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Cenário da ecoinovação na Zona Franca de Manaus

5.1 RESULTADOS DA ABORDAGEM QUALITATIVA

5.1.1 Cenário da ecoinovação na Zona Franca de Manaus

Uma apreciação inicial do cenário da ecoinovação na Zona Franca de Manaus permitirá um melhor entendimento e contextualização sobre as potencialidades, entraves e possíveis direcionamentos, os quais serão expostos posteriormente. Serão abordados nessa seção aspectos relacionados com o comprometimento empresarial com o desenvolvimento sustentável e ecoinovação, qualificação da mão de obra, pesquisa e desenvolvimento e marcos regulatórios.

Com relação ao comprometimento das empresas com o desenvolvimento sustentável e ecoinovação, as entrevistas sinalizaram haver visões particulares e não abrangentes entre as instituições, além de não ser um comprometimento generalizado. Dentre as empresas identificam-se dois comportamentos díspares. No primeiro estão grandes grupos multinacionais que seguem diretrizes de sustentabilidade de suas matrizes. No segundo grupo estão as empresas regionais que apresentam as seguintes características: conservadorismo em relação a inovação, avessas ao risco e ao pioneirismo, imediatistas quanto ao resultado e cerceadoras da criatividade dos funcionários. Um ponto a destacar é a que a sustentabilidade é promovida pelas empresas através de ações sociais. Estas afirmações foram expressas nos seguintes termos pelos respondentes:

Você tem alguns comprometimentos pontuais, mas ele não é um comprometimento espraiado, ele não é um comprometimento generalizado. A gente percebe que algumas empresas de grande porte, até por uma necessidade de economia de mercado mesmo, elas precisam manter um conceito dentro da condição de desenvolvimento sustentável, de uma produção mais verde e tudo o mais, mas são pontuais (E3).

[...] as empresas do polo [PIM], a grande parte segue uma diretriz que vem da matriz... E eles entendem que a empresa deles aqui, ela também tem que seguir a mesma política, a mesma filosofia... Existe uma preocupação, principalmente das empresas que são estrangeiras, mas outras empresas, elas fazem vista grossa em relação a essa sustentabilidade, essa preocupação com o meio ambiente (E7). [sobre as empresas locais]... elas entendem do ponto de vista conceitual, mas na hora de meter a mão no bolso, elas não fazem... Na prática, quando você tem que fazer o risco inerente à inovação, que seria a questão de sair primeiro, elas esperam que alguém o faça, para fazer a cópia. Elas são muito... conservadoras. Empresas conservadoras, elas falam em inovação, elas ditam inovação, elas falam muito em competitividade... mandam os funcionários fazer curso de inovação, de criatividade,

mas você não percebe isso na rotina... A gestão intermediária, talvez por medo de arriscar, não deixa os funcionários, que seriam a fonte da criatividade, que poderia gerar inovação, se expandir. Então não tem portfólio de ideias, não tem tempo discricionário, não tem uma série de atividades rotineiras que gerariam essa inovação (E6).

[sobre o comprometimento com desenvolvimento sustentável] Eu vejo muito pouco, eu não consigo imaginar assim, com excessão de uma ou outra, mesmo multinacionais, não vejo assim essa vontade de mudar... Lógico, todas as empresas tem essa preocupação com a gestão ambiental, porque a lei obriga e tal, mas para cumprir a lei, tá? (E8).

[...] Eu acredito que sim [comprometimento com o desenvolvimento sustentável]. A gente vê por algumas ações que são divulgadas das empresas em promover alguma ação social de responsabilidade... A percepção que a gente tem é que as empresas têm, têm isso nas suas ações, mas isso não chega com força na academia (E4).

A falta de comprometimento com o desenvolvimento sustentável também é medido pela baixa utilização de insumos regionais e pela ausência de políticas para esse fim.

[...] empresas com movimento sustentável, pouco existe... parece uma seara desconhecida por algumas empresas... Os insumos de alguns produtos ou uma outra forma de produção que pudesse ser feita, aproveitando os insumos da região... esse [des]comprometimento das empresas é a falta de uma política que faça essa exigência com as empresas (E2).

Adicionalmente, um dos entrevistados (E7) considera a ausência de consciência ambiental como um fator cultural relacionado à “Síndrome dos Recursos Naturais” ou “Paradoxo da Abundância” (resource curse ou paradox of plenty) que não estimula inovações sustentáveis. A abundância de recursos naturais não gera preocupação com o meio ambiente. Complementarmente, os conceitos de ecoinovação, sustentabilidade e pegada ecológica não estão amplamente consolidados nas empresas regionais (E8).

A baixa qualificação da mão de obra para a inovação é outro fator crítico presente na região. Os principais problemas estão relacionados com o desenvolvimento de competências regionais, ausência de estratégias para absorção de tecnologias, metodologia de ensino inadequada, baixa oferta de cursos de pós-graduação e até mesmo aspectos de natureza ideológica. Estes problemas foram apontados nas entrevistas, nos seguintes termos:

[...] o problema da transformação nessa área está na metodologia de ensino. As universidades tem uma influência ideológica caduca... é o pessoal que traz Marx no peito, Hugo Chávez na cabeça e no bolso o Evo Morales, que são de procedimentos ideológicos completamente arcaicos, nunca levaram a coisa nenhuma... Porque se alguém vai falar na parte econômica, ele já vai ser imperialista... Isso parte de professores (E2).

[...] baixíssima, baixíssima [sobre a qualificação da mão de obra]. Há uma carência de profissionais e a gente busca mão de obra fora do Estado... Há muito a ser feito.

Eu acho que é muito baixa ainda a qualificação do nosso pessoal. E precisaria nessa conversa [das universidades com o Polo Industrial de Manaus] a gente ter uma prevalência das pesquisas aplicadas (E3).

[...] a gente quer formar pessoas capazes e competentes para trabalhar na nossa região,... para que a gente não importe [não traga profissionais de fora]... Vai que a gente tenha competências aqui, regionais, para que possam tocar os empreendimentos que surjam, né? (E4).

[...] existem alguns cursos e alguns treinamentos voltados justamente para essa parte do meio ambiente, da preservação ambiental, do desenvolvimento sustentável, mas eles ainda são muito incipientes aqui no nosso Estado... dá para contar nos dedos quantos programas de pós-graduação nós temos voltados para essa área do meio ambiente (E7).

[...] a gente tem que mudar a mentalidade nas universidades brasileiras... formar o aluno para ser um grande inovador, um grande empreendedor. Elas [as universidades] estão formando alunos para pensar de uma forma mais quadradinha, para serem funcionários, para serem empregados e [existe] também uma política contra o capitalismo, eu vejo muito forte isso. Eu estudei no exterior, lá, lógico, tem os pesquisadores, pessoas de esquerda, um aluno ou outro... Então neste país [Brasil] ser bem sucedido é defeito (E8).

[...] nossa qualificação aqui na área de tecnologia ela ainda é aquém do que a gente precisa.

[...] você não tem aqui certos conhecimentos específicos e aí falta até estratégia da região para poder fazer com que esse pessoal [empresas multinacionais] venha, mas ensine os que estão aqui... Uma certa estabilidade para você poder enraizar esse conhecimento aqui (E9).

Segundo a perspectiva dos entrevistados, a realidade local sobre P&D, é caracterizada pela escassez de recursos e quando existem não são aplicadas em ecoinovação. As parcerias entre as empresas e a academia são incipientes e a ênfase é em pesquisa básica em detrimento da pesquisa aplicada e não inexistem políticas de inovação para a região. O destaque positivo é a iniciação científica no ensino médio. A esse respeito, assim se expressaram os entrevistados:

Em que pese haver bons laboratórios no INPA, bons laboratórios na FUCAPI, bons laboratórios no CBA, bons laboratórios na EMBRAPA [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária], a gente não percebe que a produção desses laboratórios venha a conduzir a uma nova visão de produção econômica. Outro problema é que as verbas são cortadas.

A gente não sabe vender na área de tecnologia. Nós da Universidade, nós não sabemos vender isso. Precisa de um elo... um cara que pense mercado dentro da universidade (E2).

[...] você tem um recurso expressivo hoje de P&D. São Valores muito altos. A gente está falando aí de bilhões, mas esses recursos também sofrem um processo de contingenciamento. Esse recurso também ele não tem, e deveria ter, programas, programas que dessem prioridade para a ecoinovação, para a economia verde. A aplicação desses recursos [fica] ao direcionamento das empresas. Então ela pode aplicar em um software, que é uma coisa relativamente simples para a empresa fazer e ela não está obrigada a aplicar em um projeto com esse conceito de ecoinovação (E3).

[...] estão surgindo devagar [parcerias com empresas]... A gente precisa de muito aporte... para chegar a um protótipo. A gente só consegue fazer se for através de aporte financeiro quando a gente tem desenvolvido um projeto em conjunto com uma empresa ou algum outro setor...

[...] tem muito recurso para pesquisa básica... A gente recebe muita tecnologia, só que é tecnologia embrionária. Não teve um teste, não teve uma aplicação, aí a gente precisa de apoio e o privado se destaca para fazer esse desenvolvimento final e fazer esse licenciamento. Essa que é a lacuna que a gente está tentando preencher hoje. [...] a gente sabe que, com a Lei de Informática, 5% vai para a SUFRAMA [verbas para P&D] e nós temos um comitê que deveria dividir isso para as instituições, mas o governo federal não tem feito essa repartição... (E4).

Pois é! Esse é um grande problema aqui no nosso Estado, um grande gargalo... O Centro de Biotecnologia da Amazonia seria um grande catalizador de novas tecnologias, novos processos, novos produtos. Seria uma vedete, vamos dizer assim, na área científica do país, porque ia atrair capital intelectual de vários lugares do mundo. Mas, infelizmente a coisa não andou. Nós vimos que existem poucos editais voltados para fomento à pesquisa nessa área de meio ambiente (E7).

[...] a FAPEAM inovou, inclusive, coisas que no Brasil não tinha que é a iniciação científica para crianças de ensino médio... Antigamente tinha iniciação científica só para ensino superior... Depois o CNPq copiou da FAPEAM... (E8).

Olha, eu posso dizer duas coisas para você que é do meu conhecimento [sobre verbas para pesquisa]. Tem dois mecanismos grandes de pesquisa aqui [no Amazonas]: um, eram o recursos da FAPEAM, que minguaram... O outro é o recurso que continua aí, caiu, mas que é o P&D de informática e o PPB... Você precisa ter gente qualificada, tanto quanto você precisa ter universidades, precisa ter centros de pesquisa que apoiem as empresas. Esse modelo é que eu acho que precisa ser reformulado e precisa ser fortalecido, porque eu acho que em Manaus está meio solto, porque falta governança. Acho que está havendo perda de governança, porque tinha e a SUFRAMA [perdeu], na minha forma de ver. Acho que falta indução. Agora do ponto de vista de recurso, hoje tem recurso, mas são as empresas que decidem onde esses recursos vão ser investidos. Então é assim, a gente, os institutos de pesquisa correm atrás para poder receber recursos, para poder sobreviver. Não acho que isso seja uma política que leve à consolidação de um ambiente de inovação na região. A inovação nossa é exógena. Ela é feita na Europa, lá na América, lá na Coréia, lá na Finlândia, lá na Suiça, na Alemanha, no Japão e isso é um problema... Nós temos que saber no que nós podemos ser bons... encontrar nosso espaço. Acho que a gente está vendo o hoje, mas também tem que olhar o amanhã e eu acho que o amanhã passa necessariamente por conhecimento, por instituições de educação, de pesquisa e inovação fortes, gente qualificada, estabilidade e mecanismos claros e de apoio a esses investimentos (E9).

Com relação aos marcos regulatórios voltados a inovações sustentáveis, existem dúvidas de interpretação por parte dos entrevistados. O Decreto-Lei no. 288 (BRASIL, 1967), que estabelece as regras para concessão de incentivos fiscais federais às empresas que se estabelecerem na Zona Franca de Manaus é omissa quanto a incentivos fiscais para a inovação, assim como a legislação estadual de incentivos fiscais, Lei no. 2.826 (AMAZONAS, 2003).

Por outro lado, a Lei de Informática no. 8.387 (BRASIL, 1991) destina recursos para pesquisa e desenvolvimento, para programas prioritários, a serem geridos pelo Comitê das

Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia (CAPDA). Nesta mesma Lei, que define o conceito de processo produtivo básico (PPB) como sendo “o conjunto mínimo de operações, no estabelecimento fabril, que caracteriza a efetiva industrialização de determinado produto” não há referência às atividades de inovação. A Lei 12.305 (BRASIL, 2010) que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos é de abrangência nacional, sem qualquer excepcionalidade em relação à ZFM. De fato, as legislações citadas não concedem incentivos fiscais para inovações, nem tampouco ecoinovações. Todavia, o posicionamento dos entrevistados é este:

Prevê. A [lei] de incentivo fiscal prevê... tanto que uma parte do incentivo fiscal [da Lei de Informática] volta para o CAPDA. Na época em que ele [CAPDA] foi lançado, não se falava muito em inovação, só em ciência e tecnologia, pesquisa e desenvolvimento... Hoje já tem uma turma que está reunida para poder repensar o CAPDA (E1).

Não só as leis de incentivo federal e estadual e parte que cabe ao município, como as outras situações, por exemplo, estas taxas de serviço que as empresas pagam e ficam contingenciadas no cofre da SUFRAMA (E2).

Não, não levam [em consideração a ecoinovação]... na verdade é um marco tributário [a legislação da ZFM]. Eu acho que cabe uma nova discussão dentro da região, especialmente na Amazônia Ocidental, de se começar a pensar uma marco regulatório da Zona Franca, que leve em consideração essas questões de ecoinovação. Você não precisa mudar toda a legislação, mas você tem como melhorar muita coisa dentro daí... eu cito como exemplo muito interessante da ecoinovação a aprovação da Zona Franca Verde... ela nada mais é do que um incentivo do IPI para as empresas [instaladas em áreas de livre comércio na Amazônia Ocidental] que utilizarem matéria prima regional. É uma coisa relativamente simples, mas que ela induz uma agregação de valor... Então você conseguiria induzir alguns arranjos produtivos, algumas cadeias produtivas, que trabalhassem os conceitos da ecoinovação, a partir da própria legislação tributária que a gente tem, sem precisar criar imposto... Na Zona Franca de Manaus você poderia ter algo parecido e poderia ser um incentivo fiscal regressivo, porque hoje se eu me limitar a cumprir meramente o PPB, que são as etapas mínimas eu tenho todos os incentivos. Se eu cumprir o PPB e trabalhar uma linha da minha produção na ecoinovação, eu vou continuar tendo os mesmos incentivos.

[Sobre a legislação brasileira] eu acho que ela é uma legislação carente de especificidade... A Política Nacional de Resíduos Sólidos ... ela é uma política de logística reversa... Então eu acho que aí precisaria tratar de algumas especificidades nessa questão... (E3).

A legislação que nós teríamos [para incentivar a inovação dentro do Estado] é a lei federal da informática (E5).

Nós temos uma lei de inovação estadual2 e a própria SUFRAMA mantém para o

Polo Industrial de Manaus essa lei, que é a lei de incentivo e inovação, que é de onde a gente consegue recurso (E6).

2 Lei no. 3.095 (AMAZONAS, 2006), que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e

tecnológica no Estado do Amazonas, porém, não tem relação com os marcos regulatórios da Zona Franca de Manaus. A gestão dos recursos é feita pela FAPEAM.

[...] se você olhar a Lei de P&D como marco regulatório ela permite que seja feito [inovação]...[mas marcos regulatórios da Zona Franca] eu desconheço (E9).

Eu acho que seria um diferencial se a gente conseguisse inserir a inovação verde [na legislação dos incentivos fiscais]... se a gente tivesse um selo verde... que fosse um selo que demonstrasse confiança... é um produto corretamente produzido... ambientalmente correto (E11).

[...] não há legislação para incentivo... (E12).