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4 ACHADOS EMPÍRICOS DE PESQUISA

4.1 Questões da Pesquisa Narrativa e Análise das Categorias

4.1.5 CATEGORIA “DINAMIZAÇÃO DO ENSINO-APRENDIZAGEM”

Quando perguntados sobre em quais aspectos as atividades inovadoras que realizaram interferiram na prática pedagógica, veio à tona mais uma unanimidade: a totalidade dos interlocutores, de um modo ou de outro, afirmaram que “Em todos", no sentido da “Dinamização do ensino-aprendizagem”.

Sobre esse processo, a fala a seguir foi muito reveladora sobre a necessidade de assunção do professor ao papel de eterno aprendiz em sua formação e prática pedagógicas:

[...] essas atividades interferem na minha prática, primeiro no sentido de me fazer feliz naquilo que eu faço, me renova. Outro é que comecei a perceber o aluno como único; não como algo anacrônico, de pensar que ele tem de ser como eu era como aluna. Tenho de ver o lugar que o aluno ocupa: o aluno de hoje não é o aluno do meu tempo. A gente não tinha toda essa tecnologia. [...] Eu vejo o aluno no tempo dele. [...] Tenho de partir da perspectiva de como eu me sentiria se estivesse assistindo a minha aula. Então, eu repenso sempre as minhas práticas. [...] Até hoje eu estou em formação: cada experiência me forma; o dia que eu estiver formada, estarei deformada. O professor é aquele que nunca se forma; está em constante formação. (PP1).

Aqui novamente dialogamos com a visão de docente como “estudante

permanente” já mencionada por Borges (2010), em um ato de reconhecimento da nossa

incompletude enquanto ser no mundo que busca o constante aperfeiçoamento. Interpretando o excerto e levando-o um pouco adiante, depreende-se que o docente se forma de maneiras díspares. Nada obstante, há que firmar a relevância da reflexão (Schon, 1992) sobre a prática para a formação do professor:

[...] A reflexão ativa a memória e ajuda a comparar nossa experiência presente com a passada; a constratá-la com a de outros professores e professoras; e a revisar a mudar nossas práticas – porque a reflexão é também experiência. (CARBONELL, 2002, p. 112).

Em outra participação, assume-se a mudança na visão do que seria o local de fala do professor:

[...] tive que ter a coragem e sair desse lugar de professor que professa conhecimentos, que está num patamar superior ao do aluno e ir para um lugar muito mais de mediadora, que ganharia os alunos não pela imposição, mas pela consistência da prática pedagógica, pela clareza na intencionalidade pedagógica. Então, essas metodologias que eu utilizei, elas procuraram se afastar desse modelo instrucional, instrucionista onde a gente fica falando, falando, falando para os meninos; eles ficam ali como objetos passivos [...] e ir para um outro modelo onde houvesse muito mais interlocução, muito mais interação, que a interação não fosse só comigo, que as aprendizagens não

acontecessem só a partir da minha movimentação, mas também a partir da movimentação entre eles; que eu fosse capaz de criar percursos, sequências didáticas em que eles se sentissem incitados, engajados a participar. Para além daquele modelo onde eu professo, eu queria um modelo onde eles fossem os protagonistas, onde botassem a mão na massa, questionassem, onde eles fizessem, fossem sujeitos de fato. (PP2).

As ponderações de PP2 encontram ressonância em estudos atuais sobre formação docente, tais como os empreendidos por Schon (1992), Tardif (2002), Imbernón (2010), entre outros. Para esses teóricos da educação contemporânea, a análise e a reflexão do professor acerca de sua própria prática é condição preponderante para possíveis mudanças.

Do mesmo modo, a fala dialoga com a de Masetto (2012) quando o autor contempla:

[...] a mudança do papel e das atividades do professor de ministrador de aulas e transmissor de informações para o de mediador pedagógico entre os alunos e suas aprendizagens para desenvolver relação de parceria e corresponsabilidade com eles e trabalhar juntos e em equipe. (MASETTO, 2012, p. 27).

Dentro dessa mesma categoria, respondeu-se que

Interferem diretamente, [...] quando você trabalha com a pedagogia inovadora, como é a pedagogia de projetos20, [...] às vezes esses percursos são múltiplos

[...], porque a pedagogia tradicional, de você dar o conteúdo e o aluno escuta, estuda e responde em uma prova, é pouco democrática. (PP10).

Nesse trecho foi possível depreender a importância da inovação para amplificar o processo de ensino e aprendizagem. E há outra resposta sobre a transformação causada por um novo olhar às práticas cristalizadas na escola e suas repercussões para a formação

do professor na qual afirma-se que:

Em todas. Eu não sou o mesmo professor. A formação acadêmica – e essa é uma crítica que eu faço – no Curso de Letras, a maior parte da sua formação se dá a partir de elementos específicos de linguagem, linguística, literaturas e línguas de modo geral. Acaba que a formação pedagógica é muito superficial. Então você só vai realmente entender [...] o que é ser professor dentro da sala de aula: experimentando, errando, quebrando a cara [...] E todas essas formações me formaram professor. E eu acho um elemento fundamental que é parar de pensar que professor – principalmente de Educação Básica – não é pesquisador. O professor é um grande pesquisador. A sala de aula é um ambiente de pesquisa. Os meus estudantes são uma base de pesquisa inimaginável. Eu não estou simplesmente conceituando de um ambiente distante. Ali eu fui experimentando e cada experiência que eu fiz, dá para ser

20 Pedagogia de projetos é a ressignificação da prática educacional em que são explorados aspectos

referentes ao contexto do aluno a fim de utilizá-los no processo de ensino-aprendizagem, conforme análises derivadas da produção do norte-americano John Dewey.

discutida teoricamente. Então, eu não sou aquele professor que acha que a teoria está desvinculada da prática. [...] as duas são um diálogo. (PP14).

Essa opinião recebe encalço nas ideias desenvolvidas por Hargreaves (2004), para quem os professores mais do que nunca terão, entre suas “necessidades”, que:

[...] promover a aprendizagem cognitiva profunda, aprender a ensinar por meio de maneiras pelas quais não foram ensinados, comprometer-se com aprendizagem profissional contínua, trabalhar e aprender em equipes de colegas, desenvolver e elaborar a partir da inteligência coletiva, construir uma capacidade para a mudança [...]. (HARGREAVES, 2004, p. 40).

Dessa feita, entre as mudanças, anseia-se por superar as relações hierarquizadas, o ensino compartimentado, o professor como detentor do saber; o estudante como repositório de conhecimentos acríticos e desconectados de sua realidade, conforme Freire (1974) ao tratar da “educação bancária”, e dar um passo na direção da integração de conteúdos, na promoção da participação de atores diversos, na estimulação do protagonismo discente, no partilhamento de poderes e do saber na escola.

Nesse cenário, o professor atua como mediador, contribuindo substancialmente na formação de cidadãos reflexivos, críticos, emancipados, intercedendo e auxiliando os estudantes a acessar os mais diferentes e significativos saberes. E ao invés de assistir a uma aula – uma vez que “assistir” é ser telespectador de algo -- os alunos participariam ativamente de sua formação. Uma fala muito interessante que dá o tom de como se desenlaçam as práticas inovadoras adveio de PP1: “[...] Não gosto da palavra ensinar;

na verdade estou despertando os alunos para o conhecimento”.

O professor é a fonte primordial de informação e conhecimento sistematizados. Entretanto, dinamizar o ensino-aprendizagem perpassa em dividir protagonismos, alterar a lógica do ensino tradicional que, sob vários aspectos, não se apresenta como fácil para nenhum dos lados. Em uma abordagem sobre esse tópico, Cunha (2012) argumenta que: “Tenho a impressão até de que os professores criam um certo sentimento de culpa se não são eles que estão “em ação”, isto é, ocupando espaço com a palavra na sala de aula. Tudo indica que foi assim que eles aprenderam a ensinar” (p. 122). Todavia, no que se relaciona aos discentes, conclui que:

[...] os estudantes, de acordo com estudos feitos, estão condicionados a ter um tipo de expectativa em relação ao professor. Em geral, ela se encaminha para que o professor fale, “dê aula”, enquanto ele, o aluno, escuta e intervém quando acha necessário. O fato de se achar na condição de ouvinte é confortável ao aluno [...]. (Idem, p. 122).

Conforme se observou, o cotejamento pela autora de conclusões de estudos acerca de professores e alunos pareceu-nos apontar para um quadro pouco animador: o de que as alternativas que mantém formas de transmissão de conhecimento tradicionais solidificaram-se e que desbravar o diferente não é prosaico uma vez que os dois principais sujeitos do processo educativo mostram-se por vezes desmotivados a transformar a prática e inovar.

Como agravante, nos últimos tempos tem-se tornado constante no seio de segmentos conservadores de nossa sociedade a fala de que os professores de Educação Básica são desqualificados, ou desinteressados. Essa dissertação permitiu desmistificar essa distorcida visão e clarificar que há, sim, professores inovadores, críticos, reflexivos (SCHON, 1992) e apaixonados pela prática e função que desempenham, comprometidos em romper com os paradigmas da educação como a conhecemos, e mais ainda, empenhados com o trabalho que exercem e com seus estudantes.

Diariamente estão à procura do novo, mesmo que seja ter um distinto olhar para uma situação, conteúdo ou turma já conhecida. Estive diante de mais de uma dúzia deles e afirmo: há ainda muitos mais do que os com os quais tive o privilégio e a honra de entrevistar e conhecer. Eles são merecedores de reconhecimento e fazem muito diante do contexto de adversidades no qual trabalham. São igualmente merecedores de valorização, respeito, formação de qualidade, acesso à pós-graduação e de que possam alimentar o sonho de um dia ver a educação tida como investimento, projeto de futuro e não apenas como gasto, ou pior, mencionada apenas em período eleitoral. Afinal de contas, hoje é primordial que se tenha a visão de que:

A escola precisa assumir o papel de formar cidadãos para a complexidade do mundo e dos desafios que ele propõe. Preparar cidadãos conscientes, para analisar criticamente o excesso de informações e a mudança, a fim de lidar com as inovações e as transformações sucessivas dos conhecimentos em todas as áreas. (KENSKI, 2012, p. 64).

É imperativo que as instituições educativas acompanhem as mudanças inerentes ao permanente processo de transformação pelo qual a sociedade atual se encontra imersa devido ao desenvolvimento tecnológico e científico rápido e permanente, de modo a garantir aos estudantes viver e usufruir de uma sociedade em contínuo processo de transformação.