dias mais tarde, Andrea confessou à polícia que planeara a morte dos filhos há já algum tempo, pois tinha chegado à conclusão de que era uma má mãe e que as crianças

estavam irremediavelmente danificadas459, e que essa seria a única alternativa para as

salvar e combater ela própria Satanás460.

Russel relatou que após o nascimento do 5º filho do casal, Andrea estava num estado mental de deterioração e robótico, passando a dormir e comer pouco, ao ponto de não ser capaz de amamentar, o que aumentou ainda mais o estado de ansiedade do qual padecia. Tinha o hábito de arranhar as pernas e os braços até deixar marcas, e o couro cabeludo até aparecerem pontos calvos na cabeça. Era vista por outras pessoas como

455 WALKER, April J., op. cit., pp. 207-209.

456 BANGS, Elizabeth T., “Disgust and the Drownings in Texas: The Law Must Tackle Emotion when

Women Kill Their Children”, in UCLA Women's Law Journal, vol. 12, 2001, p. 94 (87-108). 457 Ibid., pp. 93-94.

458 Ibid., p. 89. 459 Ibid., p. 94.

102 calma, mas nervosa, contudo, para Andrea esse seu estado eram apenas tentativas de

não magoar alguém461.

No julgamento de Andrea foram chamados 10 psiquiatras e 2 psicólogos para avaliar e testemunhar sobre o seu estado mental, apesar de nem todos a terem acompanhado durante o tratamento. Quatro psiquiatras testemunharam que no momento das mortes Andrea não estava capaz de distinguir o bem do mal e por isso não conseguia reconhecer que o que fez era errado, ou que devido ao seu estado acreditava que o que estava a fazer era correcto. A Dr.ª Melissa Ferguson, não testemunhou no sentido de que Andrea se encontrava capaz de reconhecer o bem do mal, mas alegou que esta lhe confessou que o afogamento das crianças era a melhor opção a ser tomada. Para Dr. Park Dietz, que não tratou Andrea, esta estava capaz de distinguir o bem do mal e sabia que o que estava a fazer era errado, pois alegava que tinha sido o diabo a dizer-lhe para o fazer462.

Andrea foi condenada por homicídio em 1º grau – “capital murder” -, contudo, em recurso foi julgada como inimputável. No primeiro julgamento o júri considerou que o facto de ter sido a mesma a chamar a polícia comprovava que estava em plena posse das

suas faculdades mentais e, por isso, capaz de distinguir o bem do mal463, bem como o

facto de afirmar que sabia que o que estava a fazer era legalmente errado, mas apesar

disso constituía a única escolha moralmente aceitável464.

Após ser condenada continuou com delírios e alucinações derivados da psicose puerperal. Chegada ao estabelecimento prisional onde iria cumprir a pena, pediu ao psiquiatra residente para que lhe rapassem a cabeça, de forma a que pudesse ver o número “666” gravado na cabeça, pois ela era Satanás, e afirmou que a morte dos seus filhos tinha sido a única forma de os salvar, tendo sido o seu castigo e não o deles. Pediu para que o Presidente George W. Bush a mandasse executar como um exorcismo sancionado pelo Estado para libertá-la de Satanás. Apesar de ser tratada para a psicose,

continuou com alucinações na prisão, imaginando, por vezes, cavalos nas paredes465.

461 Ibid., p. 606.

462 WALKER, April J., op. cit., pp. 209-210.

463 NAU, Melissa, BENDER, Eric, STREET, Judith, op. cit., p. 321. 464 FISHER, Kimberley, op. cit., p. 613.

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