• Nenhum resultado encontrado

Temos aqui um materialista representativo e um prelado católico, também representativo, que emitem uma opinião idêntica sobre a suficiência do

testemunho humano para demonstrar a autenticidade de fatos em que cada um

deles deve crer segundo os seus preconceitos. Depois disso, que necessidade tem o estudioso do ocultismo, ou mesmo o espiritista, de perseguir endossos do argumento que há tanto tempo e com tanta perseverança invocaram, qual seja o de que os fenômenos psicológicos dos taumaturgos antigos e modernos superabundantemente provados com base no testemunho humano devem ser aceitos como fatos? Tendo a Igreja e a Faculdade apelado ao tribunal do testemunho humano, elas não podem negar ao resto da Humanidade um privilégio idêntico. Um dos frutos da recente agitação em Londres, ao redor dos fenômenos mediúnicos, é a expressão de algumas opiniões liberais notáveis da

imprensa secular. “Em todo caso, estamos por conceder ao Espiritismo um lugar entre as crenças toleradas e por deixá-lo em paz”, diz o Daily News londrino em 1876. “Há muitos devotos que são tão inteligentes quanto a maioria de nós e para os quais qualquer ofício óbvio e palpável no que diz respeito às provas destinadas a convencer deve ter sido óbvio e palpável desde muito tempo atrás. Alguns dos homens mais sábios do mundo

acreditavam em fantasmas e continuariam a acreditar neles mesmo se meia

dúzia de pessoas, uma após outra, teimasse em assustar pessoas com diabretes falsos.”

Não é a primeira vez na história do mundo que o mundo invisível tem de lutar contra o ceticismo materialista dos saduceus cegos de alma. Platão deplora tal incredulidade e se refere a essa tendência perniciosa mais de uma vez em suas obras.

Desde Kapila – o filósofo hindu que muitos séculos antes de Cristo, duvidava já de que os iogues em êxtase pudessem ver a Deus face a face e conversar com os seres “mais elevados” – até os voltairianos do século XVIII, que riram de tudo o que fosse considerado sagrado por outras pessoas, cada época teve os seus Tomés descrentes. Chegaram eles alguma vez a impedir o progresso da Verdade? Não mais do que os beatos ignorantes que julgaram Galileu impediram o progresso da rotação da Terra. Nenhuma revelação é capaz de afetar vitalmente a estabilidade ou a instabilidade de uma crença que a Humanidade herdou das primeiras raças de homens, aqueles que – se podemos acreditar na evolução do homem espiritual tanto quanto na do homem físico – receberam a grande verdade dos lábios de seus ancestrais, os

deuses dos seus pais, “que estavam no outro lado da inundação”. A identidade

entre a Bíblia e as lendas dos livros sagrados hindus e as cosmogonias de outras nações deve ser demonstrada qualquer dia. Das fábulas das épocas

mitopoéticas dir-se-á que elas transformaram em alegoria as maiores verdades da Geologia e da Antropologia. A essas fábulas de tão ridícula expressão terá

de recorrer a Ciência para encontrar “os elos perdidos”.

De outra maneira, de onde proviriam essas “coincidências” estranhas nas respectivas histórias de nações e povos tão distanciados entre si? De onde essa identidade de concepções primitivas que, chamadas agora fábulas e lendas, contêm em si, entretanto, o germe dos fatos históricos, de uma verdade amplamente desenvolvida com as cascas dos embelezamentos populares, mas ainda assim a Verdade? Comparai apenas estes versículos do Gênese VI, 1-4: “Como os homens tivessem começado a multiplicar-se, e tivessem gerado suas filhas; vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram por mulheres as que de entre elas escolheram. (...) Ora, naquele

tempo havia gigantes sobre a Terra”, etc. – com esta parte da cosmogonia

lamenta estar sozinho entre todos os seus irmãos sem esposa. A despeito de o Eterno aconselhá-lo a devotar os seus dias apenas ao estudo do Conhecimento Sagrado (Veda), o primogênito da Humanidade insiste. Irritado com tal ingratidão, o Eterno deu ao brâmane uma esposa da raça dos daityas, ou gigantes, de que todos os brâmanes descendem em linha materna. Assim, todo o sacerdócio hindu descende, por um lado, dos espíritos superiores (os filhos de Deus) e de daiteyî, uma filha dos gigantes terrestres, os homens primitivos48. “E elas pariram filhos para eles; os filhos tornaram-se homens poderosos que na velhice foram homens de renome.”49

48. Polier, La mythologie des indous, vol. I, p. 168-69. 49. Gênese, VI, 4.

A mesma indicação encontra-se no fragmento cosmogônico escandinavo. No

Edda ocorre a descrição, feita a Gangler por Har, um dos três informantes (Har,

Jafnhar e Thridi), do primeiro homem, chamado Buri, “o pai de Bör, que tomou por esposa Beisla, uma filha do gigante Bölthorn, da raça dos gigantes

primitivos”. A narração completa e muito interessante encontra-se no Prose

Edda, seções 4-8, das Northern Antiquities de Mallet50.

50. Ed. de Bohn, p. 401-05.

O mesmo fundamento tem as fábulas gregas sobre os Titãs e pode ser encontrado na lenda dos mexicanos – as quatro raças sucessivas do Popol-

Vuh51. Ele se constitui numa das muitas conclusões encontráveis no novelo emaranhado e aparentemente inextricável da Humanidade considerada como fenômeno psicológico. A crença no sobrenaturalismo seria inexplicável de outra maneira. Dizer que ela nasceu, cresceu e se desenvolveu através das incontáveis eras, sem causa ou pelo menos sem uma base firme ou sólida sobre a qual repousar, mas apenas como uma fantasia oca, seria considerá-la um absurdo tão grande quanto a doutrina teológica segundo a qual o mundo foi criado a partir do nada.

51. No Quarterly Review de 1859, Graham faz uma estranha descrição de muitas cidades orientais, agora desertas, nas quais as portas de pedra tinham dimensões enormes, frequentemente, em aparência, fora de proporção em relação aos próprios edifícios, e observa que todas essas residências e portas trazem a marca de uma antiga raça de gigantes.

É muito tarde agora para lutar contra uma evidência que se manifesta, por assim dizer, à luz forte do meio-dia. Os jornais liberais, tanto quanto os cristãos, e os órgãos das autoridades científicas mais avançadas começam a protestar unanimemente contra o dogmatismo e os preconceitos estreitos dos saberetes. The Christian World, um jornal religioso, junta a sua voz à da imprensa incrédula de Londres. Eis um exemplo do seu bom senso:

“Se um médium”, diz ele, “puder ser considerado da maneira mais conclusiva como um impostor, nós ainda assim não concordamos com a disposição manifestada por pessoas de alguma autoridade em assuntos científicos que dizem „safa!‟ e batem na cabeça quando se lhes pede examinem cuidadosamente as questões às quais o Sr. Barret se referiu em seu trabalho apresentado à British Association. Porque os espiritistas caíram em muitos absurdos, não há razão para que os fenômenos nos quais eles se apóiam devam ser tidos como indignos de exame, sejam mesméricos, ou clarividentes, ou de qualquer outra natureza. Mas deixemos os nossos homens sábios dizer- nos o que eles são, e não nos ofender, como pessoas ignorantes frequentemente ofendem a juventude inquiridora, com este apotegma tão cômodo quanto insatisfatório: „As criancinhas não devem fazer perguntas.” Assim, chegou a hora em que os cientistas perderam todo o direito de ser elogiados como o verso de Milton que diz: “Ó tu que, pelo testemunho da verdade, incorreste na exprobração universal!”. Triste degeneração, que lembra a exclamação daquele “doutor em Física” – mencionado há cento e oitenta anos pelo Dr. Henry More – que, tendo ouvido contar a história do Tambor de Tedworth e a de Anne Walker, gritou de repente: “Se isso for verdade, tenho

estado numa situação difícil todo esse tempo e devo recomeçar os meus estudos”52.

52. Dr. More, Carta a Glanvill, em Sadducismus Triumphatus, p. 12.

Mas no nosso século, apesar do endosso de Huxley ao valor do “testemunho humano”, até o Dr. Henry More tornou-se “um entusiasta e um visionário (dois epítetos que seria desvario ver reunidos em uma só pessoa)”53.

53. J. S. F., Demonologia, or Natural Knowledge Revealed, 1827, p. 219.

Não foram fatos que faltaram à Psicologia, desde muito tempo, para que ela tornasse as suas leis misteriosas mais bem-compreendidas e aplicadas às ocorrências tanto ordinárias quanto extraordinárias da vida. Ela os teve em abundância. O que eles exigem é registro e classificação – observadores treinados e analistas competentes. O corpo científico deveria fornecer tais homens. Se o erro prevaleceu e a superstição correu desenfreada durante estes séculos por toda a cristandade, essa é a infelicidade das pessoas comuns, a repreensão da Ciência. Gerações nasceram e desapareceram, cada uma delas fornecendo a sua quota de mártires para a consciência e para a coragem moral, e a Psicologia é pouco mais bem-compreendida em nossos dias do que quando a mão pesada do Vaticano arremessou aqueles bravos desafortunados a um fim intempestivo e ferreteou a sua memória com o estigma de heresia e feitiçaria.

5. O ÉTER OU “LUZ ASTRAL”

“Ich bin der Geist der stets verneint.” (Sou o espírito que sempre nega.) GOETHE: Mefisto em Fausto.

“O Espírito da Verdade, que o mundo não pode acolher, porque não o vê nem o conhece.”

Evangelho segundo São João, XIV,17.

“Milhares de criaturas espirituais percorrem a terra Invisíveis, quando estamos despertos ou adormecidos.”

MILTON, Paradise Lost, livro IV, 677.

“A mera explicação intelectual não pode reconhecer o que é espiritual. Como o Sol que sobrepassa o fogo, assim o espírito sobrepassa os olhos do mero intelecto.”

W. HOWITT.

Tem havido uma infinita confusão de nomes para expressar uma única e mesma coisa.

O caos dos antigos; o sagrado fogo zoroastrino, ou o Âtas-Behrâm dos pârsîs; o fogo de Hermes; o fogo de Elmes dos antigos alemães; o relâmpago de Cibele; a tocha ardente de Apolo; a chama sobre o altar de Pan; o fogo inextinguível do templo de Acrópolis, e do de Vesta; a chama ígnea do elmo de Plutão; as chispas brilhantes sobre os capacetes dos Dióscuros, sobre a cabeça de Górgona, o elmo de Palas, e o caduceu de Mercúrio; πuρ άζβεζηος; o Ptah egípcio, ou Râ; o Zeus Kataibates (o que desce) grego1; as línguas de fogo pentecostais; a sarça ardente de Moisés; a coluna de fogo do Êxodo, e a “lâmpada ardente” de Abraão; o fogo eterno do “poço sem fundo”; os vapores do oráculo de Delfos; a luz sideral dos Rosa-cruzes; o ÂKÂSA dos adeptos hindus; a luz astral de Éliphas Lévi; a aura nervosa e o fluido dos magnetizadores; o od de Reichenbach; o globo ígneo, ou o gato-meteoro de Babinet; o Psicode e a forçaectênica de Thury; a força psíquica de Sergeant E. W. Cox e do Sr. Crookes; o magnetismo atmosférico de alguns naturalistas; galvanismo; e, finalmente, eletricidade, são apenas nomes diversos para inúmeras manifestações diferentes, ou efeitos da mesma misteriosa causa que a tudo penetra – o grego Archaeus ou Aρταĩος.

Sir E. Bulwer-Lytton, em seu Coming Race [cap. VII], descreve-a como o VRIL2, utilizada pelas populações subterrâneas, e permitiu aos seus leitores entendê-la como ficção. “Esse povo”, diz ele, “considera que no vril eles chegaram à unidade dos agentes naturais da energia”; e prossegue para mostrar que Faraday os designou “sob o nome mais cauteloso de correlação”, pois:

2.Entendemos que o nobre autor cunhou seus curiosos nomes contraindo palavras de línguas

clássicas. Gy proviria de gune; vril, de virile.

UMA FORÇA PRIMORDIAL MAS